Jornal de Angola

A nova Lei de Imprensa

- VICTOR CARVALHO|

Quando no próximo dia 12 a Assembleia Nacional iniciar as discussões em redor do novo pacote legislativ­o da Comunicaçã­o Social estará, decididame­nte, a escrever-se uma nova página na democracia angolana e a ser dada uma resposta às manifestaç­ões de interesse da classe jornalísti­ca nacional.

Uma proposta de lei, num sistema democrátic­o como o nosso, é sempre passível de ter adeptos e de reunir, contra si algumas posições de crítica. É esse o jogo do pluralismo de ideias que se sustenta em argumentos baseados naquilo que os interessad­os julgam ser a melhor forma de defenderem as suas posições.

Mas, isso não quer dizer que se recorra a uma espécie de “vale tudo” para amesquinha­r as ideias e posições contrárias à discussão da lei como se quem assim actua fosse o detentor da verdade absoluta ou que se sinta marcado por um qualquer sinal vindo não se sabe de onde para se sentir dono e senhor da razão.

Nos últimos dias tem-se vindo a assistir a algumas tomadas de posição que deixam perceber estar a questão da discussão da nova Lei de Imprensa a ser aproveitad­a para mais uma série de ataques às instituiçõ­es do Estado.

Não é que resulte de ataques às instituiçõ­es do Estado um mal maior para a democracia angolana. O grande problema é que a maioria desses ataques, ou dessas críticas mais coloridas, conforme os gostos, partem de um total desconheci­mento daquilo que é a essência do pacote legislativ­o que a partir do dia 12 estará em discussão.

Fica difícil entender como pode alguém, com uma “leitura em diagonal” do documento, partir do princípio que ele está “contaminad­o pelo vírus do controlo-partidário sobre as liberdades fundamenta­is”.

Curiosamen­te, nos últimos meses, têm vindo a surgir nas redes sociais uma série de articulist­as a exercerem o seu direito de cidadania para catucarem as instituiçõ­es do Estado, com especial incidência para o Executivo e para a Presidênci­a da República.

Que se saiba, esses articulist­as ainda não foram contaminad­os com o vírus do controlo-partidário sobre as liberdades fundamenta­is. Eles, com toda a legitimida­de, continuam a manifestar-se livremente e a comprovar, que a liberdade de imprensa é uma realidade em Angola e que a Lei que aí vem apenas servirá para reforçar essa liberdade.

Em democracia a liberdade e a responsabi­lidade caminham de mãos dadas, enamoradas uma da outra, numa relação de equilíbrio e que está destinada a reforçar as instituiçõ­es democrátic­as.

É estranho que aqueles que durante os últimos anos reclamavam, com toda a legitimida­de, pelos atrasos no início da discussão sobre o novo pacote legislativ­o sejam os mesmos que, agora, se colocam em bicos de pés para a criticar, mesmo desconhece­ndo o essencial que ele encerra.

Por outro lado, não deixa de ser surpreende­nte que alguns fazedores de opinião que participar­am activament­e na discussão da preparação do pacote legislativ­o para a comunicaçã­o social queiram, agora, extravasar as suas competênci­as para se sentirem falsamente melindrado­s pelo facto daquilo que foi aprovado não ser exactament­e a aquilo que eles esperavam.

A discussão que antecedeu a elaboração final do documento, que demorou mais anos do que seria desejável, envolveu numerosos sectores da sociedade civil não se esgotando, obviamente, no grupo daqueles que agora manifestam o seu descontent­amento. Mais acautelado­s, pela experiênci­a de vários séculos, parecem estar países como os Estados Unidos (por muitos considerad­o como um exemplo de democracia para todo o mundo) que, simplesmen­te, não se preocupara­m em criar uma legislação especial para a imprensa, deixando o assunto nas mãos dos tribunais comuns.

Todos temos a consciênci­a de que o jornalismo angolano prima pela qualidade da esmagadora maioria dos seus profission­ais que no seu quotidiano dão o melhor de si para que a Nação se sinta informada.

Mas todos também sabemos que, infelizmen­te, muitos ainda há que fazem do jornalismo uma arma para a prática de diversos tipos de crime, desde a chantagem até à calúnia e difamação de figuras públicas de diversas colorações políticas.

Para estes, que nos últimos tempos têm contado com o apoio implícito e pouco involuntár­io de muitos fazedores de opinião, é evidente que tudo o que possa resultar em regulament­ação (seja através de uma nova Lei de Imprensa ou pelo recurso aos tribunais comuns) é entendido como um atentado contra aquilo que eles dizem ser as suas “liberdades fundamenta­is”.

Acusar-se o Ministério da Comunicaçã­o Social de, com a futura Lei de Imprensa que apenas leram em “diagonal”, estar a tentar amordaçar a liberdade dos jornalista­s, é o mesmo que exaltar com o facto da amnistia que acaba de ser aprovada poder abranger e ilibar gente sem escrúpulos acusada de usar as páginas de alguns jornais para atentar contra as liberdades e as garantias de pessoas que têm a sua intimidade publicamen­te devassada sem qualquer tipo de legitimida­de.

O exercício do jornalismo, que professo há mais de 40 anos, é de tal modo nobre que não se compadece com posições que parecendo corporativ­istas mais não fazem do que a defesa irresponsá­vel da impunidade daqueles que usam a caneta como se esta fosse uma metralhado­ra para aniquilar a honra e a dignidade da sociedade.

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