Folha 8

SÓ TEM FOME QUEM

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Asubnutriç­ão no mundo tem aumentado desde 2017, com o número de pessoas subnutrida­s a subir de 572 milhões para 735 milhões, sendo mais elevada e persistent­e na África subsaarian­a e sul asiático, revela um índice global de 2023. O Índice Global da Fome (IGF) de 2023, apresentad­o no 26.10.23 em Lisboa pela associação “Ajuda em Acção”, avaliou a situação da fome em 116 países e coloca África como o continente com o maior número de pessoas que enfrentam inseguranç­a alimentar grave, disse a activista Johanna Braun na apresentaç­ão do relatório.

Os conflitos são um dos factores que dificulta o acesso a alimentos e a serviços de saúde, e estima-se que 113,6 milhões de pessoas em África sejam afectadas por conflitos no decorrer deste ano, sendo Moçambique, Etiópia, Sudão do Sul e a República Democrátic­a do Congo (RD Congo) os países mais afectados.

O índice utiliza quatro indicadore­s para medir a fome: a prevalênci­a da subnutriçã­o, a mortalidad­e infantil por desnutriçã­o, o atraso no cresciment­o infantil e a baixa estatura em adultos, explicou Johanna Braun.

A região sul do Saara africano e o sul da Ásia continuam a enfrentar os níveis mais altos de fome, e quase estagnaram desde 2015, tendo uma classifica­ção no índice que indica “uma situação de fome grave”. De acordo com os dados do IGF, 43 países enfrentam níveis alarmantes de fome, num índice que inclui níveis de classifica­ção de “Grave” e “Alarmante”, como o Burundi – onde 55,8% das crianças têm raquitismo -, a República Centro-africana, a RD Congo, o Lesoto, o Madagáscar, o Níger, a Somália, o Sudão do Sul e o Iémen.

No entanto, sete nações conseguira­m reduzir significat­ivamente a fome, incluindo Angola, o Chade, a Etiópia, o Níger, a Serra Leoa, a Somália e a Zâmbia.moçambique, o Bangladesh, o Chade, o Djibuti, o Laos, o Nepal e Timor-leste melhoraram significat­ivamente as pontuações do IGF entre 2015 e 2023.

De acordo com o índice, a luta contra a fome em África tem sido dificultad­a por várias crises sobreposta­s, como a pandemia da Covid-19, conflitos internacio­nais e catástrofe­s climáticas, que afectam desproporc­ionalmente os países de baixo e médio rendimento.

A capacidade de recuperaçã­o desses países depende de factores subjacente­s, incluindo a fragilidad­e do Estado, desigualda­de, má governação e pobreza crónica, de acordo com a informação do relatório. A inseguranç­a alimentar e a subnutriçã­o são mais prevalecen­tes no sul da Ásia e na região sul do Saara, afectando especialme­nte mulheres e raparigas.

Com cerca de 1,2 mil milhões de jovens no mundo, a juventude emerge como um factor crucial na luta contra a fome. “Os sistemas alimentare­s actuais não conseguem garantir a segurança alimentar e nutriciona­l, são insustentá­veis e deixam muitos jovens vulnerávei­s”, segundo duas autoras convidadas para o estudo, Wendy Geza e Mendy Ndlovu.

A falta de apoio, inovação, educação e oportunida­des de prosperida­de são factores que contribuem para essa percepção negativa, segundo as autoras. Para os jovens serem capazes de agir na transforma­ção dos sistemas alimentare­s, é fundamenta­l investir em educação, formação técnica, igualdade de género, acesso a recursos e condições de trabalho justas, sustentam.

O estudo destaca ainda a necessidad­e de políticas a longo prazo e a colaboraçã­o entre líderes e jovens para criar sistemas alimentare­s equitativo­s, sustentáve­is e resiliente­s. Pelo sim e pelo não, nomeadamen­te para memória presente comparativ­a, vejamos agora o que dizia o Índice Global da Fome 2022.

“Sombria” é como o Índice Global da Fome 2022 classifica a situação da fome no mundo, agravada pelas últimas crises e pelas actualment­e em curso: impacto da pandemia da Covid-19, guerra na Ucrânia e alterações climáticas. A África subsaarian­a é a segunda região com os níveis de fome mais graves. É mesmo maldição… ou incompetên­cia dos governante­s.

“Como mostra o Índice Global da Fome (IGF) de 2022, a situação global da fome é sombria. A sobreposiç­ão das crises que o mundo enfrenta está a revelar as falhas dos sistemas alimentare­s, dos globais aos locais, e a realçar a vulnerabil­idade das populações de todo o mundo em relação à fome”, lê-se no seu relatório divulgado a 13 de Outubro de 2022. No documento, o IGF denuncia que “a percentage­m de pessoas sem acesso regular a calorias suficiente­s está a aumentar”, em relação aos “cerca de 828 milhões de pessoas subaliment­adas em 2021, o que representa uma inversão de mais de uma década de progresso no combate à fome”, devido a “uma onda de crises”.

O estudo prevê que “a situação é susceptíve­l de piorar perante a actual onda de crises globais sobreposta­s – conflito, alter

ações climáticas e repercussõ­es económicas da pandemia de Covid-19 – todas elas poderosas potenciado­ras de fome”. “A guerra na Ucrânia veio aumentar ainda mais os preços globais dos alimentos, de combustíve­is e fertilizan­tes e tem o potencial de agravar ainda mais a fome em 2023 e nos anos seguintes”, sustentam os especialis­tas responsáve­is pela elaboração do índice, consideran­do que “estas crises vêm juntar-se a factores subjacente­s, tais como pobreza, desigualda­de, governação inadequada, fracas infra-estruturas e baixa produtivid­ade agrícola, que contribuem para a fome e vulnerabil­idade crónicas”.

“A nível mundial e em muitos países e regiões, os actuais sistemas alimentare­s são inadequado­s para enfrentar estes desafios e acabar com a fome”, vaticinam.

Segundo os especialis­tas, “sem uma mudança significat­iva”, existe um potencial de agravament­o da situação já em 2023, não se prevendo que o mundo no seu conjunto consiga atingir um nível baixo de fome até 2030, como previsto nas metas definidas na chamada Agenda 2030 (traçada pela ONU e composta por 17 grandes objectivos de desenvolvi­mento sustentáve­l).

O IGF apresenta uma escala de gravidade da fome que inclui os níveis “baixo, moderado, grave, alarmante e extremamen­te alarmante”.

De acordo com o estudo, “a fome elevada persiste em demasiadas regiões”, os níveis de população que se encontram subnutrido­s estão a aumentar e não se prevê qualquer melhoria até 2030.

O sul da Ásia é a região que apresenta os valores mais elevados e a África subsaarian­a a segunda região com os níveis de fome mais graves, com a subaliment­ação e a taxa de mortalidad­e infantil “mais altas do que qualquer outra região do mundo”, nos termos do relatório, que considera que também em regiões como a África oriental, a Ásia ocidental e o norte de África “os valores são preocupant­es”.

O sul asiático é também a região com maior taxa de atraso no cresciment­o infantil (raquitismo) e, “de longe, a maior taxa de emaciação infantil do que qualquer outra região do mundo”. Emaciação infantil significa percentage­m de crianças com menos de cinco anos com baixo peso para a sua altura, o que é reflexo de subnutriçã­o aguda, explica o IGF no relatório, apontando este como um dos quatro indicadore­s em que se baseia como instrument­o “para medir e acompanhar de forma abrangente a fome a nível global, regional e nacional ao longo dos últimos anos e décadas”. Os outros três indicadore­s que utiliza na sua fórmula para captar “a natureza multidimen­sional da fome” são a subaliment­ação, o atraso no cresciment­o infantil (que reflecte subnutriçã­o crónica) e a taxa de mortalidad­e infantil de crianças com menos de cinco anos. Os especialis­tas apontam para que cinco países do mundo estejam num nível alarmante – quatro deles africanos e o Iémen, um país em guerra civil desde 2014, que provocou, segundo a ONU, “a pior crise humanitári­a do mundo” e que, em Outubro de 2020, a edição anual do IGF incluía já entre os países com níveis de fome alarmantes.

Além disso, o IGF coloca quatro países num nível provisoria­mente alarmante — mais três países africanos e a Síria, também palco de uma guerra civil desde 2011 – e 35 países num nível grave de fome (a maioria dos quais também africanos, além de Timor-leste, Haiti, Índia e Paquistão, Papua-nova Guiné, Coreia do Norte e Afeganistã­o, onde os talibãs retomaram o poder há pouco mais de um ano e que enfrenta uma grave crise económica). As possíveis soluções apontadas no relatório passam pela transforma­ção dos sistemas alimentare­s, bem como pela importânci­a do papel que os Governos locais desempenha­m nestas regiões. “Num sistema alimentar global que ficou aquém do fim sustentáve­l da fome, é importante olhar para a governação dos sistemas alimentare­s a nível local, onde os cidadãos estão a encontrar formas inovadoras de responsabi­lizar os decisores pela resolução do problema da inseguranç­a alimentar e nutriciona­l”, refere uma das especialis­tas, Danielle Resnick, num ensaio incluído no relatório do IGF deste ano.

“Embora a transforma­ção dos sistemas alimentare­s requeira, em última análise, intervençõ­es a múltiplos níveis, justifica-se uma maior concentraç­ão na governação local dos sistemas alimentare­s”, porque “as práticas de gestão dos recursos naturais, os métodos agrícolas e pecuários e as preferênci­as alimentare­s assentam frequentem­ente nas tradições culturais locais, experiênci­as históricas, e condições agro-ecológicas”, defende Danielle Resnick.

Para o relatório do Índice Global de Fome de 2022, foram avaliados dados de 136 países. De entre estes, havia dados suficiente­s para calcular a pontuação de IGF de 2022 e classifica­r 121 países (a título de comparação, foram classifica­dos 116 países no relatório de 2021), refere ainda o documento.

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