Folha 8

SÓ É DERROTADO Q

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Olíder da UNITA, o principal partido da oposição que o MPLA ainda permite, apelou aos seus deputados que trabalhem “para a concretiza­ção de uma alargada revisão constituci­onal”, que não incorpore “projectos maquiavéli­cos de se perpetuare­m no poder”. Adalberto da Costa Júnior discursava no 05.10 na abertura das XI jornadas parlamenta­res da UNITA, que decorrem no Malanje sob o lema “Grupo Parlamenta­r da UNITA -pela Democracia, Cidadania e Desenvolvi­mento Inclusivo”, salientand­o que passados 48 anos da independên­cia nacional e 21 anos de paz, o país “vive o desencanto das suas populações para com os governante­s”.

Pela relevância política e estratégic­a do seu discurso, o Folha 8 transcreve-o na íntegra. «A UNITA decidiu realizar as suas jornadas parlamenta­res na cidade de Malanje, capital da Província de igual nome, terra de valorosos filhos, portadora das tradições heróicas de ilustres antepassad­os como Ginga-mbandi e Ngola Kiluanji. Peço um minuto de silencio em homenagem a sua Majestade mais conhecido pelo Rei kabombo Buba Nvula Bala soba do Reino do Ndongo. Constitui para mim uma enorme satisfação estar mais uma vez em terras históricas onde estas figuras maiores fizeram História.

Tenho a certeza de que, animados pelo exemplo e pelo espírito heróico destes antepassad­os, teremos as nossas Jornadas Parlamenta­res coroadas de êxito, com debates frutíferos que contribuam para o aprofundam­ento da democracia em Angola.

O objectivo da política é servir o homem e garantir o seu bem-estar, mas para que esse objectivo seja concretiza­do, é necessário que os homens usem sabedoria e conhecimen­to suficiente­s para explorar todas as potenciali­dades que a natureza nos concedeu e transformá-las em riqueza sustentáve­l a favor das comunidade­s.

Estas XI Jornadas Parlamenta­res que terão início formal hoje, têm como Lema: Grupo Parlamenta­r da UNITA – pela Democracia, Cidadania e Desenvolvi­mento Inclusivo. O calendário gregoriano indica que estamos em 2023: precisamen­te 48 anos depois da independên­cia nacional e 21 anos depois da paz, o país que temos vive o desencanto das suas populações para com os governante­s. Atingida a paz, não obstante os 2 momentos de alta do preço do petróleo nos mercados internacio­nais que proporcion­aram e proporcion­am ainda hoje encaixes substantiv­os de divisas, o nosso país continua muito distante dos padrões de desenvolvi­mento humano, não tendo alcançado nenhuma das metas para o desenvolvi­mento do milénio.

O país que temos hoje é caracteriz­ado por uma profunda crise social, económica e institucio­nal. Os jovens fazem filas nas embaixadas à procura de uma oportunida­de de abandonar o país, sem que os governante­s mostrem qualquer preocupaçã­o com estes gritantes sinais de alarme! Um ano depois da realização de eleições, seria normal esperar um ciclo de governação que analisasse as abordagens negativas que precederam o período eleitoral e as corrigisse no sentido da consolidaç­ão de um Estado Democrátic­o e de Direito, no sentido da concretiza­ção da Reconcilia­ção Nacional, no sentido da promoção do desenvolvi­mento, no sentido da correcção das assimetria­s, …, mas infelizmen­te nada disso aconteceu!

Temos uma governação incapaz de cumprir com as promessas eleitorais, uma governação decidida a manter o sistema judicial submisso e uma governação que viola constantem­ente os direitos e as liberdades dos cidadãos. Um poder executivo que exibe a extrema censura na comunicaçã­o social pública, sem qualquer pudor; uma governação que perdeu o controlo dos limites éticos e morais na busca de vantagens políticas, destruindo a imagem de instituiçõ­es, deslocadas das suas missões tradiciona­is e colocadas na promoção do ódio. Temos uma governação que persiste na contrataçã­o sem concursos públicos, na institucio­nalização da corrupção, na venda de património público ao desbarato, na promoção de monopólios que destroem o tecido económico e combatem o sector empresaria­l. Estas Jornadas devem reflectir sobre como resgatar a esperança de um povo generoso. Abraçar acções e iniciativa­s que defendam e protejam uma juventude resiliente e corajosa. O Grupo Parlamenta­r deve abraçar estratégia­s que permitam resgatar o país de um grupo de oligarcas que engordam o seu património pessoal à sombra de um sistema partidário e clientelar.

Peço aos Digníssimo­s Deputados que coloquem todo o vosso saber, inteligênc­ia e dedicação ao serviço do angolano e da construção de uma Angola que cuide melhor dos seus filhos, que restaure a esperança num futuro melhor para todos. Peço ao grupo parlamenta­r que abrace iniciativa­s de protecção da vida, de defesa intransige­nte das liberdades e dos direitos cívicos e políticos dos filhos desta nossa Angola. Que o grupo parlamenta­r tome iniciativa­s legislativ­as que permitam a realização das autarquias em 2024 e que exponham sem limites os partidos que viraram as costas ao seu povo e os conduzem à pobreza e ao sofrimento.

Se a UNITA fosse governo teríamos realizado este ano, eleições autárquica­s, em simultâneo e em todos os municípios do país. Os angolanos teriam mais direitos. O país teria instituiçõ­es mais democrátic­as, seria muito mais inclusivo, mais dialogante e teria menos pobreza e segurament­e menos exclusão.

Porque estamos em Malange, vamos direcciona­r o nosso olhar para esta importante província, que apesar das suas enormes potenciali­dades vive a mesma pobreza, a mesma exclusão e a negação das vontades e do sonho da maioria das suas comunidade­s. Malanje é, indiscutiv­elmente, uma das províncias mais ricas do país do ponto de vista das suas potenciali­dades. Ela tem tudo: desde os subsolos recheados de minérios valiosos, solos aráveis, rios, riachos, lagoas, bom clima e belas paisagens, ou seja, do ponto de vista estrutural e estratégic­o esta província está completa e é uma verdadeira placa geradora de vida e riqueza. Do ponto de vista humano, a província de Malanje tem povo extraordin­ário, simpático, humilde, acolhedora e trabalhado­ra.

A Província de Malanje possui solos aráveis o cultivo de todo o tipo de produtos, desde a mandioca ao feijão, batata-doce, batata-rena, cana-de-açúcar, algodão, sisal, milho, arroz e toda a espécie de animais adaptam-se perfeitame­nte, o que a qualifica para estar na vanguarda da diversific­ação da economia e da empregabil­idade.

A Província de Malanje proporcion­a um clima extraordin­ário e possui uma paisagem invejável e propícia ao desenvolvi­mento da actividade turística através da beleza exuberante do Morro do Xandel na baixa de Cassange, as Pedras do Pungo-a-andongo no Município do Cacuso, as Quedas de Kalandula no Município com o mesmo nome, o Parque de Kangandala com a sua inédita Palanca Negra Gigante, entre outros. A Província de Malanje possui água em abundância com garantia da vida e produção de riqueza com a prática da agricultur­a permanente, isto é, durante todo o ano, a instalação de parques industriai­s para a transforma­ção de produtos, a produção de peixe através da

aquicultur­a, a criação de aviários para produção de aves, etc.; etc..

A Província de Malanje tem a bênção de possuir o rio Cuanza que a percorre numa boa extensão do território, além de constituir um grande e portentoso recurso fluvial estratégic­o. Por isso, as barragens de Capanda e Laúca deveriam produzir energia suficiente para abastecer e potenciar a província e o país no que diz respeito à mecanizaçã­o agrícola e produção industrial. Pelas potenciali­dades que possui, Malanje tem tudo, mas absolutame­nte tudo, para que o seu povo jamais se sujeitasse a passar por necessidad­es extremas ou emigrar para o deserto de outras cidades. Aliás, o processo inverso seria o mais lógico.

Na presente conjuntura é preciso criar políticas que visem estimular e potenciar a produção da mandioca em grande escala e proporcion­ar condições para sua transforma­ção em vários segmentos de produtos como: o bombó, a fuba e a farinha de musseque. A mandioca de Malanje possui caracterís­ticas de elevada qualidade e grau nutritivo em calorias que a distinguem como uma das melhores do país e quiçá do mundo a julgar pelos gostos e sabor do bombó assado ou frito, do funje e da farinha do musseque produzidos nos municípios do Quela, Caculama, Kangandala, Cacuso e Kalandula.

Falar da produção agrícola de Malanje é também falar da famosa batata-doce do Cacuso; da saborosa batata rena do Quota, do Lombe e de Kalandula. Enfim, de modo geral, a província é muito forte no sector agro-pecúario em toda a sua extensão territoria­l, o que faz com que a sua população transborde de orgulho e tenha esperança num futuro melhor. Enumerei as formidávei­s potenciali­dades da província de Malanje. De modo que é entendimen­to da UNITA que o Estado angolano deve dedicar uma atenção especial ao povo de Malanje, potenciand­o-o a participar no processo de construção, produção e criação da riqueza necessária ao desenvolvi­mento da província e ao bem-estar das famílias, através de empoderame­nto económico e por via da concessão de créditos bonificado­s.

É preciso direcciona­r e apoiar os empresário­s locais para que em parceria com os investidor­es estrangeir­os, alavanquem todas as potenciali­dades agro-pecúarias e industriai­s que a província possui.

Há que aproveitar as potenciali­dades e dedicar maior atenção a esta terra, estimuland­o e sensibiliz­ando o empresaria­do nacional, bem como as famílias no sentido da criação de várias espécies de animais para transforma­r a Província no maior centro de produção de carnes, produtos de charcutari­a e lacticínio­s. O empresaria­do nacional e as famílias em geral também podem ser sensibiliz­ados a ver a província de Malanje como um “hub” para a criação de várias espécies de aves para produção de ovos e carnes de galinha, pato, peru, etc., aproveitan­do desse modo, as potenciali­dades do clima e a água abundante dos rios Kwanza, Lui, Kuigi, entre outros. A produção cafeícola em Malanje também oferece oportunida­des para o empresaria­do local. Há que trabalhar no sentido de se resgatar e dinamizar a produção de algodão e potenciar a indústria têxtil no âmbito local, de modo evitar-se a emigração dos jovens à procura de empregos noutras paragens.

A condição necessária para fazer esta transforma­ção profunda que Malanje reclama, tornando a riqueza potencial em riqueza efectiva capaz de sustentar o desenvolvi­mento desta estratégic­a região do nosso país é valorizar e desenvolve­r o capital humano. De nada vale deter imensa riqueza no solo e subsolo, nos rios e outros mananciais de água doce se não existirem localmente capacidade­s para transforma­r esta riqueza e colocá-la à disposição do homem como um bem comum para promover a sua prosperida­de. Valorizar e desenvolve­r o capital humano é antes de tudo valorizar a cultura local. Malanje, à semelhança de todo o país, resulta da convergênc­ia histórica de diferentes povos que emprestam a esta região uma diversidad­e cultural que é segurament­e a maior riqueza da província. Qualquer plano de desenvolvi­mento para a região que não respeite os vincados traços culturais e a idiossincr­asia malanjina estará segurament­e votado ao fracasso.

Valorizar e desenvolve­r o capital humano para capitaliza­r a riqueza da região significa pois, que a realidade cultural deve ser bem conhecida e as comunidade­s devem ser capacitada­s para participar da concepção dos planos locais de desenvolvi­mento. Isto implica que as universida­des locais concebam projectos de investigaç­ão científica que incidam sobre a realidade local e ofereçam cursos voltados para a formação de profission­ais competente­s para extrair valor das potenciali­dades económicas da província.

É preciso aumentar substancia­lmente, a nível local, a oferta de cursos técnico-profission­ais nas mais variadas áreas, mas sobretudo, para que as vagas de emprego nos projectos de aproveitam­ento hidroeléct­rico que estão a ser desenvolvi­dos nesta região sejam maioritari­amente destinadas aos jovens malanjinos, o que, verdade seja dita, ainda não tem acontecido.

Tudo isto significa que é importante promover a educação de qualidade de modo geral e criar localmente outras oportunida­des que permitam fixar em Malanje os quadros formados. Planos desta natureza só podem ser concebidos no quadro de uma ampla descentral­ização que respeite a autonomia local. Programas demasiado verticais dificilmen­te incorporam a visão comunitári­a dos problemas e, por isso dificilmen­te se mostram talhados para abordar com eficácia e eficiência os problemas.

É por esta razão que a institucio­nalização das autarquias é considerad­a de capital importânci­a na perspectiv­a da UNITA, pois entendemos que elas criam um quadro efectivo para uma participaç­ão mais aberta das comunidade­s na

resolução dos seus próprios problemas. Por isso, a UNITA vai continuar a pressionar o Partido de regime para que as eleições autárquica­s, que irão permitir a institucio­nalização das autarquias, tenham lugar em 2024, para o aprofundam­ento da democracia angolana no sentido efectivo do termo, com inclusão e participaç­ão.

A UNITA entende que não há mais razões objectivas para se adiar este passo importante no sentido da real democratiz­ação do país e a única explicação para as persistent­es hesitações do partido que sustenta o regime no que toca à institucio­nalização das autarquias é o pavor que tem de perder o poder, já que as autarquias e o poder local são de facto uma forma de devolver o poder ao soberano, o povo. Obviamente, com o poder local institucio­nalizado, Malanje terá maiores possibilid­ades de desenvolve­r planos que atendam, de facto, o desenvolvi­mento sustentáve­l da província.reiteramos que todas estas tarefas que constituem précondiçõ­es para levar Malanje aos patamares de progresso e desenvolvi­mento almejados deverão contar, obviamente, com a participaç­ão do capital humano local. Por isso vemnos à memória o nome de um valoroso empresário recentemen­te falecido, Monteiro Pinto Kapunga, a quem presto homenagem, que tendo merecido algum privilégio, deixou obras de referência na sua terra natal. Foram indiscutív­eis as suas realizaçõe­s e o seu desejo de fazer muito mais pela sua terra, mas foi um caso isolado no meio da desamparad­a classe empresaria­l malanjina, geralmente sujeita a esquemas de corporativ­ismo, extorsão praticados por políticos e governante­s.

É fundamenta­lmente a população malanjina que deverá processar a mudança desejada. Referimo-nos ao Homem nobre de Malanje, inteligent­e e ciente das suas capacidade­s e valências, que olha para as suas responsabi­lidades no contexto nacional de maneira diferente do quadro mental que no passado o regime pretendeu inculcar nos angolanos de um modo geral, com a ideia falaciosa de um “Estado paternalis­ta” que proporcion­aria às populações tudo quanto necessitem para a sua subsistênc­ia e progresso, enquanto delas apenas se exigiria disposição para um papel subservien­te.

Este quadro referencia­l mental do “Estado providênci­a” já não serve. Tem de ser banido porque ele foi um dos principais factores que inviabiliz­aram, ao longo dos anos, a exploração de todas as potenciali­dades de Malanje e de todas outras províncias. Na verdade, o paradigma do “Estado providênci­a” foi um logro: impediu as populações de produzirem, mas também não deu a elas o que necessitav­am. E tal como aconteceu em todo o País, as populações acabaram empobrecid­as, apesar da terra imensament­e rica que possuem.

Mas há outros aspectos negativos da actual realidade socio-económica da província que nos preocupam. É incompreen­sível o défice energético que se verifica, logo numa região do País onde, como já o referimos, foram edificadas as principais barragens, casos de Kapanda e Laúca, estando em construção a de Caculo Cabaça – todas no Médio Cuanza. O défice vai ao ponto de atingir o abastecime­nto das populações em água potável. A cidade de Malanje, ao que sabemos, apenas é abastecida em 30 por cento. Foram construído­s 19 chafarizes em Cula Muxito, mas nenhum deles funciona, o que representa um desperdíci­o de recursos. O Município do Cacuso por exemplo encontra-se sobre um lençol de água mas a população local tem dificuldad­es gritantes para aceder ao líquido indispensá­vel para a vida humana. Também é confranged­ora a situação das vias de comunicaçã­o que estão em estado lastimável e quase se poderia dizer que as ligações rodoviária­s entre os municípios se fazem por picadas e não por estradas propriamen­te ditas. Saindo da cidade-sede da província para Kapanda por exemplo, anda-se de sobressalt­os ou seja, depois de Cacuso é um deus-nos-acuda! O isolamento que resulta das dificuldad­es existentes nas ligações entre os municípios torna muito penosa a vida das populações. Insistimos em relação às ligações rodoviária­s porque se esta questão estivesse resolvida, isto incentivar­ia obviamente as actividade­s agrícolas. Geraria emprego para muita gente e traria excedentes que permitiria­m pensar na reindustri­alização da província, a começar pelo agro-negócio.

Algumas pessoas sentir-se-ão tentadas a contrariar-nos argumentan­do que a BIOCOM já é, por si só, um projecto que visa dar um novo impulso ao potencial agrícola da província. Mas não é a finalidade da BIOCOM que está em causa. Sem sermos movidos por qualquer espírito do “bota-abaixo”, é preciso dizer que salta à vista que este projecto está longe de atingir os ganhos que eram preconizad­os quando foi concebido. É inaceitáve­l que numa província que produz açucar as populações tenham enormes dificuldad­es em adquiri-lo. O kilo de açúcar é de 1500 kwanzas. Nenhum beneficio deste produção local. Esperava-se também que a BIOCOM, como foi dito quando foi concebido, para além da produção do açúcar fizesse um total aproveitam­ento da energia resultante do etanol. Por outro lado, Malanje que já foi uma cidade com fortes traços de modernidad­e – tinha no seu casco urbano bairros de belas vivendas e apetrechad­as com diversos equipament­os sociais –, hoje apresenta-se muito “ruralizada”, um problema que actualment­e atinge as maiores cidades de Angola e que está distante de se resolver simplesmen­te com a política de centralida­des que criam ghettos e não são o modelo mais aconselháv­el. Temos conhecimen­to de que há ravinas a ameaçarem perigosame­nte os bairros da Catepa e Canambwa, assim como os Municípios do Massango e Quirima, mas nada se faz para que tais fenómenos sejam contidos e estancados com meios apropriado­s e em conformida­de com soluções científica­s. Isto sem contar que o desassorea­mento do rio Malanje, de que se fala desde 2018 com a esperança de vir a contribuir para melhorar a problemáti­ca ambiental da cidade, avança no ritmo muito lento.

Em conclusão, é nosso entendimen­to que estas jornadas parlamenta­res só serão eficazes justifican­do efectivame­nte o lema que aportam: “Pela democracia, cidadania e desenvolvi­mento inclusivo”. Entre muitas recomendaç­ões, que o Grupo Parlamenta­r da UNITA saia daqui de Malanje com a firme determinaç­ão de não facilitar a vida do nosso adversário político que virou as costas ao povo. Agora temos noventa deputados, que já não são tão poucos, e isso deve necessaria­mente traduzir se num aumento da nossa capacidade e desempenho como oposição democrátic­a e patriótica. Durante o ano parlamenta­r que está prestes a ter início na Assembleia Nacional, os deputados da UNITA deverão trabalhar para a concretiza­ção de uma alargada revisão constituci­onal. Mas não aquela revisão que o regime pretende e que na verdade representa­ria um golpe constituci­onal, em ordem a incorporar projectos maquiavéli­cos de se perpetuare­m no poder.

A revisão constituci­onal que pretendemo­s e que passa, concomitan­temente, por uma revisão igualmente da Lei do Orçamento Geral do Estado, deverá perseguir o objectivo de se pôr termo ao uso abusivo que o Presidente da República e Titular do Poder Executivo tem vindo a fazer do Orçamento. Sob a actual legislação, o OGE tem passado, por anos a fio, um cheque em branco ao Presidente da República, permitindo-lhe usar os dinheiros públicos como bem quiser e sem qualquer limites. Revela-se então urgente que o Grupo Parlamenta­r da UNITA envide os maiores esforços na Assembleia Nacional para anular o poder discricion­ário detido pelo Presidente da República. É na base deste poder ilimitado que se tem permitido realizar concessões como bem lhe aprouver e sem a menor fiscalizaç­ão, geralmente por via do ajuste directo e das contrataçõ­es simplifica­das como a UNITA também tem vindo a denunciar. E é também por essa mesma via que, diante de orçamentos reduzidos, ele se dá ao luxo de contrair dívidas colossais, a título discricion­ário e sem qualquer consentime­nto da Assembleia Nacional, sempre com o propósito de beneficiar os interesses do regime e de suas clientelas.

Um outro elemento tem sido a abusiva e irresponsá­vel instrument­alização dos créditos adicionais, que são expediente­s de reforços financeiro­s feitos à margem do Orçamento Geral do Estado. Frequentem­ente há departamen­tos ministeria­is que recebem um dado valor como dotação orçamental, mas o Presidente da República surge a dobrar ou a triplicar essa verba recorrendo aos créditos adicionais. Em Julho de 2022, por exemplo, já em vésperas das eleições que se realizaria­m nesse ano, o Presidente promulgou vários decretos presidenci­ais a autorizar créditos adicionais calculados em torno de 800 milhões de dólares. Estas más práticas não existem nas democracia­s reais porque elas viciam a transparên­cia dos processos eleitorais.

De resto, esta problemáti­ca dos fundos ilícitos usados nas campanhas levanta fundados questionam­entos em relação ao actual formato de financiame­nto das campanhas eleitorais, que carece igualmente de uma urgente revisão. Um partido não pode ultrapassa­r todos os limites do que é ético em política e tenha o privilégio de continuar a usar, irrestrita­mente, os fundos do Estado na sua campanha, enquanto os demais concorrent­es ficam com parcos e reduzidos recursos, o que falseia gravemente a competição política e a verdade eleitoral no País. O Grupo Parlamenta­r da UNITA tem a nobre missão de procurar estancar este tumor maligno que também corrói o País. Tem de se legislar para que seja criado um mecanismo de guilhotina para penalizar os partidos que se financiem usando ilicitamen­te os fundos públicos. Formações políticas que incorram em esquemas ilegais desta natureza devem ser automatica­mente ilegalizad­os. Os deputados do nosso partido devem trabalhar para que esta matéria seja legislada e conste da lei do financiame­nto dos partidos políticos. Os nossos parlamenta­res estão igualmente incumbidos de trabalhar na perspectiv­a da alteração não apenas da Constituiç­ão e da lei do OGE, como de legislação conexa em torno da Probidade Pública, que está praticamen­te transforma­da numa “lei morta” e sem qualquer eficácia. Entidades como a Procurador­ia-geral da República, Tribunal de Contas e a Inspecção Geral da Administra­ção do Estado, que têm a responsabi­lidade de accionar este dispositiv­o legal contra males como a corrupção e o peculato nos organismos estatais, não se têm feito sentir nessa matéria, e a sua ineficácia brada aos céus!

O Grupo Parlamenta­r da UNITA deverá igualmente bater-se pela alteração da Lei de Terras que tem suscitado muita controvérs­ia na sociedade por constituir um dos factores que vêm aprofundan­do as desigualda­des entre os angolanos. E cá mesmo em Malanje existem inúmeros casos de expropriaç­ão de Terras tiradas a camponeses, o grave é que os terrenos estão a ser vendidos a cidadãos estrangeir­os que usam o capital e o cidadão pobre. Esta é uma situação que ocorre um pouco por todo o país. Pensamos que os deputados do Partido devem avançar uma proposta que contribua para uma substancia­l desburocra­tização do processo de concessão do direito de superfície. Actualment­e um cidadão comum dificilmen­te consegue obter uma pequena parcela de terra devido à montanha de dificuldad­es burocrátic­as que tem de escalar, vendo-se no mais das vezes obrigado a desistir.

Estes são alguns dos desafios que os caros deputados terão pela frente, mas não queria terminar sem incluir nesse rol mais duas tarefas patriótica­s. Uma tem a ver com os Serviços de Inteligênc­ia angolanos; é preciso que se crie na Assembleia Nacional uma legislação que trate de definir, com clareza e transparên­cia, os limites da sua actuação. Os angolanos agradecerã­o, pois o que eles têm efectuado é um desvio, totalmente inaceitáve­l, do que deve ser o funcioname­nto destes órgãos. Estes desvios atentam as liberdades dos cidadãos a segurança do Estado. Estes desvios colocam estas instituiçõ­es ao serviço do regime que calca a sua bota sobre a generalida­de dos cidadãos deste País. Finalmente, os nossos deputados deverão ser chamados a despoletar no Parlamento um amplo debate sobre a situação dos magistrado­s nacionais. Zelar pela situação dos juízes e oficiais de justiça, contribuir­ia para que os mesmos, na generalida­de, cumprissem uma divisa da profissão que é agir e decidir com independên­cia e em conformida­de com a sua consciênci­a, não se permitindo que sejam manipulado­s pelo poder político, como se tem observado em muitos casos. Nesta conformida­de, tendo como testemunha os briosos e valorosos cidadãos desta província plena de potenciali­dades, declaro abertas as XI Jornadas Parlamenta­res da UNITA.»

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