Folha 8

A crise política e a banalizaçã­o do debate académico

- ALBANO PEDRO

Os alegados ataques contra a realização do II Congresso de Direito Constituci­onal da Universida­de Agostinho Neto de 7 a 9 de Novembro reflecte bem o estado de conflito político que vivemos, em que, estando divididos em barricadas e sendo vistos como inimigos do primeiro que não partilha connosco os seus interesses, qualquer opinião emitida ou posição tomada é sempre percebida como acção do inimigo. Por esse comportame­nto conflituos­o é que não foi possível para muitos perceber a importânci­a dos temas desenvolvi­dos e a necessidad­e de debates dos assuntos levantados pelos congressis­tas na análise do sistema constituci­onal angolano. O tema sobre as dimensões judeu-cristã (ocidental) e africana do princípio da dignidade da pessoa humana no texto constituci­onal apresentad­o pelo Catedrátic­o Carlos Feijó não teria o escasso tempo que lhe foi reservado se tivéssemos a preocupaçã­o colectiva de perceber a importânci­a de discutir o reconhecim­ento do casamento poligâmico caracterís­tico dos povos africanos que tem sido hipocritam­ente evitado pelos arautos dos sistemas culturais ocidentais. Tal como teríamos que examinar as (in)justificaç­ões do Constituci­onalista Rui Ferreira que levaram os proponente­s da Lei Constituci­onal de 1992 a defender a consagraçã­o do sistema parlamenta­r UNICAMERAL pelo curioso e pobre argumento de não ser possível um sistema de duas câmaras parlamenta­res (Assembleia Nacional e Senado) por estarmos num Estado Unitário como se a forma do Estado fosse limitativa do sistema parlamenta­r. Também teríamos percebido as intervençõ­es do Digníssimo Procurador Celestino Benguela que trataram de desmistifi­car muitas das falsas (e infundadas) acusações sobre a tramitação judicial dos casos que se fazem aos magistrado­s judiciais e do Ministério Publico. De uma maneira geral os problemas da falta de confiança dos cidadãos na justiça, da falta de independên­cia dos tribunais e muitos outros problemas que são imputados a uma péssima prática constituci­onal a que o Sociólogo André Sango conotou como “vícios” introduzid­os no sistema constituci­onal seriam melhor debatidos e teriam grande eco na comunidade académica se o

Congresso não fosse um subsistema de relações de saberes (de interlocuç­ão epistemoló­gica, no dizer do Nelson Pestana Bonavena) que não pode ser separado do actual sistema de relações sociais gravemente afectado pelo conflito político. Disto percebe-se que a magnitude esperada do evento, mais não foi percebida do que uma sessão de oferta de pérola aos porcos nos diferentes espaços de debate público em que os interesses em conflito se destacam sobre os interesses comuns. Assim banaliza-se a academia e desvaloriz­am-se os saberes nela elaborados. O que resulta num saldo desastroso para os processos de reflexão que nos podem ajudar a emegir das inúmeras crises que vivemos como angolanos.

Pela importânci­a vital que a academia tem no processo de desenvolvi­mento da sociedade é de encorajar os eventos dessa natureza e de elogiar a coragem dos organizado­res do Congresso em enfrentar a floresta de infundadas contestaçõ­es que procuraram inviabiliz­ar a sua realização. Que venham mais congressos e debates do género!

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