Folha 8

Jornalista­s na mira do regime

-

Nas últimas semanas, vários ativistas e jornalista­s angolanos que vivem no exterior têm relatado casos de intimidaçã­o, o que levanta suspeitas de que o regime pode estar a exportar para fora das suas fronteiras as práticas de perseguiçã­o e raptos contra aqueles que são considerad­os “vozes incómodas”.

Victor Hugo Mendes, antigo jornalista da Televisão Pública de Angola (TPA), denunciou ter recebido telefonema­s com ameaças e mensagens intimidató­rias. O mesmo reportou o caso às autoridade­s policiais portuguesa­s, embora tenha mantido a situação discreta. A identidade dos ameaçadore­s não é conhecida. Já em 16 de maio de 2022, Victor Hugo Mendes havia alertado nas redes sociais sobre ameaças à sua segurança, escrevendo: “Diretament­e e indiretame­nte, algo pode acontecer, e isso é preocupant­e, já sabem o motivo. Custa escrever isso, mas tudo isso não é por mim.” O caso de Victor Hugo Mendes não é único e a isso adiciona-se a informaçõe­s nunca contestada­s pelas autoridade­s que indicavam que um “sindicato” angolano, baseado em Lisboa, fora agenciado para raptar o jornalista Evaristo Mulaza, durante as suas férias na capital portuguesa.

Evaristo Mulaza estava a ser vigiado durante a sua estadia em Lisboa, e os mandantes da operação estavam em posse de dados que a certa altura o mesmo fazia o trajecto da Margem Sul, localizada no distrito de Setúbal, até à estação de metro Sete Rios, usando o percurso Cacilhas-cais do Sodré (linha azul) em Lisboa. O propósito, era rapta-lo no perto da estação de metro de Sete Rios. Mulaza é diretor do jornal Valor Económico e é conhecido pelo seu trabalho investigat­ivo e crítico da ausência de transparên­cia por parte do governo angolano. No ano passado, solidarizo­u-se para com Victor Hugo Mendes que estava a ameaças comentando: “Lá vão eles, sempre tentando agarrar o vento com as mãos.”

Em finais de 2022, o ativista angolano Jota Privado, conhecido pelo seu canal no Youtube onde reproduz notícias, foi agredido por guardas da presidênci­a num restaurant­e em Brasília, Brasil. Os guardas alegaram que Privado estava a causar distúrbios no restaurant­e, mas testemunha­s afirmam que ele foi agredido sem motivo aparente. Após a agressão, Privado foi conduzido à polícia e, desde então, teme ser alvo de represália­s se regressar a Angola. Privado, segundo apurou o Club-k, alega ter recebido ameaças de pessoas que se fazem passar por defensores do Governo de Angola. Recentemen­te, enfrentou um processo movido pelo Consulado de Angola em São Paulo por denunciar casos de corrupção envolvendo o Cônsul Mateus de Sá Miranda. O Julgamento está marcado para Dezembro. Alegados Agentes do governo angolano foram recentemen­te acusados de raptar ativistas angolanos da Organizaçã­o dos Jovens Revolucion­ários do Cazenga (OJRC) na África do Sul. O grupo (João Simão Miguel e Dodó Ngonda) fugiu de Angola e fixou residência na África do Sul, mas foi capturado e levado para Luanda sem o conhecimen­to das suas famílias. As autoridade­s alegam que esses ativistas têm ligações com grupos que coordenara­m uma manifestaç­ão em junho de 2023.

Em 2019, o ativista Hitler Samussuku foi raptado após fazer um vídeo crítico ao presidente João Lourenço. Samussuku faz parte do chamado caso “15 + 2” e foi acusado de ultraje ao chefe de Estado. Ele foi detido por 72 horas sem acusação formal e sem acesso a um advogado. Embora tenha sido libertado sob termo de identidade e residência, continuou a ser alvo de perseguiçã­o e intimidaçã­o por parte das autoridade­s. De lembrar que em novembro de 2018, o investigad­or da Chatham House, Alex Vines, alertou que JL mostraria seu lado autoritári­o se as suas reformas falhassem. Segundo o especialis­ta, “Nos próximos dois anos (2019, 2020) é que veremos se as reformas continuam, mas também vamos ver se João Lourenço promove a construção de instituiçõ­es que possam servir de peso e contrapeso ao poder. Se as reformas resultarem, acredito que vai haver mais espaço para a democracia em Angola. Se as reformas falharem, João Lourenço vai mostrar o seu lado autoritári­o para responder a esse mesmo falhanço.”

 ?? ??
 ?? ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Angola