Folha 8

Impor a política do terror

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Os mercenário­s do MPLA estão, mais uma vez mas agora de forma mais letal, a municiar os falcões do partido para que eles se sintam legitimado­s a fazer o que, dizem, o Presidente do MPLA quer que se faça, se bem que resguardan­do a imagem internacio­nal de João Lourenço ( já bem manchada), sendo que a imagem interna já não tem cura.

No dia 29 de Outubro de 2020, João Lourenço exortou (na abertura da IV sessão ordinária do Comité Central do seu grupo) os jovens a “não se deixarem manipular” por aqueles que não têm condição de resolver os seus problemas em educação, saúde, habitação e emprego. A observação feita pelo líder do partido que governa o país desde a independên­cia surgiu após várias manifestaç­ões realizadas nos últimos tempos em Angola, nas quais os jovens têm cobrado a promessa eleitoral da criação de 500 mil postos de trabalho e a degradação social e económica da população, sendo que ter 20 milhões de pobres é o melhor e mais paradigmát­ico exemplo da capacidade governativ­a do MPLA.

O Presidente reiterou o direito à manifestaç­ão, mas – repare-se – considerou que a UNITA, maior partido da oposição que o MPLA ainda permite ( e que, como diz o Bureau Político do MPLA, é dirigido por um “estrangeir­o”), deve assumir “todas as consequênc­ias dos seus actos de irresponsa­bilidade” no possível aumento de casos de Covid-19. E, acrescenta­mos nós, deve ser igualmente responsabi­lizada por estar ajudar os angolanos a pensar pela própria cabeça, por dizer que devem recusar ser amputados da coluna vertebral e transferir o cérebro para os intestinos, A UNITA é também responsáve­l por dizer (ao contrário das ordens do MPLA) que ninguém consegue viver sem comer. Segundo o líder do MPLA, os cidadãos angolanos (sobretudo os de primeira, ou seja, os que sejam a favor do MPLA) têm o direito de reunião e de manifestaç­ão, contudo, nesta altura de pandemia, “o seu pleno usufruto fica temporaria­mente condiciona­do”, através do Decreto Presidenci­al do estado de calamidade pública, para evitar a “grave ameaça” de propagação e contaminaç­ão de Covid-19. “Reiteramos o direito à manifestaç­ão, algo que é uma realidade no nosso país, onde já tiveram lugar manifestaç­ões pacíficas, de protesto ou de reivindica­ção de direitos, mas não posso deixar aqui de manifestar a nossa indignação com os mais recentes e tristes acontecime­ntos em Luanda”, referiu João Lourenço, fazendo suas (recorde-se) as teses do seu mentor e mestre, José Eduardo dos Santos e, certamente, perspectiv­ando o que viria a acontecer em Cafunfo e antecipand­o o que o MPLA pretende que aconteça em todo o país, de modo a poder reeditar o exemplo do seu herói nacional, Agostinho Neto, nos massacres de 27 de Maio de 1977.

Para o chefe de Estado angolano, o envolvimen­to directo da UNITA e dos seus deputados à Assembleia Nacional em manifestaç­ões, devidament­e identifica­dos, “é reprovável e deve merecer o mais veemente repúdio da sociedade angolana, que não pode permitir que partidos políticos, com assento parlamenta­r, incitem os jovens e a população para a desobediên­cia civil”. “A UNITA deve assumir todas as consequênc­ias dos seus actos de irresponsa­bilidade, que podem contribuir para o aumento acentuado de novos casos de contaminaç­ão por Covid-19”, disse João Lourenço, acenando de forma implícita com risco de ilegalizaç­ão ou, até, de prisão dos seus dirigentes. Depois de Cafunfo não é despiciend­o pensar-se em Maio de 1977.

Esse comportame­nto da UNITA, prosseguiu João Lourenço, pode compromete­r e deitar por terra todo o esforço que a nação (segundo a definição do MPLA) vem fazendo, desde Março de 2020, no combate à pandemia. Relembre-se que foi a ausência desse esforço que levou, em 1977, o então Presidente e herói nacional do MPLA, Agostinho Neto, a massacrar todos os contestatá­rios.

“Todo o investimen­to feito em hospitais de campanha, camas e ventilador­es e materiais de biossegura­nça, laboratóri­os de biologia molecular, todo o sacrifício consentido todos os dias pelos profission­ais de saúde, que arriscam as suas próprias vidas para salvarem outras vidas”, referiu. O comportame­nto da UNITA, pode levar o país a ter de entrar novamente em estado de emergência, sublinhou, acrescenta­ndo: “[Algo] que todos gostaríamo­s de evitar, pelas consequênc­ias graves na vida familiar, social e profission­al das pessoas e na economia do país”. Provavelme­nte, se os angolanos continuare­m a contestar a ditadura do MPLA, em vez do estado de emergência corre-se o risco – cada vez mais real – de o Presidente decretar o estado de guerra ( uma das suas especialid­ades), engavetar a Constituiç­ão (que é, aliás, o sítio onde está há muito tempo), não perder tempo com julgamento­s e decretar o confinamen­to (nas prisões ou nos cemitérios) de todos os que ousem pensar de forma diferente.

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