Dilma Rousseff denuncia golpe
A Presidente brasileira está suspensa há quatro meses e discursou ontem perante o Senado, defendendo o segundo mandato para o qual foi eleita e acusou muitos políticos de quererem atacar o que foi uma escolha de mais de 54 milhões de brasileiros. Num longo discurso, Dilma Rousseff começou por defender-se ao afirmar que ao exercer o cargo de Presidente da República respeitou a vontade do povo e assumiu o compromisso de uma nação, declarando que se orgulha do segundo mandato que venceu em Janeiro de 2015.
A Presidente do Brasil, Dilma Rousseff, não poupou nas palavras na sua defesa perante o Senado, no julgamento em que pode vir a ser destituída do cargo, do qual está suspensa desde Maio: “Cassar o meu mandato é como submeter-me a uma pena de morte política”, afirmou, fazendo comparações com o seu julgamento durante a ditadura. Neste momento, disse, o Brasil está “a um passo de uma grave ruptura institucional. Estamos a um passo da concretização de um verdadeiro golpe de Estado”.
Como golpistas não hesitou em identificar Eduardo Cunha, ex-presidente da Câmara dos Deputados, eleito pelo Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), acusado dos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro no processo de corrupção da Petrobras, investigado pela operação Lava Jato.
Cunha deveria ser um aliado no Governo mas tornou-se o pior inimigo de Dilma Rousseff: “Todos sabem que esse processo de ‘impeachment’ teve início numa chantagem explícita do ex-presidente da Câmara”, afirmou a política do Partido dos Trabalhadores (PT).
A chantagem teve a ver com as suspeitas de corrupção de que foi alvo, na Lava Jato, como as de que recebera um suborno de cinco milhões de dólares e além disso tinha contas na Suíça, com “despesas completamente incompatíveis com os seus rendimentos lícitos”. Durante o ano de 2015, Cunha tentou forçar o partido de Dilma a votar para o proteger da investigação, em troca de a manter a salvo do ‘impeachement’, que começou a ser falado pouco depois de Rousseff tomar posse para o segundo mandato, no início de 2015.
A sua vitória nas eleições presidenciais de 2014, face a Aécio Neves, do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), diz Rousseff, foram o verdadeiro gatilho de Primeira Presidente da história do Brasil enfrenta a oposição de cabeça erguida todo este processo. “A possibilidade de ‘impeachment’ tornou-se o assunto principal nos media dois meses após a minha eleição, apesar da falta de fundamentação evidente”, acusou a ainda Presidente brasileira.
“Arquitectaram a minha destituição, independentemente de quaisquer factos que pudessem justificar a minha destituição”, afirmou. “Não cometam o crime de condenar uma inocente.”
Os senadores confrontaram-na com a acusação de ter usado dinheiro dos bancos estatais para aumentar o investimento público durante o ano eleitoral de 2014. Rousseff respondeu que este dinheiro não teve impacto no défice total e foi pago no ano seguinte.
Em suma, a Presidente defende-se destas acusações – muitos analistas dizem que esta contabilidade criativa não é muito diferente da realizada por outros governos. Foi o que disse o ex-ministro da Economia, Nelson Barbosa, ouvido como testemunha. Mas para os acusadores, como o senador Cássio Cunha Lima (Partido da Social Democracia Brasileira, PSDB), o que está em causa é “a maior fraude orçamental da história do país”.
“Vocês estão criminalizando a política orçamental”, acusa a Presidente. “Desde 2009 nós começámos a enfrentar a maior crise que houve no mundo depois de 1929”, diz Rousseff, respondendo às perguntas dos senadores no plenário, justificando-se com a crise internacional pós-2008 e do seu impacto na economia brasileira.
“As provas produzidas deixam claro que as acusações contra mim são meros pretextos”, sublinhou a Presidente. Se Dilma Rousseff perder o mandato, não pode ser eleita para cargos públicos durante oito anos.
As previsões actuais, feitas pelo site Atlas Político, apontam para que 55 senadores votem a favor da destituição, e 26 contra.
Temer e democracia
“Peço que façam justiça a uma Presidente honesta. Votem contra o ‘impeachment’. Votem a democracia”, pediu Dilma. “Não luto pelo meu mandato, por vaidade ou por apego ao poder. Luto pela democracia, pela verdade e pela justiça. Luto pelo povo do meu país”, declarou.
O seu discurso foi cheio de críticas ao presidente interino, Michel Temer, que de seu apoiante se tornou um inimigo durante o processo de destituição. “Entre os meus defeitos não está a deslealdade e a cobardia. Aos quase 70 anos de idade, não seria agora, sendo mãe e avó, que abriria mão dos meus princípios”.
Dilma mencionou o facto de o Governo Temer ser composto maioritariamente por homens brancos e ter um programa mais interessado em acomodar os interesses dos mercados do que nas medidas sociais. “É um Governo que dispensa negros na sua governação, que revela desprezo pelo programa escolhido pelos eleitores em 2014. O que está em jogo no processo de ‘impeachment’ não é só o meu mandato. O que está em jogo é o respeito pelos eleitores, a Constituição, os ganhos dos últimos 13 anos, conquistas da classe média, jovens, valorização do salário mínimo, os médicos atendendo a população, o sonho de casa própria”, afirmou Dilma Rousseff.
Nas redes sociais, reproduz-se a batalha que se joga no interior do Senado: os partidários de Dilma promovem a hashtag #PelaDemocracia no Twitter e os opositores dizem #TchauQuerida no Facebook, relata o site Broadcast Político.
Miguel Rossetto, ex-ministro do Governo Dilma, sugeriu que o partido pode ir à luta pela realização de eleições directas se a Presidente Dilma for destituída.