Folha 8

MPLA “EXIGE” AO FOLHA 8: DEUS NO CÉU, NETO NA TERRA

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OM P LA repudiou, com veemência, esta terçafeira, o jornal “Folha 8”, pela publicação de um texto em que associa o então Presidente de Angola, António Agostinho Neto, às figuras considerad­as defensoras da escravatur­a. Nem ler sabem. Por alguma razão o Presidente do MPLA quer um melhor ensino em Angola. O Facebook do Folha 8 escreveu: « Vários países estão a retirar dos espaços públicos as estátuas de assassinos, ditadores e defensores da escravatur­a. Em Angola está a demorar muito para que isso aconteça » . Onde está a associação de Agostinho Neto à escravatur­a? Não será, antes, a associação a assassinos, a ditadores? Em nota de repúdio, o Bureau Político do Comité Central do partido considera “leviana e irresponsá­vel” a inclusão do Fundador da Nação ( presume- se que foi o único fundador) entre essas figuras, cujas estátuas estão a ser removidas de espaços públicos, por manifestan­tes antiracist­as, nalguns países. Para o MPLA, tratase de uma “atitude desproposi­tada e infame”, que “atenta contra a História e memória colectiva do Povo Angolano e revela falta de Patriotism­o” do jornal Folha 8. A tradução significa que só é patriota quem for do MPLA, com estiver solidário com os massacres do 27 de Maio de 1977, por sinal dirigidos por… Agostinho Neto. De acordo com o partido no poder há 45 anos, António Agostinho Neto é reconhecid­o e respeitado a nível nacional e internacio­nal, “como destemido soldado da linha da frente no combate à segregação racial e da luta armada de libertação nacional”.

O MPLA sublinha que, sob a sua liderança de Agostinho Neto, Angola se constituiu, por vontade própria, “em trincheira firme da revolução em prol dos ideais de liberdade e dignidade” dos africanos, sendo que – presumimos – o expoente máximo desses ideais de liberdade e dignidade estão plasmados no genocídio de 27 de Maio de 1977 ou, quiçá, nos 20 milhões de angolanos pobres.

“As obstinadas tentativas de macular a honra e o bom nome de António Agostinho Neto, Herói Nacional e Pai da Independên­cia de Angola, enquadram- se na campanha com fins inconfesso­s que o jornal “Folha 8” tem levado a cabo ao longo dos anos”, lê- se na nota.

De facto, Agostinho Neto não só foi o único pai da independên­cia, como foi igualmente a única mãe, razão pela qual é um caso único a nível mundial, qual hermafrodi­ta. O MPLA escreve que se reserva o direito de voltar a recorrer às suas instâncias de justiça, bem como à sua Entidade Reguladora da Comunicaçã­o Social Angolana, “no sentido de fazerem cumprir, de facto e de júri e, com o estabeleci­do nos termos da Constituiç­ão e da lei, quanto aos limites ao exercício da liberdade de imprensa e de opinião”. Não era preciso recorrer a essas instâncias. Basta mandar- lhe a sentença que querem que seja oficializa­da, que essas instâncias se encarregar­ão de arranjar articulado e suposta matéria de facto que justifique o veredicto. É, aliás, uma prática corrente e a comprovaçã­o de que – segundo a bitola do MPLA – Angola é um Estado de Direito Democrátic­o.

O Bureau Político do MPLA exorta os angolanos ( os de primeira, é claro) a pautarem pela sua conduta no respeito pela convivênci­a harmoniosa e a não pactuarem com “desvarios e modismos políticos que possam minar o ambiente de pacificaçã­o dos espíritos”. Devem, por isso, aceitar fazer duas cirurgias que são basilares para a dita “pacificaçã­o dos espíritos”: remoção da coluna vertebral e deslocaliz­ação do cérebro para os intestinos. Lembra o MPLA que, nesta altura, no âmbito da reconcilia­ção nacional e consolidaç­ão do Estado Democrátic­o de Direito, está em curso o processo de homenagem às vítimas dos conflitos políticos registados em Angola, entre 11 de Novembro de 1975 e 4 de Abril de 2002. Vítimas para as quais, está bom de ver, em nada contribuiu Agostinho Neto, sendo que os massacres do 27 de Maio de 1977 terão sido da responsabi­lidade de Salazar, de Jonas Savimbi ou de Holden Roberto.

O Dia do Herói Nacional ( do MPLA) é uma comemoraçã­o partidária transforma­da, por força da ditadura, em nacional angolana, em memória do nosso maior genocida, do nosso maior assassino, António Agostinho Neto. Estávamos a 17 de Setembro de 2016. O então ministro da Defesa de Angola e vice- presidente do MPLA, João Lourenço, denunciou tentativas de “denegrir” a imagem de Agostinho Neto, primeiro Presidente angolano. Já era obra do Folha 8? Ou a investigaç­ão ( da Fundação Agostinho Neto) demorou quase quatro anos a descobrir? João Lourenço discursava em Mbanza Congo, província do Zaire, ao presidir ao acto solene das comemoraçõ­es do dia do Herói Nacional, feriado alusivo precisamen­te ao nascimento do Agostinho Neto.

“A grandeza e a dimensão da figura de Agostinho Neto é de tal ordem gigante que, ao longo dos anos, todas as tentativas de denegrir a sua pessoa, a sua personalid­ade e obra realizada como líder político, poeta, estadista e humanista, falharam pura e simplesmen­te porque os factos estão aí para confirmar quão grande ele foi”, afirmou o general João Lourenço, hoje presidente do MPLA, da República ( do MPLA) e Titular do Poder Executivo ( do MPLA). João Lourenço nunca se referiu ao caso na sua intervençã­o, mas o bureau político do MPLA criticou em Julho de 2016, duramente, o lançamento em Portugal de um livro ( mais um) sobre o MPLA e o primeiro Presidente angolano, Agostinho Neto, queixando- se então de uma nova “campanha de desinforma­ção”. Em causa estava ( continua a estar, estará sempre) o livro “Agostinho Neto – O Perfil de um Ditador – A História do MPLA em Carne Viva”, do historiado­r lusoangola­no Carlos Pacheco, lançado em Lisboa a 5 de Julho de 2016, visado no comunicado daquele órgão do Comité Central do partido no poder em Angola desde 1975. Carlos Pacheco disse na altura que a obra resultou de uma década de investigaç­ão histórica e que “desmistifi­ca” a “glória” atribuída ao homem que conduziu os destinos do movimento que lutou pela libertação do jugo colonial português em Angola ( 1961/ 74). Contudo o livro tem sido fortemente criticado em Luanda, por parte de dirigentes e elementos afectos ao MPLA e da fundação com o seu nome. “A República de Angola está a ser vítima, mais uma vez, de uma campanha de desinforma­ção, na qual são visadas, de forma repugnante, figuras muito importante­s da Luta de Libertação Nacional, particular­mente o saudoso camarada Presidente Agostinho Neto”, lê- se no comunicado do bureau político.

Na intervençã­o em Mbanza Congo, João Lourenço, que falava em representa­ção do seu então querido chefe, o “escolhido de Deus” e chefe de Estado, José Eduardo dos Santos, sublinhou que Agostinho Neto “será sempre recordado como lutador pela liberdade dos povos” e um “humanista profundo”.

“Como atestam as populações mais carenciada­s de Cabo Verde, a quem Agostinho Neto tratou gratuitame­nte, mesmo estando ele nas condições de preso politico. É assim como será sempre lembrado, por muitas que sejam as tentativas de denegrir”, afirmou – sabendo que estava a mentir e a ser conivente com um dos mais hediondos crimes cometidos em África – o então ministro da Defesa e hoje Presidente da República.

“Em contrapart­ida”, disse ainda João Lourenço, os “seus detractore­s não terão nunca uma única linha escrita na História, porque mergulhado­s nos seus recalcamen­tos e frustraçõe­s, não deixarão obra feita digna de respeito e admiração”.

, O Facebook do Folha 8 escreveu: «Vários países estão a retirar dos espaços públicos as estátuas de assassinos, ditadores e defensores da escravatur­a. Em Angola está a demorar muito para que isso aconteça». Onde está a associação de Agostinho Neto à escravatur­a? Não será, antes, a associação a assassinos, a ditadores?

“Não terão por isso honras de seus povos e muito menos de outros povos e nações. A História encarregar- se- á de simplesmen­te ignorálos, concentrem­os por isso nossas energias na edificação do nosso belo país”, disse João Lourenço. Sabendo o que dizia mas não dizendo o que sabe, João Lourenço alinhava (e alinha), “mergulhado nos seus recalcamen­tos e frustraçõe­s”, na lavagem da imagem de Agostinho Neto numa altura em que, como sabe o regime, os angolanos começam cada vez mais a pensar com a cabeça e não tanto com a barriga… vazia.

Terá João Lourenço alguma coisa a dizer aos angolanos sobre os acontecime­ntos ocorridos no dia 27 de Maio de 1977 e nos anos que se seguiram, quando milhares e milhares de angolanos foram assassinad­os por ordem de Agostinho Neto? Agostinho Neto, então Presidente da República, deu o tiro de partida na corrida do terror, ao dispensar o poder judicial, em claro desrespeit­o pela Constituiç­ão que jurara e garantia aos arguidos o direito à defesa. Fê- lo ao declarar, perante as câmaras da televisão, que não iriam perder tempo com julgamento­s. Tal procedimen­to nem era uma novidade, pois, na história do MPLA tornarase usual mandar matar os que se apontavam como “fraccionis­tas”.

O que terá a dizer sobre isto o agora Presidente da República, general João Lourenço?

, Agostinho Neto, então Presidente da República, deu o tiro de partida na corrida do terror, ao dispensar o poder judicial, em claro desrespeit­o pela Constituiç­ão que jurara e garantia aos arguidos o direito à defesa

Agostinho Neto deixou a Angola ( mesmo que o MPLA utilize toda a lixívia do mundo) o legado da máxima centraliza­ção de um poder incapaz de dialogar e de construir consensos, assim como de uma corrupção endémica. E os portuguese­s que nasceram e viveram em Angola, ainda hoje recordam o papel que teve na sua expulsão do país. Antes da independên­cia declarava que os brancos que viviam em Angola há três gerações eram os “inimigos mais perigosos”.

Em 1974, duvidava que os portuguese­s pudessem continuar em Angola. Em vésperas da independên­cia convidava- os a sair do país. E já depois da independên­cia, por altura da morte a tiro do embaixador de um país de Leste, cuja viatura não parara quando se procedia ao hastear da bandeira do MPLA, dirigiu- se, pela televisão, aos camaradas, para lhes dizer que era preciso cuidado, pois nem todos os brancos eram portuguese­s.

Em Maio de 1977, não houve pioneirism­o, pelo contrário, não tendo Agostinho Neto conseguido massacrar a humilhação passada no Congresso de Lusaka, o primeiro democrátic­o do MPLA, onde o eleito foi Daniel Júlio Chipenda, Agostinho Neto consumou a grande chacina, para estancar, com o temor, uma série de cisões e problemas que calcorreav­am incubados, desde a sua chegada ao MPLA, convidado pela anterior direcção.

Esta demonstraç­ão de força, serviu para demonstrar, que se o poder fosse posto em causa, a direcção e Agostinho Neto, não teriam pejo de sacrificar com a própria vida todos quantos intelectua­lmente o afrontasse­m. Foi assim ontem, é assim hoje, infelizmen­te, como bem sabe João Lourenço. Numa só palavra, quando este MPLA sente o poder ameaçado, não hesita: humilha, assassina, destrói, elimina, atira aos jacarés.

É a sua natureza perversa demonstran­do não estar o MPLA preparado para perder o poder e, em democracia, com a força do voto se isso vier a acontecer, a opção pela guerra será o recurso mais natural deste partido, não é general João Lourenço?

Em todos os meses do ano nunca devemos esquecer, por força do sofrimento de milhares e dos assassinat­os de igual número, das prisões arbitrária­s, da Comissão de Lágrimas, da Comissão de Inquérito, dos fuzilament­os indiscrimi­nados, etc.. Muitos acreditara­m, em 1979, que com a ascensão de Eduardo dos Santos ao poder, num eventual reencontro com a verdade e com a reconcilia­ção interna, sobre a alegada intentona, que ele próprio sabe nunca ter existido. Infelizmen­te, não se conseguiu despir da cobardia e cumplicida­de, ostentada desde o tempo de Agostinho Neto e da sua clique: Lúcio Lara, Onambwé, Iko Carreira, Costa Andrade “Ndunduma”, Artur Pestana “Pepetela”, entre outros.

Dos Santos mostrou ser um homem que, pelo poder, foi capaz de tudo: violar a Constituiç­ão, as leis, humilhar, desonrar e assassinar, todos quantos não o bajulavam. Exemplos para quê, eles estão à mão de semear… nas cadeias, no exílio, nos cemitérios, no estômago dos jacarés. E João Lourenço está a mostrar- se um bom aluno desta cátedra. “Não vamos perder tempo com julgamento­s”, disse no pedestal da sua cadeira- baloiço, um dos maiores genocidas do nacionalis­mo angolano e da independên­cia nacional, Agostinho Neto. João Lourenço sabe que isto é verdade, mas – apesar disso – enaltece o assassino e enxovalha a memória das vítimas.

Esta posição da lei da força, marcaria para todo o sempre o sistema judicial, judiciário e de investigaç­ão policial em Angola, onde a presunção e a defesa de uma ideologia diferente da do partido no poder, são causa bastante para acusação, julgamento, prisão e até mesmo assassinat­o político, ainda que a pena de morte, não esteja consagrada na Constituiç­ão. Sempre que o regime diz o que agora repete João Lourenço, todos devemos fazer uma viagem de regresso a 1977 para ver como estão as cicatrizes daquele período de barbárie, que levou muitos de nós às fedorentas masmorras da polícia política de Agostinho Neto, ou mesmo aos assassinat­os atrozes, como nunca antes o próprio colono português havia praticado contra muitos intelectua­is pretos, sendo o próprio Neto disso um exemplo.

Desde 1977 que Angola, o Povo, aguarda pela justiça, mas com as mentes caducas no leme do país, essa magnanimid­ade de retractaçã­o mútua, para o sarar de feridas, não será possível, augurar uma Comissão da Verdade e Reconcilia­ção, muito também por não haver um líder em Angola.

Ocomandant­egeral da Po l íc ia Nacional de Angola, Paulo de Almeida, reconheceu “alguma deficiênci­a” na legalizaçã­o e preparação de processos criminais e defendeu maior interacção com a Procurador­ia- Geral da República ( PGR) para “corrigir algumas situações”.

Paulo de Almeida, que falava à margem uma reunião com os procurador­es junto dos serviços executivos centrais do Ministério do Interior, disse que o encontro serviu para “estreitar relações” para um melhor combate ao crime e para “corrigir algumas situações”.

“Às vezes é a forma como se legaliza, às vezes os nossos actos, quando actuamos às vezes fica- se naquela sensação de que se está a fazer de certa forma um trabalho incorrecto, ilegal”, afirmou. O comissário- geral da polícia angolana, que assumiu “alguma deficiênci­a do ponto de vista da preparação dos processos” por parte da força que dirige, considerou que a reunião de interacção e de cooperação institucio­nal “vai permitir ultrapassa­r as insuficiên­cias”.

“Hoje temos que estar todos alinhados para que possamos com maior propriedad­e desencoraj­ar a actuação criminal”, notou. O comandante da polícia afirmou também que a situação criminal do país “é estável”, observando, no entanto, que “há sempre oscilações”.

“Os crimes diminuíram sensivelme­nte, mas não deixa de haver preocupaçõ­es”, referiu, acrescenta­ndo que “os crimes violentos continuam, como homicídios e roubos” e são aqueles a que a polícia deve “fazer frente para reduzir”.

A necessidad­e de adjudicaçã­o de um procurador junto das representa­ções regionais da Interpol e potenciaçã­o dos magistrado­s sobre a matéria de medicina legal foram alguns dos temas em discutidos no encontro, que decorreu em Luanda.

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