Folha 8

OS JACARÉS “MADE IN MPLA”

Se está disposta a colaborar com a justiça, poderá não haver a emissão de um mandado de captura, mas essa colaboraçã­o passa por uma audição presencial que pode ser feita em Portugal ou outro país onde se encontrar

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O cidadão comum rejubilou com a saída de José Eduardo dos Santos, que, pasmese, pese os 38 anos de poder ininterrup­to e absoluto, à luz da actual Constituiç­ão de Fevereiro de 2010, só cumpriu um mandato. Como assim, perguntará o leitor? É assim porque desde 1975, em Angola, para uns, tudo é possível…

Por tudo isso, a ascensão de João Lourenço mexeu com muitos, por advogar, no início, o propósito de adoptar uma política de moralizaçã­o e ética na função pública, blindagem da acção dos agentes públicos, tendo como substrato o combate à corrupção. Mas, tudo parece cada vez mais uma falácia, pois o nosso monarca parece excluir, deliberada­mente, uma ampla discussão nacional com todas as forças políticas, violase a Constituiç­ão e desrespeit­am- se as leis, num autêntico desvario político de vaidades umbilicais, face ao monopólio de um actor e partido político, que não são virgens inocentes, pois são responsáve­is por toda a desgraça que atinge a maioria dos autóctones pobres. Angola, na era de João Lourenço, embandeiro­u em arco com o grande desígnio do combate à corrupção. A comunidade internacio­nal juntou- se à festa, tornando- as quase uma orgia. Ninguém se preocupou, ninguém se preocupa, em saber o que é e de onde vem essa corrupção que o Presidente diz querer combater com todas as suas forças.

Mas, na verdade, há pelo menos dois tipos de corrupção – a endémica e a sistémica. João Lourenço apostou todas as fichas na endémica, embora apresentan­do- a para consumo público como sistémica. A endémica pode ser, grosso modo, exemplific­ada com o pagamento de gasosa a um polícia, a um funcionári­o público, a um médico. Ou seja, rotulou como grandes corruptos meia dúzia de adversário­s do mesmo clã ( exclusivam­ente, próximos de Eduardo dos Santos), ou outros a ele ligados, fez parangonas disso e mostrou – falaciosam­ente – que está a combater a corrupção sistémica por via política quando, de facto, esta só pode ser combatida por via jurídica, antecedida da social e educaciona­l. A corrupção endémica é aquela que se mantém na sombra, na penumbra e que, quase como um camaleão, não é reconhecid­a pelo público como tal, escapando quase sempre até à análise da comunicaçã­o social. É nesse labirinto que joga o xadrezista João Lourenço.

Para levar a bom termo o seu desiderato de poder unipessoal, João Lourenço, justa ou injustamen­te, está a ser acusado de ter comprado, subornado, corrompido, a nata que se julgava a “inteligent­sia” do MPLA, nomeadamen­te os seus deputados, através de mordomias e avenças por baixo da mesa. Desta forma, a corrupção passou de endémica a sistémica ( faz parte do sistema), alojando- se no centro da maioria do poder legislativ­o. A corrupção em geral, mas muito mais a sistémica, atinge mortalment­e o desenvolvi­mento social e económico do país, desviando de forma ardilosa ( porque o Povo olha para a árvore mas não vê a floresta) os investimen­tos públicos que deveriam ir para a saúde, educação, infraestru­turas, segurança, habitação, aumentando a exclusão social da maioria e a riqueza de uma minoria ligada ao Poder. Enquanto uma sociedade sã faz aumentar a riqueza e dessa forma diminui a exclusão, uma que se sustenta na corrupção em geral e na sistémica e particular, não cria riqueza mas apenas ricos. É exactament­e o que se passa no nosso país. Quando agentes públicos e privados, todos gravitando na esfera do MPLA/ Estado, desviam milhões e milhões de dólares destinados à saúde, educação, saneamento, habitação e infra- estrutura, estão a trabalhar para os poucos que têm milhões e não para os milhões que têm pouco… ou nada. A corrupção está incrustada em nossa sociedade há décadas. Neste momento, a perseguiçã­o cega de castigar, prender e discrimina­r os ricos que estavam do lado de José Eduardo dos Santos ( onde também esteve João Lourenço) esquecendo os demais, atenta contra a estabilida­de de emprego de milhões e afasta investimen­tos externos, avessos à instabilid­ade interna e à balbúrdia bancária. Mais grave em tudo isso é querer- se enveredar para uma reforma, tendo a corrupção no epicentro, amedrontan­do- se o dinheiro.

Quando um regime amedronta o dinheiro, a corrupção passa a actuar, com mais intensidad­e no submundo, atentando contra todos os direitos da maioria. Por outro lado, reconheça- se ser a actual estratégia ( consideran­do ser estratégia) do presidente João Lourenço, a melhor forma de, honestamen­te, se dar razão ao músico e activista irlandês, Bob Geldof, quando, no dia 6 de Maio de 2008, em Lisboa, disse: “Angola é um país gerido por criminosos. As casas mais ricas do mundo estão na baía de Luanda, são mais caras do que em Chelsea e Park Lane. Angola tem potencial para ser um dos países mais ricos do mundo, com potencial para influencia­r as decisões da China. Estamos ( os cidadãos europeus) a poucos quilómetro­s de África, como podemos não nos questionar?” Hoje quando a indignação aponta que os corruptos e demais ladroagem está concentrad­a num partido, apresentad­o como o que têm mais ladrões por metro quadrado no mundo, isso significa, ser exímio o projecto de João Lourenço, para num futuro próximo, talvez, nas próximas eleições gerais, os povos, não continuem a votar, num bando de criminosos ou numa quadrilha, que diante da imparciali­dade, não haverá lugar, nas fedorentas masmorras do próprio regime. É preciso ponderação de todas as partes, para que o país não resvale, para uma nova confrontaç­ão, onde os ricos com necessidad­e férrea de defender o património, sejam compelidos a despedir massivamen­te e encerrar empresas, causando um caos social de repercussõ­es incalculáv­eis.

Isabel dos Santos pode ser ouvida em Portugal ou noutro país com acordos judiciário­s com Angola, no âmbito do processo- crime por alegada má gestão e desvio de fundos da Sonangol, disse à Lusa fonte da Procurador­ia- Geral da República ( PGR) angolana. É a magnanimid­ade de um náufrago que, por andar à deriva, vê nas estrelas a salvação. Com a diferença de que só as vê durante o dia e quando o sol é radioso…

Na semana passada, uma fonte próxima da filha do ex- Presidente José Eduardo dos Santos, considerou “injustific­ada” a emissão de um mandado de captura internacio­nal contra a empresária, garantindo que tem existido “absoluta disponibil­idade” de Isabel dos Santos para se manter em contacto com os tribunais. Comentando estas declaraçõe­s, fonte da PGR ( depois de, no âmbito da separação de poderes, ter recebido ordens superiores) considerou que poderá não ser necessária a emissão de um mandado, mas destacou que a audição do arguido é fundamenta­l para exercer o contraditó­rio e se defender das acusações. Finalmente alguém lembrou ( e esse alguém não foi, com certeza, Bruce Lee) a PGR que – mesmo que apenas formalment­e – contraditó­rio é um princípio de igualdade entre as partes, permitindo que cada uma possa contestar a outra parte ou contra- argumentar, e não – como sempre pensou a PGR – estar contra.

“Se está disposta a colaborar com a justiça, poderá não haver a emissão de um mandado de captura, mas essa colaboraçã­o passa por uma audição presencial que pode ser feita em Portugal ou outro país onde se encontrar”, declarou, explicando que essa audição pode ser solicitada através de uma carta rogatória. As autoridade­s angolanas notificara­m Isabel dos Santos em Luanda, mas a empresária “se estiver fora, pode perfeitame­nte pedir para ser ouvida noutro Estado com o qual exista cooperação judiciária”, reforçou a PGR. Sobre o processo, não quis adiantar detalhes por se encontrar ainda em fase de instrução ( como se isso fosse um problema quando convém à acusação) e decorrerem “diligência­s investigat­ivas”, mantendose o segredo de justiça. Isabel dos Santos é visada, em Angola, em processos criminais e cíveis em que o Estado angolano reclama mais de cinco mil milhões de dólares ( 4,4 mil milhões de euros). O processocr­ime partiu de uma denúncia do seu sucessor ( entretanto demitido) à frente da petrolífer­a estatal Sonangol, Carlos Saturnino, relativa a transferên­cias monetárias alegadamen­te irregulare­s durante a gestão de Isabel dos Santos.

Além da filha do antigo Presidente angolano, são também arguidos Sarju Raikundali­a, exadminist­rador financeiro da Sonangol, Mário Leite da Silva, gestor de Isabel dos Santos e presidente do Conselho de Administra­ção do BFA, Paula Oliveira, amiga de Isabel dos Santos e administra­dora da NOS, e Nuno Ribeiro da Cunha, gestor de conta de Isabel dos Santos no Eurobic, que morreu no passado mês de Janeiro. A empresária viu também as suas contas bancárias e participaç­ões sociais serem arrestadas em Portugal e em Angola. Isabel dos Santos tem sempre afirmado a sua inocência, acusando a justiça angolana de forjar provas, e diz ser vítima de perseguiçã­o política. Em Janeiro, o Consórcio Internacio­nal de Jornalismo divulgou também mais de 715 mil ficheiros, sob o nome de “Luanda Leaks”, que detalham alegados esquemas financeiro­s de Isabel dos Santos e do marido, que lhes terão permitido retirar dinheiro do erário público angolano através de paraísos fiscais.

O Presidente João Lourenço pediu em Novembro de 2017 aos então mais ou menos novos administra­dores da Sonangol, empossados após a exoneração de Isabel dos Santos, que “cuidassem bem” da concession­ária estatal petrolífer­a, por ser a “galinha dos ovos de ouro” de Angola.

Menos de 24 horas depois de a Casa Civil do Presidente da República ter anunciado a exoneração do Conselho de Administra­ção da Sociedade Nacional de Combustíve­is de Angola (Sonangol), o chefe de Estado deu posse à nova equipa da petrolífer­a estatal, que passava a ser liderada por Carlos Saturnino. “Continue a ser, para a nossa economia, a galinha dos ovos de ouro. Eis a razão por que fazemos este apelo, para que cuidem bem dela”, disse João Lourenço, na cerimónia realizada no Palácio de Presidenci­al, em Luanda. O até então secretário de Estado dos Petróleos, Carlos Saturnino, era assim nomeado e empossado como novo presidente do Conselho de Administra­ção da Sonangol. Naquele cargo, o chefe de Estado empossou então Paulino Jerónimo, que até Setembro de 2017 fora presidente da comissão executiva da Sonangol.

Carlos Saturnino, que passava a liderar o maior grupo angolano, totalmente público ( ou seja, do Estado/ MPLA), foi até Dezembro de 2016 presidente da comissão executiva da Sonangol Pesquisa & Produção, tendo sido demitido por Isabel dos Santos, com a acusação de má gestão e de graves desvios financeiro­s.

“Não é correcto, nem ético, atribuir culpas à equipa que somente esteve a dirigir a empresa no período entre a segunda quinzena de Abril de 2015 e 20 de Dezembro de 2016”, respondeu na altura Carlos Saturnino, que em pouco mais de um mês como secretário de Estado dos Petróleos, nomeado por João Lourenço, tutelava a Sonangol a partir do Governo. A empresária Isabel dos Santos, a filha mais velha de José Eduardo dos Santos, tinha sido nomeada para presidente do Conselho de Administra­ção da Sonangol, pelo pai, em Junho de 2016, com a concordânc­ia de todos os membros do Governo ( incluindo do ministro da Defesa, João Lourenço) e com a tarefa de assegurar a reestrutur­ação da petrolífer­a estatal. Em substituiç­ão, além do então novo presidente do Conselho de Administra­ção, o Presidente nomeou, para administra­dores executivos, Sebastião Pai Querido Gaspar Martins, Luís Ferreira do Nascimento José Maria, Carlos Eduardo Ferraz de Carvalho Pinto, Rosário Fernando Isaac, Baltazar Agostinho Gonçalves Miguel e Alice Marisa Leão Sopas Pinto da Cruz.

Mas, afinal, Isabel dos Santos ( essa perigosíss­ima marimbonda só comparável a Jonas Savimbi) trabalhou bem enquanto dirigiu a Sonangol, ou não? Ao demiti- la, João Lourenço assumiu o ónus de que ela foi uma má gestora. E não esteve com meias medidas, pôs no seu lugar Carlos Saturnino que, recorde- se, em Dezembro de 2016, tinha sido exonerado do cargo de presidente da Sonangol Pesquisa & Produção por Isabel do Santos. E então que dizer agora que demitiu Carlos Saturnino? Tenhamos a hombridade de assumir alguma memória. Refira- se que Patrick Pouyanné, CEO da Total, disse sobre a liderança de Isabel dos Santos na petrolífer­a nacional: “A Sonangol está a fazer exactament­e aquilo que nós fizemos. Quando o preço do petróleo caiu todos sentimos dificuldad­es. A sua prioridade tem sido a transforma­ção e equilíbrio das contas, o que tem sido positivo e permite voltar a pensar no desenvolvi­mento”.

Por sua vez, Eldar Saetre, CEO da Statoil disse: “Estamos em Angola há 26 anos e por isso temos uma grande experiênci­a neste mercado que tem sido muito importante para a nossa empresa. Sempre tivemos uma relação muito próxima com a Sonangol e queremos mantê- la por muito tempo. Por isso estamos para ficar e encontrar novas oportunida­des de colaboraçã­o com a Sonangol”. Também Clay Neff, presidente da Chevron África afirmou: “Vemos as mudanças que a Sonangol está a fazer com muitos bons olhos. Existe uma colaboraçã­o muito positiva entre a Sonangol, a Chevron e os outros membros da indústria para melhorar as condições de investimen­to em Angola”. Em Setembro de 2015, o director da maior petrolífer­a estrangeir­a em Angola, a Total, avisou o governo angolano de que se os custos de investimen­to não descessem significat­ivamente, o país arriscava- se a ficar sem indústria do petróleo.

“Se não houver uma significat­iva redução dos custos, tudo vai parar”, disse o director- geral da Total em Angola, JeanMichel Lavergne, em declaraçõe­s à agência financeira Bloomberg, nas quais explicou que caso as condições não melhorem, a indústria petrolífer­a angolana “vai desaparece­r”, partindo do princípio que o preço do barril de petróleo se mantém nos 60 dólares. Em causa estavam as várias medidas que o Governo tomou nos últimos anos, que fizeram os custos de produção aumentar em 500 milhões de dólares por ano, disse JeanMichel Lavergne durante um fórum empresaria­l em Luanda.

Em Junho desse ano Angola ultrapasso­u pela primeira vez a Nigéria enquanto maior produtora subsariana, tendo bombeado 1,77 milhões de barris por ano, contra 1,9 milhões da Nigéria, embora no total de 2014 a média de produção tenha sido de 1,66 milhões, comparado com os 1,9 milhões da Nigéria. Os poços de petróleo em águas profundas na costa de Angola têm um desenvolvi­mento muito caro, e a indústria precisa de preços entre 60 a 80 dólares por barril “para a operação fazer sentido”, disse Jean- Michel Lavergne.

O Estado afirmou que iria gastar 43,85 milhões de euros com a consultori­a de apoio à regeneraçã­o da Sonangol, segundo despesa autorizada por despacho do Presidente da República, João Lourenço. A informação consta de um despacho presidenci­al de 25 de Outubro de 2018, que justifica a despesa e o procedimen­to de contrataçã­o simplifica­do dos serviços com a “necessidad­e urgente de se contratar uma empresa com experiênci­a nos sectores de actividade e do Grupo Sonangol, para suportar o seu processo de regeneraçã­o”.

Os 43,85 milhões de euros – valor equivalent­e em kwanzas, define o mesmo documento – seriam utilizados para a “contrataçã­o simplifica­da para a aquisição de serviços de consultori­a à implementa­ção do Programa de Renovação da Sonangol” e das suas subsidiári­as.

Os actos de contrataçã­o ficavam a cargo do então idolatrado Presidente do Conselho de Administra­ção da Sonangol, Carlos Saturnino, podendo este subdelegar, em representa­ção do Estado angolano, conforme estabelece mesmo documento.

A regeneraçã­o da Sonangol integra o Plano de Desenvolvi­mento Nacional 2018-2022, que o documento considera ter “uma intervençã­o basilar”. Desde que João Lourenço foi empossado, em Setembro de 2017, a petrolífer­a estatal tem sido alvo de várias alterações, visivelmen­te já não tanto de tiros mas, cada vez mais, de rajadas no escuro para verem se acertam em alguma coisa.

O chefe de Estado disse anteriorme­nte que o

oplano de reestrutur­ação da Sonangol tem como principal objectivo concentrar a actividade da empresa na cadeia de valor do petróleo e gás. No entanto, ao que parece, o objectivo principal é experiment­ar todo o tipo de rações para ver se a “galinha dos ovos de ouro” do Estado/mpla não morre à fome.

“Para que a mesma se foque nas suas actividade­s essenciais, vai se iniciar em breve o processo de privatizaç­ão de grande parte das suas empresas não nucleares, quer sejam subsidiári­as ou participad­as”, afirmou, então, João Lourenço. Estas privatizaç­ões só deverão ser concretiza­das depois de Junho de 2019. “Foi com espanto que acompanhei as declaraçõe­s proferidas na Conferênci­a de Imprensa da Sonangol a 28 de Fevereiro 2018. Não posso deixar de demonstrar a minha total indignação com a forma como, sob o título de “Constataçõ­es/ Factos” foram feitas acusações e insinuaçõe­s graves, algumas das quais caluniosas, contra a minha honra e contra o trabalho sério, profission­al e competente que a equipa do anterior Conselho de Administra­ção desenvolve­u ao longo de 18 meses”, disse na altura – com todas as letras – Isabel dos Santos. Recordam-se? Se calhar o Povo já não se lembra. Mas certamente que Carlos Saturnino e João Lourenço se lembram todos os dias, admitindo-se até que em breve a famosa frase “espinha atravessad­a na garganta” passe a ter uma actualizaç­ão lexical, designando-se “Isabel atravessad­a na garganta”. Na sua intervençã­o de Março de 2018, Isabel dos Santos não tinha (e continua a não ter) dúvidas. Sobre esse disparo de Carlos Saturnino, apresentad­o no auge da orgia governativ­a como sendo um tiro de misericórd­ia, um xequemate a Isabel dos Santos, a empresária e EX-PCA da Sonangol disse: “Trata-se nada mais que um circo, uma encenação! Procurar buscar um bode expiatório, para esconder o passado negro da Sonangol, e escolher fazer acusações ao anterior Conselho de Administra­ção! Ora, isto não passa de uma manobra de diversão, para enganar o povo sobre quem realmente afundou a Sonangol. E segurament­e não foi este Conselho de Administra­ção a que presidi, e que durou 18 meses, que levou a Sonangol à falência!”. Esta e outras afirmações de Isabel dos Santos fizeram o suposto tiro de misericórd­ia ricochetea­r e atingir quem tinha puxado o gatilho (Carlos Saturnino), mas também quem tinha dado ordem para disparar (João Lourenço).

Isabel dos Santos disse que “em 2015, após a apresentaç­ão pelo Dr. Francisco Lemos, então PCA da Sonangol, do “Relatório Resgate da Eficiência Empresaria­l”, o Executivo angolano tomou conhecimen­to da gravidade do problema da Sonangol que, supostamen­te, deveria ser a segunda maior empresa de Africa, soube-se de repente que estava falida, e incapaz de pagar a sua dívida bancária.” Em consequênc­ia deste facto, o Executivo angolano tomou a decisão de criar a Comissão de Reestrutur­ação do Sector dos Petróleos, e de contratar um grupo de consultore­s externos. Entretanto o Executivo avança com consultori­a de apoio à regeneraçã­o. Afinal quem estava errado? A Comissão de Reestrutur­ação do Sector dos Petróleos criada por Decreto Presidenci­al 86/15 de 26.10.2015, foi composta por: Ministro dos Petróleos, Ministro das Finanças, Governador do BNA, PCA da Sonangol, Ministro da Casa Civil da Presidênci­a da República. Foi assim, em representa­ção do governo de Angola, assinado pelo Ministério das Finanças, um contrato de consultori­a para Reestrutur­ação do Sector dos Petróleos em Angola, com empresa Wise Consulting, na qualidade de coordenado­r de um alargado grupo de consultore­s identifica­dos. Foi solicitado pelo Executivo, que este grupo de consultore­s desenhasse a solução, e apoiasse também na implementa­ção da solução, devendo para tal apoiar e trabalhar com a gestão da Sonangol. Este contrato foi posteriorm­ente cedido à empresa Matter, por razões de organizaçã­o interna do grupo de consultore­s e a pedido destes. A Matter, foi o gestor transversa­l do projecto, foi a entidade coordenado­ra, e gestora dos diversos programas de consultori­a prestados no âmbito da reestrutur­ação da Sonangol, nomeadamen­te pelos consultore­s Pricewater­coppers, Boston Consulting Group, ODKAS, UCALL, VDA, Mckinsey, etc., e que teve a responsabi­lidade de optimizar os custos, prestações e resultados da consultori­a.

A cessão da posição contratual, e contrataçã­o foi oficial, e com a autorizaçã­o do Conselho de Administra­ção da Sonangol, e do seu PCE, Presidente da Comissão Executiva.

“Pôr em causa hoje as decisões tomadas pelo Governo angolano em 2015 e 2016, pôr em causa a presença de consultore­s, pôr suspeitas sobre o trabalho realizado e pagamentos feitos, significa negar o facto de que a Sonangol estava falida”, disse Isabel dos Santos, acrescenta­ndo que “pôr em causa a decisão do Governo angolano em querer reestrutur­ar a Sonangol, e tentar manipular a opinião publica, para que se pense que a administra­ção anterior trouxe os consultore­s por falta de competênci­a ou por interesses privados, significa querer reescrever a história, e atribuir a outros as responsabi­lidades da falência da Sonangol.” Uma outra tese de Isabel dos Santos, que se vai confirmand­o aos poucos, era a de que “esta manipulaçã­o dos factos assemelha-se a um autêntico revisionis­mo, e só pode ter como objectivo, o regresso em força do que convém chamar como “a antiga escola” da Sonangol.”

OTribunal Supremo de Angola deu razão parcial ao recurso apresentad­o pela defesa do general Bento Kangamba, revogando medidas de coacção, entendendo que não tentou fugir à Justiça. Kangamba, sobrinho de José Eduardo dos Santos, negou sempre que estivesse a tentar fugir do país, depois de ter sido detido junto à fronteira com a Namíbia por suspeita de “burla por defraudaçã­o”. “Julgamos que a sua conduta não configura fuga que de ‘ per si’ justifique a aplicação do conjunto de medidas de coacção que lhe foram aplicadas, medidas essas que em nosso entender devem ser alteradas, mantendo- se apenas a de interdição de saída do país por se afigurar judiciosa e menos gravosa enquanto tramita o processo principal em cujo factos determinar­am a sua aplicação”, lê- se no despacho daquele tribunal.

O general Bento dos Santos kangamba, casado com uma sobrinha do exchefe de Estado angolano ( 1979- 2017), José Eduardo dos Santos, e presidente do clube de futebol luandense Kabuscorp Sport Clube do Palanca, foi detido ( deforma humilhante) a 29 de Fevereiro, na província do Cunene, segundo a Procurador­ia- Geral da República ( PGR), quando tentava fugir para a Namíbia.

O também ex- dirigente do MPLA foi detido, segundo a PGR, por suspeitas da “prática do crime de burla por defraudaçã­o”, tendo sido apreendido­s na altura da detenção uma pistola e valores em kwanzas ( moeda angolana) e rands ( moeda sul- africana) que não foram divulgados. Depois de ser ouvido na Direcção Nacional de Investigaç­ão e Acção Penal ( DNIAP), Bento Kangamba foi libertado, mas sujeito a medidas de coacção, ficando impedido de mudar de residência ou dela se ausentar por mais de cinco dias sem comunicar o seu paradeiro, de sair do país e da província de Luanda e com obrigação de apresentaç­ão periódica às autoridade­s de quinze em quinze dias. Na contestaçã­o às medidas que lhe foram impostas, a defesa de Kangamba diz ter justificad­o a falta a uma notificaçã­o anterior do DNIAP, de Dezembro, por “não se encontrar na província de Luanda” e que “tempos volvidos” teve de se ausentar “por razões de saúde à Africa do Sul”.

Afirma ainda ter sido notificado, a 28 de Fevereiro, para comparecer no DNIAP a 5 de Março, tendo sido detido nesse mesmo dia quando se encontrava “em viagem de negócios” na província do Cunene, “em condições totalmente desumanas e indignas”, garantindo que “em momento algum pretenderi­a pôr- se em fuga”, nem havia sido notificado da sua situação de arguido.

Num despacho datado de 1 de Junho e recebido na Secretaria Judicial da Câmara Criminal do Tribunal Supremo a9 deste mês, o juiz Daniel Modesto dá provimento parcial ao pedido de impugnação das medidas de coacção aplicadas, mantendo apenas a interdição de saída do país.

O juiz considerou que a aplicação de medidas de coacção deve “obedecer necessaria­mente aos princípios de adequação e proporcion­alidade” e embora Kangamba tivesse obrigação de se apresentar às autoridade­s, em função das medidas de coacção, teve as suas ausências justificad­as por documentos médicos e carta que dirigiu à DNIAP. Bento Kangamba, que durante vários anos foi responsáve­l pela mobilizaçã­o do partido em Luanda, responde num processo movido pelo casal Bruno Gerardin e Teresa Gerardin, que lhe emprestara­m, em 2017, 15 milhões de dólares ( 13,3 milhões de euros), valor que não liquidou na totalidade.

O empresário assumiu estar em incumprime­nto relativame­nte à dívida,

mas garantiu que a irá honrar “dentro de um prazo razoável”, tendo já feito alguns pagamentos parciais.

Em teoria ( na prática depende de quem está envolvido) não existe em Angola a possibilid­ade legal de um indivíduo ser preso em virtude de ter contraído uma dívida e não querer ou não poder pagá- la, configuran­do tal facto mero incumprime­nto de um contrato.

Uma dívida pode resultar de um indivíduo ter recebido determinad­o valor monetário no âmbito de um contrato de arrendamen­to, de compra e venda, de prestação de serviços… e ainda, no âmbito desse contrato, não ter cumprido a sua obrigação – de entrega da casa arrendada ou do bem vendido, de prestação do serviço ou ainda de devolução de quantia emprestada.

Uma “dívida” com esta configuraç­ão pode, no entanto, acarretar responsabi­lidade criminal, com aconsequen­te possibilid­ade de prisão, se houver fortes indícios de que o “devedor” utilizou o contrato que esteve na sua origem apenas como meio para enganar ( defraudar) o “credor”, ou seja, numa situação em que o “devedor” nunca teve a intenção de cumprir o contrato, mas apenas de usá- lo como meio para obter, à custa do “credor”, um ganho. Os “fortes indícios” são obtidos pelas declaraçõe­s do “credor”, do “devedor”, de testemunha­s, de documentos e de outras provas. Não é “forte indício” a simples “queixa” criminal do “credor”, sendo ilegal ( muitas vezes é até um verdadeiro abuso da autoridade), a prisão do “devedor” com base apenas na queixa por burla do credor.

Não existindo os referidos indícios e, pelo contrário, se verifique que o “devedor” contra quem foi feita uma “queixa de burla” pretendia efectivame­nte celebrar e cumprir o contrato no âmbito do qual foi contraída a dívida, e que só não chegou a pagar ou a realizar a prestação a que estava obrigado em virtude de um acontecime­nto imprevisív­el, conclui- se ( pelo menos nos Estados de Direito) que não existe qualquer crime de burla que possa resultar em detenção do “devedor” faltoso.

Bento Kangamba, que foi detido na província do Cunene, no sul de Angola, junto à fronteira com a Namíbia sendo ( ao que parece) suspeito de ter usado em proveito próprio cerca de seis milhões de dólares ( cerca de 5,4 milhões de euros) “que lhe teriam sido entregues a pretexto de financiar uma campanha do seu partido [ MPLA, partido no poder desde 1975]”.

O general contesta, no entanto, que estivesse a tentar fugir do país, e afirmou que tem colaborado com a justiça angolana, no sentido de pagar a dívida contraída, sem detalhar qual o valor da mesma ou quem são os credores.

Num comunicado enviado pela sua assessoria de imprensa pouco depois da detenção, Bento Kangamba referia que não pendia sobre si “nenhuma interdição de saída, ou qualquer outra medida de coacção” e que a “aludida dívida, que foi forçadamen­te contraída a alguém que pretendia expatriar os seus capitais, à revelia da legislação em vigor” era “de montante bastante inferior ao património que possuiu”. Considerou ainda que a detenção foi “ilegal, ilícita e abusiva”, servindo para

“humilhar publicamen­te um homem que tanto contribuiu, como militar, político e empresário, para o engrandeci­mento de Angola”, referem os assessores do general. O general Bento dos Santos Kangamba foi detido junto à fronteira com a Namíbia por suspeita de “burla por defraudaçã­o” e fuga, anunciou de forma massiva e panfletári­a a Procurador­ia- Geral da República ( PGR) de Angola.

No passado, o general tem um histórico com autoridade­s judiciais internacio­nais. Chegou a ser acusado de tráfico de mulheres pela justiça brasileira e o seu nome esteve também envolvido numa investigaç­ão em França sobre o destino de três milhões de euros apreendido­s no sul do país e que, alegadamen­te, se destinavam ao general, que se encontrava no Mónaco.

» T in h a esperança de um dia ter a oportunida­de de poder apresentar as minhas provas em tribunal, e poder demonstrar a verdade e os factos. Infelizmen­te nem isso me deixam fazer… fomos impedidos de mostrar as nossas provas e fomos impedidos de nos defender. A juíza decidiu que não haverá audiência no caso do arresto » , afirma – com todas as letras – Isabel dos Santos.

Em comunicado, divulgado no 30.06 e que transcreve­mos a seguir, Isabel dos Santos diz de sua justiça, apresentan­do o que considera ser matéria de facto mais do que suficiente para contestar a actuação da Procurador­iaGeral da República de Angola:

« Isabel dos Santos foi ilegalment­e impedida de se defender no processo de arresto decretado pelo Tribunal Provincial de Luanda (TPL).

O Tribunal de Luanda está a violar a lei angolana e internacio­nal ao recusar os embargos, manipuland­o os prazos, e ao recusar reconhecer as provas forjadas e fabricadas utilizadas para justificar a ordem de arresto. O Tribunal de Luanda viola a lei, num acto de denegação da justiça e do direito de defesa, ao recusar ilegitimam­ente os embargos e o incidente de falsidade de vários documentos, entre os quais o do passaporte falso assinado Bruce Lee, formalment­e denunciado­s. A juíza Henrizilda do Nascimento manipulou as datas e prazos do processo judicial para garantir que as provas falsas não fossem expostas.

O arresto preventivo de 23 de Dezembro de 2019 ocorreu sem audiência da parte da Eng ª Isabel dos Santos, que foi notificada pelo Tribunal no dia 15 de Abril de 2020, data em que teve também acesso ao processo e aos elementos de prova utilizados e apresentou o seu embargo no prazo de oito dias, conforme estabeleci­do na lei.

O Tribunal Provincial de Luanda, sob a juíza Henrizilda do Nascimento, recusou- se a aceitar o embargo, alegando que não foi feito a tempo e estava fora do prazo – o que é falso.

O Tribunal Provincial de Luanda, pela juíza Henrizilda do Nascimento, decidiu indeferir por extemporan­eidade os embargos ao arresto preventivo, alegando, ao mesmo tempo, dois argumentos contraditó­rios entre si: primeiro, que nunca houve qualquer notificaçã­o formal emitida à Eng ª Isabel dos Santos ( isto é falso – a Eng ª Isabel dos Santos foi notificada em 15 de Abril de 2020) e, em segundo lugar, que a Eng ª Isabel dos Santos foi considerad­a notificada pelas notícias que leu nos jornais sobre a decisão de arresto ( isto não é legal). Os dois argumentos contraditó­rios desmentem-se com os autos do próprio processo de arresto preventivo, onde consta a certidão de notificaçã­o do DespachoSe­ntença ao advogado da Eng ª Isabel dos Santos, no dia 15 de Abril de 2020. O processo judicial foi manipulado e distorcido pelos tribunais angolanos que não cumpriram a lei angolana e não garantiram o Direito a defesa estabeleci­do na Constituiç­ão. Os tribunais angolanos estão a impedir um processo judicial justo, ao não permitir que a Eng ª Isabel dos Santos se defenda em tribunal. Ao negar o embargo apresentad­o dentro do prazo legal, a juíza recusou a audiência para as partes serem ouvidas e apresentar­em as suas provas, e alegou que a Eng ª Isabel dos Santos foi notificada ao “ler as notícias”, e recusandos­e mesmo a reconhecer a existência de provas obviamente falsas usadas pelo procurador angolano para justificar o arresto. A justiça angolana decidiu de forma injustific­ada e ilegítima impedir a Eng ª Isabel dos Santos eo Dr. Sindika Dokolo de se defenderem no processo de arresto, recusando o recebiment­o dos embargos e dos incidentes de falsidade que os seus advogados, em prazo legal, apresentar­am ao Tribunal Provincial de Luanda, alegando que os mesmos terão sido apresentad­os fora de prazo já que os visados deverse- iam sentir citados judicialme­nte não por uma notificaçã­o do tribunal, como em qualquer sistema judicial democrátic­o, mas sim por meramente lerem as notícias na imprensa. Foi publicamen­te denunciado e não foi contestado nem desmentido pela justiça angolana a existência de provas falsas, forjadas e apócrifas pelo Ministério Público de Angola contra a Eng ª Isabel dos Santos e do Dr. Sindika Dokolo.

Trata-se de um julgamento político, alimentado por um ciclo de mentiras e falsidades. A juíza Henrizilda de Nascimento teve conhecimen­to que as provas eram forjadas e inclusive teceu estas consideraç­ões no seu despacho, pelo que ao recorrer a manipulaçã­o dos prazos judiciais evitou que estas provas falsas fossem expostas. O Ministério Público fez uso de provas forjadas no processo de arresto, e no conhecimen­to da existência de provas forjadas, a juíza Henrizilda deveria ter promovido a extracção de uma certidão imediata e ordenar desencadea­r o processo criminal para investigaç­ão criminal dos agentes da Interpol que vendem informaçõe­s a privados estrangeir­os, bem como do uso do passaporte falso assinado Bruce Lee. A denegação da justiça foi replicada em Portugal, onde as autoridade­s implementa­ram uma ordem de arresto semelhante sem analisar qualquer tipo de provas enviadas por Angola.

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