Banda Desenhada Evolução e (in)produtividade
Com uma exposição de mais de cem obras, entre caricaturas, ilustrações e Banda Desenhada (BD), de 43 artistas angolanos e estrangeiros, a 15.ª edição do Festival Internacional de Banda Desenhada e Animação (Luanda Cartoon) deixou mais uma vez em evidência o talento dos criadores angolanos.
Além do Centro Cultural Português, a mostra e as actividades, que encerraram a 31 de Agosto, estiveram igualmente patentes na Casa de Cultura do Rangel e no Estúdio Olindomar; é que as mais de mil e quinhentas obras que chegaram à organização obrigaram a alargar o festival para três salas. Dos mil cartoonistas inscritos, na sua maioria jovens, apenas 40 puderam representar as suas obras no Camões, enquanto os restantes expuseram nas duas novas salas abertas pela primeira vez.
Com o objectivo de provocar uma re lexão alargada sobre a Banda Desenhada no país, descobrir novos talentos, conquistar novos leitores, animar o intercâmbio entre artistas nacionais e estrangeiros, o Festival acabou por ser um verdadeiro palco da evolução da qualidade do trabalho apresentado pelos artistas nacionais e do aumento de público. "Estamos muito felizes porque percebemos que cada vez mais o nosso público demonstra interesse pelo desenho”, regozija-se Lindomar de Sousa que, ao lado do irmão Olímpio de Sousa, promove o evento desde 2003 e que se tornou único do género em Angola, além de ser um evento de referência na banda desenhada da África Austral, e o mais importante dos Países Africanos de Língua O icial Portuguesa (PALOP).
O cartoonista Júlio Pinto revelouse igualmente feliz com a aderência do público. Autor da obra “Eles ainda Cantam”, em exposição, o artista junta-se ao coro dos seus colegas que pedem mais apoios para a produção de obras, com a finalidade de incentivar a criatividade dos novos talentos. “Temos muitos talentos, mas temos tidos muitas dificuldades para a produção de obras, factor que constitui um obstáculo ao crescimento da banda desenhada".
A visível qualidade nos trabalhos de Laudo Pereira, Luís Airosa, Braulio Cole, Deban, Júlio, Isabel, Casimiro, Jacob Lopes, Tché Gougel, Lindomar de Sousa, Pedro Tchivinda, Tim, Calles Bossas, Nelson Paim e André Diniz, entre outros, não deixou dúvidas a quem visitou as exposições: é chegado o momento de se apostar na produção de livros de Banda Desenhada.
E o experiente Lindomar de Sousa não perde a oportunidade e faz o seu manifesto: “O estado da banda desenhada é este: há muitos talentos e pouca produção, porque é muito di ícil produzir obras aqui em Angola. Já seria o momento de produzir mais livros de Banda Desenhada!”.
O cartoonista mostrou-se preocupado com o aumento do número de jovens cartoonistas que não conseguem publicar as suas produções e revela ainda ser estranho haver poucos livros ilustrativos no mercado angolano. Artista premiado no país e no estrangeiro, Lindomar de Sousa entende que o banda desenhista é o ilho órfão da literatura e da arte plástica, ou seja, “é um ilho bastardo das letras e do desenho porque além da pintura há a presença do texto”. Os artistas estrangeiros convidados não deixaram de reconhecer o potencial criativo dos jovens criadores angolanos.
O artista brasileiro André Dinis, que apresentou "Malditos Amigos" e "Olimpo Tropical", que retratam questões relacionadas com a depressão nas grandes cidades como São Paulo (Brasil) e a delinquência, respectivamente, enalteceu a capacidade artística dos novos talentos angolanos. "Estou feliz por cá estar, pois serve para interagir com os criadores angolanos. Este evento vai contribuir para o crescimento da banda desenhada em Angola".
Enquanto isso, Weberson Santiago, também de nacionalidade brasileira, admitiu o empenho dos jovens e aconselhou-os a engajarem-se mais para o alcance da qualidade nos seus trabalhos. "Sinto-me satisfeito com a qualidade dos trabalhos dos criadores angolanos, o que representa, de certo modo, o empenho dos fazedores da banda desenhada no seu todo", destacou o artista brasileiro. Além dos cartoonistas brasileiros, o congolês democrático, Jeremie Nsing, também foi um dos grandes convidados do even- to, e apresentou duas obras que retratam o con lito entre os géneros, através das palavras e da exploração de mulheres. O artista avançou que sempre almejou participar no Luanda Cartoon, por se tratar de um festival de carácter internacional, de referência na região da África Austral, estando este entre os mais cotados.
Entretanto, logo depois do arranque do evento icou-se a saber que a organização estava de luto. Osvaldo Bala (Vavá), um dos impulsionadores do certame, foi sepultado no dia da abertura do Luanda Cartoon. “Estamos extremamente arrasados com o facto, mas como o festival não é só nosso, tivemos que reunir forças para prosseguir. Acreditamos que ele também faria o mesmo. Deste modo, estamos a fazer o festival neste dia de tristeza, mas não deixa de ser uma festa”, enfatizou Lindomar de Sousa, director do evento que, na sua 15.ª edição, presta ainda uma homenagem à moda, um tributo que se deve a sua constante ligação à Banda Desenhada por meio das obras que retratam várias épocas. “Os artistas quando fazem os seus trabalhos, muitas vezes com temas que re lectem uma determinada época e a moda, sempre estiveram ligados a isso. Por exemplo, um trabalho que retrata os anos 80 é impossível fazer-se sem ilustrar a tendência da moda desta época".