DISCURSOSSCURSOS DO TEMPO
Neste livro, paraa lá do habitual rrecurso que Ulikaa faz aos prprovérbios, à informaçãomação que detémém sobresobr as instituiçõesões do poder tradicional,tr não é em vão queue o autor recorree aos anantepassados paraa o guiarguiarem em momentos de crisee ou ante circunstânciascunstâncias advadversas antee causas que
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Permitam-me dizer-vos que é para mim uma verdadeira honra e um extremo prazer apresentar-vos este livro de Timóteo Ulika, não só pelos créditos por ele conquistados tanto ao nível do ensaio com a sua “Contribuição para o Pensamento Histórico e Sociológico”, quanto ao nível da literatura, com as obras A rola de Thingandu, Kandundu e O julgamento do Homem, obra esta que antes de ser livro foi original, através do qual no Programa Antologia,por correspondência trocada com ele, conheci o autor, então residente no Namibe, num contexto ditado pelas circunstâncias e ambiente que podem ser percebidos a partir do conto “a Última Célula” que igura a páginas 111 deste livro, “Discursos do tempo…” que ora apresento.
Para mim, relativamente ao autor, foi aí “onde tudo começou”, como o próprio autorgosta de citar Jacinto e ele mesmo também escreve neste livro. Foi aí que percebi e conheci o autor que em toda a sua obra literária não abdica do recurso ao conhecimento e à tradição ancestral e, de forma particular ao texto oral, para trazer para a actualidade muitos elementos matriciais da angolanidade que, ancorados na diversidade cultural que caracteriza o nosso país, tal como um rioe seus a luentes, constituem os fundamentos sobre os quais se ergue a nação e que, portanto, precisam de ser cada vez mais valorizados e promovidos em favor da paz e do bem estar social. Aliás, neste livro, para lá do habitual recurso que Ulika faz aos provérbios, à informação que detém sobre as instituições do poder tradicional e outras instituições e práticas das sociedades tradicionais, não é em vão, nem é por mero acaso que o autor recorre aos antepassados para o guiarem e suportarem nos juramentos necessários em momentos de crise ou ante circunstâncias adversas ou ainda em momentos cruciais ante causas que parecem ou pareciam impossíveis.
Permitam-me entretanto dizer-vos que do ponto de vista da análise do texto literário, o competente prefácio do Doutor António Fernandes da Costa ao livro, aconselha-nos e obriga-nos mesmo a buscar o outro lado, os outros lados do texto que por vezes escapa aos especialistas da análise literária. Re iro-me à literatura como fonte auxiliar da história, a par da linguística e de outras ciências, tantas vezes esquecidas nessa tarefa o que leva a persistência dos erros tantas vezes presentes nas fontes escritas coloniais.
A par das suas características literárias e estéticas já invocadas no prefácio a que izemos referência, este livro de Timóteo Ulika impõe-se como fonte para a compreensão da História de Angola dos pelo menos últimos 50 anos. Aliás, sem me desviar desta obra, faço um parêntesis para a irmar que, a par de documentos escritos e fontes orais, é aconselhável aos estudiosos, não descurar a literatura angolana pois nela poderão encontrar pistas para o entendimento e enquadramento dos factos históricos que pretendem abordar. E discursos do tempo está recheado desses elementos.
“Guia de desembaraço”, conto que se inicia a páginas 23, para referir apenas este, pois o tema aparece de maneira frequente em muitos outros, poderá ajudar a conhecer o que foi na verdade a divisão da nossa sociedade entre indígenas e assimilados, doutra maneira, ente indígenas e cidadãos, processo que em larga medida ajuda a compreender a actualidade linguística angolana. Importa lembrar que essa divisão consagrada através do Acto Colonial de 1930 e re inado através do Decreto- Lei n º 39: 666, de 2 de Junho de 1954, só viria a ser extinto formalmente em Setembro de 1961, como consequência do início da Luta de Libertação Nacional, situação que no entanto, na realidade continuou a existir.
Para quem face às di iculdades do nosso quotidiano romanticamente evoca o tempo colonial como um tempo áureo e de coexistência racial pací ica, deste livro bastará ler o Conto homenagem, a páginas 127, ou o conto Os Gémeos de Salongue, a páginas 31, ou ainda lembrar-se que a partir das 5 da tarde, a Mutamba era um aglomerado de gente pobre, de patricíos, rumo aos musseques, no maximbombo 15, do muyungo, da linha 4 ou da linha 24, como o conto Imbomdeiro do Cazenga nos faz recordar, transformando-se então a zona do asfalto na cidade branca, a que no outro dia lavadeiras, criados, serviçais, funcionários subalternos, negros, mulatos e brancos pobres regressariam invariavelmente no dia seguinte. Discursos do tempo, é na verdade um conjunto de textos literá- rios de grande alcance histórico que nos permitem compreender a questão do contratado e do contrato que envolvendo angariadores de mão de obra barata forçaram muitos sulanos a trabalhar nas fazendas do norte, diríamos em regime de praticamente cativeiro e que geraram con litos e incompreensões entre ilhos da mesma pátria, assim como avivar a memória quanto a um processo migratório de angolanos em direcção às minas da África do Sul, o que deu origem aogénero musical Tchissossi retomado por autores como o Duo, depois Trio, Tchissossi e mais recentemente Fedy.
A luta de Libertação nacional, métodos e tácticas, formas de organização da mesma e do trabalho clandestino, as contradições dentro do sistema, da administração e do exército colonial, as alianças e “as desgraças” dos opositores e do nosso povo na causa comum conte o regime colonial, a descrença e a esperança, assim como elementos importantes que podem ajudar a compreender as situações que estiveram na origem do con lito armado que o país viveu e que felizmente para sempre terminou, o que em larga medida se pode perceber a partir da leitura do conto Destinos Cruzados, em que se revela como amigos e familiares ontem, se tornaram inimigos no dia seguinte, são elementos e situações que Timóteo Ulika nos narra literariamente com mestria.
Há livros que passam despercebidos até que um dia alguém neles repare. Espero porém que este livro do Timóteo Ulika não espere tanto tempo e ocupe o lugar que lhe devido. Portanto, meus caros, permitam-me felicitar o autor por este livro que muito tem para nos ensinar em termos de conhecimento da nossa história verdadeira, evitando assim que erros se repitam.
Discursos no tempo, traz-nos um percurso, muitas vezes ditados pelas circunstâncias e outros por opções próprias que muitas vezes se confundem com os nossos próprios, pelo que é também um avivar de muitas memórias.
Termino agradecendo ao Timóteo Ulika o que através da literatura traznos para a comprensão da história contemporânea de Angola e… inalmente, para nós, a con irmação sobre a origem do tchissossi e o ensinamento quanto à forma como se dança este género musical. Para quem o queira, é só consultar o conto Os gémeos de Salongue…