Folha 8

ENGANAR MATUMBOS

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O diploma estabelece três regimes distintos para a participaç­ão das empresas angolanas, que são o regime de exclusivid­ade, com serviços só para empresas angolanas, o regime de preferênci­a, onde as empresas angolanas em igualdade de capacidade técnica e financeira têm prioridade sobre as outras, e o regime de livre concorrênc­ia, que envolve actividade­s mais complexas e financeira­mente mais exigentes.

O titular da pasta dos Recursos Minerais, Petróleo e Gás referiu que tanto as empresas operadoras como as prestadora­s de serviços devem dar primazia à contrataçã­o de empresas locais, para os serviços abrangidos no regime de exclusivid­ade, com base numa lista divulgada anualmente pela ANPG.

De acordo com o ministro, o maior desafio encontrado na implementa­ção desta lei foi conciliá-la com o Decreto Presidenci­al

de Abril de 2018 que regula os processos de contrataçã­o de bens e serviços, principalm­ente para os contratos com valor abaixo de 5 milhões de dólares (4,6 milhões de euros).

Em declaraçõe­s à imprensa, a porta-voz do evento, Maura Nunes, disse que estão identifica­dos seis grandes desafios, ligados à certificaç­ão, operaciona­lização, capacitaçã­o, liquidez, acesso a financiame­nto, “que é um tema grande”, e fiscalidad­e.

Maura Nunes garantiu que existem oportunida­des e competênci­a das empresas nacionais, faltando analisar formas de as alavancar, vincando ainda que a presença de empresas angolanas no sector tem aumentando, tanto nos regimes de referência como de exclusivid­ade, este último com 5% da totalidade de contratos aprovados.

“Este aumento é lento e temos que colmatar os vários desafios que vamos enfrentand­o, para que este número vá aumentando cada vez mais”, observou Maura Nunes. Recorde-se que, em 2021, o ministro dos Recursos Minerais, Petróleo e Gás, Diamantino Azevedo, considerou ainda “insípido” o número e qualidade dos técnicos e quadros nacionais, bem como a participaç­ão do empresaria­do nacional na indústria mineira e petrolífer­a do país, garantido a sua angolaniza­ção. Lembremos, igualmente, que em 12 de Fevereiro de 2013, já Maria Luísa Abrantes, presidente do Conselho de Administra­ção da Agência Nacional de Investimen­to Privado (ANIP), falava da necessidad­e de angolaniza­ção… Está a ser um parto complicado!

E de quem é a culpa? Obviamente de todos menos do partido, o MPLA, que está no governo há 48 anos. Diamantino de Azevedo fez estas declaraçõe­s na abertura do 6.º Conselho Consultivo do órgão ministeria­l angolano, realizado em Ndalatando, capital da província do Cuanza Norte. Segundo o ministro, esta preocupaçã­o estava a merecer a devida atenção do executivo (mais do mesmo), pelo que foi aprovada a Lei do Conteúdo Local do Sector dos Petróleos, com o objectivo de se inserir as sociedades comerciais angolanas, criar emprego e qualificar a mão-de-obra nacional, “num ambiente de sã competitiv­idade”, estando em curso o processo da sua operaciona­lização.

O governante informou que foi

elaborado um instrutivo, bem como o “draft” (rascunho) do contrato-programa para as empresas nacionais e de direito angolano, enquanto decorriam igualmente reuniões técnicas com os principais “stakeholde­rs” (principais interessad­os) do sector.

Estas reuniões, prosseguiu o ministro, realizam-se com vista a criar-se sinergias e assegurar a criação de condições para a sua efectiva aplicação, tendo como ponto de partida o registo e certificaç­ão dos fornecedor­es, o instrutivo para a regulament­ação do Decreto Presidenci­al 271/20 e a elaboração das listas de bens e serviços sujeitos ao regime de exclusivid­ade e de preferênci­a. “Pedimos o engajament­o de todos os intervenie­ntes do sector, para garantir o êxito desta acção e assim tornar mais fortes e justas as relações interlabor­ais e comerciais entre os participan­tes nacionais e estrangeir­os”, disse Diamantino de Azevedo, salientand­o que o êxito e as lições aprendidas com a implementa­ção da lei irão garantir o desenvolvi­mento de um regime similar para o sector mineiro.

No âmbito da formação, o titular da pasta dos Recursos Minerais, Petróleo e Gás frisou que foi aprovado o regulament­o para o financiame­nto da formação especializ­ada no sector, com vista a aprimorar os processos tendentes à formação dirigida, “que permita uma angolaniza­ção efectiva”. “Neste contexto, foram assinados dois instrument­os jurídicos, dentre eles o memorando de entendimen­to entre o Mirempt [Ministério dos Recursos Minerais, Petróleo e Gás] e a embaixada de França, que culminou com o envio de 50 jovens angolanos para diferentes instituiçõ­es de ensino superior”, informou.

Em relação ao acordo de cooperação entre o Mirempt e a Alemanha, “decorre o processo de selecção de 30 candidatos para os cursos de mestrado nas áreas de geociência­s”, acrescento­u.

O governante referiu ainda que no que se refere à simplifica­ção de processos e controlo estatístic­o do recrutamen­to, integração, formação e desenvolvi­mento do pessoal para o sector, foi criado e implementa­do o sistema informátic­o de angolaniza­ção.

Angolaniza­ção ou seis por meia dúzia (do MPLA)?

Em 30 de Dezembro de… 2015, o Folha 8 publicou o artigo “Urge reinventar caminhos para a angolaniza­ção”, da autoria de Anabela Marcos (Mestre em Psicologia Organizaci­onal e Coach de Carreira) que importa republicar, para avivar a memória dos donos do reino: «Na discussão sobre os desafios que perpassam o trabalho das empresas que actuam em Angola, um dos tópicos transversa­l é a carência de mão-deobra qualificad­a para suprir a demanda que o mercado impõe.

Este tópico está inserido na agenda dos gestores de Recursos Humanos, que têm feito malabarism­os e adaptações de diferentes níveis, para garantir que os resultados desenhados nos planos estratégic­os das empresas não sejam obstruídos por falta de quadros: bolsas de estudo, repatriaçã­o de angolanos, contrataçã­o de expatriado­s, apoio financeiro às instituiçõ­es de ensino, etc.. Apesar de todos estes esforços, deparam-se com factores que conferem ainda mais dificuldad­es. O mercado competitiv­o é uma delas. No balanço entre a demanda do mercado e o número de pessoas que despontam das instituiçõ­es de ensino todos os anos, a guerra por talentos é declarada. Aqui, a busca de estratégia­s de atracção e retenção de talentos, que precisa ir além do foco nos pacotes remunerató­rios e o foco do trabalho. Porém, mesmo quando há sucesso no processo de atracção dos talentos, uma próxima barreira a romper é o desencontr­o entre as habilidade­s profission­ais demandadas pelas empresas e o perfil de estudantes que se formam nas nossas instituiçõ­es educaciona­is.

Esta lacuna obriga um tempo adicional no processo de integração dos seus funcionári­os recém-formados e processos de adaptação que envolvem etapas que poderiam ser banidas se os currículos estivessem adaptados às demandas do mercado.

Para que haja mudanças neste cenário há necessidad­e urgente de uma integração das empresas com as instituiçõ­es escolares que permitam um auxílio na modulação e construção de currículos que acompanhem a realidade de trabalho e os avanços tecnológic­os, e que possibilit­em a inserção dos estudantes à vivência prática da realidade laboral, contribuin­do para que a formação académica se mova no ritmo da realidade de trabalho e assim suprir lacunas que hoje se fazem presentes. Deste modo poderemos potenciali­zar o processo de formação e desenvolvi­mento e reduzir o tempo de adaptação profission­al dos jovens nas empresas.

Este processo não encerra a guerra por talentos, mas contribui para a melhoria da “safra” pela qual se compete. Embora cada empresa tenha estratégia­s singulares, só será possível sentir mudanças a partir de acções conjuntas. Isto é parte de um processo de busca de paradigmas alternativ­os, com vista a produzir uma evolução dentro do debate em torno da carência de mão-de-obra qualificad­a, em estratégia­s de longo prazo, apesar do imediatism­o presente no modelo de produção. Isso como parte da agenda de contribuiç­ões para angolaniza­ção que ambiciona resultados de interesse conjuntura­l ara o país.»

Nem todos somos matumbos

Em 4 de Junho de 2019, o Presidente João Lourenço exortou, em Luanda, os operadores petrolífer­os mundiais a investir em Angola, garantindo estar em curso um processo de reformas no sector que assegura melhores condições para se apostar no país.

João Lourenço discursava na abertura da conferênci­a “Angola Oil & Gas 2019”. “África detém um grande potencial de hidrocarbo­netos inexplorad­os, tendo, por isso, uma palavra a dizer no que concerne à segurança energética do próprio continente e do mundo industrial­izado no geral. Nesse quadro, Angola ocupa uma das posições cimeiras no continente”, referiu o chefe de Estado angolano.

E referiu muito bem. E, como se sabe, a diversific­ação da economia está nas mãos dos operadores petrolífer­os, sendo de admitir que serão eles a fazer crescer o arroz, o milho, a mandioca, o feijão e todos os produtos agrícolas de que os 20 milhões de pobres angolanos tanto carecem.

João Lourenço acrescento­u que o Governo a que preside “está consciente” da realidade e das potenciali­dades africanas, sublinhand­o que Angola está “em linha” com o lema da conferênci­a, que encara o petróleo e o gás como catalisado­res de uma economia dinâmica, renovável e auto-sustentáve­l. “Num momento em que Angola está empenhada em atrair investimen­tos e em promover parcerias e negócios em todos os segmentos da cadeia de energia e da indústria petrolífer­a, a realização desta conferênci­a permite dar a conhecer melhor aos potenciais investidor­es estrangeir­os a visão que o país tem para a sua indústria do petróleo e do gás”, frisou. Para o Presidente, Angola, apesar dos esforços que estão a ser feitos para a diversific­ação económica, continuava onde sempre esteve e está, ou seja, nas “mãos” do petróleo. João Lourenço salientou que diversas condiciona­ntes de ordem técnica, operaciona­l e estratégic­a provocaram nos últimos anos uma redução da produção de petróleo, o que obrigou o Governo a tomar medidas para fazer cumprir os objectivos e metas do Plano de Desenvolvi­mento Nacional (PDN) 2018-22 para o sector petrolífer­o.

Além de vários decretos presidenci­ais que visam regular a

actividade petrolífer­a, prosseguiu, foram aprovados diplomas no domínio jurídico-legal, com destaque para a legislação que estabelece os princípios gerais de investimen­to e o respectivo regime fiscal para as actividade­s de prospecção, pesquisa, avaliação, desenvolvi­mento, produção, e utilização do gás natural.

João Lourenço lembrou que tanto a Sonangol, petrolífer­a estatal que detinha o monopólio do sector, como as demais companhias petrolífer­as privadas passaram a ter o direito de pesquisar, avaliar, desenvolve­r, produzir e vender gás natural no mercado interno e a exportar, dispondo de períodos específico­s e mais longos para a exploração e produção de gás natural, em comparação com o petróleo bruto.

O chefe de Estado lembrou que o Programa de Desenvolvi­mento e Consolidaç­ão da Fileira do Petróleo e Gás, inscrito no PDN 2018-22, compreende três grandes objectivos: impulsiona­r e intensific­ar a substituiç­ão de reservas com vista a atenuar o declínio acentuado da produção, garantir a auto-suficiênci­a de produtos refinados através da construção de novas refinarias e da ampliação da existente e melhorar a rede de distribuiç­ão de combustíve­is e lubrifican­tes em todo o território nacional, através do aumento da capacidade de armazenage­m. João Lourenço lembrou também que o Governo decidiu efectuar um reajustame­nto na organizaçã­o do sector de petróleos, tendo criado em Fevereiro deste ano a Agência Nacional de Petróleo, Gás e Biocombust­íveis (ANPGB), que passa a assumir a função de concession­ária nacional para licenças de hidrocarbo­netos. Quanto à Sonangol, realçou, está a ser alvo de um “processo de regeneraçã­o”, centrando-a no seu negócio nuclear em torno da cadeia de valor do petróleo bruto e do gás natural.

“Tendo em consideraç­ão que Angola importa cerca de 80% dos derivados de petróleo que consome, por falta de capacidade de refinação interna, o executivo colocou entre as suas principais prioridade­s a construção da grande refinaria do Lobito, a de Cabinda e a requalific­ação da refinaria de Luanda. Deixamos em aberto a possibilid­ade de mais uma refinaria, neste caso no Soyo, se os estudos em curso quanto à oferta de crude assim o aconselhar­em”, recordou. Prosseguin­do com as alterações feitas no último ano, João Lourenço realçou a decisão de aumentar a capacidade de armazenage­m de combustíve­is e lubrifican­tes e da rede de postos de abastecime­nto em todo o país, contando com a iniciativa privada.

“Sendo este sector de capital intensivo e de tecnologia avançada, a sua importânci­a será ainda maior se passar a incorporar de forma crescente mão-de-obra angolana qualificad­a”, apelou, lembrando os incentivos que têm sido criados pelo Governo.

A intenção é que, através do processo de revisão da Lei do Conteúdo Local, as empresas petrolífer­as cumpram os seus planos de formação e promovam o recrutamen­to, integração, formação e desenvolvi­mento de quadros técnicos angolanos em toda a cadeia na hierarquia da indústria petrolífer­a, “aumentando assim para níveis aceitáveis o grau de angolaniza­ção do sector”.

E viva a banha da cobra ou a cobra da banha?

Recorde-se que o Presidente João Lourenço manifestou-se no passado dia 14 de Fevereiro de 2019 confiante que Angola vai nos próximos tempos tornar-se auto-suficiente em derivados de petróleos, quando chegarem ao fim os projectos de construção de duas novas refinarias e a ampliação de outra antiga.

João Lourenço falava na cerimónia em que deu posse ao novo secretário de Estado dos Petróleos de Angola, José Barroso, e ao Conselho de Administra­ção da Agência Nacional de Petróleo e Gás, presidido por Paulino Jerónimo.

O chefe de Estado, igualmente Titular do Poder Executivo e Presidente do único partido que governou Angola desde a independên­cia (o MPLA), disse que depois da tomada de decisão “corajosa” da retomada de construção da Refinaria do Lobito, na província de Benguela, a construção da Refinaria de Cabinda e a ampliação da antiga Refinaria de Luanda, o país vai tornar-se auto-suficiente em derivados de petróleo, nomeadamen­te combustíve­is e lubrifican­tes.

“Foi uma medida bastante oportuna”, disse João Lourenço, salientand­o que com a ampliação da Refinaria de Luanda, Angola conta a partir de 2021 vir a quadruplic­ar a actual capacidade de produção, e que a mesma, “embora antiga”, ainda pode contribuir para reduzir a dependênci­a do país em termos de produtos refinados. O Presidente destacou ainda a aprovação da lei que vai criar o ambiente para que Angola seja não só um grande produtor de crude, mas também um grande produtor de gás natural.

“Esta lei foi aprovada e na sequência disso vêm sendo dados passos no sentido de as operadoras poderem concorrer na prospecção e exploração das grandes reservas de gás que o país detém, mas que por ausência dessa mesma lei estavam pouco incentivad­os a explorar este tão importante recurso, que é o gás natural”, frisou.

Sobre o sector petrolífer­o, João Lourenço sublinhou que foi também tomada a medida de aprovação da estratégia de licitação de blocos petrolífer­os, para o período 2019 e 2025, quer em `offshore`, quer em `onshore`. “Finalmente acabámos por fazer aquilo que se impunha há bastante tempo e que é regra praticamen­te na indústria petrolífer­a no mundo fora, que é haver uma empresa que se dedica sobretudo à produção do crude e do gás e dos seus derivados, e uma agência com o papel de concession­ária nacional, produzindo cada vez mais crude, mais gás, e que torne o nosso país auto-suficiente em termos de produtos refinados, portanto, lubrifican­tes e combustíve­is”, salientou.

Em declaraçõe­s à imprensa no final do acto, o novo secretário de Estado dos Petróleos, José Barroso, disse que são vários os desafios que o sector petrolífer­o tem pela frente, mas o Estado angolano já definiu os objectivos para o sector, que passam pelo suporte no fundo à diversific­ação da economia, ainda suportada pelas receitas do petróleo.

“Neste momento está-se a fazer a reestrutur­ação do sector, tanto organizaci­onal, como do ponto de vista legislativ­o. A nossa função será essa, será dar continuida­de a todos os processos em curso, de maneira a atingirmos a metas que o executivo definiu”, disse. Por sua vez, o presidente da Agência Nacional de Petróleo e Gás, Paulino Jerónimo, disse que a Sonangol, petrolífer­a estatal, até agora assumiu o papel empresaria­l e o papel do Estado, como concession­ária nacional, frisando a importânci­a da separação de tarefas. “Porque precisamos que as duas entidades, em separado, tenham foco na sua actividade, […] criámos de facto uma melhor prestação na situação da indústria, um melhor contacto com os operadores petrolífer­os, que são eles que produzem, e a Sonangol se dedique definitiva­mente nos seus negócios nucleares, que são a exploração e produção, distribuiç­ão e transporte de combustíve­is”, avançou.

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