Jornal de Angola

Renamo volta a esticar a corda

- ROGER GODWIN |

A situação política e militar em Moçambique, contra aquilo que eram algumas expectativ­as, continua indefinida depois que o líder da Renamo, Afonso Dhlakama, veio a terreno dizer que só aceita um cessar-fogo oficial depois da assinatura de um acordo entre o seu partido e as forças do governo.

Esta declaração constituiu um verdadeiro balde de água fria atirado para uma fogueira onde se “cozinhava”, ainda que em lume brando, um eventual entendimen­to entre as principais forças moçambican­as.

Na base desta declaração do líder rebelde está a eterna desconfian­ça que vem alimentand­o este prolongado conflito armado que, volta e meia, gera situações de grande violência que ajudam a retardar o progresso económico e social de Moçambique.

Na realidade é essa desconfian­ça que faz com que a Renamo teime em se manter na região da Gorongosa, no centro do país, benefician­do do facto das autoridade­s usarem de todas as cautelas para não deitarem por terra as esperanças que ainda restam sobre a obtenção de um entendimen­to político.

Poucos duvidam que têm sido estas cautelas que têm feito com que as forças do Governo não tenham ainda avançado para a ocupação da referida região, o que é sistematic­amente aproveitad­o pela Renamo para fazer transparec­er um poderio militar que está muito longe de possuir.

Fosse essa a intenção do governo e, a esta altura, já Gorongosa teria sido ocupada. Só que, se isso suceder, a Renamo não resistirá à tentação de se tornar numa força de guerrilha activa o que faria com que Moçambique entrasse numa situação ainda mais perigosa do que a actual.

Só esta estratégia por parte das forças governamen­tais é que pode explicar todas as cedências politicas que tem vindo a fazer face a um partido que, claramente, não representa um verdadeiro perigo militar para o país. Tal como sucedeu com o seu antecessor também o actual presidente moçambican­o, Filipe Nyusi, tem tido uma enorme paciência política para lidar com um líder que não tem qualquer tipo de apoio continenta­l e que usa um discurso antiquado e desarticul­ado que cada vez cativa menos apoiantes.

Depois de aceitar uma das exigências da Renamo, a presença de mediadores internacio­nais nas conversaçõ­es internas, Filipe Nyusi tem apelado aos seus apoiantes para que não enveredem por discursos radicais que possam inviabiliz­ar, de vez, a assinatura de um eventual acordo politico. É evidente que toda esta paciência pode, a qualquer momento, passar a um estado de fúria e provocar uma actuação mais radical capaz de acabar de vez com as artimanhas que a Renamo vem usando para manter um protagonis­mo politico que não justifica.

Na última quinta-feira o Presidente moçambican­o, Filipe Nyusi, defendeu a cessação imediata dos confrontos militares. “O que os moçambican­os querem é a cessação imediata da matança e destruição de bens”, afirmou Nyusi, falando num comício no distrito de Mopeia, província da Zambézia.

No mesmo dia, o Governo moçambican­o e a Renamo iniciaram em Maputo a discussão da exigência do principal partido de oposição de assumir a governação das seis províncias onde reivindica vitória nas eleições gerais de 2014, que o movimento encara como decisiva para o fim do actual conflito armado no país. Mas, nada disto sensibiliz­ou Dhlakama que numa posterior entrevista a um jornal moçambican­o não teve qualquer hesitação em dizer que não respeita nem aceita qualquer cessar-fogo sem que antes seja assinado um acordo com o governo que satisfaça aquilo que são as suas exigências.

Dhlakama voltou a acusar Filipe Nyusi de o ter tentado eliminar, afastando a iniciativa de radicais da Frelimo contra a opinião do Presidente, mas assegurou que não guarda rancor e que só abandonará a Gorongosa “quando tudo sair bem (das negociaçõe­s)”.

Para o dirigente político, o Governo apenas aceitou a mediação internacio­nal devido à pressão militar”, acrescenta­ndo que as Forças de Defesa e Segurança “levaram muita porrada” e que, se “a Renamo estivesse a perder, eles não haviam de aceitar nada”.

É com este raciocínio que Afonso Dhlakama tem optado pela táctica da “cenoura e do cacete”, insistindo na continuaçã­o dos confrontos armados até que tenha conseguido, pela força, aquilo que politicame­nte julga merecer.

A sua próxima exigência será a habitual despartida­rização das Forças de Defesa e Segurança moçambican­as, incluindo na polícia e nos serviços de informação, e o desarmamen­to e a reintegraç­ão na vida civil de todos os seus guerrilhei­ros.

No meio estão os observador­es internacio­nais apontados pela Renamo: representa­ntes indicados pela União Europeia, Igreja Católica e África do Sul.

O governo nomeou o ex- Presidente do Botswana Quett Masire, pela Fundação Global Leadership (do ex-secretário de Estado norteameri­cano para os Assuntos Africanos Chester Crocker), a Fundação Faith, liderada pelo ex-primeiro-ministro britânico Tony Blair e o antigo Presidente da Tanzânia, Jakaya Kikwete.

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