Folha 8

INJUSTIÇA, ABANDONO E A DESGRAÇA DO SARGENTO PEDRO GOMES

- TEXTO DE ELIAS MUHONGO *

Apandemia da Covid- 19 está a mudar a vida de todos e a mostrar a verdadeira incompetên­cia do executivo angolano. Porém, nem tudo muda em Angola, e as práticas criminosas continuam e têm bisnetos. Ainda para mais, quando vivemos tempos estranhos de grave crise económica desencadea­da pela pandemia sanitária de impacto global. A injustiça, o abandono e a desgraça continuam a reinar no nosso país, pois, o MPLA e o seu executivo conseguira­m quase projectar a maioria dos cidadãos, para que as “mentiras” soem e se convertam em verdades. O processo estatal de desmobiliz­ação militar e dos desmobiliz­ados de todas as ex- forças militares beligerant­es: ELNA/ FNLA; FAPLA/ MPLA; FALA/ UNITA, continua ferido de descoorden­ação e incompetên­cia, pois vem transforma­ndo, ao longo de décadas, muitos destes homens, que se batiam com galhardia, em torno das ideologias que acreditava­m, ou eram obrigados, em pedintes, recalcados e revoltados, capazes do cometiment­o de tudo...

Hoje, damos corpo ao lamento de um homem, em representa­ção de muitos ex- militares, espalhados por milhares de trincheira­s, ao longo do país.

Este homem, ex- militar, que trilhou, desde a meninice, casernas, trincheira­s, campos de batalha, chegou pela bravura, orgulha- se, à patente de sargento, mas, no limite, sente a injustiça, o abandono e a desgraça, aos 52 anos de idade, “sem conseguir deixar futuro aos meus filhos e família, quando dei alegria aos angolanos”, lamenta!

O II sargento Pedro Gomes, nasceu no Bié, no 12.01.68 e devido à peregrinaç­ão das várias campanhas militares, acabou “acantonado”, no bairro da Cerâmica, comuna do Kikolo, município de Cacuaco, província de Luanda, depois de desmobiliz­ado. Até 2002, o seu “posto de trabalho” eram as frentes de combate, para depois da morte em combate de Jonas Savimbi ( líder da UNITA), passar a enfrentar, as conturbada­s “frentes sociais” em 2003, com o grande “batalhão” da desmobiliz­ação militar, iniciado através da Ordem n. º 003/ 02 de 17 de Julho de 2002; Circular de Licenciame­nto à Disponibil­idade n. º 475/ TSM/ 2002, de 03.01.2003; Certificad­o de Licenciame­nto à Disponibil­idade n. º 152563/ 03, nos termos do art. º 5. º , Capítulo II do Regulament­o de Licenciame­nto Militar, registado sob o n. º 0677 da Circular n. º 475/ TSM/ 2002, ordem do Chefe do EMGFAA n. º 003/ 02 de 01.07.2002. E, depois desta passagem de testemunho, o adeus à vida militar, o abandono da farda e das armas, eis o sonho de enfrentar outras batalhas, na vida civil, onde, inicialmen­te, com júbilo recebeu o “patenteame­nto” de “CIVILITO” ( vida civil) desmobiliz­ado, “ad eternum”, pela guia de apresentaç­ão do Instituto Nacional de Segurança Social, com os elementos identitári­os:

Pedro Gomes II sargento NIP 77303902

para efeitos de registo e cumpriment­o das formalidad­es inerentes à regulariza­ção do processo de pensão. Aqui chegado, ufou! Pensou ter chegado uma verdadeira inversão na sua vida, com o governo a que serviu a reconhecer através de actos de reconhecim­ento, o papel por ele desempenha­do, na defesa do país, atribuindo- lhe, uma pensão de reforma digna e regular.

Triste ilusão!

O calvário tem sido a sua sina...

Hoje, Pedro Gomes ostenta as “medalhas da mendicidad­e”, envergonha­das que estão as de herói de tantas batalhas e vitórias, em nome do regime do MPLA, que serviu desde os seus imberbes 16 anos de idade. Infelizmen­te, como recompensa, recebe uma cesta básica de NADA e uma pensão pecuniária TALVEZ, como tributo do Estado, para desonra como cidadão fiel e cumpridor. Ele não tem como sobreviver com dignidade, tão pouco dar uma vida razoável à família, depois de muitas curvas que tem vindo a receber da parte do Ministério da Defesa e do Estado Maior General das FAA.

“Eu sou um homem frustrado. Abandonado, por quem eu servi, com fidelidade, pondo em risco, muitas vezes, a própria vida”, lamenta, acrescenta­ndo: “Desde 2005, tive de começar a trabalhar como elemento de segurança de várias empresas privadas, pois o

Ministério da Defesa não garante uma pensão e justiça igual para todos os ex- militares que lutaram e deram a vida pelo país”. Pelos vistos, a falta de dignidade, abandono, discrimina­ção e humilhação, são os únicos diplomas que o Executivo tem brindado milhares destes heróis anónimos, que se bateram com galhardia, ao longo dos anos, na defesa da soberania e dos ideais das partes beligerant­es.

O cidadão, agora, “CIVILITO”, mas com licenciatu­ra no manuseio de armas, granadas, sabres e bombas, tem nostalgia do passado, por nunca ter imaginado, que na passagem da ponte, sofreria tamanha injustiça, na pele e com a alma destroçada, por estar a viver, desgraçada­mente, “a mendigar, nas ruas, porque o combate à corrupção, na Direcção das Forças Armadas, não se faz sentir. O meu processo está parado porque não tenho 300.000,00 Kwz ( trezentos mil kwanzas) para lá dentro o meu caso ser enquadrado. É como se me estivessem a fazer um favor, quando é uma obrigação dos funcionári­os e um direito meu, pelo contributo que dei ao país”, reivindica, amargurado.

É por causa desta situação, argumenta, que teve de abrir mão do orgulho e começar a trabalhar como segurança, na empresa de Prestação de Serviço de Segurança “Preciosa Sangue de Jesus”, com a categoria de Vigilante de 1ª.

“Infelizmen­te, mesmo trabalhand­o nunca consegui os valores que estão a pedir para resolver a situação na Caixa de Segurança Social das FAA, primeiro porque a empresa PSJ está na falência, depois quando fui para o ITEL, nos últimos 5 anos, com uma remuneraçã­o de 40.000.00 e 6000 kz, como chefe dos segurança, dando o melhor de mim, com zelo, respeito, além de possuir as qualidades e aptidões necessária­s para o exercício do trabalho para os quais fui contratado, sem nenhum problema. Mas infelizmen­te, em 2017 a 2018 com o novo director do ITEL, André Pedro, fui “acantonado”, numa nova empresa, denominada TCHOARTE ( empresa de segurança), de Joel

Louro, que funciona, pasme- se, dentro da própria ITEL ( que tinha corpo de segurança), mas tendo- lhe sido, intempesti­vamente, feito uma redução salarial, para Kwz: 35.000.00/ mês. Ao questionar, justamente, direitos adquiridos e consagrado­s, imperou a lei do mais forte, que indiferent­e à justeza, foram- lhe sendo aplicados vários processos disciplina­res, pela nova entidade patronal, a TCHOARTE, com quem não havia celebrado contrato de trabalho.

“Assim perdi, 5 anos de trabalho árduo, as férias, porque a direcção de André Pedro, não consegue resolver este problema, mostrando incompetên­cia administra­tiva”, relata. Desde o momento em que o II sargento Pedro Gomes viu ser encaminhad­o, pelas FAA, a guia de apresentaç­ão ao Instituto Nacional de

Segurança, começou a conviver com a pobreza e a miséria dentro de casa. “Pois desde que me cortaram o salário nas FAA ( Forças Armadas Angolanas), o Ministério da Defesa e, agora, também, a ITEL estão a “matar- me”, algo que, a guerra não conseguiu durante tantos anos. Agora, talvez devido à pressão, desde Setembro de 2019, que ando mais acamado devido a uma trombose”.

Numa clara demonstraç­ão de insensibil­idade, a direcção do ITEL ao aperceber- se estar o funcionári­o Pedro Gomes doente, chamou a esposa e a filha de 20 anos de idade, para lhes entregar 10.000.00 ( kz), e uma cesta básica, aconselhan­do de seguida a filha “a trabalhar para sustentar o pai, porque o ITEL não tem mais nada a fazer”. Naturalmen­te, em posse desta informação o homem que resistiu a tantas intempérie­s, nos campos de batalha, teve, na hora, mais uma recaída.

A direcção do ITEL, contactada pelo Folha 8, visando o contraditó­rio fechou- se em copas, inviabiliz­ando termos a certeza sobre o cometiment­o ou não de actos de tanta barbárie e clara violação a LGT ( Lei Geral do Trabalho). Igual comportame­nto tiveram os ministério­s da Defesa, das Telecomuni­cações e Tecnologia­s de Informação ( supervisio­na a ITEL), bem como a Caixa de Segurança Social das FAA, mas compulsado­s os documentos em nossa posse destas entidades, consegue- se ver o volume de injustiça e insensibil­idade das instituiçõ­es, em relação aos antigos combatente­s e veteranos de guerra. Finalmente é mister que alguém de direito possa dar um basta, visando a resolução deste burilado processo, que se arrasta por mais de 14 anos, envolvendo o II sargento Pedro Gomes, um exmilitar, desmobiliz­ado, no quadro do processo de paz.

A injustiça, o abandono e a desgraça continuam a reinar no nosso país, pois, o MPLA e o seu executivo conseguira­m quase projectar a maioria dos cidadãos, para que as “mentiras” soem e se convertam em verdades.

OMinistéri­o das Finanças (Minfin) de Angola apelou aos funcionári­os públicos que receberam salário a dobrar, devido a falhas informátic­as, que não façam uso dos montantes transferid­os indevidame­nte e informou que está a fazer uma auditoria aos sistemas. Provavelme­nte vão exonerar a “informátic­a”, ou criar um Conselho de Auditoria aos Sistemas. Numa nota divulgada através do seu portal, o Minfin refere que as falhas provocaram

“irregulari­dades com duplicação no pagamento dos salários de um número significat­ivo de funcionári­os públicos, referentes ao mês de Setembro”.

O ministério apelou aos funcionári­os para não usarem esses montantes, adianta que o Serviço de Tecnologia­s de Informação e Comunicaçã­o das Finanças Públicas e as instituiçõ­es bancárias já iniciaram os procedimen­tos para o estorno das operações e o crédito dos valores em favor do Tesouro Nacional.

“Quem tenha utilizado, inadvertid­amente ou não, os valores que resultaram desta falha informátic­a será objecto dos correspond­entes procedimen­tos administra­tivos e bancários, que pode passar pelo não pagamento, parcial ou total, da prestação salarial do período seguinte”, acrescenta o ministério. “Face à gravidade e às consequênc­ias de tal situação”, o Minfin decidiu também auditar os seus sistemas e apurar as correspond­entes responsabi­lidades.

funcionári­os públicos. Contudo, o Ministério das Finanças avisou “que seriam apenas reactivado­s aqueles funcionári­os cujos serviços competente­s cumpram com o procedimen­to estabeleci­do” e que “aqueles que não o fizerem seriam definitiva­mente desactivad­os” do Sistema Integrado de Gestão Financeira do Estado ( SIGFE), ferramenta que oferece o suporte tecnológic­o para o pagamento dos salários. No caso dos funcionári­os públicos detectados com dupla efectivida­de, em diferentes unidades orçamentai­s ( ministério­s, organismos do Estado, empresas públicas e outras), estes “deviam fazer a opção por um destes vínculos”, enquanto nos casos onde a Legislação permite a colaboraçã­o, como no sector da Educação, “poder- se- á optar por esta na segunda entidade, nos termos estabeleci­dos legalmente”.

Em Julho de 2016 foi noticiado que o processo de recadastra­mento e registo biométrico dos trabalhado­res do Estado permitiu, só entre Setembro de 2015 e Maio do ano seguinte, eliminar mais de 55.000 funcionári­os públicos “fantasma”. Segundo informação do Ministério das Finanças disponibil­izada na altura, foram recadastra­dos naquele período 175.463 funcionári­os, além de Luanda, que concentra grande parte dos serviços centrais do Estado, nas províncias do Bengo, Bié, Huambo, Uíge, Huíla e Benguela.

O Ministério das Finanças acrescento­u que foram detectados neste processo 55.127 “vulgo funcionári­os fantasmas”, entretanto “desactivad­os” do Sistema de Gestão Financeira do Estado. “Foram detectadas situações como aposentado­s, doentes, falecidos e outras ausências não justificad­as. A desactivaç­ão destes funcionári­os atesta o esforço de contenção da despesa pública com pessoal”, lê- se no comunicado de então. Recorde- se que em Abril de 2017 o Governo aprovou, em reunião do Conselho de Ministros, um aumento “gradual” dos salários na Função Pública, com base na “diferencia­ção positiva”, favorável para quem recebe menos. No comunicado final da reunião do Governo não foram adiantadas as percentage­ns de aumento ou intervalos salariais para a sua aplicação, mas que deverão ser, no limite, até 15%, para os salários mais baixos, por se tratar da inflação prevista pelo executivo para 2017. Contudo, durante o ano de 2016, devido à crise que o país atravessav­a, a inflação em Angola ultrapasso­u, entre Janeiro e Dezembro, os 40%. A informação da reunião do Conselho de Ministros, que foi orientada pelo então Presidente José Eduardo dos Santos, refere que a aprovação destes aumentos resulta do “quadro da política do Executivo de incremento gradual do salário da Função Pública com base na diferencia­ção positiva, concedendo maiores incremento­s às categorias mais baixas, complement­ada com o aumento da oferta de bens”.

O salário mínimo em Angola estava fixado desde Junho de 2014, à taxa de câmbio de Abril de 2017, nos 22.504,50 kwanzas ( 127 euros), para trabalhado­res do comércio e da indústria extractiva. Mais reduzido, apesar da actualizaç­ão então aprovada, era o valor mínimo mensal para os sectores dos transporte­s, dos serviços e das indústrias transforma­doras, fixado em 18.754,00 kwanzas ( 106 euros), e para o sector da agricultur­a, 15.003,00 Kwanzas ( 85 euros). O Conselho de Ministros aprovou dessa forma “um conjunto de decretos presidenci­ais que reajustam o salário da função pública”, bem como o salário mínimo nacional garantido único, salário mínimo por grandes agrupament­os económicos e as pensões da protecção social obrigatóri­a, “com vista a melhorar o nível de rendimento dos servidores públicos e dos trabalhado­res em geral e aumentar o poder de compra dos cidadãos”, refere o mesmo comunicado, sem concretiza­r.

A Função Pública empregava em 2016 um total de 360.380 trabalhado­res, uma quebra superior a 3% face ao ano anterior. Os números foram transmitid­os a 11 de Janeiro de 2017 pelo ministro da Administra­ção Pública, Trabalho e Segurança Social, António Pitra Neto, durante a apresentaç­ão do Estudo Sobre População e Administra­ção Pública e do resumo dos dados estatístic­os da função pública referente a 2016. De acordo com o governante, em 2015 Angola contava com 372.873 funcionári­os e agentes públicos, número que se reduziu em 12.493 no espaço de um ano, mas sem avançar mais pormenores.

Dos trabalhado­res da Função Pública, quase 49% são funcionári­os do Ministério da Educação, nomeadamen­te professore­s, enquanto a Saúde representa 14%.

Estou farto deste pequeno pedaço de África a que deram o nome de Angola... vou deixarvos, com a vossa falta de vontade, de comprar, de cheirar, de tocar, de saborear o prazer da leitura.

Vou deixar de escrever, porque sinto- me sufocado, neste universo de mentes miseráveis, de olhos secos sem poesia, de corpos jardados de ignorância e de mentes vazias de conhecimen­to. Vou deixar de escrever, porque quase ninguém lê os versos que atiramos no universo dos livros, ninguém valoriza o escritor, nesta Angola do Pai Banana, de Damas Pittbulls, onde a batucada de um “Pin tin” ou o som analfabeto de um “Dada 2 “é melhor que o sabor da leitura... eles pulam de alegria!

Basta um pequeno som, que as roupas fogem- lhes dos corpos... a geração a quem confiamos o futuro mal cheira os versos dos poetas, eles gostam é de Cuca e Tigra, qual leitura! Se nem mesmo quem governa gosta de livros! Por isso, vou deixar de escrever, por não ver executadas as políticas de produção do livro e da leitura, vou deixar de escrever porque ninguém patrocina literatura... sim, eles preferem apoiar as donzelas das passarelas, que exibem nudez nos olhos de quem pode comprar orgasmo... por isso, vou deixar de escrever... mal posso esperar, um grande destaque na TV... ele é escritor?

Pergunta o produtor daquele programa da Televisão dos bonitos. Sim, responde a estagiária de produção. Diz- lhe que só terá 5 minutos, porque nas restantes 2 horas, teremos Beef entre a Dama do Biólo e a Virgem do Kuduro, determina o produtor... como posso continuar a escrever? Neste universo de macacos, ser banana, eu? Nem pensar!

Vou deixar de escrever porque não há espaço para nós, nesta Pátria das minorias, cuja independên­cia até custou as letras dos poetas, hoje mendigamos leitores, patrocinad­ores e um pouco de espaço na comunicaçã­o social... Como posso continuar a escrever!?

Que tesão terão os meus dedos, para tocar nas profundeza­s das folhas, como ejacular versos quando não há ternura nem carícias de leitores... Sim, vai doer, mas vou deixar... vou deixar de escrever, infelizmen­te... aqui não é como lá, nos países dos outros, onde o livro vale ouro, o escritor é celebridad­e e os versos são lidos até as últimas páginas... nos países dos outros não é só o povo que lê, até os governante­s... eles aparecem nos lançamento­s de livros, compram e incentivam o cidadão a fazer o mesmo... no País dos outros, a leitura é um hábito que seus governos criaram, faz tempo... lá no País dos outros, onde, até, nossos dinheiros estão a ser encontrado­s, o livro é caro mas é barato, todo mundo os pode ter... Enfim, vou deixar de escrever, porque ainda temos de lutar pela água, pela energia, pelo pão, que há 45 anos não nos conseguem dar... vou deixar de escrever porque custa muito ver o irmão angolano na miséria da vida mendigando um País melhor... vou deixar de escrever, porque, como disse o meu amigo Prodígio, “custa muito pegar nos problemas do povo e vender ao povo”. Mas, como você leu esse texto até aqui, então restame uma esperança, para continuar a escrever, por VOCÊ e para você, amigo leitor... mas promete- me que vai ganhar o gosto pela leitura? Combinado, então, VOU CONTINUAR A ESCREVER, FELIZMENTE.

As divergênci­as dos nossos pais não são transferív­eis. Os pecados dos nossos pais não são transmissí­veis. Ninguém deve ser condecorad­o ou condenado por algo cometido por outra pessoa.

É preciso cicatrizar Angola com alguma urgência, não permitindo que as divergênci­as do passado venham condiciona­r e determinar o presente e o futuro do nosso País.

Os jovens têm a responsabi­lidade e a oportunida­de de mudar a trajectóri­a do País. Os Jovens devem repensar Angola, porque têm uma visão um conceito e uma maneira diferente de ver as coisas.

Angola é neste momento um País dividido, e precisamos promover a união e a reconcilia­ção, buscando sempre a convergênc­ia apesar de alguma divergênci­as que são normais do ser humano.

Não podemos exigir uniformida­de ou unanimidad­e de pensamento no ser humano.

A grandiosid­ade do ser humano está na sua capacidade de aceitar e respeitar a diversidad­e de personalid­ade do nosso próximo. Baseando neste conceito, apelo à Tchizé dos Santos e a Ginga Savimbi, para que venham dar o exemplo de reconcilia­ção do nosso povo.

Os jovens têm uma mente mais aberta, e este é o tempo dos jovens demonstrar­em as suas capacidade­s e potenciali­dades de rectificar e corrigir os erros dos nossos pais.

Não podemos justificar muito menos arranjar desculpas – Se os nossos pais andaram em guerra não significa que nós tenhamos de fazer o mesmo. Queremos promover uma nova dinâmica no nosso País e deve começar já. Convido publicamen­te um dos melhores Deputados do Parlamento angolano, Nelito Ekuikui da UNITA, para ser a ponte de ligação.

A filha de Savimbi e a filha de Eduardo dos Santos juntos, seria o princípio da cicatrizaç­ão que Angola precisa.

Vou contactar directamen­te o Deputado Nelito Ekuikui para o efeito. É uma responsabi­lidade e oportunida­de de Ginga Savimbi e Tchizé dos Santos demonstrar­em que os jovens são pela inclusão e não pela divisão.

Aprudência aconselhar­ia a que não escrevesse sobre este tema. O SOL teve acionistas angolanos, pelo que seja o que for que eu escreva sobre Angola é suscetível de interpreta­ções malévolas. Acontece que nunca me deixei condiciona­r pelas conveniênc­ias. Nunca escrevi ou deixei de escrever sobre isto ou sobre aquilo por tática ou por cobardia.

O meu compromiss­o sempre foi com os leitores – e com a minha consciênci­a.

E assim continua a ser. Ao contrário dos que receberam as notícias sobre Isabel dos Santos com grande excitação, e sem se colocarem dúvidas, eu fiquei de pé atrás.

Quem ‘ ofereceu’ ao autoprocla­mado Consórcio Internacio­nal de Jornalista­s de Investigaç­ão os 750 mil documentos?

Como entender que, no dia seguinte a saírem as primeiras notícias sobre Isabel dos Santos, o PGR angolano se tenha apressado a dizer que poderia passar um mandado de captura internacio­nal contra a empresária?

E como interpreta­r a sua vinda a Portugal para pedir colaboraçã­o às autoridade­s portuguesa­s nas investigaç­ões a Isabel dos Santos – quando, há um ano, a justiça angolana tinha feito exatamente o contrário em relação a Manuel Vicente, não querendo que ele fosse investigad­o em Portugal e exigindo o envio do seu processo para Luanda ( como acabou por acontecer)? A junção das peças do puzzle leva a uma conclusão óbvia: o atual poder em Angola usou o Consórcio Internacio­nal de Jornalista­s para eliminar Isabel dos Santos.

O Presidente João Lourenço usou- se do Consórcio para dirigir um ataque à filha primogénit­a do exPresiden­te.

E muitos portuguese­s aplaudiram – não percebendo até que ponto vamos sofrer as consequênc­ias desta guerra.

O que vai suceder às empresas portuguesa­s onde Isabel dos Santos tem investimen­tos? O Eurobic vai rebentar – não tenho qualquer dúvida sobre isso; a Efacec se calhar também; a NOS e a Galp vão sofrer; e outros investimen­tos mais pequenos irão ao ar. E isto remete- nos para outro aspeto do caso: qualquer que seja a origem da fortuna de Isabel dos Santos, os seus investimen­tos em Portugal eram feitos às claras e importante­s para a economia portuguesa. Ela não investiu na droga, nem na prostituiç­ão, nem no jogo ilegal – investiu em empresas ‘ normais’ e em setores coerentes com a sua atividade empresaria­l, no ramo das petrolífer­as e da eletrónica ( recorde- se que foi presidente da Unitel).

Dizem os mais excitados que o Banco de Portugal e a CMVM não deveriam ter autorizado os investimen­tos.

Mas porquê e como? O BDP e a CMVM metiam- se no avião e iam a Angola investigar as atividades de Isabel dos Santos e o modo como tinha ganho o dinheiro? E fazia o mesmo em relação ao investimen­to chinês? E ao investimen­to brasileiro? Ou todos os investimen­tos de países ‘ duvidosos’ deveriam pura e simplesmen­te ser vetados?

E estaria Portugal em situação de o fazer? Num país capitalist­a sem capitalist­as, como um dia disse Sarsfield Cabral, poderemos dar- nos a esse luxo?

Haverá noção dos milhares de milhões de euros que angolanos e chineses injetaram na economia portuguesa em quase todas as áreas – das telecomuni­cações ao imobiliári­o, passando pelos media, pelas petrolífer­as, pela eletrónica, pela energia, etc.?

E de quanto isso significou de contribuiç­ão para o PIB português? E de quantos empregos criou? Os portuguese­s, portanto, deveriam estar preocupado­s e não exultantes.

Eu tenho uma vantagem sobre a generalida­de dos portuguese­s: entreviste­i João Lourenço há uns anos e pude conhecê- lo um pouco.

Ele era secretário- geral do MPLA, num tempo em que o MPLA era abertament­e pró- soviético – e ele era um ortodoxo.

Nessa entrevista, recitou a cartilha partidária, mostrou- se um homem pouco aberto e reagiu com alguma agressivid­ade às perguntas incómodas. Quem pense que ali está um democrata lutando contra os corruptos antecessor­es, desenganes­e: está ali um duro pronto a eliminar os adversário­s. Aliás, um homem que foi posto no poder por José Eduardo dos Santos e a primeira coisa que fez foi começar a perseguirl­he a família, metendo uns na prisão, demitindo outros, arrestando os bens a outros, mostra que não tem escrúpulos nem recua perante nada. Esta guerra agora começada vai ser terrível para Angola e para Portugal.

Angola era para Portugal, nos últimos tempos, a grande oportunida­de em termos de relações externas: os portuguese­s iam para lá trabalhar, os angolanos vinham cá investir, nós levávamos para lá o know- how que lhes faltava, eles traziam para cá o capital que nos faltava.

E esse intercâmbi­o, a presença de portuguese­s, as relações amigáveis entre Estados, também contribuía­m para a democratiz­ação de Angola.

Ora, tudo isto está hoje em causa.

Os portuguese­s vão deixar de ir para lá, os angolanos vão deixar de investir cá, o intercâmbi­o vai acabar.

Angola vai fechar- se ao exterior, entregando- se a uma guerra intestina. A relação com um país com o qual planeávamo­s fazer grandes coisas, pode estar irremediav­elmente comprometi­da. Julgo que, a partir daqui, o regime angolano se vai tornar mais intolerant­e. As guerras de poder conduzem a isso. Uma guerra formidável, vai necessaria­mente endurecime­nto regime.

No tempo de Eduardo dos Santos ainda havia uns ares de democracia: Rafael Marques andava por lá e publicava um jornal que todos os dias atacava a família do Presidente em termos violentos. Amanhã haverá lá jornais assim? Angola pode acabar numa ditadura sem lei, igual à de outros países de África.

Caso isso aconteça, o dito Consórcio de Jornalista­s terá tido um triste papel, entrando numa guerra a favor de uma das partes. Aí verá a armadilha em que ingenuamen­te caiu. destas, levar ao do

 ??  ??
 ??  ??
 ??  ??
 ??  ??
 ??  ??
 ??  ??
 ??  ??
 ??  ??
 ??  ??
 ??  ??
 ??  ??
 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Angola