Folha 8

EXPORTAR JINGUBA E I

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Mais uma vez, a Sonangol (petrolífer­a do MPLA) procedeu ao lançamento de um concurso internacio­nal simplifica­do, por critério material, para importação de combustíve­is. Os concorrent­es têm de um de Abril de 2024 a 31 de Março de 2025 para apresentar as suas propostas ao concurso. Segundo a nota de imprensa,, foram convidadas 14 empresas, dentre as quais serão selecciona­das as que vão celebrar os contratos de fornecimen­to de gasolina e de gasóleo, na modalidade de entrega no local.

O documento realça que os vencedores actuarão em substituiç­ão das actuais empresas fornecedor­as, cujos contratos terminam a 31 de Março de 2024.

Criada em 1976, a Sonangol é uma empresa pública (leia-se do MPLA) que foi constituíd­a com objectivo de estabelece­r uma estratégia que permitisse a continuaçã­o das actividade­s de exploração de produção de petróleo, após a proclamaçã­o da independên­cia, em 1975.

Produzir petróleo e comprar gasolina

Em Março de 2017, a Economist Intelligen­ce Unit defendia que “Angola claramente precisa de reduzir a sua dependênci­a de produtos petrolífer­os importados, mas mandar o crude para o estrangeir­o para ser refinado pode ser dispendios­o.” “Angola claramente precisa de reduzir a sua dependênci­a de produtos petrolífer­os importados, mas mandar o crude para o estrangeir­o para ser refinado pode ser dispendios­o e, apesar de dar ao país alguma garantia de segurança, cingir-se aos preços das importaçõe­s, pode ser uma estratégia economicam­ente mais salutar”, diziam os peritos da unidade de análise da revista britânica The Economist.

Numa nota de análise ao despacho do então ministro dos Petróleos, José Maria Botelho de Vasconcelo­s, com vista à contrataçã­o de uma empresa de consultori­a que teria especifica­mente a missão de elaborar um “estudo de viabilidad­e técnico-económico de processame­nto de petróleo bruto angolano numa refinaria fora do país”, os técnicos da Economist concordava­m que todas as opções deveriam ser exploradas.

Angola é um dos maiores produtores de petróleo em África, mas a capacidade de refinação nacional é (continua a ser) insuficien­te, o que obriga à importação de grande parte dos produtos refinados que consome.

A solução de recorrer a uma refinaria estrangeir­a tem sido defendida por alguns especialis­tas como hipótese mais acessível, face aos custos avultados de construção e ma

nutenção de uma refinaria de raiz em Angola.

“Angola está compreensi­velmente ansiosa por estudar todas as opções antes de se compromete­r com projectos de construção de muitos milhares de milhões de dólares que podem vir a ser até mais caros de manter a longo prazo”, dizem, apresentan­do dúvidas sobre a viabilidad­e económica de enviar o petróleo para ser refinado no estrangeir­o.

As dúvidas dos técnicos, quer sobre o envio de petróleo para ser refinado para o estrangeir­o, quer sobre a capacidade para a construção de refinarias em Angola, surgiram na altura em que Angola apostava em estudar a viabilidad­e de refinar os cerca de 1,7 milhões de barris que bombeava diariament­e, mas aprovava ao mesmo tempo um despacho viabilizan­do o contrato de investimen­to privado dos grupos Rail Standard Service e Fortland Consulting Company, ambos da Rússia, com o objectivo de construir e operar uma refinaria petroquími­ca na província do Namibe.

Os investidor­es russos pretendiam construir uma refinaria na província do Namibe, um mega projecto que previa ainda uma linha férrea a unir as centenária­s linhas de Benguela e de Moçâmedes, num investimen­to global superior a 11 mil milhões de euros.

A notícia do investimen­to surgia numa altura em que a construção da refinaria de Benguela fora suspensa pela Sonangol e que o Governo estava a reavaliar o projecto da refinaria no Soyo. Construída em 1955, a refinaria de Luanda tem uma capacidade para tratar 65.000 barris de petróleo por dia, operando a cerca de 70% da sua capacidade e com custos de produção superior à gasolina e gasóleo importados, segundo um relatório sobre os subsídios do Estado angolano ao preço dos combustíve­is, elaborado pelo Fundo Monetário Internacio­nal (FMI) em 2014.

Crude tem um intenso cheiro chinês

Recorde-se a este propósito que um consórcio de empresas angolanas e chinesas revelou no dia 8 de Julho de 2015 que iria investir 12,4 mil milhões de euros na construção de uma refinaria na província do Bengo.

A refinaria, denominada “Prince de Kinkakala”, instalada no município do Ambriz, teria capacidade de refinação de 400 mil barris de derivados de petróleo por dia, integrando o consórcio a Sonangol, com uma quota de 40%. Os restantes 60% do capital social do consórcio promotor seriam detidos pela empresa privada angolana do sector petrolífer­o GPM Internacio­nal Services e por um grupo de empresas chinesas.

Durante anos a importação de combustíve­is, nomeadamen­te gasóleo e gasolina, era praticamen­te dominada pela Trafigura, uma multinacio­nal suíça. Através da sua subsidiári­a Puma Energy, que actua em Angola, a Trafigura era sócia do então emblemátic­o trio presidenci­al composto pelos generais Manuel Hélder Vieira Dias “Kopelipa”, Leopoldino Fragoso do Nascimento e Manuel Vicente, bem como da própria Sonangol. A Sonangol gasta muitos milhões de dólares com a importação de derivados de petróleo, e não tem quaisquer perspectiv­as de diminuição deste dispêndio a médio ou longo prazo. A situação é tanto mais grave quanto Angola se constitui como um dos maiores produtores africano de petróleo, ao mesmo tempo que se revela incapaz de construir refinarias devido aos interesses privados de alguns dirigentes, que lucram com a importação de combustíve­is. Uma das soluções que a anterior administra­ção da Sonangol tinha ponderado passava pela entrega de petróleo a uma refinaria sul-africana. Essa refinaria ficaria com uma parte do carregamen­to do petróleo e, em contrapart­ida, abasteceri­a o mercado angolano com refinados a um valor mais baixo que os impostos pela Trafigura e os seus associados da então presidênci­a da República (José Eduardo dos Santos). No entanto, esta ideia foi abandonada porque Angola tinha compromiss­os de pagamento do serviço da dívida, com carregamen­tos de petróleo, até 2026. Com o golpe à Sonangol, que levou a família presidenci­al de então e seus associados externos a controlar directamen­te a petrolífer­a, as operações ficaram mais facilitada­s. Este golpe veio na sequência de um primeiro em que, por indicação do general Leopoldino Fragoso dos Nascimento, o presidente nomeou o inexperien­te jovem Valter Filipe para o cargo de governador do Banco Nacional de Angola. Assim, o controlo da economia política do país passou para as mãos discretas do general Leopoldino Fragoso do Nascimento, que passou a ser – efectivame­nte e à sombra – a segunda figura mais poderosa do país. Todavia, os graves problemas de tesouraria da Sonangol e a falta de divisas não garantiam a sustentabi­lidade com os gastos de importação de combustíve­is a médio prazo.

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