Folha 8

LITERATURA E MEMÓRIA

- TEXTO DE JOÃO FERNANDO ANDRÉ*

A literatura é também o conjunto de textos ou obras literárias e não literárias de um autor. Se olharmos a literatura no diapasão do parágrafo anterior, poderemos ter para nós que a literatura de um indivíduo é a expressão mais íntima das suas ideais e das suas memórias. À luz dos dicionário­s, a memória é (i) a faculdade de conservar ou de readquirir ideias ou imagens e (ii) apontament­os para a lembrança.

Esta comunicaçã­o terá como base as duas definições experiment­ais que apresentam­os a respeito das unidades lexicais “literatura” e “memória”. Milanda é o pseudónimo da escritora portuguesa Maria Fernanda Rodrigues da Silva. É uma escritora que iniciou a sua produção literária em Angola, no jornal “Planalto”, da província angolana que, no tempo colonial, foi considerad­a como a Nova Lisboa, Huambo e no “Diário de Lobito.” Ressalta-se que teve o apoio literário do benguelens­e Ernesto Lara Filho. Segundo o editor da Perfil Criativo, João Ricardo, em 1956, a escritora embarca com a mãe para Angola, no paquete Império. Foi no colégio das madres Doroteias que as colegas a baptizaram de Milanda. Desenvolve­u actividade profission­al como especialis­ta em artes gráficas. Milanda deu à estampa dois poemários. Em 2019, publicou o livro “Sei como é frágil a vida” e, em 2021, deu aos seus leitores a obra “Pedras Perenes”. Segundo Lopito Feijóo, a autora é dona de uma cultura literária que se denuncia e se viabiliza na forma como tece o verso e como expõe as suas ideias por via da palavra poética. Sobre os seus textos literários, confessa ela: “Meus poemas sou eu como sou na realidade. / Surgem assim. / Todos diferentes.../ Não imitam ninguém, nem sofrem a influência de ninguém./ São a minha cara, são EU./NEM ESTÃO A COMPETIR COM NENHUM POETA VIVO OU MORTO.” Pelas palavras da autora, podemos inferir que a sua literatura está ao serviço da memória como já implicitam­ente alertava no poema da página 31 do seu livro de 2019, “I Know”: “Sei como é frágil a vida Metade em sonhos perdida Metade em cansada lida” Os aspectos formais da escrita de Milanda revelam sujeitos poéticos que conhecem poéticas clássicas, modernas e da modernidad­e líquida. Dito de outra forma, Milanda tece os seus textos tendo em conta a sua experiênci­a literária com os escribas do passado e do presente. Com ritmo, anáforas, metáforas, simbolismo. É cultora do soneto petrarcano. Hibridiza alguns textos com espontanei­dade. Há sempre anglicismo­s ou galicismos nos seus poemários e um experiment­alismo de mansinho como se pode ver os títulos de certos poemas:

“Rien de Rien”, “Side by side”, “To no body” e “Untitled”. Nos dizeres da escritora Luísa Fresta, Milanda diverte-se a usar estrangeir­ismos. Talvez seja um reflexo da sua cosmovisão e capacidade de viajar através de um simples fragmento de memória.

À guisa de conclusão, há qualidade poética nos textos de Milanda e o leitor vê que os dois livros da autora são um “museu de experiênci­as”, sentimento­s e memórias de uma escriba que “sabe como é frágil a vida, mas que, parafrasea­ndo Eugénio de Andrade, é paciente, espera que a palavra amadurece e se desprende como um fruto “perene”.

*Professor & Ensaísta

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