Jornal Cultura

O PRIMEIRO DESCOBRIDO­R DO PARAÍSO DE FETI E CHOYA

-

Oprimeiro homem nasceu num paraíso localizado no curso superior do rio Cunene algumas dezenas de quilómetro­s depois da Babaera. Para uns, caiu do céu aos trambolhõe­s. Para outros, foi criado por Zambi, a partir de um rochedo que ele amoleceu e com essa massa granítica fez Feti, o Adão dos angolanos que habitam o Planalto Central, até à região de Caconda. A primeira mulher, Choya, nasceu no próprio rio, gerada pelo Rei das Águas.

No mosaico cultural do Cassai, desenhado e criado ao longo de milénios, o primeiro Homem é Congo, ilho de Suku, que também lhe deu vida a partir de um rochedo. O rio nasce em Angola e corre centenas de quilómetro­s em direcção ao grande Zaire ou Congo, onde desagua. Mesmo ao lado, médios e pequenos cursos de água avançam paci icamente para a vertente do Zambeze e lá vão para Oriente. Por esses caminhos foram os ilhos dos nossos ancestrais, povoando todo o Mundo.

O paraíso que recebeu o primeiro Homem ica situado a 75 quilómetro­s da cidade do Huambo, na estrada que liga ao Lubango. Nos anos 50, um professor primário, Júlio Diamantino Moura, descobriu o Éden angolano. Dava aulas na capital do planalto central. Nas férias escolares, arranjava uma equipa de ajudantes e explorava os rios da região, à procura de pepitas de ouro. Nessa actividade esquadrinh­ou o curso do rio Cunene desde a sua nascente até à Huíla. Um dia encontrou o paraíso.

Num texto colorido e empolgante, ele contou, no boletim do Instituto de Angola, como descobriu a casa de Feti, o primeiro Homem. Andava à procura de ouro, junto ao Cunene, a 75 quilómetro­s da cidade do Huambo. Na hora de descanso no acampament­o, ao início da noite, um elemento da equipa, nascido na região, contou quase em segredo que ali estava o “princípio de tudo” (Feti). E a lenda tornou-se real. Por trás de uma densa barreira vegetal, era o Éden. O princípio da Humanidade. A nossa casa.

No dia seguinte, Júlio Diamantino Moura decidiu explorar o território por trás da densa barreira vegetal. Os ajudantes não queriam acompanhál­o. Tinham uma razão de peso. No paraíso existe um rochedo, conhecido na região como a Pedra da Água. Quem olhava para a rocha ou lhe tocava, era imediatame­nte fulminado pela morte.

O professor primário não se comoveu com a lenda e marchou para o paraíso. Os ajudantes, timidament­e, acompanhar­am-no. E encontrara­m algo extraordin­ário. Júlio Diamantino Moura descreve no seu texto um grande espaço com a dimensão de um campo de futebol, coberto de cinza. E ossadas de pessoas e animais, mais ou menos encobertas.

Numa das extremidad­es, o paraíso de Feti tinha uma pirâmide de pedra, desmantela­da até quase metade da altura. As pedras que faltavam na construção estavam despalhada­s na zona. Muito perto, corre lentamente o Cunene.

Júlio Diamantino Moura durante três anos explorou a “casa” de Feti. Descobriu que por baixo da pirâmide existiam galerias que entretanto foram assoreadas, o que não permitia a circulação de pessoas.

Durante dias e dias, o professor primário e seus ajudantes desobstruí­ram as galerias e fizeram achados interessan­tes. Algumas flechas com ponta de ferro, alfaias agrícolas muito antigas, mas também enxadas da época. Apenas estavam cobertas de ferrugem.

Todos esses materiais foram desenterra­dos e levados para o Huambo. As investigaç­ões de Júlio Diamantino Moura estavam autorizada­s pelas autoridade­s locais e ele reportava todas as suas descoberta­s. Por- que havia a suspeita de que existia ali um tesouro fabuloso!

O Rei Lobengula

Lobengula, o rei dos Matabeles, em 1893 revoltou- se contra os ingleses. À frente dos guerreiros Ndebele e Shona, enfrentou os ocupantes. O Império Britânico tremeu. A guerra foi travada entre 1893 e 1897, na área do actual Zimbabwe .

As tropas de Lobengula tinham armas rudimentar­es e os ocupantes estavam bem armados. A derrota foi inevitável. O soberano retirou e entrou no território que é hoje a província do Cunene. Em Xangongo foi subindo o curso do rio, até Galangue. Trazia com ele um tesouro fabuloso, de mar im, pedras preciosas e ouro.

Quando chegou ao paraíso, resolveu enterrar as riquezas. Depois matou um a um, todos os que conheciam o local. Para sinalizar o sítio, mandou construir a pirâmide. Como disfarce, ao lado, foi criado um campo de sacrifício­s aos deuses, o que justifica as ossadas de pessoas e animais. A construção de pedra seria uma espécie de Totem.

O rei Lobengula desaparece­u sem deixar rasto. Ninguém, desde então, sabe para onde foi. Mas os sobrevi- ventes dos massacres dos ingleses ali construíra­m as suas casas, criaram o gado, cultivaram a terra e alimentava­m- se da abundante caça que ainda hoje existe.

Faraó exilado

Júlio Diamantino Moura descobriu outra versão. A pirâmide continua a ser um ponto de referência e um local sagrado, mas foi mandada construir por um faraó do Egipto, deposto pelo irmão.

O soberano conseguiu reunir muitas riquezas e fugiu acompanhad­o do seu séquito e protegido por guerreiros ferozes dispostos a tudo, para defenderem o seu Faraó. Desceram África até ao paraíso de Feti. As riquezas foram enterradas e um número restrito dos seus colaborado­res sabia que a pirâmide era o ponto de referência do tesouro enterrado.

O professor primário foi desobstrui­ndo as galerias, uma a uma, mas não encontrou qualquer tesouro. Escavou novas galerias, foi esventrand­o a terra à volta da pirâmide mas além das alfaias agrícolas e das lechas com ponta de ferro, nada encontrou. Se existia um tesouro, ele foi levado por outros. Feti é em si um tesouro extraordin­ário, à espera de ser aprecia-

 ??  ?? Pirâmide
Pirâmide

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Angola