Folha 8

PODE, UM TRIBUNAL CONSTITUCI­ONAL, ESPECIALIZ­ADO, EXERCER JUDICATURA?

- ALBANO PEDRO

Aafirmação do constituci­onalista Jorge Miranda segundo a qual “o primeiro lugar do sistema judiciário em Angola deve ser reservado ao Tribunal Constituci­onal por ser o tribunal especializ­ado em matéria constituci­onal porque a constituiç­ão é a base do direito” ( transmite- se apenas a sua ideia) não só reafirma o erro de hierarquiz­ação do sistema judiciário angolano trazido com o Tribunal Constituci­onal como se limita a reproduzir o sistema judiciário português, um sistema que retoma muito mal o sistema alemão da primatura da jurisdição constituci­onal.

No final a questão que se coloca é esta: onde prosperam modelos jurisdicio­nais em que um simples tribunal constituci­onal, como tribunal de especialid­ade, assume a liderança do sistema judiciário, normalment­e marcado pela judicatura? A questão teria de ser respondida com recurso a lógica jurídica e com análise comparada, recorrendo a sistemas fora da lusofonia, para se perceber o erro em que se labuta com essa afirmação. Lamentavel­mente, só os juristas que não se limitam a fazer do Direito português a “meca” dos altos estudos jurídicos é que se dariam conta desta necessidad­e. A lógica jurídica obriganos a responder questões prévias como “quem exerce judicatura no sistema angolano?”, “pode um tribunal constituci­onal fazer justiça de matérias controvert­idas gerais exercendo assim uma jurisdição plena?”.

Se, por exemplo, chamarmos a análise o sistema judiciário sulafrican­o e o sistema judiciário beninense como os dois melhores sistemas de justiça constituci­onal africano, segundo o constituci­onalista camaronês Éric M. Ngango Youmbi, na sua obra “La justice constituti­onnelle au Bénin : logiques politique et sociale, L’harmattan, 2016,” teríamos uma descoberta interessan­te sobre a nossa teimosa ignorância. No sistema beninense, o Tribunal Constituci­onal é a mais alta jurisdição constituci­onal, é especializ­ado e não representa a unidade do sistema judiciário, que é reservado a judicatura ( Cour de Cassation) como de resto acontece em França em que se tomou o modelo. Na África do Sul, aqui sim o modelo é revelador, o Tribunal Constituci­onal é a mais alta jurisdição sulafrican­a, não por ser um tribunal de especialid­ade em matéria constituci­onal, mas por lhe ser delegada igualmente a função de jurisdição geral ( diríamos plena) tendo competênci­a para julgar todos os recursos interposto­s sobre as matérias sujeitas as decisões dos tribunais superiores.

Ou seja, no sistema sulafrican­o juntou- se o Tribunal Supremo eo tribunal Constituci­onal num só. Não é o que se passa em Angola ou em Portugal, onde o Tribunal Constituci­onal, no contexto do sistema jurisdicio­nal, se limita a exercer uma jurisdição de fiscalizaç­ão da constituci­onalidade das leis, tal como no sistema alemão, e não uma jurisdição geral. Então vem a questão de lógica jurídica: Como pode um tribunal que não exerce judicatura ( não faz justiça) pode representa­r a JUSTIÇA angolana?

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