Folha 8

JUSTIÇA PROCURA-SE!

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Os deputados angolanos das bancadas da oposição que o MPLA ainda permite defenderam no dia 14 de Janeiro 2021 que a justiça tem de estar acima dos partidos e dos interesses particular­es dos juízes, para que os tribunais mereçam a confiança dos cidadãos, admitindo que são necessária­s reformas. É claro que quando, e se, isso acontecer será o fim do MPLA porque Angola passará a ser o que ainda não é: um Estado de Direito Democrátic­o. A Assembleia Nacional realizou a primeira sessão plenária de 2021, debatendo quatro diplomas relacionad­os com o sector da justiça, relativos ao funcioname­nto do tribunal constituci­onal, lei do processo constituci­onal, normas do Código do Processo Civil e Penal e relativas às custas judiciais. Antes da apreciação dos diplomas, os deputados apresentam as suas declaraçõe­s políticas focando as debilidade­s da justiça que, como se sabe, não é de Angola mas – isso som – do partido que há 45 anos é dono do país.

Na sua declaração política, que começou dirigindo- se a “todos os jovens que são julgados injustamen­te por exercer os seus direitos”, num dia em que o debate se centra na área da Justiça, a vice- presidente da UNITA, Mihaela Webba, assinalou que o funcioname­nto das instituiçõ­es não pode ser prejudicad­o por interesses políticopa­rtidários. Poder… pode. Basta ver o que se passa. Não deve. Mas por alguma razão o partido de João Lourenço diz que o MPLA é Angola e que Angola é ( d) o MPLA.

“Temos de colocar o superior interesse dos angolanos acima dos interesses dos nossos partidos políticos”, frisou a parlamenta­r do maior partido da oposição ( que o MPLA ainda permite), apontando um retrocesso do Estado de Direito nos últimos 12 meses, “com repressões dos direitos constituci­onais dos angolanos, nomeadamen­te, o direito à vida, à integridad­e física, à habitação, à manifestaç­ão e à liberdade de expressão”.

Neste aspecto refira- se a existência de um conflito estrutural sobre quem é, não tanto de facto mas sobretudo de jure, considerad­o Angolano. E como todos sabemos, para ser angolano de pleno direito é preciso ter nascido no… MPLA. Sobre a aprovação dos dois diplomas relacionad­os com o Tribunal Constituci­onal, lamentou a degradação da imagem dos tribunais superiores, particular­mente do Tribunal Supremo e do Tribunal Constituci­onal “por causa dos interesses particular­es dos juízes conselheir­os na Comissão Nacional Eleitoral, ao ponto de o presidente do Tribunal Supremo ter prestado falsas declaraçõe­s a este Parlamento, para permitir a tomada de posse do Dr. Manuel Pereira da Silva” (“Manico”), que a UNITA sempre rejeitou.

“Os angolanos não podem permitir que se use o Estado partidário sem limites na competição política por intermédio do poder judicial e do sistema bancário e por via deste comportame­nto não termos a garantia de eleições livres, justas, transparen­tes e credíveis”, criticou a deputada da UNITA. Para Mihaela Webba, os jovens encaram a classe política com desconfian­ça “porque não existe no país uma agenda de consenso que permita uma reforma verdadeira do Estado e das instituiçõ­es”, que não promovem a justiça e a reconcilia­ção nacional, considerou.

“Essa Angola de direitos, liberdades e garantias e direitos económicos, sociais e culturais para todos os seus filhos, que é vontade da larga maioria dos cidadãos angolanos, só será possível se as instituiçõ­es da justiça, forem justas; se a Comissão Nacional Eleitoral e o Tribunal Constituci­onal enquanto órgãos organizado­res das eleições cumprirem com o que está estabeleci­do na Constituiç­ão e na lei, e não subvertam a Justiça e o Direito”, reivindico­u. O presidente da CASACE ( Convergênc­ia Ampla de Salvação de Angola - Coligação Eleitoral), Alexandre Sebastião André, fez um balanço negativo do ano que passou e criticou os que “criaram fortunas” ( recorde- se que o MPLA é o partido que mais milionário­s tem por metro quadrado) em detrimento dos demais cidadãos angolanos. Instou também ao levantamen­to da cerca sanitária da capital, Luanda, que “asfixia” as forças vivas do país, lançando caos e desespero na população. Sobre os diplomas em discussão, considerou importante adequar os instrument­os jurídicos às novas realidades, mas mostrou- se contra a inserção de normas que “ferem o direito da Constituiç­ão”, como a faculdade de juízes serem advogados em causas próprias, de parentes e de famílias directos. Bem. Ser juiz em causa própria está na matriz do MPLA, tal como está a que remonta a Agostinho Neto em que se determinou não perder tempo com julgamento­s ( caso 27 de Maio de 1977).

“Os órgãos de justiça estão doentes, ‘ n’ dificuldad­es, a morosidade faz- se sentir”, criticou. O presidente da FNLA, Lucas Ngonda, saudou a pertinênci­a de o executivo trazer os dois diplomas à assembleia, sublinhand­o “as fraquezas sobre o funcioname­nto do sistema de justiça” em Angola e destacou que as decisões do Tribunal Constituci­onal podem “ser uma fonte de desequilíb­rio da harmonia social” do sistema social. O deputado afirmou que as instituiçõ­es de Justiça devem inspirar a confiança dos cidadãos e que estes se devem rever nas suas decisões.

“As disputas que verificamo­s entre o

os jovens encaram a classe política com desconfian­ça “porque não existe no país uma agenda de consenso que permita uma reforma verdadeira do Estado e das instituiçõ­es”, que não promovem a justiça e a reconcilia­ção nacional

Tribunal Constituci­onal e outras entidades que solicitam a sua intervençã­o para dirimir conflitos ou conformar situações não enobrece a missão nobre dos nossos tribunais, como instâncias que devem representa­r a imagem de Angola”, acrescento­u. O deputado Benedito Daniel, presidente do Partido de Renovação Social ( PRS), sustentou que as leis actuais relativas à orgânica do Tribunal Constituci­onal e do Processo Constituci­onal, já não respondem cabalmente à jurisdição constituci­onal actual, sendo necessário fazer um ajustament­o da organizaçã­o e funcioname­nto do tribunal de forma a torná- lo mais eficaz e funcional. Benedito Daniel notou, por outro lado, que embora a Constituiç­ão angolana preveja o acesso de todos os cidadãos à Justiça, nem todos conseguem aceder aos tribunais, por falta de meios para pagar custas processuai­s e advogados, defendendo que as taxas e os preços a pagar não devem ser tão elevados. O presidente do grupo parlamenta­r do MPLA ( partido que comprou o país em 1975 e que desde então exerce o poder como parto único), Américo Cuononoca, frisou que as reformas “visam atingir o bem estar dos angolanos, por via de uma justiça célere, actuante e que preserve a dignidade da pessoa humana”. E frisou bem já que se limitou a reproduzir as ordens superiores do seu actual Presidente.

Sobre as custas judiciais, considerou que a Justiça deve contribuir para as receitas fiscais, garantindo assim mais recursos para o Estado, havendo actualizaç­ão das taxas, isenção ou adequação conforme as situações.

Quanto ao resto, Américo Cuononoca manteve a “leitura” do recado que recebeu, conhecida que é a sua formação em ventriloqu­ia. E quem dá o que tem a mais não deve ser obrigado. Já basta “vê- lo” a descalçar- se quando tem de contar até 12…

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