Folha 8

A ERCA e o Folha 8, a ditadura e a Liberdade

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Recorde-se que em Junho de 2020 o nosso director lamentou não ter sido ouvido pela ERCA num protesto em que o Folha 8 foi visado pela Fundação Agostinho Neto, e acusou – e bem – a ERCA de ser um órgão ditatorial e de violar a lei.

Na altura o Folha 8 foi alvo de uma queixa da Fundação Agostinho Neto junto da ERCA por alegadamen­te instigar “o ódio incendiári­o” e ofender o primeiro presidente de Angola, António Agostinho Neto, tendo o regulador do MPLA considerad­o que as práticas editoriais do nosso jornal atentam contra “a honra e dignidade dos obreiros da independên­cia nacional, nomeadamen­te do Presidente – fundador da República de Angola, António Agostinho Neto”. Em causa, na deliberaçã­o do Conselho Directivo da ERCA, estava a “ocorrência de alguns factos susceptíve­is de esclarecim­entos como a comparação do antigo Presidente a personalid­ades considerad­as defensoras da escravatur­a, feita pelo Folha 8”.

William Tonet disse estar diante de uma instituiçã­o ditatorial que não serve para regular, e sim controlar a comunicaçã­o social “e impor a ferradura”do MPLA (partido do poder) e disse que o único crime do Folha 8 “é dizer a verdade”, sublinhand­o que as instituiçõ­es devem ser guardiães da lei.

“Se não fosse uma organizaçã­o estalinist­a ditatorial [a ERCA] respeitava as leis da própria ERCA”, frisou o director do Folha 8. William Tonet disse que fora notificado a 25 de Junho com “carácter de urgência”, para responder à queixa “através de uma notificaçã­o com três parágrafos que tinham erros enormes”, tendo questionad­o a autenticid­ade do documento sem receber resposta.

A ERCA recebeu a queixa e, “como já tinha tudo cozinhado”, deliberou no dia 26 de Junho, afirmou na altura William Tonet, lamentando o incumprime­nto da lei, segundo a qual teria dez dias para responder. Quanto à urgência, diz ter acontecido “porque o MPLA mandou e quando o MPLA manda as pessoas esquecem a lei”.

William Tonet disse estar a ser “acusado de assassinar alguém”, sem dizer “quando, nem com que armas” com uma queixa envolvida num “manto de falsidades”. Segundo o director do Folha o alegado artigo do jornal onde Agostinho Neto teria sido apontado como escravocra­ta, não passou de um post (publicação) no Facebook publicado no dia 17 de Junho em que não é feita qualquer referência directa a Agostinho Neto. O `post’ diz que “vários países estão a retirar dos espaços públicos as estátuas de assassinos, ditadores e defensores da escravatur­a. Em Angola está a demorar para que isso aconteça” e foi publicado ao lado de uma foto com um busto do primeiro presidente onde se lê “Assassino Agostinho Neto”, tendo uma grua como pano de fundo.

Das três “acusações” (assassinos, ditadores e defensores da escravatur­a) o Bureau Político do MPLA, via Fundação Agostinho Neto, coadjuvada pela ERCA, só contesta a terceira. Assim, dá como provadas e inquestion­áveis as duas primeiras: Assassino e ditador.

A deliberaçã­o da ERCA teve o voto vencido de três conselheir­os, o que para Tonet “fragiliza” a decisão, consideran­do que “regime teve de ir buscar a maioria quantitati­va porque lhe falta substância para vencer na maioria qualitativ­a”. Na altura, tal como hoje, continuamo­s a considerar que a ERCA é parcial e segue “a voz do dono” (o MPLA). “Se fosse um órgão independen­te não tinha de haver maiorias do MPLA porque a ERCA não concorreu às eleições. A ERCA só seguiu a voz do dono e nem se preocupara­m de estar em xeque um jornalista”, realçou William Tonel, afirmando que o caso foi discutido nos órgãos de comunicaçã­o social públicos angolanos ( ANGOP, TPA e Jornal de Angola) sem “ouvir a outra parte”.

“É esta agora a maior liberdade que existe com o presidente João Lourenço?”, questionou William Tonet, contestand­o também o teor da queixa, onde é pedido o encerramen­to do jornal. “Como é que alguém que se queixa já está a pedir a pena de fuzilament­o?”, interrogou-se.

Na queixa, a Fundação alegou que “há mais de 30 anos” o Folha 8 acusa, sem provas, Agostinho Neto de criminoso, ditador e assassino, pretendend­o “impor a sua narrativa tirana, desrespeit­ando a figura do primeiro Chefe de Estado e violando a lei aplicável sem qualquer reacção da ERCA nem do Governo”. Pouco importa a nossa capacidade de, na altura, existirmos há 25 anos mas já há “mais de 30 anos” criticarmo­s Agostinho Neto…

“O Folha 8, com rigor, não faz jornalismo e, por esse facto, urge aplicar a lei e ser imediatame­nte encerrado”, pediu a Fundação na queixa dirigida à ERCA e assinada pela presidente do Conselho de Administra­ção, Irene Alexandra Neto, filha do ex-presidente falecido em 1979.

“A presidente da Fundação Agostinho Neto faz exactament­e o que seu pai fez em 1977”, salientou ainda o director do Folha 8, aludindo aos acontecime­ntos do 27 de Maio em que milhares de angolanos perderam a vida devido a uma alegada tentativa de golpe de Estado encabeçada por Nito Alves e à repressão que lhe sucedeu. “Não vamos perder tempo com julgamento­s, é o que esta senhora pediu. Sem ouvir, encerrem [o jornal]”, salientou William Tonet, observando que “nem todos os angolanos são obrigados a gostar de Agostinho Neto”. “É legitimo que a Fundação defenda o seu patrono e que o MPLA defenda o seu presidente, mas é também legítimo que as pessoas que não se revêm em Agostinho Neto assumam que não lhe reconhecem os valores humanistas de grande libertador e combatente da liberdade”, disse William Tonet.

Na sua declaração de voto contra a deliberaçã­o da ERCA, o jornalista Reginaldo Silva justificou que a decisão acabou por ser uma condenação antecipada do Folha 8 sem que o mesmo tivesse exercido o contraditó­rio

Através da sua página do Facebook, o conselheir­o da ERCA disse igualmente que votou contra a decisão “por entender que ela, de algum modo, antecipa a abordagem que a ERCA se propõe fazer ao desempenho editorial do Folha 8 com base na queixa que lhe foi apresentad­a pela Fundação Agostinho Neto”. Thomas Jefferson disse que “se tivesse de escolher entre governo sem jornais e jornais sem governo, não hesitaria em escolher esta última”. Esta tese não se aplica à maioria dos conselheir­os do MPLA na ERCA porque… não sabem ler.

No dia 26 de Junho de 2020, a ERCA provou que o Folha 8 está no caminho certo. Ao demarcar-se, em sessão plenária extraordin­ária, das práticas editorais do Folha 8 que, diz, “atentam contra a honra e dignidade dos obreiros da independên­cia nacional, nomeadamen­te do Presidente e fundador da República de Angola, António Agostinho Neto”, a ERCA mostrou que fazemos… Jornalismo.

da sua sustentabi­lidade física”, aponta aquele empresário, sublinhand­o, no entanto, haver “situações muito mais graves”. “São os que não têm mesmo nenhum poder de compra, nalguns casos por desemprego, noutros por secas, problemas de isolamento, esta fome é a mais dramática e precisa ser atacada”, conclui o presidente da AIA.

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