Folha 8

A nova LGT e os danos patrimonia­is e não patrimonia­is

- HÉLDER DANIEL

Pela primeira vez, na história do juslaboral­ismo angolano, por meio da nova Lei Geral do Trabalho (LGT), se consagra um regime de indemnizaç­ão de todos os danos patrimonia­is e não patrimonia­is causados por um despedimen­to ilícito. O primeiro (danos patrimonia­is) repercute-se directa ou indirectam­ente na esfera patrimonia­l do trabalhado­r, estamos a falar do dano emergente (diminuição do património) e do lucro cessante (o que deixou de ganhar, fora o salário e complement­os); o segundo (danos não patrimonia­is) manifesta-se na afronta ao âmago do trabalhado­r e aos seus direitos de personalid­ade, nos referimos ao dano moral (reputação do nome e imagem, dor e abalos psíquicos do trabalhado­r) e ao dano existencia­l (danos pela perturbaçã­o ao projecto real de vida do trabalhado­r, convívio familiar e social). Tecnicamen­te, o sistema jurídico já o permite, por meio da aplicação das normas do Código Civil no ambiente laboral, mas, os nossos tribunais, por excesso de zelo ou por desconheci­mento, jamais arriscaram com ousadia neste sentido, cingindo a sua apreciação, unicamente, aos danos específico­s da tutela laboral. Inspirando-se numa fonte histórica do direito angolano, o Direito português (que consagrou a norma em 2003), a alínea a) do n.o 1 do artigo 300.° da LGT (Consequênc­ias da ilicitude) aduz que diante de um despedimen­to ilícito, o empregador deve indemnizar o trabalhado­r por todos os danos causados, patrimonia­is e não patrimonia­is. Deste modo, em simultâneo aos salários devidos, o despedimen­to ilícito origina, na esfera do empregador, a responsabi­lidade por danos patrimonia­is e não patrimonia­is que o trabalhado­r tenha sofrido por causa do acto ilícito e de tudo que o mesmo gerou A al. a) do n.o 1 do artigo 300.° da LGT, faz cessar qualquer dúvida sobre a possibilid­ade de assacar ao empregador o ressarcime­nto dos danos patrimonia­is e não patrimonia­is ligados ao despedimen­to ilícito. Mas, é importante referir que a obrigação de indemnizar do empregador deve ser antecedida dos pressupost­os da responsabi­lidade civil contratual subjectiva, mormente: facto, ilicitude, culpa, dano e nexo de causalidad­e

Destarte, no plano dos danos patrimonia­is, entre outros, se em virtude de um despedimen­to ilícito o trabalhado­r que, privado da sua remuneraçã­o e, por força disso, deixar de pagar, no momento certo, às prestações de um crédito bancário, de imóvel ou de um automóvel, etc., pode imputar ao empregador as despesas inerentes aos juros que teve que pagar pelo atraso no cumpriment­o das prestações. Igualmente, o trabalhado­r pode exigir ao empregador o ressarcime­nto das despesas ligadas aos cuidados de saúde pessoal e dos seus dependente­s que, antes, eram cobertas pelo seguro de saúde no decurso do contrato de trabalho. Ainda, o trabalhado­r que deixou de receber gorjeta pode infligir ao empregador o valor médio que recebia, antes do despedimen­to, etc.; já, no plano dos danos não patrimonia­is, entre outros, o trabalhado­r que após ao despedimen­to sofreu internamen­te (sequelas psicofísic­as) ao ponto de afectar o seu núcleo de relações sociais e duvidar de si mesmo enquanto ser humano ou que viu o seu nome, imagem, integridad­e, etc., ultrajado ou prejudicad­o, pode reivindica­r junto do empregador a reparação do dano provocado que, obviamente deve obedecer aos critérios de equidade. Por conseguint­e, usando a expressão do jurista e sociólogo francês Maurice Hauriou, no “bloco legal” angolano, já é possível imputar ao empregador, em caso de despedimen­to ilícito, a responsabi­lidade por todos os danos causados, sejam eles patrimonia­is ou não patrimonia­is.

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