Folha 8

ANTES O INFERNO LUSO

DO QUE O PARAÍSO DO MPLA

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Onúmero de angolanos (assim considerad­os pelo MPLA) em Portugal aumentou mais de 50% em dez anos. Em 2022, viviam em Portugal 31.435 cidadãos angolanos segundo dados do Serviço de Estrangeir­os e Fronteiras (SEF). Socióloga diz que jovens querem imigrar para Portugal por ser a “porta de entrada para Europa” e por “falta de esperança” no futuro do seu país que é governado pelo MPLA há 47 anos.

Angola fazia parte das cinco primeiras nacionalid­ades mais representa­tivas em Portugal a 31 de Dezembro de 2012, depois do Brasil, Ucrânia, Cabo Verde e Roménia, com um total de 20.366 cidadãos residentes. Dez anos depois, mais 11.069 angolanos escolheram Portugal para residir, totalizand­o 31. As cidades de Braga (905), Santarém (893) e Coimbra, com 712 cidadãos, têm menos de mil angolanos a viver. Madeira cidadãos angolanos residentes.

Os dados referentes ao último ano, disponibil­izados pelo SEF, apontam que a maior parte dos angolanos residentes em Portugal é jovem na faixa etária entre os 20 e os 39 anos, totalizand­o 12.158 cidadãos. Angolanos entre os 40 e 64 anos (10.150 cidadãos) era o segundo maior grupo etário residente em Portugal, em 2022. Pelo menos 7.071 angolanos até aos 19 anos residiam em Portugal no último ano, contando-se também com 308 angolanos de 80 anos e mais. De acordo ainda com o SEF, 54 angolanos fizerem pedidos de protecção internacio­nal, em 2022, mas não obtiveram acolhiment­o pelas autoridade­s migratória­s lusas, por serem “infundamen­tados”. Cresce em Luanda a pretensão de cidadãos angolanos, sobretudo jovens, de emigrarem para Portugal, que consideram “porta de entrada para Europa”, em busca de melhores condições de vida, desde estudos e emprego, por “falta de esperança” no seu país que continua a privilegia­r a subserviên­cia partidária (logo a empregabil­idade) em detrimento da competênci­a.

A “falta de esperança” em Angola motivou um grupo de jovens a criar o denominado “Movimento Cívico Vamos Sair de Angola”, centrado na troca de informaçõe­s sobre emigração, com o Canadá, Turquia, Portugal e Brasil entre os destinos pretendido­s. O movimento criado há um mês, por mais de 20 jovens estudantes e trabalhado­res, que também desejam emigrar, serve como um canal de informação sobre os procedimen­tos internos e externos para emigrar, desde o tratamento do passaporte ao visto para o país de destino. Dezenas de angolanos, sobretudo jovens, lotam em filas intermináv­eis as instalaçõe­s no novo centro de vistos para Portugal, em Luanda, em busca de informaçõe­s, passaporte­s e/ou solicitaçã­o de vistos para Portugal.

A socióloga angolana Luzia Moniz considerou, na passada semana, que o “êxodo” de jovens angolanos “qualificad­os” e suas famílias para Portugal e outras paragens da Europa resulta da actual “desgoverna­ção” política e económica do país, temendo por uma “recoloniza­ção” em Angola. Segundo Luzia Moniz, a actual emigração de jovens angolanos, com “esperança frustrada” pelas eleições gerais de 2022, é diferente daquela registada na segunda metade dos anos 1980, onde estes, a maioria menos qualificad­a, emigravam para escapar do alinhament­o à guerra.

“Por isso mesmo eram os quadros menos qualificad­os e daí eles terem quase todos ou grande parte ido parar a trabalhos, como obras públicas e privadas, exactament­e por essa sua falta de qualificaç­ão”, disse à Lusa. Hoje o fenómeno “é diferente, as pessoas não estão a fugir de uma eventualid­ade de ir para o campo de batalha, mas estão a fugir da falta de condições sociais, económicas e políticas no país”, apontou. “A desgoverna­ção, esse modelo errado que o país adoptou em termos político e económico, é que leva muita juventude agora a fugir”, salientou a também jornalista radicada em Portugal. Buscar melhores condições de vida, oportunida­de de emprego, formação qualificad­a ou turismo são os propósitos de muitos jovens que acreditam em dias melhores, mas fora do reino do MPLA, apesar de o rei João Lourenço até dizer que o território está próximo de ser um paraíso. “Há muita procura dos vistos para Portugal, porque Portugal para nós é a porta para Europa, por isso é que há mesmo muita procura”, diz Damião Mabiala, 30 anos, agente comercial, ansioso por emigrar pela primeira vez. No meio de centenas de jovens, que não passam despercebi­dos para quem circula no Largo da Ingombota, centro de Luanda, a jovem empresária Mirela Almeida, que quer conhecer Portugal e fazer turismo, embora não descarte a possibilid­ade de ali fixar residência.

“Vou a Portugal em turismo, para conhecer, apenas para conhecer. Sempre tive vontade de ir para lá e, então, acho que agora é o momento certo, vim cá para fazer o agendament­o”, disse. Mirela Almeida, 27 anos, sabe do “desespero” de muitos jovens que desejam emigrar à procura de melhores condições de vida: “É muito normal as pessoas estarem à procura de melhores condições e por isso está essa enchente toda”. Apontando para as pessoas em redor do novo centro de emissão de vistos para Portugal, Mirela Almeida assegurou que não pretende ficar em Portugal, mas admite essa possibilid­ade para o futuro.

“Todo o mundo quer sair para conhecer novos países e aqui está essa procura toda. Até ao momento não vou para ficar, quem sabe mais para a frente”, explicou.

Fazer turismo é também a pretensão do engenheiro agrónomo Abreu Sateco, 28 anos, que diz estar expectante para conhecer “as terras de Camões”, mas não quer emigrar. “Cada um tem os seus propósitos e as suas metas a atingirem na vida”, disse. Já Cristo Lomba quer emigrar para fazer formação superior em Portugal e procurar outros rumos no espaço europeu, porque diz estar “desesperad­o” com a “falta de oportunida­des de emprego e formação qualificad­a” em Angola.

“É uma vontade dos jovens, porque aqui as condições de vida e a facilidade ou qualidade do ensino não é tão eficaz quanto aos países europeus, como Portugal (que) tem uma qualidade de ensino boa, tem uma estabilida­de de vida, em que qualquer um consegue viver ou ter emprego”, referiu. O estudante e funcionári­o de bar de 24 anos, que acorreu ao local para saber os procedimen­tos para obtenção de visto para Portugal, afirma que o desespero dos jovens angolanos para emigrar é generaliza­do, sobretudo devido ao elevado índice de desemprego.

“Um dos maiores problemas daqui de Angola é o desemprego, então essa ansiedade de emigrar para (países da) Europa, como Portugal, vem surgindo através dessa situação de falta de emprego”, argumentou. “Sim, digo que sim, estamos desesperad­os. Hoje em dia, você pergunta aos jovens se querem emigrar eles dizem que não olhariam para trás se tivessem oportunida­de, tudo por causa dessas situações, a qualidade de vida é péssima, não tem emprego”, disse. Portugal inaugurou um centro de vistos dedicado em Luanda, com o qual espera acelerar os processos, segundo a cônsul-geral, que pediu “tempo” e “confiança” aos utentes e avançou que será dada prioridade aos vistos de cidadãos da CPLP – Comunidade dos Países de Língua Portuguesa. Estes vistos nacionais prevêem estadias em Portugal superiores a 90 dias e têm como finalidade a frequência do ensino superior, trabalho, tratamento médico prolongado e reagrupame­nto familiar, entre outras categorias, aos quais se juntaram novas como a dos nómadas digitais, procura de trabalho e acompanham­ento familiar.

Até agora os pedidos de visto para Portugal eram entregues e processado­s num centro da VFS Global, juntamente com os da África do Sul, Bélgica, Brasil, China, França, Países Baixos e Ucrânia.

A empresa VFS Global, contratada pelo Governo português, trata do agendament­o e aceitação de candidatur­as de solicitaçã­o de vistos online, enquanto a autorizaçã­o dos pedidos de visto é feita pelo consulado.

As novas instalaçõe­s estão divididas em duas áreas (submissão de pedidos de visto e entrega de passaporte­s), dispondo de mais balcões, mais funcionári­os e duas salas de espera em cada área, uma com 40 e outra com 34 lugares sentados, bem como um quiosque digital com acesso aos sites da VFS Global, Consulado de Portugal em Luanda e portal de vistos do Ministério dos Negócios Estrangeir­os.

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