CONSTITUIÇÃO PROÍBE LOURENÇO DE SER PRESIDENTE DO MPLA
AConstituição nos países sérios é um documento solene, cuja estrutura normativa estabelece os órgãos, a independência e as regras pelas quais todos devem obediência, respeito e cumprimento obrigatório.
O poder legislativo é o seu guardião e o Chefe de Estado o principal garante da sua aplicabilidade e cumprimento. Infelizmente, Angola, não é um Estado sério, de direito e democrático, pois, faz parte dos Estados onde a partidocracia é uma instituição de engenharias ideológicas fraudulentas de manutenção de poder e que, para atingir esse fim, não olha a meios, não se coíbe de espezinhar a própria Constituição. A existência de vários partidos não é sinónimo de multipartidarismo pleno, mas, no caso angolano, de atipicidade verbal/ constitucional, assente na força de baionetas militares, controladas por uma clique, sem noção de país.
A Constituição de Angola proíbe que João Lourenço, Presidente da República seja, igualmente, presidente do MPLA. Porque razão o MPLA é o único partido político a possuir células partidárias em todos quartéis e unidades militares, policiais e de Segurança de Estado, se as Forças Armadas devem ser apartidárias?
E, mais grave ainda é tendo criticado os excessos de poder do antecessor, em três anos ( 2017- 2020) tenha “criado” mais decretos legislativos presidenciais, conferindo- se mais poderes, inclusive do que os que têm os presidentes dos Estados Unidos da América e da Rússia, que têm armas nucleares? O bizarro é toda esta “engenharia con
stitucional” ser uma homenagem à Lei Constitucional do MPLA de 1975, imposta ao país de 1975 a 2010, agora, com respaldo do Tribunal Supremo, Tribunal Constitucional, Procuradoria- Geral da República e Assembleia Nacional ( antes Assembleia do Povo), numa espécie de re
pristinação ao art. º 6. º ( Lei Constitucional do MPLA de 10 de Novembro de 1975):
“As Forças Armadas Populares de Libertação de Angola – FAPLA – braço armado do Povo, sob a direcção do MPLA e tendo como Comandante em Chefe o seu Presidente, são institucionalizadas como exército nacional da República Popular de Angola, cabendo- lhes a defesa da integridade territorial da Pátria e a participação ao lado do povo na produção e, consequentemente, na Reconstrução Nacional. O Comandante em Chefe das Forças Armadas Populares de Libertação de Angola – FAPLA – nomeia e demite os responsáveis militares no escalão superior”. Ora, como se pode verificar, “o seu Presidente” é referência ao do MPLA, à época, António Agostinho Neto, como Comandante em Chefe, das Forças Armadas Angolanas, sucedendo- lhe, em 1979, José Eduardo dos Santos, com o mesmo figurino partidocrata, pese um ligeiro polimento, através da Lei 23/ 92, de 16 de Setembro, no quadro do multipartidarismo, mas ludibriando as forças democráticas, principalmente, a UNITA que vinda das matas, desconhecia as manhas urbanas de um regime, que diz( ia) ter- lhe sido “imposta a democracia”.
O maior partido da oposição, auto- convencido de vitória fácil, por alegada saturação popular ao comunismo, não conclamou os seus juristas ou outros, para uma verdadeira introspecção à Lei Constitucional vigente, que não era de viés republicano, mas partidocrata, para aferir se ela comportava uma separação dos órgãos do poder, a isenção republicana, capaz de garantir a transição transparente, que o momento impunha de um regime de partido único, para um regime democrático. A UNITA e a oposição banalizaram o facto de todas revisões da ex- Lei Constitucional terem sido aprovadas exclusivamente, por deputados, membros do comité central do MPLA e, que, José Eduardo dos Santos detinha todos poderes: Presidente da República; Presidente da Assembleia do Povo ( Parlamento); presidente do MPLA; Comandante em Chefe das FAPLA, verdadeiro paradigma comunista.
Jonas Savimbi, não fosse tomado pela emoção e ingenuidade de confiar na comunidade internacional, deveria exigir, com a nefasta experiência do passado ( 1975), a repristinação, de alguns artigos dos Acordos do Alvor ( adaptando- os à nova realidade de 1992), para haver um período neutro, capaz de expurgar do Estado, vícios monocráticos de 17 anos de poder absoluto, como garantia de segurança e lisura, num período de transição, até à realização das primeiras eleições gerais. Vejamos o que diziam certos artigos dos Acordos de Alvor, cuja adaptação à realidade de 1992 poderiam conferir maior credibilidade, ao processo: a) Art. º 5. º - O poder passa a ser exercido, até à proclamação da independência ( substituído até à realização das eleições gerais), pelo Alto- Comissário ( representante das Nações Unidas e ou Mediador do Processo de Paz) e por um governo de transição ( MPLA, UNITA e Sociedade Civil), o qual toma posse em 31 de Janeiro de 1975 ( 31 de Janeiro de 1992)”.
(...) b) Art. º 14. º - O Governo de Transição é presidido e dirigido pelo Colégio Presidencial. c) Art. º 15. º - O Colégio Presidencial é constituído por três membros ( no caso de 1992, seria por dois membros), um de cada Movimento de Libertação, e tem como tarefa principal dirigir e coordenar o Governo de Transição. d) Art. º 24. º - Compete ao Governo de Transição:
(...) b) Superintender no conjunto da administração pública, assegurando o seu funcionamento, e promovendo o acesso dos cidadãos angolanos a postos de responsabilidade;
(...) d) Preparar e assegurar a realização de eleições gerais para a Assembleia Constituinte de Angola, e) Exercer por decreto- lei a função legislativa e elaborar os decretos, regulamentos e instruções para a boa execução das leis, f) Garantir, em cooperação com o Alto Comissário ( no caso, seria o representante da ONU, Margareth Ansthee), a segurança das pessoas e bens, g) Proceder à reorganização judiciária de Angola, h) Definir a política económica, financeira e monetária, e criar as estruturas necessárias ao rápido desenvolvimento da economia de Angola, i) Garantir e salvaguardar os direitos e as liberdades individuais ou colectivas. PRINTED AND DISTRIBUTED BY PRESSREADER
Não tendo sido feito isso, a máquina para a transição continuou à mercê da visão comunista de Estado, com o seu projecto de poder, que nunca desmantelou a máquina bélica das politizadas Forças Armadas, que se adoptasse os padrões dos Acordos do Alvor de 1974, garantiriam maior segurança e estabilidade em 1992 e mesmo um retorno à guerra, senão vejamos: Art. º 28. º - É criada uma Comissão Nacional de Defesa com a seguinte composição: Alto- Comissário ( em 1992 - Alto representante da ONU); Colégio Presidencial ( José Eduardo dos Santos, Jonas Malheiro Savimbi); Estado- Maior Unificado ( tropas das FAPLA/ MPLA e FALA/ UNITA).
(...) Art. º 32. º - Forças Armadas dos três Movimentos de Libertação ( 1992: dois: MPLA e UNITA) serão integrados em paridade com Forças Armadas Portuguesas ( Capacetes Azuis da ONU) nas Forças Militares mistas em contingentes assim distribuídos:
8000 combatentes do MPLA/ Estado; 8000 combatentes da UNITA/ Rebelião; 24000 militares das Forças Armadas Portuguesas ( Capacetes azuis da ONU).
Art. º 33. º - Cabe à Comissão Nacional de Defesa proceder à integração progressiva das Forças Armadas nas Forças Militares Mistas referidas no artigo anterior, devendo em princípio respeitar- se o calendário seguinte: De Fevereiro a Maio, inclusive, serão integrados, por mês 500 combatentes de cada um dos Movimentos de Libertação e 1500 militares portugueses ( Capacetes azuis da ONU).
De Junho a Setembro, inclusive, serão integrados por mês 1500 combatentes de cada um dos Movimentos de Libertação e 4500 militares portugueses ( capacetes azuis da ONU).
(...) Art. º 35. º - A evacuação do contingente das Forças Armadas Portuguesas ( Capacetes azuis da ONU, em 1992) integrado nas Forças Militares Mistas deverá iniciar- se a partir de 1 de Outubro de 1975 ( 1 de Outubro de 1992) e ficar concluído até 29 de Fevereiro de 1976 ( 29 de Fevereiro de 1993). Art. º 36. º - A Comissão Nacional de Defesa deverá organizar Forças Mistas de Polícia encarregadas de manter a ordem pública. Como se pode rememorar, tendo uma importante ferramenta para a manutenção da paz sido subestimada, quando em causa estavam contradições insanáveis entre duas forças beligerantes, com ideologias, igualmente diferentes, o cenário de retorno a guerra, estava desenhado, principalmente, quanto a desigualdade de armas, na fiscalização e monitorização do processo eleitoral. O controlo e organização das eleições esteve nas mãos de uma das partes, quando era visível não haver intenção de um verdadeiro acordo de reconciliação, entre os ex- beligerantes, cada um desejoso em manter e, ou conquistar hegemonia, de tal monta que menosprezaram a constituição da primeira Assembleia Constituinte, que garantiria, como previsto em Alvor e nunca implementado, mas que poderia, em 1992, ser adoptado: (...)
Art. º 40. º - O Governo de Transição organizará eleições gerais para uma Assembleia Constituinte no prazo de nove meses a partir de 31 de Janeiro de 1975 ( 31 de Janeiro de 1992), data da sua instalação.
Art. º 42. º - Será estabelecida, após a instalação do Governo de Transição, uma Comissão Central, constituída em partes iguais por membros dos Movimentos de Libertação ( MPLA, UNITA e, eventualmente, sociedade civil) que elaborará o projecto da lei fundamental e preparará as eleições para a Assembleia Constituinte.
Art. º 43. º - Aprovada pelo Governo de Transição e promulgada pelo Colégio Presidencial, a lei fundamental, a Comissão Central deverá: a) Elaborar um projecto de lei eleitoral, b) Organizar os cadernos eleitorais, c) Registar as listas dos candidatos à eleição da Assembleia Constituinte apresentadas pelos Movimentos de Libertação. A ligeireza da análise da situação política, económica e militar, por parte da UNITA e das novas formações políticas, em 1992, determinaram o recuperar de fôlego do MPLA em continuar, através de elucubrações jurídico- partidárias, com a manutenção do seu projecto de poder, incapaz de inaugurar uma nova aurora, tanto assim é que, isolado no período de transição, tratou de blindar, não só a sua posição militar, numa eventual derrota, determinando em lei constitucional, uma táctica comunista recorrente, da manutenção de chefias militares, durante 5 anos, em outro governo, veja- se o n. º 2 do art. º 10. º da Lei 23/ 92 de 16 de Setembro: “2- Os oficiais membros do Comando Superior das Forças Armadas e dos seus Estado- Maior não podem ser destituídos e afastados das suas funções, durante o período de cinco anos contados da publicação da presente Lei, salvo por razões disciplinares e incapacidade nos termos da Lei referente às normas de prestação de serviço militar” e, pasme- se, toda esta reforma da lei constitucional, foi feita pelo MPLA, com as forças políticas, incluindo a UNITA, a dormir a sombra da bananeira, deixando que tudo ficasse nas mãos de José Eduardo dos Santos, na quádrupla condição de: 1. Presidente da República; 2. presidente do MPLA;
3. presidente da Assembleia do Povo ( composta, exclusivamente, por membros do MPLA); 4. Comandante em Chefe das Forças Armadas Populares de Libertação de Angola, FAPLA ( braço armado do MPLA). Foi o mutismo, a cumplicidade, os responsáveis pelo afastamento da democracia e da manutenção de forças armadas partidárias, até hoje, 2020.
O MPLA mão mudou a época, não muda e não o fará sem pressão dos verdadeiros patriotas, nacionalistas, intelectuais e os povos em geral, para dar um basta a tanta impunidade, de violação grosseira a Constituição, mesmo a atípica de 2010, feita por “mercenários jurídicos” do exterior ( portugueses) e aprovada por gente ( deputados do MPLA, autoridades policiais e militares) que nem sequer a leu. Basta observar a resistência e oposição feita ao art. º
47. º CRA ( Constituição da República de Angola), direito de reunião e manifestação.