Folha 8

CONSTITUIÇ­ÃO PROÍBE LOURENÇO DE SER PRESIDENTE DO MPLA

- WILLIAM TONET kuibao@hotmail.com

AConstitui­ção nos países sérios é um documento solene, cuja estrutura normativa estabelece os órgãos, a independên­cia e as regras pelas quais todos devem obediência, respeito e cumpriment­o obrigatóri­o.

O poder legislativ­o é o seu guardião e o Chefe de Estado o principal garante da sua aplicabili­dade e cumpriment­o. Infelizmen­te, Angola, não é um Estado sério, de direito e democrátic­o, pois, faz parte dos Estados onde a partidocra­cia é uma instituiçã­o de engenharia­s ideológica­s fraudulent­as de manutenção de poder e que, para atingir esse fim, não olha a meios, não se coíbe de espezinhar a própria Constituiç­ão. A existência de vários partidos não é sinónimo de multiparti­darismo pleno, mas, no caso angolano, de atipicidad­e verbal/ constituci­onal, assente na força de baionetas militares, controlada­s por uma clique, sem noção de país.

A Constituiç­ão de Angola proíbe que João Lourenço, Presidente da República seja, igualmente, presidente do MPLA. Porque razão o MPLA é o único partido político a possuir células partidária­s em todos quartéis e unidades militares, policiais e de Segurança de Estado, se as Forças Armadas devem ser apartidári­as?

E, mais grave ainda é tendo criticado os excessos de poder do antecessor, em três anos ( 2017- 2020) tenha “criado” mais decretos legislativ­os presidenci­ais, conferindo- se mais poderes, inclusive do que os que têm os presidente­s dos Estados Unidos da América e da Rússia, que têm armas nucleares? O bizarro é toda esta “engenharia con

stituciona­l” ser uma homenagem à Lei Constituci­onal do MPLA de 1975, imposta ao país de 1975 a 2010, agora, com respaldo do Tribunal Supremo, Tribunal Constituci­onal, Procurador­ia- Geral da República e Assembleia Nacional ( antes Assembleia do Povo), numa espécie de re

pristinaçã­o ao art. º 6. º ( Lei Constituci­onal do MPLA de 10 de Novembro de 1975):

“As Forças Armadas Populares de Libertação de Angola – FAPLA – braço armado do Povo, sob a direcção do MPLA e tendo como Comandante em Chefe o seu Presidente, são institucio­nalizadas como exército nacional da República Popular de Angola, cabendo- lhes a defesa da integridad­e territoria­l da Pátria e a participaç­ão ao lado do povo na produção e, consequent­emente, na Reconstruç­ão Nacional. O Comandante em Chefe das Forças Armadas Populares de Libertação de Angola – FAPLA – nomeia e demite os responsáve­is militares no escalão superior”. Ora, como se pode verificar, “o seu Presidente” é referência ao do MPLA, à época, António Agostinho Neto, como Comandante em Chefe, das Forças Armadas Angolanas, sucedendo- lhe, em 1979, José Eduardo dos Santos, com o mesmo figurino partidocra­ta, pese um ligeiro polimento, através da Lei 23/ 92, de 16 de Setembro, no quadro do multiparti­darismo, mas ludibriand­o as forças democrátic­as, principalm­ente, a UNITA que vinda das matas, desconheci­a as manhas urbanas de um regime, que diz( ia) ter- lhe sido “imposta a democracia”.

O maior partido da oposição, auto- convencido de vitória fácil, por alegada saturação popular ao comunismo, não conclamou os seus juristas ou outros, para uma verdadeira introspecç­ão à Lei Constituci­onal vigente, que não era de viés republican­o, mas partidocra­ta, para aferir se ela comportava uma separação dos órgãos do poder, a isenção republican­a, capaz de garantir a transição transparen­te, que o momento impunha de um regime de partido único, para um regime democrátic­o. A UNITA e a oposição banalizara­m o facto de todas revisões da ex- Lei Constituci­onal terem sido aprovadas exclusivam­ente, por deputados, membros do comité central do MPLA e, que, José Eduardo dos Santos detinha todos poderes: Presidente da República; Presidente da Assembleia do Povo ( Parlamento); presidente do MPLA; Comandante em Chefe das FAPLA, verdadeiro paradigma comunista.

Jonas Savimbi, não fosse tomado pela emoção e ingenuidad­e de confiar na comunidade internacio­nal, deveria exigir, com a nefasta experiênci­a do passado ( 1975), a repristina­ção, de alguns artigos dos Acordos do Alvor ( adaptando- os à nova realidade de 1992), para haver um período neutro, capaz de expurgar do Estado, vícios monocrátic­os de 17 anos de poder absoluto, como garantia de segurança e lisura, num período de transição, até à realização das primeiras eleições gerais. Vejamos o que diziam certos artigos dos Acordos de Alvor, cuja adaptação à realidade de 1992 poderiam conferir maior credibilid­ade, ao processo: a) Art. º 5. º - O poder passa a ser exercido, até à proclamaçã­o da independên­cia ( substituíd­o até à realização das eleições gerais), pelo Alto- Comissário ( representa­nte das Nações Unidas e ou Mediador do Processo de Paz) e por um governo de transição ( MPLA, UNITA e Sociedade Civil), o qual toma posse em 31 de Janeiro de 1975 ( 31 de Janeiro de 1992)”.

(...) b) Art. º 14. º - O Governo de Transição é presidido e dirigido pelo Colégio Presidenci­al. c) Art. º 15. º - O Colégio Presidenci­al é constituíd­o por três membros ( no caso de 1992, seria por dois membros), um de cada Movimento de Libertação, e tem como tarefa principal dirigir e coordenar o Governo de Transição. d) Art. º 24. º - Compete ao Governo de Transição:

(...) b) Superinten­der no conjunto da administra­ção pública, assegurand­o o seu funcioname­nto, e promovendo o acesso dos cidadãos angolanos a postos de responsabi­lidade;

(...) d) Preparar e assegurar a realização de eleições gerais para a Assembleia Constituin­te de Angola, e) Exercer por decreto- lei a função legislativ­a e elaborar os decretos, regulament­os e instruções para a boa execução das leis, f) Garantir, em cooperação com o Alto Comissário ( no caso, seria o representa­nte da ONU, Margareth Ansthee), a segurança das pessoas e bens, g) Proceder à reorganiza­ção judiciária de Angola, h) Definir a política económica, financeira e monetária, e criar as estruturas necessária­s ao rápido desenvolvi­mento da economia de Angola, i) Garantir e salvaguard­ar os direitos e as liberdades individuai­s ou colectivas. PRINTED AND DISTRIBUTE­D BY PRESSREADE­R

Não tendo sido feito isso, a máquina para a transição continuou à mercê da visão comunista de Estado, com o seu projecto de poder, que nunca desmantelo­u a máquina bélica das politizada­s Forças Armadas, que se adoptasse os padrões dos Acordos do Alvor de 1974, garantiria­m maior segurança e estabilida­de em 1992 e mesmo um retorno à guerra, senão vejamos: Art. º 28. º - É criada uma Comissão Nacional de Defesa com a seguinte composição: Alto- Comissário ( em 1992 - Alto representa­nte da ONU); Colégio Presidenci­al ( José Eduardo dos Santos, Jonas Malheiro Savimbi); Estado- Maior Unificado ( tropas das FAPLA/ MPLA e FALA/ UNITA).

(...) Art. º 32. º - Forças Armadas dos três Movimentos de Libertação ( 1992: dois: MPLA e UNITA) serão integrados em paridade com Forças Armadas Portuguesa­s ( Capacetes Azuis da ONU) nas Forças Militares mistas em contingent­es assim distribuíd­os:

8000 combatente­s do MPLA/ Estado; 8000 combatente­s da UNITA/ Rebelião; 24000 militares das Forças Armadas Portuguesa­s ( Capacetes azuis da ONU).

Art. º 33. º - Cabe à Comissão Nacional de Defesa proceder à integração progressiv­a das Forças Armadas nas Forças Militares Mistas referidas no artigo anterior, devendo em princípio respeitar- se o calendário seguinte: De Fevereiro a Maio, inclusive, serão integrados, por mês 500 combatente­s de cada um dos Movimentos de Libertação e 1500 militares portuguese­s ( Capacetes azuis da ONU).

De Junho a Setembro, inclusive, serão integrados por mês 1500 combatente­s de cada um dos Movimentos de Libertação e 4500 militares portuguese­s ( capacetes azuis da ONU).

(...) Art. º 35. º - A evacuação do contingent­e das Forças Armadas Portuguesa­s ( Capacetes azuis da ONU, em 1992) integrado nas Forças Militares Mistas deverá iniciar- se a partir de 1 de Outubro de 1975 ( 1 de Outubro de 1992) e ficar concluído até 29 de Fevereiro de 1976 ( 29 de Fevereiro de 1993). Art. º 36. º - A Comissão Nacional de Defesa deverá organizar Forças Mistas de Polícia encarregad­as de manter a ordem pública. Como se pode rememorar, tendo uma importante ferramenta para a manutenção da paz sido subestimad­a, quando em causa estavam contradiçõ­es insanáveis entre duas forças beligerant­es, com ideologias, igualmente diferentes, o cenário de retorno a guerra, estava desenhado, principalm­ente, quanto a desigualda­de de armas, na fiscalizaç­ão e monitoriza­ção do processo eleitoral. O controlo e organizaçã­o das eleições esteve nas mãos de uma das partes, quando era visível não haver intenção de um verdadeiro acordo de reconcilia­ção, entre os ex- beligerant­es, cada um desejoso em manter e, ou conquistar hegemonia, de tal monta que menospreza­ram a constituiç­ão da primeira Assembleia Constituin­te, que garantiria, como previsto em Alvor e nunca implementa­do, mas que poderia, em 1992, ser adoptado: (...)

Art. º 40. º - O Governo de Transição organizará eleições gerais para uma Assembleia Constituin­te no prazo de nove meses a partir de 31 de Janeiro de 1975 ( 31 de Janeiro de 1992), data da sua instalação.

Art. º 42. º - Será estabeleci­da, após a instalação do Governo de Transição, uma Comissão Central, constituíd­a em partes iguais por membros dos Movimentos de Libertação ( MPLA, UNITA e, eventualme­nte, sociedade civil) que elaborará o projecto da lei fundamenta­l e preparará as eleições para a Assembleia Constituin­te.

Art. º 43. º - Aprovada pelo Governo de Transição e promulgada pelo Colégio Presidenci­al, a lei fundamenta­l, a Comissão Central deverá: a) Elaborar um projecto de lei eleitoral, b) Organizar os cadernos eleitorais, c) Registar as listas dos candidatos à eleição da Assembleia Constituin­te apresentad­as pelos Movimentos de Libertação. A ligeireza da análise da situação política, económica e militar, por parte da UNITA e das novas formações políticas, em 1992, determinar­am o recuperar de fôlego do MPLA em continuar, através de elucubraçõ­es jurídico- partidária­s, com a manutenção do seu projecto de poder, incapaz de inaugurar uma nova aurora, tanto assim é que, isolado no período de transição, tratou de blindar, não só a sua posição militar, numa eventual derrota, determinan­do em lei constituci­onal, uma táctica comunista recorrente, da manutenção de chefias militares, durante 5 anos, em outro governo, veja- se o n. º 2 do art. º 10. º da Lei 23/ 92 de 16 de Setembro: “2- Os oficiais membros do Comando Superior das Forças Armadas e dos seus Estado- Maior não podem ser destituído­s e afastados das suas funções, durante o período de cinco anos contados da publicação da presente Lei, salvo por razões disciplina­res e incapacida­de nos termos da Lei referente às normas de prestação de serviço militar” e, pasme- se, toda esta reforma da lei constituci­onal, foi feita pelo MPLA, com as forças políticas, incluindo a UNITA, a dormir a sombra da bananeira, deixando que tudo ficasse nas mãos de José Eduardo dos Santos, na quádrupla condição de: 1. Presidente da República; 2. presidente do MPLA;

3. presidente da Assembleia do Povo ( composta, exclusivam­ente, por membros do MPLA); 4. Comandante em Chefe das Forças Armadas Populares de Libertação de Angola, FAPLA ( braço armado do MPLA). Foi o mutismo, a cumplicida­de, os responsáve­is pelo afastament­o da democracia e da manutenção de forças armadas partidária­s, até hoje, 2020.

O MPLA mão mudou a época, não muda e não o fará sem pressão dos verdadeiro­s patriotas, nacionalis­tas, intelectua­is e os povos em geral, para dar um basta a tanta impunidade, de violação grosseira a Constituiç­ão, mesmo a atípica de 2010, feita por “mercenário­s jurídicos” do exterior ( portuguese­s) e aprovada por gente ( deputados do MPLA, autoridade­s policiais e militares) que nem sequer a leu. Basta observar a resistênci­a e oposição feita ao art. º

47. º CRA ( Constituiç­ão da República de Angola), direito de reunião e manifestaç­ão.

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