A lição (mais uma) de Cabo Verde
OPresidente de Cabo Verde, Jorge Carlos Fonseca, afirmou, nas Nações Unidas, que a “primeira prioridade” do arquipélago é “combater” a pandemia de Covid- 19 e pediu mais atenção aos problemas dos pequenos Estados insulares.
“Na presente conjuntura, a primeira prioridade de Cabo Verde é combater a pandemia de Covid- 19. Ganhos importantes e consistentes têm sido registados, tanto na redução das taxas de transmissão, quanto na taxa de vacinação da população elegível, que já atingiu os 74%, com pelo menos uma dose, sendo nossa meta atingir 85%, da população elegível, totalmente imunizada, até o final de Outubro”, afirmou, ao discursar na 76. ª sessão da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas ( ONU), em Nova Iorque.
“Este sucesso não seria possível sem a perseverança e determinação que caracterizam os dirigentes e o povo cabo- verdianos, bem assim, sem o reforço da solidariedade mundial de todos os parceiros, designadamente do Covax. O nosso mais vivo agradecimento a todos”, disse ainda Jorge Carlos Fonseca.
O mecanismo Covax é uma iniciativa fundada pela Organização Mundial da Saúde ( OMS, agência das Nações Unidas), que visa garantir uma vacinação equitativa global contra o novo coronavírus. Paralelamente , reconheceu, a recuperação económica continua a ser uma prioridade para Cabo Verde, “principalmente através da retoma do sector do turismo e das economias conexas”. “O reconhecimento recíproco dos certificados de vacinação e a revisão dos avisos de viagens, são medidas em relação às quais Cabo Verde tem vindo a trabalhar com os parceiros públicos e privados, e orientações internacionais, nesse sentido, só poderão apoiar e encorajar o retorno do turismo”, apelou Jorge Carlos Fonseca. Segundo o Presidente, Cabo Verde “tem estruturalmente todas as características” de um Pequeno Estado Insular em Desenvolvimento ( SIDS, na sigla em inglês), nomeadamente “a pequenez física e a dispersão em ilhas, a imersão em grandes espaços oceânicos e o afastamento dos principais mercados”, que “fragilizam a sua base económica, acentuam a sua exposição às mudanças climáticas e a outros fenómenos ambientais, como a seca”, reduzindo a “resiliência face aos fenómenos naturais e a outros choques externos”.
“Nesse âmbito, as manifestações e impacto da Covid- 19 somente exacerbaram as condições preexistentes, fazendo dos SIDS os mais afectados pela pandemia”, enfatizou.
“Os SIDS, seus problemas, desafios e soluções, deverão estar presentes na Cimeira do Futuro anunciada pelo Secretário- Geral [ da ONU, António Guterres], como parte dos problemas, mas também como parte das soluções. E a oportunidade se nos oferece para a tomada de decisões que venham ao encontro das especificidades e dos legítimos interesses e aspirações deste grupo de países, de entre os mais vulneráveis da família das Nações Unidas, não deixando nenhum para trás”, apelou.
Ainda sobre o impacto da pandemia, Jorge Carlos Fonseca recordou que “desconstruiu de forma brutal” a economia de Cabo Verde, devido à ausência total de turismo, após um crescimento económico anual a rondar os 6%, nos últimos anos. “Causando desprotecção social, desemprego e aumento da pobreza. Desregulando os fundamentos da macroeconomia, como a inflação, o défice orçamental, a dívida e a queda vertiginosa do crescimento económico, em suma, gerando uma recessão nunca antes experimentada, traduzindo- se numa redução de 14,8%”, sublinhou.
Disse, no entanto, que Cabo Verde “não reagiu com resignação, mas com determinação, tomando de imediato, e a curto prazo, todas as medidas anticrise recomendadas internacionalmente”.
“Para o médio e longos prazos, fizemos um exercício participativo de planificação estratégica, para definir uma visão comum para o horizonte 2030, intitulado Cabo Verde Ambição 2030, para retomarmos o processo do desenvolvimento sustentável e reconstruirmos melhor, a partir dos ensinamentos e oportunidades surgidas da crise, incluindo, no plano do acesso ao financiamento concessional e da atracção do investimento directo externo, que continuam a ser os maiores obstáculos nessa direcção”, acrescentou Jorge Carlos Fonseca, que manteve em Nova Iorque, nos últimos dias, vários encontros paralelos à reunião da Assembleia Geral da ONU. Recordou que as relações internacionais, a diplomacia em geral, as grandes conferências mundiais e das Nações Unidas, “acostumaramnos às tradicionais reuniões marcadas pela singularidade da presença física e efusão entre os participantes”.
“As reuniões presenciais, os apertos de mão, os abraços, os diálogos nos corredores, as negociações em bilateral ou em pequenos comités, foram sempre a alma desses encontros da comunidade internacional, que a obrigatoriedade do recurso às comunicações on- line e digital deixou para trás, há quase dois anos.
O facto de nos reunirmos, presencialmente, por
ocasião do debate geral desta 76. ª sessão da Assembleia Geral, deve ser interpretado como um sinal da nossa determinação colectiva de tudo fazer para vencer o flagelo da pandemia do Covid- 19, na senda de reconstruirmos melhor e termos um mundo mais resiliente”, disse ainda. Naquela que foi a sua última mensagem anual à Assembleia Geral da organização, face à realização de eleições presidenciais em Cabo Verde no mês de Outubro — às quais já não concorre -, Jorge Carlos Fonseca voltou a insistir numa reforma do Conselho de Segurança da ONU. “Entendemos, também, que a revitalização da ONU passa pela necessidade de uma reforma do Conselho de Segurança, que possa conferir uma maior abrangência dos Estadosmembros na tomada de decisões atinentes à paz e segurança internacionais. Enquanto, membro da União Africana, Cabo Verde subscreve integralmente o consenso de Ezulwini”, disse.