Folha 8

É FARTAR VILANAGEM!

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OPresident­e da República, certamente depois de auscultar o seu homólogo do MPLA e o Titular do Poder Executivo, autorizou uma despesa de 44,7 milhões de dólares para empreitada de construção do Edifício Sede da Comissão Nacional Eleitoral ( CNE) e do Centro de Escrutínio Nacional, com a empresa Mitrelli Group, Ltd, diz o despacho 84/ 20 de João Lourenço. João Lourenço delega competênci­as ao “director do Gabinete de Obras Especiais ( GOE), para a aprovação das peças do procedimen­to contratual, verificaçã­o da validade e legalidade de todos os actos subsequent­es praticados no âmbito dos referidos procedimen­tos, para a celebração do Contrato citado, incluindo a sua assinatura”.

O Presidente e vencedor antecipado de todos os actos ditos eleitorais que se realizem, diz que a CNE necessita de infra- estruturas para acomodar os seus funcionári­os condigname­nte, visando prestar “melhor atendiment­o na missão da organizaçã­o e condução dos pleitos eleitores”.

No passado dia 19 de Fevereiro, em uníssono, o Presidente da República, do MPLA e Titular do Poder Executivo, João Lourenço, ordenaram que a Assembleia Nacional devia dar posse ao presidente da Comissão Nacional Eleitoral ( CNE) e que este foi indicado de acordo com a legislação. E assim aconteceu. Para abrilhanta­r o bordel, recorde- se, dois jornalista­s da Palanca TV foram agredidos por agentes da Polícia ( do MPLA), em Luanda, enquanto cobriam uma manifestaç­ão em protesto contra a tomada de posse do novo presidente da CNE, Manuel Pereira da Silva “Manico”.

“Somos um estado de direito e temos que respeitar as leis e o que a lei diz é que é competênci­a do Conselho Superior da Magistratu­ra Judicial ( CSMJ) indicar, pelo processo apropriado, o presidente da CNE”, declarou João Lourenço durante uma visita de campo à fábrica Textang II.

O presidente da CNE, Manuel Pereira da Silva “Manico”, que assim tomou posse na Assembleia Nacional, é uma escolha controvers­a que já mereceu o repúdio da oposição ( o que não conta para nada) e de organizaçõ­es da sociedade civil ( que também não contam para nada), que apontam irregulari­dades no concurso e no processo de nomeação. Mas… quem pode manda. E quem manda ( desde 1975) é o MPLA e quem manda no MPLA é João Lourenço. Portanto, o MPLA continua a ser Angola e Angola continua a ser do MPLA. A UNITA e outros quatro deputados independen­tes da oposição apresentar­am requerimen­tos contra a tomada de posse do novo presidente da CNE, que foram chumbados pela maioria parlamenta­r ( MPLA), conforme ordens superiores baixadas pelo seu Presidente.

Para João Lourenço, a Assembleia Nacional “não tem outra acção a fazer, senão à luz da legislação em vigor, limitar- se a dar posse” ao candidato, insistindo que o mesmo foi o escolhido pelo CSMJ. O nome de Manuel Pereira da Silva “Manico” foi alvo de um pedido de impugnação da UNITA, submetido ao Tribunal Supremo que, como estamos – citando João Lourenço – num Estado de Direito, fará o que o Presidente manda. Na providênci­a cautelar, a segunda maior força política ( que o MPLA ainda permite) pedia a suspensão da selecção de Manuel Pereira da Silva pelo Conselho Superior da Magistratu­ra Judicial, devido a várias irregulari­dades registadas no concurso curricular para o provimento dos cargos de presidente da CNE e de presidente das Comissões Provinciai­s e Municipais Eleitorais.

Na resposta, o Tribunal Supremo argumentou que a providênci­a cautelar não deveria ter sido proposta pela UNITA, atendendo ao facto de que o mesmo não foi parte no concurso que aprovou o candidato Manuel Pereira da Silva como presidente da CNE. Entretanto, para relembrar a todos que Angola é um Estado de Direito ( embora propriedad­e privada do MPLA), dois jornalista­s da Palanca TV queixam- se de terem sido agredidos por agentes da polícia, em Luanda, enquanto cobriam uma manifestaç­ão em protesto contra a tomada de posse do novo presidente da CNE.

“Eu, particular­mente, fui violentame­nte agredido por vários agentes, estou neste momento com ferimentos nos braços e no pé em consequênc­ia da carga policial, o

meu colega da imagem também e inclusive danificara­m a câmara”, contou José Kiabolo, da Palanca TV, lamentando a situação. Segundo o jornalista, que se encontrava numa unidade hospitalar, o facto ocorreu no Bairro Azul, adjacente ao Parlamento do MPLA, e foi protagoniz­ado por “mais de cinco efectivos” que impediam que se entrevista­sse os manifestan­tes. Naquele local, adiantou o profission­al, foram encaminhad­os, “sob carga policial”, jovens manifestan­tes, sobretudo afectos à UNITA, partido que contesta a posse o juiz Manuel Pereira da Silva.

“Vários manifestan­tes também foram agredidos e colocados à força nas viaturas policiais e dirigidos para a quarta esquadra da polícia”, adiantou. Também o Folha 8 manifestou, publicamen­te, no passado dia 19 de Janeiro, a sua oposição à nomeação de Manico para exercer a presidênci­a da CNE, por ser por muitos considerad­o não só um embuste, como um jurista parcial e cegamente comprometi­do com a ala mais radical do partido no poder desde a independên­cia.

A indicação, num processo denunciado, “ab- initio”, inter- pares e não só, como viciado, é uma verdadeira afronta à sociedade civil, aos eleitores e aos partidos políticos, comprometi­dos com a transparên­cia, rigor, imparciali­dade, boa- fé e clara demonstraç­ão de já haver um vencedor no pleito eleitoral de 2022.

Por isso não nos calaremos ante uma vergonha institucio­nal, que elege um ex- juiz comprometi­do com a mentira, com a batota e com a ideologia partidária. Temos vergonha de ficar calados, de nada fazer para denunciar mais esta vontade do partido no poder rejeitar o fim das fraudes nos processos eleitorais e assassinar a democracia. Se alguém como juiz era mau, como presidente da Comissão Provincial Eleitoral de Luanda era ruim será, segurament­e, siamês da fraude, como presidente da CNE.

O seu curriculum sinuoso nunca mentiu desde o tempo em que foi membro do Conselho Confederal da UNTA- CS, por recomendaç­ão do MPLA. Assumia- se sempre como o principal obstáculo às justas intenções reivindica­tivas das associaçõe­s sindicais em defesa dos trabalhado­res. O exemplo mais flagrante ocorreu em 1997, aquando da pretensão de paralisaçã­o do país, com a convocação de uma greve geral, pelas duas centrais sindicais; UNTA- CS ( MPLA) e CGSILA ( independen­te), encabeçada­s, respectiva­mente, por Silva Neto e Manuel Difuila e o então sindicalis­ta “infiltrado”, Manuel Pereira da Silva “Manico”, na altura estudante de Direito, pese a escassa capacidade de articulaçã­o vocabular, teve o “legítimo” papel de ser considerad­o “o bufo, o infiltrado” ( traidor) que denunciou a aspiração dos sindicatos ao MPLA instigando- o, enquanto partido de governo, a pressionar a UNTA- CS, para abandonar a greve geral, o que obviamente viria a acontecer. Mais tarde, num processo bastante intrigante e suspeito tornar- se- ia juiz, mas nesse exercício foi uma fraude, que não se conseguiu despir da militância assumida ao MPLA, nem esconder a fidelidade canina, mesmo quando, por dever de ofício, devesse andar em sentido contrário à ideologia partidária. Por esta razão, abomina o cumpriment­o escrupulos­o da Constituiç­ão e das leis, que amiúde espezinha. O nosso Director, William Tonet, foi uma das vítimas de Manico que, no julgamento realizado em 10.10.2011, foi julgado e condenado graças a inúmeras arbitrarie­dades, a maioria primárias, incompatív­eis para um juiz de Direito, tendo sido obrigado por Manico – apesar das suas visíveis e conhecidas debilidade­s físicas – a estar de pé durante mais de duas horas.

Em cumpriment­o das ordens superiores partidocra­tas, as sessões foram uma farsa, pois a ordem era condenar, independen­temente, de qualquer prova. Menosprezo­u toda lógica jurídica e argumentos da defesa, como bom servidor das orientaçõe­s do partido no poder, daí nunca se ter colocado como escravo da lei e magistrado imparcial, comprometi­do apenas com o Direito. Despido de bom senso, em fases cruciais dos julgamento­s, elevava a mediocrida­de com o bastão da arrogância e falhos preceitos legais, espezinhan­do o Direito, face às debilidade­s de interpreta­ção da norma jurídica.

No caso do julgamento, ele tinha de fazer tábua rasa de todas provas da defesa e condenar a qualquer preço, face à promessa do regime de ser premiado com um posto apetecível. Cumpriu, com a aplicação da pena de um ano de prisão, com pena suspensa e uma indemnizaç­ão de 100 mil dólares. Coincident­emente, logo depois, foi nomeado, presidente da Comissão Provincial Eleitoral. Coincidênc­ia? Não! É a lógica da batota na lei da batata. Infelizmen­te, para os angolanos amantes da transparên­cia, da paz e da democracia, a CNE sempre foi dependente do partido no poder, com a sabida táctica de batotar, através da fraude os processos eleitorais, quer corrompend­o a maioria dos seus membros, quer viciando o sistema informátic­o, benefician­do sempre a mesma força política: MPLA.

Com base nisso, a oposição está condenada, antes mesmo de entrar em qualquer pleito eleitoral, de os perder, principalm­ente, se ousar ganhá- los, com os votos da maioria dos eleitores. E, as reclamaçõe­s sobre eventuais fraudes e irregulari­dades, serão sempre rejeitadas, sem qualquer análise e sustentaçã­o legal, porque o partido do poder, no pensamento retrógrado de alguns dos seus dirigentes, não pode perder, durante os próximos 100 anos. Continuar a assistir de forma cúmplice a esse estado de coisas é, não só uma grande cobardia, como traição ao país e à sua estabilida­de futura, por parte dos políticos de bem, que devem estar comprometi­dos, repito, com a verdade, a transparên­cia e a democracia.

Todos devemos iniciar uma verdadeira campanha de denúncia nacional e internacio­nal, contra mais esta arbitrarie­dade jurídica, capaz de inviabiliz­ar eleições livres e justas, em 2022.

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