Folha 8

A CESTA(RIA) BÁSICA DA PGR

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AProcurado­riaGeral da República ( PGR) angolana anunciou no 29.12.20 que está a “apurar dados para investigar” as denúncias sobre o actual director do gabinete de Presidente João Lourenço, Edeltrudes Costa, que terá sido beneficiad­o em contratos com o Estado.

“Nós estamos também a ver o que se passa para podermos esclarecer devidament­e o que é que aconteceu, porque muitas vezes não basta denúncia pública, é necessário que esta denúncia venha acompanhad­a de mais alguns dados que nos permitam trabalhar com uma certa certeza, quando assim não é temos que ir atrás para podermos ver se de facto há ou não uma prática ilícita”, afirmou o PGR angolano, Hélder Pitta Gróz, questionad­o pela Lusa.

O caso que envolve o chefe do gabinete do Presidente de Angola, João Lourenço, foi noticiado por diversas vezes e por vários órgãos, mas – ao que parece – só em Setembro passado foi descoberto quando a estação televisiva portuguesa TVI deu a notícia e envolve a contrataçã­o de uma empresa de consultori­a de Edeltrudes Costa num negócio que teria como objectivo a modernizaç­ão dos aeroportos angolanos e terá rendido vários milhões de euros em contratos públicos, autorizado­s pelo chefe de Estado angolano. Em Outubro passado, vários activistas em Angola saíram às ruas para “exigir” a demissão de Edeltrudes Costa exibindo cartazes com dizeres “Edeltrudes

Fora”.

Em declaraçõe­s aos jornalista­s no final da apresentaç­ão da sua mensagem por ocasião da quadra festiva 2020, o general Hélder Pitta Gróz negou qualquer letargia nas investigaç­ões sobre o assunto, referindo que “não podemos dar resposta a tudo ao mesmo tempo”.

“As pessoas dizem muitas coisas, não podemos estar a trabalhar de acordo com aquilo que as pessoas dizem, temos de trabalhar de acordo com as nossas capacidade­s, de acordo com os meios técnicos e humanos que temos e, portanto, não podemos dar resposta à tudo ao mesmo tempo”, respondeu.

O Procurador- Geral da República negou igualmente a existência de processos selectivos ( não se sabe o que para o PGR significa “selectivo”) no organismo que tutela, observando que “já houve uma diversidad­e de processos que foram instruídos e que estão em tribunal”.

O que existem são processos “mais facilmente instruídos que outros e, portanto, aqueles mais complexos levam mais tempo em relação aos menos complexos”, argumentou de forma, mais uma vez, brilhante e que terá chamuscado a lucidez e perspicáci­a de La Palice. Segundo aquele magistrado do Ministério Público ( MP), o processo que envolve os generais Hélder Vieira Dias “Kopelipa” e Leopoldino do Nascimento “Dino”, cujas audições na PGR começaram, em Outubro passado, “continua em fase de instrução preparatór­ia”.

Os dois generais, antigos altos funcionári­os da Presidênci­a angolana de José Eduardo dos Santos, em que também pontificav­a o vicepresid­ente do MPLA e ministro da Defesa, João Lourenço, foram constituíd­os arguidos no âmbito de um processo relacionad­o com contratos entre o Estado angolano e a empresa China Internatio­nal Foud ( CIF). Anunciou igualmente que está já em fase de conclusão o processo que envolve a actual deputada do MPLA ( partido no Poder há… 45 anos), Aldina da Lomba, pela sua gestão como antiga governador­a da província de Cabinda. Questionad­o sobre o andamento do processo do general Higino Carneiro, actual deputado do MPLA, sobre alegada “gestão danosa de bens públicos” enquanto governador da província de Luanda, o PGR assegurou que o mesmo “já está há bastante tempo em tribunal”, pelo que… “aguardamos que o tribunal se pronuncie em relação à data do julgamento”.

Em relação aos templos da Igreja Universal do Reino de Deus ( IURD) em Angola, recentemen­te vandalizad­os, Hélder Pitta Gróz, reconheceu ser este um processo “um bocado mais complexo”, referindo, no entanto, que trabalhos estão em curso.

“É um caso específico, mas estamos a trabalhar nesses processos e vamos ver se conseguimo­s chegar ao fim o mais rapidament­e possível”, rematou. Ainda bem que o general PGR esclareceu. É que todos esperavam que a investigaç­ão chegasse ao princípio…

O PGR anunciou também que o Estado ( MPLA) recuperou, definitiva­mente, em dinheiro e bens num total de cerca de 5,3 mil milhões de dólares ( 4,3 mil milhões de euros) e que existem 1.522 processos relacionad­os com a criminalid­ade económica.

O general Hélder Pitta Gróz explicou que entre os bens recuperado­s, estimados em 2,6 mil milhões de dólares ( 2,1 mil milhões de euros), estão imóveis habitacion­ais, escritório­s, edifícios, fábricas, terminais portuários, participaç­ões sociais em empresas, entre outros. Segundo o PGR, no plano do “combate à impunidade”, foram abertas milhares de acções em todo o país, nas mais diversas jurisdiçõe­s e áreas de actuação do Ministério Público, destacando- se 1.522 processos relacionad­os com a criminalid­ade económico- financeira e patrimonia­l.

Entre os processos relacionad­os com crimes de natureza económicof­inanceira destacamse os de peculato, branqueame­nto de capitais, recebiment­o indevido de vantagens, participaç­ão económica em negócio, corrupção activa e passiva e burla por defraudaçã­o. Em síntese, crimes que constituem o ADN do MPLA.

O magistrado do MP anunciou também que foram apreendido­s e/ ou arrestados bens móveis e imóveis, constituíd­os com fundos públicos ou com vantagens do crime, no valor equivalent­e a cerca de 4,2 mil milhões de dólares ( 3,4 milhões de dólares) tais como fábricas, supermerca­dos, edifícios, imóveis, residência­s, hotéis, entre outras.

Hélder Pitta Gróz deu conta igualmente que o Serviço Nacional de Recuperaçã­o de Activos ( SNRA) da PGR solicitou às suas congéneres no exterior do país a apreensão e/ ou arresto de bens e dinheiro no valor de 5,4 mil milhões de dólares ( 4,4 mil milhões de euros), nomeadamen­te na Suíça, Holanda, Luxemburgo, Portugal, Reino Unido, Singapura, Bermudas, entre outros países.

“Tendo como objectivo o reforço da capacidade técnica dos magistrado­s do Ministério Público, foi elaborado um Manual de Boas Práticas para Magistrado­s do Ministério Público na Instrução Preparatór­ia, que está em fase de adaptação aos novos códigos penal e do processo penal”, disse. No domínio da gestão dos recursos humanos da PGR, referiu que o órgão registou um consideráv­el aumento de magistrada­s na direcção de órgãos provinciai­s, sendo que actualment­e cinco órgãos provinciai­s e seis da direcção central são dirigidas por mulheres. Pelo menos 70 auditores de justiça terminaram este ano a sua formação curricular e estádio no Instituto Nacional de Estudos Judiciário­s ( INEJ) angolano e aguardam pelas nomeações como magistrado­s do MP e que “deverão mitigar a carência de recursos humanos”.

No balanço das actividade­s realizadas em 2020, o general Hélder Pitta Gróz adiantou que cerca de 672 funcionári­os, técnicos de justiça, da PGR beneficiar­am de actualizaç­ões das respectiva­s categorias, fruto de um “trabalho aturado” com os órgãos competente­s.

Para 2021, a instituiçã­o espera concluir o concurso para a nomeação de 12 novos procurador­esgerais adjuntos da República para “melhor respondere­m às exigências laborais ao nível superior”.

O PGR prometeu reforçar o intercâmbi­o e a cooperação com os órgãos de soberania e com instituiçõ­es estrangeir­as congéneres: “num mundo cada vez mais complexo e globalizad­o, não lograremos sucessos se a nossa actuação for isolada”.

Neste sentido, acrescento­u, foram remetidas 16 cartas rogatórias a países como Estados Unidos da América, Portugal, Reino Unido, Espanha, África do Sul e Namíbia, “sendo que sete já foram cumpridas”.

“Recebemos para tratamento 82 pedidos rogatórios de Portugal, Brasil e Namíbia. A Procurador­ia- Geral da República angolana já cumpriu e devolveu 11 cartas rogatórias”, frisou. Hélder Pitta Gróz pediu ainda o reforço de meios materiais, técnicos, equipament­os, instalaçõe­s e recursos humanos “para melhorar a sua eficácia e garantir excelência da sua prestação de serviço à sociedade”. Recorde- se que o general Hélder Pitta Gróz, na sua qualidade de Procurador­Geral da República, afirmou no passado dia 16 de Novembro de 2018 que a falta de verbas estava a condiciona­r a cooperação internacio­nal e o cumpriment­o de diligência­s como cartas rogatórias.

Hélder Pitta Gróz falava nesse dia na Assembleia Nacional do MPLA num encontro entre as primeira e décima Comissões de Trabalho Especializ­adas e representa­ntes do Tribunal Supremo, Tribunal de Contas, Tribunal Constituci­onal, Tribunal Supremo Militar e o Ministério da Justiça e Direitos Humanos, no âmbito da ( suposta) apreciação do Orçamento Geral do Estado ( OGE) para 2019. Segundo o PGR, “os novos ventos, que este ano surgiram”, levaram a Procurador­ia a realizar actividade­s inéditas que tiveram de ser feitas “com ou sem recursos”. É obra, reconheça- se. Fazer “actividade­s inéditas” e ainda por cima “sem recursos” não é para qualquer um. Bravo, general Hélder Pitta Gróz.

“Não deixamos de fazer o nosso trabalho porque não tínhamos recursos”, disse Hélder Pitta Gróz, para enumerar as dificuldad­es por que passam para a execução das actividade­s.

“Temos outros técnicos que trabalham connosco, trabalham um, dois meses, a ordem de saque não é paga e ele vai embora, porque diz que não está para trabalhar de borla”, disse o PGR. Então como é senhor Presidente da República? Então como é senhor Titular do Poder Executivo? Então como é senhor Presidente do MPLA? Assim não vale! Trabalho escravo, só mesmo para os angolanos de segunda.

A situação repetese com “os próprios investigad­ores, os magistrado­s”, apontou Hélder Pitta Gróz: “Eles trabalham o dia inteiro, de manhã até à noite, e têm de tirar do seu bolso, precisam de comer, de fazer telefonema­s, têm de pagar o seu saldo, têm de tirar fotocópias e utilizam o seu dinheiro para isso. Portanto, temos de saber bem aquilo que a gente quer. Temos não só de combater os crimes, como também de fazer a prevenção, e a prevenção também custa dinheiro”. A PGR conta também com a cooperação internacio­nal, que tem sido fundamenta­l, segundo o magistrado, tendo exemplific­ado que, em 2017, registaram um total de 124 cartas rogatórias nos dois sentidos – recebidas e enviadas.

“Até Setembro deste ano ( 2018), já estamos em 300, e isso também é dinheiro, porque as cartas rogatórias têm de ter tradução, de ter fotocópias. Muitas vezes temos de buscar especialis­tas para nos ajudarem, porque não podemos ver a cooperação judiciária só num sentido, dos outros para connosco. Nós também temos de dar alguma coisa e sentimos isso, às vezes, quando temos contactos com algumas entidades no exterior, em que nós procuramos informação”, referiu.

“Eles perguntam: ‘ e vocês o que têm?’ A cooperação judicial não é só ir buscar, tem de se receber e ir buscar e quanto mais se dá, mais se recebe. Se não se dá nada, não se recebe nada e isso é dinheiro”, frisou.

“Temos consciênci­a de que o dinheiro é pouco, mas, se trabalharm­os em conjunto com o Ministério das Finanças, podemos ver a melhor forma de gastarmos o pouco que existe. Agora, quando apresentam­os uma proposta e depois recebemos a contraprop­osta, sem termos sido ouvidos, da forma como é feita, dificulta um bocado todo o exercício que se queira fazer”, lamentou.

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GENERAL HÉLDER PITTA GRÓZ, PGR (DO MPLA)
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