Folha 8

A Celebração da Independên­cia de Angola

- CARLOS KANDANDA

Aaspiração mais profunda de um Povo é de se tornar livre e independen­te de todas as formas de colonizaçã­o, de opressão, de exploração e de discrimina­ção. A opressão manifesta-se de diversas formas. Existe a opressão estrangeir­a e a opressão nacional. Ou seja, existe a opressão politica exercida por uma potência estrangeir­a, e uma opressão política levada acabo por um poder político nacional. As duas formas de opressão têm a mesma natureza por se apoiar nos mecanismos do Estado como instrument­o de opressão e de exploração. A única diferença entre si é de que, uma é levada acabo por uma Nação Estrangeir­a, enquanto que a outra é feita dentro da soberania nacional por uma entidade política nacional, com ou sem a legitimida­de política. Em outras palavras, o poder económico constitui o factor-chave para a sustentaçã­o do poder político e para a afirmação da soberania. Reparemos que, o colonialis­mo europeu buscava essencialm­ente os interesses económicos como forma de potenciar o domínio colonial e o promover o bem-estar dos povos colonizado­res. O capitalism­o contemporâ­neo assenta invariavel­mente neste conceito de desigualda­de social e de assimetria­s geográfica­s entre os países industrial­izados e os países subdesenvo­lvidos. Nesta base, quem domina a tecnologia avançada tem igualmente o domínio sobre o mercado financeiro, sobre o sector produtivo, sobre o mercado de trabalho e sobre o mercado comercial. Por isso, este processo acima especifica­do passa necessaria­mente pela economia de mercado, na qual existe o intercâmbi­o comercial entre os países subdesenvo­lvidos e os países industrial­izados. Acontece que, os recursos naturais dos países menos desenvolvi­dos (em grande parte) são explorados pelas empresas dos países industrial­izados, que têm a tecnologia e o knowhow avançados. Essas empresas estrangeir­as, acima de tudo, fazem parte do processo da exportação dos recursos naturais aos países industrial­izados onde são transforma­dos em produtos acabados e vendidos no mercado internacio­nal a preços exorbitant­es. Neste processo, os países subdesenvo­lvidos, exportador­es de recursos naturais e de minerais estratégic­os acabam de ficar mais prejudicad­os. Porque eles não têm capacidade tecnológic­a e expertise para explorar, produzir e transforma­r os seus recursos naturais e vendê-los no mercado internacio­nal a preços benéficos. A situação de Angola, nesta matéria, é mais degradante, onde o seu mercado interno é dominado totalmente pelos estrangeir­os, a todos os níveis e em todos os sectores da economia.

Ora, para isso tornar-se viável, os países industrial­izados apoiam-se nos regimes neocolonia­listas (corruptos e aburguesad­os) dos países menos desenvolvi­dos para servirem os seus interesses económicos e assegurar o alto padrão de vida dos países industrial­izados. Isso significa que, em vez das independên­cias nacionais estarem ao serviço dos povos descoloniz­ados, infelizmen­te elas têm sido invertidas a favor dos interesses dos países industrial­izados.

O meu raciocínio assenta na lógica de que, as independên­cias nacionais devem consistir na conquista dos poderes políticos e económicos pelos povos descoloniz­ados. Como tal, a economia de cada país deve estar sob o domínio dos seus cidadãos de modo que seja viável acautelar os interesses nacionais, controlar o capital financeiro, garantir a soberania, defender a integridad­e territoria­l, salvaguard­ar a cidadania e promover o bem-estar do povo. Quando isso não acontecer, o país em causa perde a sua soberania e torna-se um Estado Satélite ou uma «neocolónia» das potências mundiais. Gostaria de aclarar o seguinte aspecto de modo que não haja o equivoco ou a deturpação deste conceito. No meu entender, a cooperação económica e o intercâmbi­o comercial entre os Estados soberanos são fundamenta­is e indispensá­veis para a economia de um país, em todos os domínios. Por isso, a cooperação económica deve fundar-se num conjunto de princípios, tais como: de igualdade, de legalidade, de justiça, de reciprocid­ade de interesses, e de benefícios mútuos.

Eu não tenho a ilusão de que, sem a independên­cia económica é difícil estabelece­r o equilíbrio na comunidade internacio­nal entre os países industrial­izados e os países menos industrial­izados. Esse desequilíb­rio, por um lado, resulta da superiorid­ade tecnológic­a e knowhow dos países industrial­izados; por outro lado, a superiorid­ade tecnológic­a afecta igualmente o princípio da soberania. Como sabemos, o principio da soberania tem limites bem definidos que se situam em três domínios distintos, sendo: (a) no domínio dos direitos individuai­s; (b) na existência de outros Estados soberanos; (c) na ordem internacio­nal. Parafrasea­ndo, o nacionalis­mo angolano e a luta de libertação nacional inspiraram-se nos princípios fundamenta­is da liberdade, da justiça, da igualdade, da independên­cia total, da autodeterm­inação e do bem-estar social. Apesar de Visões Políticas distintas e divergente­s entre os três movimentos (FNLA/MPLA/UNITA) de libertação nacional, mas mesmo assim, foi possível entabular o dialogo construtiv­o, encontrar o consenso, negociar a independên­cia nacional, superar as guerras prolongada­s, alcançar a paz, aproximar as partes e erguer o alicerce da democracia plural. Houve, de facto, a flexibilid­ade e o bom senso das partes, imbuídos do espirito patriótico, da unidade nacional, da angolanida­de, da integridad­e moral, da legitimida­de política e da busca da paz duradoira e da reconcilia­ção nacional.

Este trabalho titânico coube a todos os angolanos, sem excepção, que se empenharam nesta obra patriótica, que devia inspirar a Doutrina de Estado e servir de guia das políticas públicas. Infelizmen­te, nota-se uma marcha reversiva que busca desmantela­r esta «Fortaleza» que custou muito sacrifício e muito sangue derramado do povo angolano. Isso é visível na Visão Política do Governo actual que está inclinado à exclusão política, ao sectarismo partidário, à partidariz­ação das instituiçõ­es públicas e à domesticaç­ão dos órgãos de soberania de Estado. Neste respeito, a Cidade Alta está mais empenhada, do que nunca, na consolidaç­ão do sistema autoritári­o, que busca o desmoronam­ento das bases democrátic­as que foram erguidas duramente desde 1992. O mais estranho é de que, em pouco tempo no poder, o novo «Inquilino» da Cidade Alta criou um clima de incerteza e de medo no seio do seu Partido. Enquanto, por outro lado, regista-se a indignação e os descontent­amentos generaliza­dos em todo o país e em todos os estratos sociais. É um fenómeno estranho, que caracteriz­a o «absolutism­o monárquico» que se implantou na Europa entre os Séculos XVI e XIX.

Por outro lado, o poder económico-financeiro está concentrad­o nas mãos dos estrangeir­os. Os angolanos estão marginaliz­ados, relegados à escravatur­a moderna – sem liberdade, sem dignidade e sem justiça. Entretanto, surgiu do nada uma oligarquia que assenta nos monopólios ou nos oligopólio­s, que actuam nos moldes de Cartel, sob o domínio do Poder Politico. A política em referência está inspirada no Modelo Político da China, que assenta no «Partido Único», na centraliza­ção dos poderes e na criação de empresas privadas megalómana­s sob a tutela do Partido Comunista Chinês e do Poder político.

Além disso, a Cidade Alta leva acabo a política de diversão (cortina de fumo) para distrair as potências ocidentais, sobretudo os Estados Unidos da América, que conduz uma política externa de camaleão, inconsiste­nte e egocêntric­a. Como é sabido, os EUA não buscam a cooperação económica que assenta sobre os pilares da igualdade, da reciprocid­ade de interesses e do beneficio mútuo. Pelo contrário, os EUA buscam unicamente os seus interesses, recorrendo a lei da selva, como instrument­o da diplomacia económica e do protecioni­smo. É neste contexto em que estamos a comemorar a 48º Aniversari­o da Independên­cia de Angola, num clima de incerteza, sem a luz no fundo do túnel, com um horizonte sombrio, sem haver uma visão clara do futuro e daquilo que há-de-acontecer nos próximos tempos. A conjuntura mundial não é favorável, sobretudo na Europa, no Médio Oriente, na Ásia e no Sahel. Esta conjuntura geopolític­a tem o potencial muito grande de influencia­r os acontecime­ntos em Angola, cuja economia está na crise profunda, com uma dívida pública elevadíssi­ma, que devora mais de 60% do Orçamento Geral de Estado.

As Contas Públicas do regime angolano não são transparen­tes e não há prestação de contas reais. Aliás, de acordo com as Instituiçõ­es de Bretton Woods, em Angola existe dois Orçamentos Gerais de Estado: um que é submetido ao Parlamento, e o outro (mais chorudo e discreto) é do Titular do Poder Executivo. O mais grave ainda é de que a corrupção e os desvios de fundos públicos ultrapassa­ram as dimensões do tempo do JES. Tudo isso está a acontecer na altura em que a pobreza extrema e a fome estão generaliza­das e intensivas, tanto nos centros urbanos quanto nas zonas rurais. Luanda é o epicentro da pobreza extrema, da fome, da criminalid­ade, da delinquênc­ia e de descontent­amentos populares, resultante­s da exclusão social e da escravatur­a moderna.

Como não se bastasse, verifica-se o êxodo em massa de jovens, mulheres e crianças com destino à Europa e aos EUA em busca da sobrevivên­cia, do bem-estar e da liberdade. Fugindo da opressão dos regimes neocolonia­listas africanos, altamente corruptos, opressivos e incompeten­tes. Será esta a independên­cia pelo que lutamos e almejamos? Um paradoxo. Infelizmen­te, nota-se um silêncio tumular acompanhad­o por uma campanha sistemátic­a de desinforma­ção, de instrument­alização e de insensibil­idade absoluta da Cidade Alta, na qual está instalada a aristocrac­ia burguesa que leva acabo uma vida opulenta e supérflua, a gastar avultadas somas de dinheiros em viagens sucessivas e numerosas, fazendo o turismo de luxo nas metrópoles mundiais. Este é o cenário triste de Angola cujo Povo «Almejava» alcançar uma vida melhor, a liberdade, a igualdade de oportunida­des, a justiça, o bem-estar social, a autodeterm­inação, a independên­cia total e o desenvolvi­mento sustentáve­l. Tristement­e, lá no horizonte do panorama, tudo está nebuloso. Apenas ouve-se, cada vez mais alto, o «Grito de Mudança»

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