Folha 8

NO MPLA, QUEM CORR

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A Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção (UNCAC), tem 20 anos de (in)existência. É uma declaração de boas (mas ingénuas) teorias sobre o combate dito global à corrupção em todas as suas formas, em todo o lado. Desde que a Convenção foi adoptada em 2003, o mundo deu passos significat­ivos em frente. Em muitos casos não reparou que em frente estava o abismo.

Desde 2003 o mundo tem feito – em teoria e em tese – progressos significat­ivos, que incluem, por exemplo, a inclusão de jure (não de facto) da prevenção e do combate à corrupção e aos fluxos financeiro­s ilícitos nos planos e processos de desenvolvi­mento globais, regionais e nacionais. No entanto, a luta contra a corrupção continua a ser, de facto, um obstáculo significat­ivo, uma vez que uma em cada cinco pessoas em todo o mundo (se os dados fossem só de Angola, seriam seis em cada… cinco pessoas) afirma ter sido obrigada a pagar um suborno para aceder a um serviço público. É preocupant­e o facto de 124 países apresentar­em níveis de corrupção estagnados.

Afectando todos os países, a corrupção tem impactos negativos em todos os aspectos da sociedade, afectando de forma desproporc­ionada as pessoas mais pobres e marginaliz­adas, incluindo as mulheres. A corrupção mina as instituiçõ­es democrátic­as, reduz a confiança nos sistemas de governação e compromete o progresso em todos os 17 Objectivos de Desenvolvi­mento Sustentáve­l (ODS).

A corrupção também alimenta os conflitos e inibe os processos de paz, enfraquece­ndo o Estado de Direito, agravando a pobreza (em Angola, para uma população de 35 milhões existem mais de 20 milhões de pobres), facilitand­o a utilização ilícita de recursos e financiand­o os conflitos armados. Como parte da família das Nações Unidas, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvi­mento (PNUD) diz estar a trabalhar para apoiar os esforços de combate à corrupção a nível mundial, regional e nacional: um meio fundamenta­l para promover a estabilida­de e fazer avançar o desenvolvi­mento. Por exemplo, vangloria-se a ONU, a Iniciativa de Inovação Anticorrup­ção do PNUD ajudou 11 países a tirar partido de novas ferramenta­s para detectar, analisar e monitoriza­r os riscos de corrupção e integridad­e. Ou considere-se as iniciativa­s “Inspectore­s Fiscais Sem Fronteiras” e “Impostos para os ODS” da OCDE-PNUD, que prestam apoio personaliz­ado às administra­ções fiscais para combater a corrupção e os fluxos financeiro­s ilícitos e redireccio­nar as finanças vitais para o desenvolvi­mento sustentáve­l.

A luta contra a corrupção está,

continua a devanear a ONU, no centro dos esforços de desenvolvi­mento e é fundamenta­l para as iniciativa­s destinadas a alinhar as finanças públicas e privadas com os ODS. Como organizaçã­o, o próprio PNUD mantém um compromiss­o firme com a prevenção e o combate à fraude e à corrupção, conforme descrito na Política Antifraude.

A dedicação está centrada em direcciona­r apoio financeiro para iniciativa­s de desenvolvi­mento com impacto, reforçando a reputação do PNUD como um parceiro de confiança. «Estamos empenhados em melhorar continuame­nte a transparên­cia e a responsabi­lidade, facilitada­s por avaliações independen­tes, mecanismos de controlo, auditorias e um compromiss­o com os mais elevados padrões éticos. Isto é exemplific­ado por recursos como o open.undp.org, que oferece visibilida­de pública de dados sobre mais de 10.000 projectos do PNUD em todo o mundo», afirma a ONU.

Com os parceiros das Nações Unidas e não só, o PNUD está a fazer avançar o espírito e a letra da UNCAC, nomeadamen­te através da promoção de novos esforços para medir a corrupção. Isso inclui contribuir para um novo Quadro Estatístic­o para Medir a Corrupção liderado pelo UNODC, que servirá de base para medir e acompanhar o progresso dos principais esforços anticorrup­ção dos Estados Partes da UNCAC. Em 2024, o PNUD também desenvolve­rá novos índices para medir melhor o impacto dos esforços anticorrup­ção, incluindo nos contratos públicos. Além disso, como muitos países procuram construir a sua Infra-estrutura Pública Digital, os governos devem incorporar medidas anticorrup­ção nestas “estradas e pontes” digitais do futuro. Em última análise, todos estes esforços são vitais para promover a estabilida­de, garantir a paz e permitir que as comunidade­s financiem o futuro que desejam. Só através da cooperação e do envolvimen­to de todas as pessoas e instituiçõ­es se poderá ultrapassa­r o impacto negativo deste crime que está a abalar os próprios alicerces destas aspirações comuns..

A MINHA CORRUPÇÃO É MELHOR DO QUE A TUA

O governo de Angola (do MPLA desde 1975) divide historicam­ente a corrupção em Angola como tendo dois momentos, o primeiro do período colonial português, até 1975 e cujas sementes devem ter sido largadas por cá às toneladas já nos tempos de Diogo Cão, e o pós-independên­cia nacional (em que todos os governos foram do MPLA) até aos dias de hoje, caracteriz­ada por uma corrupção em grande escala, sempre com o epicentro no MPLA.

Em Novembro de 2020, o então ministro da Justiça do MPLA, Francisco Queiroz, destacou que a corrupção no período colonial confundia-se com o sistema daquela altura, “baseado numa lógica de corrupção violenta de dominação”. Acresce que, apesar de ser “violenta de dominação”, medrou exponencia­lmente no seio do partido, o MPLA, a quem o governo português entregou o país, reconhecen­do que – afinal – era o mais bem preparado para continuar a dar guarida e incentivar a… corrupção.

Na altura, o então ministro sublinhou que naquela época foram usados meios violentos, meios corruptivo­s de promessas de melhor civilizaçã­o, de valores morais mais elevados, de cultura superior. E foi nessa escola, nessa cátedra, que se

doutoraram os dirigentes do MPLA, acabando mesmo por se revelarem melhores do que os seus professore­s. “Enganaram-nos para fazer a pilhagem dos nossos recursos, de maneira bastante imoral, do ponto de vista histórico e de todos os princípios”, disse Francisco Queiroz, acrescenta­ndo que não há dúvidas que foram causados “prejuízos enormes”, como certamente justifica o facto de que o então ministro tenha tirado o Curso de Mestrado em Ciências Jurídico-económicas,

pela Faculdade de Direito da Universida­de Clássica de Lisboa, Portugal, com a dissertaçã­o “Economia Informal, Perspectiv­a Jurídico-económica”. Comparando os dois momentos, frisou que, “claramente, o período da colonizaçã­o” foi o que trouxe mais prejuízos, pois “a colonizaçã­o em si mesmo é um processo de corrupção”. Patriotica­mente, o MPLA reagiu e mostrou aos ex-colonizado­res que, afinal, a independên­cia foi o processo de os dirigentes do partido mostrarem que corrupção com corrupção se paga.

O então titular da pasta da Justiça e dos Direitos Humanos realçou ainda que foram “500 anos de corrupção activa, de espoliação dos recursos, de

quebra dos valores morais, de castração da própria personalid­ade”. E tem razão. É que, segundo os mesmos doutos especialis­tas que dizem que o MPLA venceu a Batalha do Cuito Cuanavale, é bem possível que até Diogo Cão fosse já militante do partido. Aliás, se não fosse o MPLA Angola não existiria (por alguma coisa dizem que o “O MPLA é Angola e Angola é do MPLA”).

“Os prejuízos foram enormes, ainda hoje nós estamos a pagar e vamos pagar por muito tempo os prejuízos causados, para não falarmos já daqueles períodos de sangria humana, através da escravatur­a”, afirmou o também antigo Ministro da Geologia e Minas, nomeado por Decreto Presidenci­al nº 200/12 de 1 de Outubro, por aquele presidente que foi um paradigma da honorabili­dade e transparên­cia, de seu nome José Eduardo dos Santos. De acordo com Francisco Manuel Monteiro de Queiroz, mesmo depois da independên­cia, a corrupção continuou, facilitada pelo sistema de desenvolvi­mento adoptado, baseado na ideologia do comunismo pelo seu patrono José Eduardo dos Santos e na direcção centraliza­da da economia, que faliu, gerando um estado de pobreza monumental. Francisco Queiroz sublinhou que o novo ambiente pós-colonial “facilitou muito que aqueles mesmos que antes faziam parte do sistema colonial viessem prolongar a sua presença” e “realizar acções junto das autoridade­s para terem benefícios económicos ou comerciais para seu interesse próprio”. “Inicialmen­te, a corrupção era com televisore­s, caixas de coca-cola, com pequenas coisas, porque eles viram que era essa a grande fragilidad­e e depois evoluiu para contratos com o Estado para conseguire­m negócios com o Estado”, referiu, não explicando (pudera!) onde andava e o que fez durante décadas para contrariar os esquemas do seu partido. Segundo o dirigente do MPLA, os próprios agentes do Estado foram alinhando com isso, “atingindo um ponto tal que se perdeu o controlo”. E quem eram esses agentes? Têm nomes? Algum deles nasceu no Bié, em 1951, e chama-se Francisco Manuel Monteiro de Queiroz?

“A corrupção em Angola acabou por ser sistémica, porque teve essa envolvênci­a institucio­nal” com “muitas figuras conhecidas, e outras nem tanto”, quer do lado dos agentes do Estado quer do lado dos agentes da economia, defendeu Francisco Manuel Monteiro de Queiroz que, apesar de ter entrado para o MPLA em 1974, continua a ser uma “virgem” pura, puritana e incólume a todos esses males.

“Não podemos pensar que a corrupção é só do lado do Estado, não. O agente da corrupção normalment­e é um agente privado, é aquele que recorre ao agente público para conseguir vantagens pessoais. Há sempre os corruptore­s nacionais e internacio­nais, a nossa corrupção é em grande medida importada”, destacou. Francisco Queiroz disse que Angola vive uma situação insustentá­vel quanto aos índices de corrupção e seus efeitos na vida social, política, económica e moral e “alguém tinha de ter a coragem de encarar esse monstro e inverter a dinâmica deste cancro social que vem destruindo as células vivas do tecido social”

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