“O vendedor de passados” de Agualusa
Nesta edição, a sugestão de leitura recai para a obra “O vendedor de passados” do escritor angolano José Eduardo Agualusa. O autor foi distinguido em 2020 pelo seu contributo na projecção da literatura angolana no mundo com o Prémio Nacional de Cultura e Artes. O percurso literário de Agualusa é marcado por polémicas e posicionamentos sociais contundentes sobre a política angolana.
“Eduardo Agualusa é suficientemente ousado, disruptivo e comprometido com as causas e problemáticas sociais e políticas fundamentais deste tempo, o que lhe permite, amiúde, posições intelectuais que privilegiam o dissenso, a controvérsia e a polémica reflexiva. Desta forma tem contribuído tanto para o surgimento do leitor emancipado, como para o fortalecimento da cidadania e da liberdade de expressão”, lê-se na acta do prémio acima referenciado.
O livro “O vendedor de passados” é pouco conhecida pelos leitores angolanos, aliás a maior parte dos livros de Agualusa são consumidos no mercado europeu e latino-americano. O referido livro integra o plano nacional de leitura do ensino secundário de Portugal. Neste livro, Agualusa narra a história de um albino morador de Luanda, que elabora árvores genealógicas em troco de dinheiro. Uma actividade um tanto quanto estranha exercida por um esquisito personagem principal - o vendedor de passados falsos, chamado Félix Ventura e uma lagartixa que, na verdade comanda toda a narrativa. Félix Ventura escolheu um estranho ofício: vende passados falsos. Os seus clientes - prósperos empresários, políticos, generais, enfim, a emergente burguesia angolana - têm o futuro assegurado. Falta-lhes, porém, um bom passado. Félix fabrica-lhes uma genealogia de luxo e memórias felizes, e consegue-lhes os retratos dos ancestrais ilustres.
A vida corre-lhe bem. Uma noite entra-lhe em casa, em Luanda, um misterioso estrangeiro à procura de uma identidade angolana. Então, numa vertigem, o passado irrompe pelo presente e o impossível começa a acontecer.
Sátira feroz, mas divertida e bem-humorada, à actual sociedade angolana.
Para a estudante portuguesa, Sónia Rodrigues Pinto, este livro caracteriza a oralidade de uma nação “a maneira mais bonita de poetizar o passado, a maneira mais bonita de honrar a oralidade de uma nação, de se manter fiel às suas origens através de personagens sem sol, de personagens com cicatrizes, de memórias de um passado que se tenta esquecer mas que nos pertence. E, acima de tudo, a maravilhosa ideia da osga. Este escritor, essa capacidade de se manter terra-a-terra com o que é seu, com o que lhe caracteriza, oferecendo-nos através da fantasia uma irrealidade quase real,” destaca.