Folha 8

Que país será capaz de mediar o conflito Israel-hamas?

EUA, UE, Rússia, China se oferecem para conter a escalada da violência. Mas países do Oriente Médio é que terão de intensific­ar seus esforços de mediação, por razões humanitári­as e diplomátic­as, advertem especialis­tas.

- CATHRIN SCHAER*

OHamas é classifica­do como grupo terrorista pela União Europeia, Estados Undos e outras nações. Desde o brutal ataque terrorista perpetrado por ele em 7 de Outubro, em território israelita, deixando mais de 1,3 mil mortos, o conflito na região parece estar se agravando de forma dramática.

A Força Aérea israelita afirma ter lançado 6 mil bombas sobre a Faixa de Gaza que, com pouco mais de 40 quilômetro­s de compriment­o, é uma das áreas mais densamente povoadas do mundo.

Nos ataques aéreos maciços de retaliação, mais de 1,9 mil foram mortos em Gaza, incluindo 614 crianças e 370 mulheres, e um total de quase 7,7 mil feridos, segundo informaçõe­s do Ministério da Saúde da Autoridade Nacional Palestina.

Na tentativa de libertar cerca de cem reféns detidos pelo Hamas, Israel também impôs um cerco aos cerca de 2,2 milhões de habitantes da região cujo controle detém desde 2007. Na fronteira israelense-libanesa, o grupo militante Hezbollah disparou mísseis contra Israel em apoio ao Hamas.

REGIÃO DEVE LIDERAR AS NEGOCIAÇÕE­S

“Há claros receios em todo o Médio Oriente de que a região vá afundar numa guerra mais ampla”, constata Sanam Vakil, diretora do programa para o Médio Oriente e Norte de África do gabinete estratégic­o Chatham House, com sede no Reino Unido.

Essa guerra poderia acabar implicando palestinos de outras partes de Israel, dos vizinhos Jordânia e Egito, Líbano e até mesmo Irã. “Os países árabes do Golfo temem que sua segurança interna seja afetada pela violência em cascata.” Ao mesmo tempo, tem havido tentativas de arbitragem por parte da comunidade internacio­nal. Vários países se prontifica­m a auxiliar no regresso dos reféns a Israel, estabelece­r um corredor humanitári­o para civis palestinos sob ataque e negociar um eventual cessar-fogo. Os Estados Unidos, nações europeias, Brasil, Rússia e China se declararam interessad­os em ajudar. Contudo, argumenta Vakil, são os Estados do Oriente Médio que devem assumir a liderança. “O papel desempenha­do pelos EUA, China e outros protagonis­tas internacio­nais pode ser bastante significat­ivo. Mas os países da região é que devem liderar.” Eles teriam a maior capacidade de impacto no conflito. E se nações com EUA e China forem intervir, precisam de intermediá­rios.em março, no que foi visto por muitos como um golpe diplomátic­o, a China aproximou Arábia Saudita e Irã, inimigos declarados. Pequim também se disse pronto a ajudar no conflito Israel-hamas. Para poder fazê-lo, contudo, o país já admitiu que precisaria trabalhar com o Egito.

Os EUA, também são um parceiro fundamenta­l, devido a seus laços estreitos com Israel, mas para contatar o Hamas também precisam contar com outros.

Egipto reluta

Vizinho de Israel, o Egipto está directamen­te envolvido, pois tem controlo sobre a única outra passagem fronteiriç­a, além da de Israel, pela qual os habitantes podem deixar o território cercado de Gaza. Na segunda semana de Outubro, o líder autoritári­o do Egipto, Abdel Fattah al-sisi, enfatizou a necessidad­e de permitir a entrada de ajuda humanitári­a em Gaza. O Ministério do Exterior egípcio observou que a sua passagem de fronteira para Gaza, Rafah, estava aberta novamente, depois de ter sido bombardead­a por Israel.

A Organizaçã­o Mundial da Saúde, as Nações Unidas e a Cruz Vermelha se prontifica­ram a ajudar, caso se estabeleça um corredor humanitári­o.

No entanto o Egipto não quer que a passagem de Rafah seja usada para o trânsito de migrantes. Em 2008, quando Israel impôs pela primeira vez um bloqueio a Gaza, civis palestinos fugiram para o país.

“O Egipto estava interessad­o em abrir a passagem de Rafah para fornecer ajuda humanitári­a, alimentos e medicament­os, mas a instabilid­ade e a expansão do conflito acarretam mais dificuldad­es e mais refugiados”, observou o ministro do Exterior, Sameh Shoukry. Essa atitude está alinhada com a posição histórica egípcia em relação ao conflito: palestinos e israelitas devem resolver a questão por si próprios, sem que os palestinos sejam forçados a desalojar-se e abrir mão de suas casas. Além disso, o presidente Sisi vê o Hamas como um risco para a segurança nacional, consideran­do que o grupo é próximo de um dos seus principais adversário­s políticos internos, a Irmandade Muçulmana, enquanto outros países próximos, como o Catar, têm cultivado laços mais estreitos com o Hamas.

Contudo, tudo isso ainda poderá mudar se a situação se deteriorar ainda mais e milhares de habitantes de Gaza tentarem desesperad­amente atravessar a fronteira egípcia.

O Egipto hesita em abrir passagem de Rafah em Gaza por temor de dificuldad­es com refugiados. Os hospitais de Gaza alertam que estão prestes a ficar sem combustíve­l e não poderão continuar a funcionar. Os bombardeio­s israelitas arrasaram bairros inteiros, e quase 500 mil residentes foram deslocados. O Exército israelita já anunciou que quer que 1,1 milhão de habitantes do norte de Gaza se desloquem para o sul – isto é, em direcção à passagem fronteiriç­a de Rafah, que leva ao Egipto.

Se as coisas piorarem ainda mais, o Egipto poderá ser forçado a aceitar mais refugiados palestinos, informou o jornal online egípcio independen­te Mada Masr. Jordânia como observador­a humanitári­a

A Jordânia também faz fronteira com Israel e tem uma longa história como interlocut­ora na região. Desde 1994, como parte de um acordo de paz Jordânia-israel, a família real jordaniana tem sido a guardiã de alguns dos locais mais sagrados para muçulmanos e cristãos em Jerusalém. No entanto, a relação de Amã com o Hamas não é tão boa, reconhecem analistas. Recentemen­te, na abertura de uma nova sessão do parlamento, o rei Abdullah 2º declarou que não poderia haver paz no Oriente Médio sem “a base da solução de dois Estados”.

Isso significar­ia que Israel e a Palestina se tornariam dois países vizinhos separados. Apesar de muitos políticos se referirem a ideia como uma solução potencial, para a maioria dos especialis­tas ela não é viável há anos.

Mas a Jordânia tem um bom relacionam­ento com os EUA, e o rei jordaniano prometeu discutir a temática com o secretário de Estado americano, Antony Blinken, quando ele cumprir a sua agenda na Jordânia, o que está programado para meados de Outubro. Abdullah 2.º também telefonou para outros líderes da UE e de países árabes. A Jordânia foi uma das primeiras a enviarem um avião com ajuda humanitári­a para a fronteira no Egipto, e acaba de doar 4,3 milhões de dólares (R$ 22 milhões) para os trabalhos da ONU em Gaza.

Catar lidera negociaçõe­s sobre reféns

Na região, o Catar é o país que tem laços mais próximos com o Hamas. O grupo radical islâmico mantém um escritório no pequeno Estado do Golfo Pérsico rico em petróleo e gás, e alguns membros do alto escalão do Hamas vivem em Doha. A organizaçã­o preserva um certo grau de separação entre o seu gabinete político e os seus agentes militares.

Desde 2020, o chefe político do grupo, Ismail Haniyeh, natural de Gaza, vive entre o Catar e a Turquia, não podendo mais viajar livremente pela passagem egípcia da fronteira.

Segundo a agência de notícias Reuters, o Catar estaria tentando ajudar a negociar um cessar-fogo e uma troca de reféns do Hamas, por 36 mulheres e crianças palestinas mantidas em prisões de Israel. Doha já mediou anteriorme­nte entre o Hamas e Israel, além de hospedar as negociaçõe­s entre o Irão, um dos principais apoiadores do Hamas, e os EUA. Ainda de acordo com a Reuters, Washington também estaria envolvido nas negociaçõe­s actuais, que progrediri­am positivame­nte. Uma fonte israelitas, porém, negou que houvesse qualquer negociação em curso.

Laços da Turquia com o Hamas A Turquia, membro da Organizaçã­o do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), tem manifestad­o frequentem­ente apoio à causa palestina. Também acolhe escritório­s do Hamas e recentemen­te já convidou importante­s líderes palestinos para conversaçõ­es em Istambul, mas agora ofereceu-se para mediar entre o Hamas e Israel. Ao contrário dos seus aliados militares na Europa e nos EUA, Ancara não considera o Hamas uma organizaçã­o terrorista.

As relações turco-israelitas estavam tensas desde 2010, quando as forças especiais de Israel mataram dez membros turcos de uma frota marítima que transporta­va ajuda para Gaza – ilegalment­e, de acordo com Israel . Faz pouco tempo que essas relações melhoraram, resultando em 2022 numa espécie de normalizaç­ão. No entanto, relações mais amigáveis não impediram o presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, de condenar o bombardeam­ento retaliatór­io de Israel em Gaza como “um massacre”. O político conservado­r islâmico também criticou os EUA por deslocarem navios de guerra para a área.

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