OS SOBREVIVENTES DO NAVIO 270577
Oorgulho é um sentimento intrínseco do ser humano. O “NAVIO 270577” tem orgulho na resiliência dos seus integrantes/ sobreviventes que das trevas ressuscitam e renovam esperanças, todos os dias, tal como Fénix... Todos emergiram das dantescas celas e campos de concentração, autênticas fábricas de morte, construídas por Neto/ Lara/ Iko/ Ludy/ Onambuwe e outros, para não deixarem sobreviventes, mas souberam, como homens e mulheres comprometidos com um projecto de sociedade, capaz de derrubar a mentira, remando, teimosamente, em direcção ao horizonte de PAZ, PERDÃO, VERDADE e RECONCILIAÇÃO! Mas, por estranho que pareça, só estas sublimes palavras, só estas, sem baionetas, sem canhões, sem algemas, sem vinganças, atemorizam a consciência dos algozes “Netolaristas” ( de Maio de 1977), pese contarem, agora, também, com o inusitado patrocínio do Presidente da República, João Manuel Gonçalves Lourenço.
Ontem Eduardo dos Santos converteu Neto de genocida em herói nacional, hoje querem transformar o genocídio em conflito armado, com a cumplicidade saloia ( e por isso criminosa) da maioria dos parlamentares. Podem institucionalizar, no crónico boçalismo e arrogância a negação dos assassinatos em massa, mas não contarão com a nossa vénia.
Eles, os crimes violentos e hediondos, de Agostinho Neto, Lúcio Lara e DISA de Maio de 1977 até 1979, são imprescritíveis e insusceptíveis de amnistia. Não somos covardes ( a maioria), temos orgulho e honra! Nunca atiraremos a bandeira da verdade, ao chão!
Se não for negociada, no nosso tempo, uma solução consensual, entre as partes: Vítimas x Algozes, por desonestidade do regime de 44 anos, os nossos descendentes, persistirão, tal como nós o fazemos, em defesa da memória dos co- sofredores que partiram.
O executivo que protege, pelo óbvio, os algozes, teme a nossa única arma: a pomba da verdade, tal como o diabo da cruz! Espera( va) m, radicalismo, boçalidade, intolerância e machados de guerra, como armas de vingança e nós estendemos as mãos de serenidade, dignidade, honra e orgulho de sermos íntegros e verticais, na defesa da memória dos nossos camaradas, injustamente assassinados. O executivo e o partido no poder falam na defesa dos Direitos Humanos, mas albergam, nos mais altos pelouros, muitos dos radicais do 27 de Maio de 1977, que ainda se vangloriam dos assassinatos, tais como Wadjimbi, um dos terrores de Malanje, a par de Laborinho e Marta, Liberdade, que forneceu a lista a Iko Carreira, para o regresso de jovens que estavam no exterior, secundados por, João Melo, Pelinganga, Carlos Jorge, Ludy Kissassunda, Onambwe, Carneiro, Pepetela, Rui Monteiro, Luandino, intelectuais/ escritores de uma monstruosidade literária, que resistem ao mea- culpa.
Nito Alves foi acusado de ser racista, de estrangular o abastecimento alimentar, os salários dos militares e do descalabro da economia, tudo pelo Bureau Político do MPLA, em 1977, este mesmo órgão chega a fazer insinuações e calúnias passionais que mostram a sua natureza perversa, no caso de Sita Vales.
Ela era uma jovem íntegra, corajosa, coerente e blindada ideologicamente, nunca foi militante do sexo, como só por maldade, dirigentes de baixo coturno, a puderam acusar, por não terem higiene intelectual.
A alusão do 27 de Maio ter a sua base social de apoio na 1. ª Região do MPLA e no Campo de São Nicolau, também, não colhe. Felizmente a verdade não prescreve e, hoje, a situação mantém- se inalterável e embaça a tese: O MPLA é a Mentira e a Mentira é o MPLA. Vejamos excertos de um macabro comunicado do Bureau Político do Comité Central do MPLA de 20 e 21 de Maio de 1977 e, depois, analisemos se alguma coisa se alterou:
BASE SOCIAL DE APOIO:
-“É no entanto evidente que um determinado número de ex- prisioneiros políticos do antigo “Campo de São Nicolau”, chefiado por Zé Van- Dúnem e um punhado de responsáveis da 1. ª região, tendo à cabeça Nito Alves, manifestam desde os primeiros momentos da derrocada do fascismo colonialista, estranhas afinidades que, a partir da Conferência Inter- regional de Militantes em Setembro de 1974, viriam a caracterizar- se por uma actividade política de grupo, fora das estrutura do MPLA, mas sempre a coberto do MPLA. A eleição daqueles dois cabecilhas para o Comité Central foi justamente fruto de uma actividade de grupo e foi facilitada pelo momento que então se vivia com o fim próximo da guerra colonial e a ofensiva imperialista contra o MPLA, inclusivamente, através das chamadas “revolta activa” e “revolta do leste” fomentadas no seio do Movimento, em benefício dos agrupamentos fantoches da Unita e Fnla. O plano executado em 27 de Maio vinha sendo preparado há mais de três anos e pode dizer- se que se inspira nas reflexões, da vivência comum e das ambições de um relativo pequeno grupo de jovens prisioneiros políticos dos anos 70 do que no tempo colonial se chamava “campo de São Nicolau”. Esse grupo, que não se misturava com a maioria dos prisioneiros políticos originários das classes mais exploradas, constitui mesmo em São Nicolau um núcleo elitista, que não conseguia ultrapassar os seus preconceitos pequeno- burgueses”, in comunicado do BP do MPLA em 1977. Muitos jovens assassinados nunca estiveram nestas duas plataformas ( 1. ª Região e São Nicolau), nem sequer conheciam Nito Alves e Zé Van- Dúnem.
RACISMO:
Neste quesito, na brincadeira, costumo chamar os meus camaradas co- sofredores de incolores, pela forma como os racistas do MPLA nos tratavam, senão vejamos, como era o conceito de país multirracial, visto nas amizades de Nito Alves: “Sita Vales, Rui Coelho, Manuel Vidigal, Nuno Simões, José Reis, Carlos Pacheco ( conhecido como o comando aventureiro, actual historiador), João de Almeida, Elvira da Conceição Virinha, Amadeu Neves
“Dédé”, entre outros, não eram pretos, logo o Bureau Político mais uma vez mentiu e continua, quando se trata de atacar adversários. ACUSAÇÃO INFAME “São os seus próprios colaboradores, António Mendes Costa, Virgílio Santos Neto ( Zamba), Paulo Manuel ( King), e outros do CIR “Certeza”, que vêm com reservas o ascendente de Sita Vales, só possível devido ao apoio de Alves com quem viveu maritalmente”. Uma infame mentira, só possível de gente insana, maldosa, insensível, que nem depois de a terem assassinado barbaramente, sou
beram, respeitar a sua alma e honorabilidade. Sita nunca teve nenhuma relação marital com Nito Alves, por ser esposa de Zé Van- Dúnem, que todos os próximos podem provar. Depois é atribuída a Sita Vales um rascunho, a ser lido por Nito Alves, sobre um alegado comunicado a decretar um estado de sítio. PROCLAMAÇÃO DO POVO ANGOLANO O governo acaba de ser derrubado. Numa acção corajosa, as massas populares de Luanda em conjunto com as nossas gloriosas FAPLA, ergueram- se em armas contra a actual situação que se vivia no país – fome, miséria e repressão sobre a grande maioria do nosso povo, luxo e corrupção para uma minoria. As massas populares e as gloriosas FAPLA, proclamam a todo o país a insurreição Popular Armada. O povo ergue- se em todo o país contra os reaccionários e oportunistas que se haviam apoderado da direcção do nosso glorioso MPLA, que embora proclamassem como o seu objectivo o socialismo, a sua acção prática visava a consolidação de uma pequena burguesia em ascensão no poder, à custa da opressão dos operários, camponeses, intelectuais revolucionários da pequena burguesia patriótica que diziam defender e representar.
Está decretado o Estado de sítio no país”.
MANIFESTAÇÃO OU GOLPE
O próprio Bureau Político se contradiz
na sua declaração. “Durante o mês de Março a clique fraccionista inicia uma intensa preparação para uma manifestação no dia da reunião decisiva do Comité Central, que impedisse a previsível sanção de Nito Alves e Zé Van- Dúnem”, in BP, MPLA.
MENTIRA E INCOMPETÊNCIA ETERNAS ALIADAS
O MPLA alimenta mentiras a cada momento de fracasso das suas políticas económicas e crónica incompetência, como se pode aferir destes extractos: a) ” A nível da governação, os fraccionistas, apoiados numa burocracia conservadora, travaram constantemente a concretização das decisões dos governantes. A cada passo se usava e abusava do EFU ( Estatuto do Funcionalismo Ultramarino) para justificar a necessidade de preencher tal e tal formalidade, antes de cumprir as decisões revolucionárias que iam no interesse do Povo”; b) ” Ao nível da distribuição dos alimentos uma perfeita sabotagem foi organizada. O sacrifício feito pela Nação em importar bens de consumo não se traduzia por uma melhoria na sua aquisição por parte das populações. Verificam- se estrangulamentos a vários níveis, desde as Comissões Populares de Bairro até ao próprio Ministério do Comércio Interno, e tudo isso com o objectivo declarado de provocar o descontentamento e a revolta do Povo contra o MPLA e o Governo”; c) “Nunca Nito Alves ou qualquer dos chefes fraccionistas convidou a população a intensificar a produção. Nunca qualquer deles se referiu ao preocupante desgaste de divisas para aquisição de alimentação em prejuízo dos bens de equipamento de que o país tanto precisa”; d) “O próprio desporto foi utilizado pelos fraccionistas na preparação do golpe. Recorrendo à táctica já utilizada pelos patriotas angolanos no tempo do colonialismo, fortaleceu- se um clube desportivo de modo a para ele atrair a simpatia das massas, e a utilizá- lo assim como propaganda a favor de determinados objectivos. Isso foi feito com o “Progresso do Sambizanga” que incluiu no seu elenco jogadores de qualidade, chegando mesmo recentemente a ganhar um torneio. Animado pelos fraccionistas da CPB do Sambizanga, o clube passa de um momento para o outro a ter como presidente Nito Alves e começa a planificar encontros em diversas províncias. É o próprio assassino Kiferro quem declara que o clube tinha fins políticos e que sob a sua capa se tinha constituído o grupo de choque Kiferro que durante o golpe recebeu a missão de levar a cabo missões de liquidação física e outras missões de carácter violento”; e) ” Nas Forças Armadas todas motivações foram utilizadas. O Ministério da Defesa e o Estado- Maior Geral eram responsabilizados pelas carências em matéria de salário, fardamento, alimentação e mesmo armamento.
(...) Incompreensivelmente algumas zonas queixavam- se de atrasos inconcebíveis e tudo isso era imputado ao Estado Maior e ao Ministério. No próprio dia do golpe de Estado verificou- se que oficiais fraccionistas guardavam ( e muitas vezes utilizavam em seu proveito) as somas destinadas aos combatentes, dizendo- lhes que ainda não as tinham recebido”. Como se pode verificar todas estas acusações foram feitas em Maio de 1977 e a pergunta que teima em não se calar é: porquê que elas continuam tão actuais, quando já foram assassinados, naquele ano os alegados responsáveis e tantos outros?
É o MPLA de Neto, uma entidade de bem? Seguramente, não! Eles continuam a destilar o ódio, a adorar a mentira, a amar o dinheiro, a odiar a maioria dos povos, a vilipendiar as liberdades e democracia, bem como a destruir as vidas dos adversários ou mesmo assassina- los, como única saída negocial. Por esta razão, os do “Navio 270577” nunca deverão esquecer o genocídio do 27 de Maio de 1977, nem aceitar imposições do regime. É incontornável? Não! Havendo respeito e consideração para com as vítimas, tudo é possível, o inverso não é verdadeiro, porquanto as partes devem estar num encontro dignamente representadas e com legitimidade, para o alcance da magistratura da Reconciliação e do Perdão entre camaradas.
O nosso clamor, durante todos estes tortuosos anos, não visa a simples obtenção de um boletim de óbito, direito consagrado constitucionalmente, mas saber das causas de tão hediondo acto de barbárie.
Pouco importa que a maioria dos deputados não tenha noção do que aprova, mas as vítimas do 27 de Maio, não se vendem, tão pouco se rendem por um rebuçado envenenado. Os boletins de óbito de um conflito militar, são diferentes dos das vítimas dos crimes de genocídio, por estes terem de atender ao seguinte: a) Onde foi enterrado o cadáver? b) Qual foi a causa da morte? c) Os restos mortais têm de ser alvo de testes de ADN d) Qual o regime que vigorava, na altura da morte? e) Quem foi a entidade executora? f) As vítimas tiveram julgamento justo? Estas e outras razões determinam o encerramento do dossier com a assinatura de um Acordo Nacional de Reconciliação e Perdão, sustentado com um conjunto de indemnizações, recuperação dos direitos políticos e reabilitação da memória das vítimas.