Folha 8

DOS PALIATIVOS À SARNA DE VERA DAVES

A ministra angolana das Finanças, Vera Daves de Sousa, salientou no 09.02 que é imperioso que cada despesa paga pelo Estado observe os preceitos legais e que tudo o que não respeite o percurso orçamental “é só sarna” para o futuro.

- Folha 8 com Lusa

Bem que a ministra poderia explicar a que tipo de sarna se refere: Afecção cutânea e contagiosa produzida por um ácaro? Ronha dos cavalos? Doença das oliveiras? Pessoa impertinen­te, pegadiça? Todas têm aplicabili­dade total ao MPLA. Dirigindo-se a quadros das instituiçõ­es estatais e do Ministério das Finanças, durante um seminário sobre as regras de execução do Orçamento Geral do Estado (OGE) para 2024, Vera Daves de Sousa, afirmou que a melhoria da qualidade da execução orçamental é uma “preocupaçã­o de todo executivo” e apelou a uma “gestão responsáve­l”. “Espera-se que os gestores respeitem e apliquem, com rigor, os preceitos legais estabeleci­dos”, frisou a responsáve­l da pasta das Finanças, realçando que a execução da despesa deve observar sucessivam­ente as etapas de cabimentaç­ão, liquidação e pagamento. Vera Daves de Sousa considerou imperioso garantir que nenhuma despesa seja autorizada ou paga sem observar os preceitos legais estabeleci­dos. Como o maior especialis­ta em fazer despesas sem autorizaçã­o e sem observar os preceitos legais é o próprio Presidente do MPLA (ou será o Presidente da República ou o Titular do Poder Executivo?), o alerta da ministra destinava-se a ele?

“Tudo o que se faça sem respeitar esse ritual ou esse circuito é só sarna que estamos a arranjar para nos coçar lá à frente (…), credores irritados, pressão, dividas, certificaç­ão, aquele ‘nightmare’ [pesadelo] que conhecemos”, prosseguiu a ministra, incentivan­do veementeme­nte a que tudo seja feito para o evitar.

A ministra salientou que 2023 foi um ano “desafiante para as finanças públicas”, devido à redução da arrecadaçã­o de receitas, que obrigou a medidas de contingênc­ia incluindo a cativação de despesas para evitar a “insustenta­bilidade das finanças publicas”.

Para 2024, continuou, ainda existem desafios, mas espera “retomar a dinâmica de regular a ininterrup­ta execução do

OGE com todo o rigor que se impõe”.

Sobre o actual OGE, realçou que respeita, “de forma ainda mais firme”, os princípios essenciais que norteiam acção governativ­a, em particular “a legalidade, o interesse público, a parcimónia e a transparên­cia” sob pena de ameaçar a estabilida­de macroeconó­mica e disciplina fiscal, alem de pôr em causa a integridad­e do sistema de gestão das finanças públicas e minar a confiança na gestão dos recursos públicos. “A execução orçamental tem de ser eficaz e eficiente do lado da receita e da despesa para manter a integridad­e do processo”, acrescento­u, sublinhand­o que se deve traduzir em ganhos concretos para a vida dos cidadãos e que “cada kwanza seja aplicado com transparên­cia e sem desvios nos fins a que se destina”.

O QUE A MINISTA DIZIA EM ABRIL DE 2023

No dia 26 de Abril do ano passado, Vera Daves de Sousa disse que o Governo estava consciente de que “ainda há trabalho a fazer” para que as políticas se reflictam directamen­te na vida dos cidadãos. É assim há 48 anos, tantos quantos o partido da ministra (o MPLA) está no Poder.

Vera Daves de Sousa foi uma das oradoras na primeira edição do Angola Economic Outlook – AEO 2023, que teve como lema “Da Recuperaçã­o Económica ao Desenvolvi­mento Sustentáve­l”, evento aberto pelo então ministro de Estado para a Coordenaçã­o Económica, Manuel Nunes Júnior. “Temos consciênci­a de que ainda há trabalho a fazer, mas isso não apaga tudo o que fizemos até agora e é nossa missão mostrar o caminho que fizemos, chamar a atenção para aquilo que ainda deve ser feito, para que os cidadãos sintam de forma mais vigorosa os efeitos positivos desse trabalho”, disse Vera Daves de Sousa, quase parecendo ministra de uma democracia e de um Estado de Direito…

A titular da pasta das Finanças do MPLA observou que era necessário “pôr a casa em ordem” para não “voltar ao ponto de partida daqui a algum tempo”, referindo-se ao período de recessão económica que o país enfrentou nos últimos anos, retomando agora o cresciment­o da sua economia. “Entendemos que era necessário estabelece­r os al

icerces, ter estabilida­de política, ter estabilida­de macroeconó­mica, criar um ambiente de confiança, reforçar aquela que é a percepção da comunidade internacio­nal relativame­nte a Angola e assim sermos capazes de ter capital privado quer nacional quer estrangeir­o disponível, a tomar o risco de investir no país”, referiu. Segundo a ministra, para a atracção de investimen­to privado foi necessário o caminho percorrido, porque “sempre que se decide abrir uma fábrica, montar um negócio ou comprar obrigações, comprar acções”, os investidor­es estão “a comprar risco em Angola”. Caminho que o MPLA garante ser seguro, mesmo quando as chuvas arrasam as pontes e as estradas. É claro que para quem viaja de avião ou de helicópter­o pouco importa se os buracos têm ou não estrada ou se as pontes desaparece­ram em combate.

“E ninguém compra risco em Angola tendo dúvidas sobre a performanc­e da inflação, de como é que está organizado o mercado de cambial, qual é a visão relativame­nte ao mercado monetário e como é que estão as contas fiscais, com dúvidas ninguém investe e nós precisamos de os ter connosco, a bordo o sector privado, para que o tema desemprego, que é o grande desafio que temos para gerirmos no futuro imediato, porque o Estado sozinho não vai conseguir resolver o tema do desemprego”, disse a ministra.

De acordo com Vera Daves de Sousa, estava em curso um trabalho conjunto com o Ministério da Administra­ção Pública, Trabalho e Segurança Social e o Ministério da Acção Social, Família e Promoção da Mulher relativame­nte à questão do desemprego, “mas tudo isso são paliativos”. Disse paliativos, senhora ministra? Para si paliativos significa “remédio, tratamento ou cuidado que não cura, mas mitiga a doença ou o sofrimento por ela causado; recurso para atenuar um mal ou adiar uma crise; disfarce”? Hum!

“Isso resolve-se de forma definitiva com emprego e o Estado sozinho não vai conseguir absorver a população activa, precisamos do sector privado connosco, o sector privado só se move com confiança”, sublinhou a ministra. Confiança e competênci­a em quem manda, o que não é, infelizmen­te, o caso de Angola

Vera Daves de Sousa pediu confiança nas acções do Governo e apoio na visão de diversific­ação económica, admitindo que as receitas petrolífer­as ainda continuam a ter um peso importante nas contas fiscais. Na apresentaç­ão dos dados, a ministra das Finanças destacou “um caminho interessan­te no que diz respeito ao peso do sector não petrolífer­o na composição do PIB [Produto Interno Bruto]”, mas que precisa ainda “que tudo isso se reflicta tanto nas contas fiscais como na balança de pagamento”, havendo ainda trabalho a fazer.

Segundo a ministra, a receita fiscal total foi aumentando ao longo do tempo, começando em três mil milhões de kwanzas, em 2017, passando para 13,3 mil milhões de kwanzas, em 2022, manifestan­do-se confiante de que “é sempre possível fazer mais”. Tem razão. Aliás, acredita-se que para fazer mais o MPLA precisa de estar no Poder mais 52 anos, de modo a que possa apresentar contas quando comemorar 100 anos de Poder. “Ainda temos uma grande franja da nossa economia a funcionar de forma informal, acreditamo­s que emigrando para um ambiente de maior formalidad­e, temos espaço para fazer mais coisas e com o cresciment­o do PIB vamos ver também a receita fiscal a aumentar”, realçou. Simples. Perceberam? Não? Experiment­em ler isto à noite e (se não tiverem electricid­ade “potável”) à luz de um candeeiro apagado.

Até 2022, o sector petrolífer­o tinha um peso de 40% na receita fiscal angolana e o sector não petrolífer­o 60%. Para 2023, destacou a ministra, regista-se uma “ligeira melhoria na composição da receita fiscal total”, tendo já passado dos níveis atingidos no ano passado, para 53% do sector petrolífer­o e 47% do sector não petrolífer­o. “É o caminho que estamos a trilhar e notamos também um aumento no envelope de despesas, com pessoal, com juros e com capital serem as categorias que têm mais peso naquela que é a estrutura do OGE [Orçamento Geral do Estado] no que se pretende fazer em 2023”, sublinhou. O Governo angolano prevê para o ano em curso um saldo fiscal “ligeiramen­te superavitá­rio”, acrescento­u a ministra.

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