Título académico no nome das instituições: O exemplo do novo aeroporto
Em maio de 2023, a sociedade sul-africana viveu uma polémica ortográfica depois que falantes da língua xitsonga apontaram um suposto erro ortográfico nas mais novas notas bancárias do Banco de Reserva. Na nota de R100, a tradução em xitsonga de “Reserve Bank” foi alterada, com o segundo “N” em “Bangi Nkulu” removido. A palavra ficou “Bangi Kulu”. O Conselho Pan-sul Africano da Língua, responsável pela tradução, discordou, dizendo que o “N” extra estava incorreto nas notas antigas, pois é usado apenas ao se referir a uma pessoa e não a uma instituição. O Banco de Reserva, por sua vez, confirmou que as notas antigas continham o referido erro ortográfico, mas foram já corrigidos na nova impressão. O assunto chamou atenção sobre a importância de haver consultas públicas quando se trata de assuntos desta natureza de grafia ou nomes as instituições do Estado.
O caso do Aeroporto de Luanda
Recentemente, Angola inaugurou um novo aeroporto. Se também houvesse a cultura de consulta pública, o Presidente da República, João Lourenço, hesitaria assinar o Despacho Presidencial nº 140/22 de 9 de junho, colocando a palavra “Doutor” ao aprovar o topônimo outorgado à infraestrutura aeroportuária, situada na Comuna do Bom Jesus. Apesar de não haver proibição alguns especialistas advertem que o título acadêmico não deve ser usado no nome de uma instituição.
No Brasil, o escritor e linguista Mário de Andrade foi um dos primeiros a defender essa posição. o mesmo escreveu num artigo publicado em 1930, que o uso do título acadêmico no nome de uma instituição é uma forma de “excesso de formalismo” e que pode gerar confusão.
Outro importante defensor dessa posição foi o professor e linguista Evanildo Bechara, que num artigo publicado em 1992, afirmou que o uso do título acadêmico no nome de uma instituição é “uma aberração linguística” e que “não tem qualquer fundamento lógico”.
Exemplos de outros países
Em 1974, quando os franceses renomearam o Aeroporto de Roissy em homenagem ao general Charles de Gaulle, passou a ser apenas Aeroporto de Paris-charles de Gaulle (CDG), sem o título militar. O mesmo ocorreu com o aeroporto de Lisboa, em homenagem ao general Humberto Delgado, que em 1945 fundou a TAP. Em África, concretamente na cidade de Ponta Negra, há o aeroporto Agostinho Neto, sem o título da personalidade honrada.
Política angolana
Desde a governação de Agostinho Neto e José Eduardo dos Santos, as autoridades tiveram atenção em não colocar títulos aos nomes de personalidades dadas às instituições. Quando o MPLA chegou ao poder, alterou o nome do hospital universitário para “Hospital Américo Boavida”, em homenagem ao médico Américo Boavida, sem o prefixo “Doutor”. O Hospital Pediátrico David Bernardino também não recebeu título acadêmico.
A única universidade pública de então ficou Universidade
Agostinho Neto (UAN), e não “Universidade Dr. Agostinho Neto (UDAN)”. O mausoléu passou a ser “Mausoléu Antônio Agostinho”, e não “Doutor”. No Huambo, a nova universidade pública é a Univ. JES, e não Univ. Eng. JES. A Universidade Mandume Ya Ndemufayo (UMNY) não tem o título “Rei” e a Universidade Lueji A’nkonde (ULUA) não tem o título “Rainha”.
A prática de colocar o título académico no nome das instituições, em Angola começou a ser sentida no consulado do Presidente João Lourenço. Em setembro de 2020, o Chefe de Estado deu nome ao novo Hospital Geral do Bié, como Hospital Geral do Bié Dr. Walter Strangway, em homenagem ao médico canadense com quem o seu pai, Serqueira Lourenço, trabalhou como enfermeiro no Bié. Antes das eleições angolanas de 2022, também nomeou o Hospital Materno-infantil Dr. Manuel Pedro Azancot de Menezes. Ambos estabelecimentos com o prefixo “Doutor”. Há também o Complexo Hospitalar de Doenças Cardio-pulmonares Cardeal Dom Alexandre do Nascimento, que poderia ficar sem o prefixo “Dom” que é uma abreviação da palavra latina “dominus”, que significa “senhor”. Apesar de não haver um padrão que impeça, é importante considerar a consulta pública para evitar possíveis reparos. Dessa forma, no futuro, não surgiriam instituições designadas como “Universidade General João Lourenço” ou “Instituto Superior Senhor João Lourenço” em vez de “Universi