Jornal Cultura

AMAHIGUÈRÈ DOLO

E A ALMA NA NATUREZA DA ARTE

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Nascido no País Dogon,ogon, no Mali,M Amahiguèrè­higuèrè Dolo é reconhecid­oonhecido mundo afora af por suas esculturas­as que fazfazem nascer do barro ou de troncosos de madeiramad­eir obras de arte orgânicasg­ânicas que mesclam naturezana e artee art em uma mesma peça.

Amahiguèrè Dolo é reconhecid­o mundo afora por suas esculturas que fazem nascer do barro ou de troncos de madeira obras de arte orgânicas que mesclam natureza e arte em uma mesma peça. Nascido no País Dogon, no Mali, o artista, que também trabalha com argila, ferro e pintura, se destacou pelas galerias do mundo com obras feitas exclusivam­ente de materiais orgânicos e com matérias-primas simples como madeira, terracota e tintas naturais. Seu estilo aproxima a arte estética da arte natural, com formas complexas que se confundem e se mesclam com a brandura do meio ambiente. Para ele, a natureza já carrega a mensagem e o seu trabalho está em de inir e decifrar a alma de cada objecto, que por si mesmo é inspiração e é arte.

O escultor acredita que existe um jogo ambíguo que o caracteriz­a como artista. Para ele, a arte é universal e individual ao mesmo tempo e essas duas faces estarão sempre presentes no mundo de sua criativida­de. Dolo explica que antes de tudo, ele é um artista no sentido puro e directo da palavra e por isso sua arte fala, sobretudo, de si mesmo, de quem ele é no fundo. Suas escolhas são a de um artista e não a de um artista africano. Antes de ser de Dogon, de ser do Mali ou ser da África, ele é ele mesmo. É nesta de inição que ele encontra a ambiguidad­e, uma vez que ao mesmo tempo, ser ele mesmo é ser de onde ele vem. Tudo que faz é apoiado e embasado em sua cultura. Não por escolha, mas porque a própria obra fala do autor e de seu deslocamen­to no mundo. A conotação da origem estará sempre implícita, sendo maior do que o próprio artista.

“Eu venho do país Dogon, mas eu não trabalho para mostrar o país Dogon. São os outros que vêem, que adivinham e que pensam automatica­mente que tal escultura se assemelha a tal caracterís­tica da minha cultura. São os analistas que trazem esse olhar. O que eu faço é o que eu aprecio, são as coisas que moram em mim e que não podem ser outras que onde eu nasci e cresci. E se existe uma abertura onde é possível enxergar isso, então existe. Na matemática do trabalho que faço, se sente a África. E isso é claro”, explica Dolo ao reivindica­r a universali­dade da arte. Fora a representa­ção do seu “eu inteiro”, ele acredita ser um artista como os outros. Para ele, no imaginário não existe diferença, tudo rima em algum ponto. Pelo mundo, artistas podem falar da mesma coisa, e mesmo estar um dentro um do outro. A diferença está apenas na maneira de abordar a arte em sua base, uma vez que a obra de um artista obrigatori­amente o traduzirá.

“Eu sou o fruto da minha localidade, onde nasci, onde aprendi, onde me ensinaram, onde me formaram. Eu não posso aprender em outro lu- gar mais do que isso. Nos outros lugares, você aprende os complement­os. É a aprendizag­em de base que forma o teu verdadeiro eu”, continua o escultor que acredita que o que pode levar alguém longe é conhecer a si mesmo e às suas origens. Dolo é de origem animista e em suas obras a espiritual­idade ancestral fala mais alto. Ele acredita na cosmogonia complexa e atribui uma alma a cada ser presente na terra, animal ou material, e por isso defende que as formas não são gratuitas. Ao apontar um tronco de madeira, ele explica que ali a arte já está presente em seu feitio natural. E para esculpir é preciso deixar que o objecto tome sua própria forma, para depois apenas a inteirar e a complement­ar, destacando o que há de mais positivo nela.

Nas madeiras esculpidas, nos seus quadros pintados com terra pura, nas argilas moldadas: na arte de Amahiguèrè, a concepção é antes de tudo trabalhar o interior da escultura, a sua alma. Para depois, deixar a obra nascer. “Escolhas técnicas? Será que eu escolhi alguma coisa? Eu acho que a força está dentro do material. O animismo é deixar as coisas estarem. Nós estamos do lado de fora e somos nós, com nosso imaginário, que temos que compreende­r o objecto. É essa forma, essa maneira de compreensã­o que vai ser a maneira que ele deve ser. Só depois que você trabalha a parte interna, é que existe uma externa, é que aquilo se transforma em material”, ilustra o artista ao ser perguntado por suas motivações.

Inspirado pela natureza na sua forma pura, ele acredita que cada matéria tem em si uma palavra a ser compreendi­da e captada por quem a trabalha, uma vez que os materiais da natureza trazem algo além daquilo que é visível: “A água tem uma função visível e invisível em relação ao homem. O vento, a terra e outros componente­s também. O animismo é esse aspecto orgânico e é também o respeito a ele.

O artista pode fazer parte da tradução entre os dois mundos. Ele tem que aproveitar dentro do quotidiano o movimento e a luidez natural dos elementos naturais e para fazer isso é preciso de alma e de ânimo”, ilustra o escultor, adicionand­o que o conceito actual de arte é uma criação burguesa. Para ele, a arte na sua origem é um espelho do passado e do presente e a cintilação do amanhã, é o sacri ício de nos colocar em conexão com os entes invisíveis e com o futuro que ninguém conhece.

A arte é aceitar que somos todos susceptíve­is desse futuro. A arte se desdobra em si mesma, servindo para que a sociedade leia a natureza e todas as suas formas na sua face mais positiva. Por im, para Amahiguèrè Dolo, deixar um objecto existir é iluminar o que nos espera de melhor no nosso destino.

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Arte de Natan Aquino
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FLORA PEREIRA DA SILVA (AFREAKA)

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