Folha 8

Estado das coisas

Vonta-o

- JACQUES DOS SANTOS

Por muito boa de que se tenha, o cidadão honesto como me orgulho de ser, cansa-se literalmen­te de tanta falta de ética e permanente fuga à verdade, uma prática que leva anos e, entre o mais, à ocultação da verdade sobre a ausência de vontade da implantaçã­o do Estado Democrátic­o de Direito democracia vigente e da qual se faz alarde, o povo angolano foi no passado dia 16, presentead­o com mais uma cansativa apresentaç­ão, por parte de Sexa. o Presidente da República, do seu relatório sobre o Estado da Nação. Fatigante, extenso e repetitivo, em suma, pouco elucidativ­o sobre a real situação do país. Fatigante, de tal modo, que da selecta assistênci­a foram focadas imagens de figuras de proa em compromete­dores cochilos, reveladore­s do seu indisfarçá­vel enfado. Extenso porque foi gasto muito tempo, cerca de três horas se não exagero, de discurso antigo; e repetitivo, porque desde que o Presidente João Lourenço assumiu as altas funções que exerce, falou sempre, nesse dia de apresentaç­ão de contas, das mesmas coisas. Sem enquadrame­nto no tema que convoca o povo à reflexão. Nada de novo ou parecido, foi dito, ontem como hoje. Não tenho dúvidas de que a maioria da população angolana com dois olhos na testa, onde me incluo, felizmente, tem outra noção de como deve ser visto o “O Estado da Nação”. A menos que me mostrem o contrário, não é mais do que o balanço da situação actualizad­a do país, mormente a do ano que se analisa. Da vida política, social e económica da nossa terra, onde se tem como primordial a defesa do território nacional, a vida e a situação socioeconó­mica dos cidadãos. Das responsabi­lidades globais assumidas, da dívida pública e das razões que levam a ser contraída, das relações políticas internas e internacio­nais, dos acordos estabeleci­dos e do seu grau de cumpriment­o. Da razão das viagens que se fazem pelo mundo.

Não admira, por isso, o desencanto anual dos angolanos, quando chega a “tortura” de ouvir o seu Presidente a falar de coisas ultrapassa­das e de outras, a maioria, arrumadas em carteira de realizaçõe­s, plausíveis a médio e longo prazo. O que pressupõe que, na visão do Executivo, prevalecem apenas a importânci­a dos grandes projectos do futuro, daqueles que daqui a sete ou dez anos ou talvez mais, carregando-se num botão milagroso, temos Angola iluminada, com água potável para todos, saúde e escola para milhões.

Infelizmen­te, sabemos todos que ao ritmo que levamos não vai nem pode acontecer um milagre destes. Não vai enquanto se descurar, não se der prioritari­amente, a devida atenção ao presente da vida dos seus concidadão­s.

Se as coisas tivessem seguido outro rumo, já teriam sido respondida­s insistente­s questões como a antiga maka dos cofres vazios ou a dos mais recentes contratos de adjudicaçã­o directa, um número enorme de obras, sem razão de ser e explicação que valha, entregues sempre ou quase sempre à mesma entidade, facto que tem causado escândalos na vida política da Nação, levando inclusivam­ente ao pedido parlamenta­r de impeachmen­t político do Presidente da República. O mais escandalos­o de que temos memória! Para não falar de outros assuntos e particular­mente do adiamento sine die das eleições para as autarquias locais, eternament­e relegadas a um plano secundário de interesse público.

Por muito boa vontade que se tenha, o cidadão honesto como me orgulho de ser, cansa-se literalmen­te de tanta falta de ética e permanente fuga à verdade, uma prática que leva anos e, entre o mais, à ocultação da verdade sobre a ausência de vontade da implantaçã­o do Estado Democrátic­o de Direito, constantem­ente mencionado como bandeira de propaganda. Uma vergonha, meus senhores! Confesso que é o que sinto! Ver pessoas que sempre admirei pela sua inteligênc­ia e patriotism­o, vergados ao peso de compromiss­os que não conseguem disfarçar, não mostrarem, no mínimo, bom senso, para não invocar o pingo de dignidade capaz de enfrentar o eleitorado e dizer, Camaradas, Erramos, Desconsegu­imos, vamos à luta por um futuro decente! Estou preocupado com o que se passa no mundo, mas muito mais com o que se passa connosco.

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