BANDA DESENHADA EM ANGOLA O FUTURO DA ARTE NUMA NOVA PERSPECTIVA
Um mundo diferente, povoado de novas perspectivas, está a ganhar dimensão mundial, através da banda desenhada. A sétima arte tem ajudado a divulgar, actualmente, todo um universo de histórias e personagens, que ganharam maior fôlego no início do século XX, mais precisamente em 1930, quando começou a se criar o “universo dos super-heróis”, nos EUA, ou de jovens detectives como Tintin, na Europa, ou os mangás, no Japão.
Assim começou o “boom” de uma arte, que ganhou nomes diferentes ao longo dos anos, mas sempre cumpriu com o seu objectivo: contar histórias (reais ou ficcionárias) em diferentes géneros e estilos. Estas novas formas gráficas de narrar determinados acontecimentos, que inicialmente “nasceu” na Europa, mas se desenvolveu nos EUA, teve os jornais como porta para o mundo.
Hoje, anos depois de se afastarem um pouco mais dos jornais e conquistarem um espaço próprio, o “patinho feio” das artes tornou-se num cisne. Nem mesmo Ricciotto Canudo, quando enumerou as artes, imaginaria que um dia a banda desenhada atingiria tal sucesso. Actualmente, com o cinema como mola impulsionadora, todo um universo de “bolso”, escondido de muitas gerações, começou a ser divulgado. Grandes sucessos de bilheteiras, como “Super-Homem”, “Vingadores”, ou até mesmo “Tintin”, estão a voltar à curiosidade de todos graças ao trabalho da “máquina Hollywoodiana”.
Com trabalhos divulgados em todo o mundo, muitos acreditavam que a banda desenhada, tal como os livros ísicos, morreria, com o advento das novas tecnologias do século XXI. Porém, mais uma vez, ela sobreviveu e continua a se inovar anualmente, quer no formato ísico quer no digital.
Contrariamente ao que muitos pensam, as mensagens da banda desenhada não são apenas direccionadas ao público adolescente ou juvenil. O género evoluiu tanto, que conseguiu ir mais além das fronteiras dos “nerds” com apoio da cultura pop, criando hoje um segmento bem mais amplo, com o qual já muitos se identi icam, não só além fronteiras, como também em Angola.
VISÃO INTERNA
Apesar dos avanços e do crescimento actual, a banda desenhada ainda continua ligada a sua primeira passagem para o mundo, os jornais. Em Angola, mesmo com a realização de um festival internacional, o Luanda Cartoon, a nona arte ainda está muito “amarrada” a imprensa. Em alguns títulos, os cartoonistas (desenhadores) têm criado as suas próprias personagens, que um dia, como alguns prometem, podem sair também para conquistar o mundo.
Títulos das Edições Novembro, como o Jornal de Angola, Jornal Cultura ou o Metropolitano abriram um espaço para este género, que, como se pode constatar anualmente, em cada edição do Luanda Cartoon, já tem um público a icionado, na sua maioria jovem, facto que representa a garantia de sucessão de um legado.
Embora o Luanda Cartoon seja um espaço criado inicialmente para os cartoonistas e os desenhadores (autores de banda desenhada), actualmente o festival tem sido o local ideal para juntar outros estilos. O cartoon (desenho animado na tradução portuguesa do termo inglês) continua a ser o que mais espaço tem nos jornais angolanos, ao contrário da banda desenhada. A escolha, em parte, deve-se a proximidade que este estilo cria no leitor, ao representar diversas críticas sociais, através das imagens.
Muitos dos desenhadores nacionais têm visto no cartoon o seu melhor “mercado de trabalho”. A maioria utiliza a caricatura para fazer criticas à sociedade e com isso “vender” o seu produto ao público. Para os jornais, esta acaba por ser a melhor saída, o que os leva a relegar a banda desenhada para segundo plano.
Se um erro ou não, a decisão depende, em parte, de quem dirige estes títulos, como diz o cartoonista Armando Pululu, criador da personagem de banda desenhada “Ti Chico”. Para o desenhador, já se pode viver de algumas artes em Angola. A banda desenhada ainda tem muito para ser traba- lhada, mas o cartoon é um estilo com um mercado de trabalho bem assente no país, principalmente nos jornais.
“Antes existiam muitas di iculdades, mas hoje já existe um espaço e até mesmo oportunidades para a formação”, disse, adiantando que o principal cuidado a se ter agora é com o conteúdo das mensagens. Outra chamada de atenção vai, como acontece na maioria das artes, para o pouco interesse dos empresários nacionais. “A popularidade alcançada com projectos como o Luanda Cartoon ainda não é su iciente para despertar o interesse de quem pode apostar nos talentos nacionais. Não é uma realidade que afecta só a banda desenhada, mas todas as artes”, lamenta o desenhador, que está a reunir condições ( inanceiras) para publicar, em livro, as histórias da sua personagem, “Ti Chico”.
Depois de anos a desenhar e a tentar se impor no mercado do cartoon e da banda desenhada, Armando Pululu prevê um futuro promissor para os criadores desta arte, principalmente ao rever toda uma trajectória, que teve “nomes de peso” entre as ileiras, com destaque para Henrique Abranches, Lito Silva ou Sérgio Piçarra. “Acredito que o legado deixado por estes teve sequência e está prestes a ganhar uma maior dimensão com a próxima geração.”
EDUCAR PELO DESENHO
Uma das maiores questões em relação a projecção da banda desenhada é a da produção, conteúdo das mensagens e divulgação dos trabalhos, para o professor de desenho José Teles Francisco, que vê na educação das novas gerações a possibilidade de se fortalecer ainda mais o mercado e criar já os leitores de amanhã.
Gicartes Teles, de nome artístico, chama ainda atenção para a importância de se aproximar mais a banda desenhada das crianças. “É uma das formas mais fáceis de comunicação e de aprendizagem. A relação entre o texto curto e as imagens típicas desta arte são uma forma e iciente de ensino. A criança tende a associar rapidamente as imagens as palavras.”
Actualmente, conta, a banda desenhada já tem esta função, mas infelizmente ela não é ainda direccionada ao público infantil, mas sim adolescente, jovens e adultos, através de projectos particulares de algumas instituições ou ministérios, em particular durante as campanhas de sensibilização da população em relação a um determinado assunto.
“É preciso ir mais além”, pede, acrescentando que muita vezes este projectos de sensibilização chegam até um público que não tem o hábito de ler ou tem muitas di iculdades de o fazer. “Por isso, o ideal seria começar a reforçar a aposta nas crianças”, continuou o professor que dá aulas aos meninos que frequentam o Olindomar Estúdios.
Com uma metodologia diferente da usada pelas escolas convencionais, Gicartes Teles procura associar o desenho a capacidade criativa e de escrita das crianças. A justi icação, conta, é o facto de, às vezes, termos bons desenhadores e péssimos argumentistas. A banda desenhada, explica, deve ser vista como um “casamento perfeito” entre a escrita e o desenho e no país ainda existe um de icit acentuado neste ponto.
A participação de Angola em alguns festivais internacionais de banda desenhada já é um passo grande ao reconhecimento do trabalho dos desenhadores e cartoonistas angolanos. Agora, diz, é preciso aprender a destrinçar o que cada um faz, criar um mercado mais forte e um público para os dois estilos, assim como deve-se começar a pensar no surgimento de uma indústria do género, capaz de vender os seus produtos, inicialmente a nível dos países lusófonos, depois os africanos e no inal para o mundo.