E os Koevoet começam a recuar
posicionamento forte de Martti Ahtisaari.
A 4 De Agosto de 1989, num seminário organizado pelo Instituto de Estudos Estratégicos, em Pretória, o representante do secretáriogeral das Nações Unidas na Namíbia disse que “a maioria dos elementos do PLAN tinha regressado à Namíbia como civis, a estrutura de comando do PLAN tinha sido desmantelada e as armas do PLAN estavam armazenadas e guardadas, a sete chaves, em Angola”, pelo que, nos termos da Resolução 435/78 do Conselho de Segurança, não havia necessidade de se continuarem as operações de contrasubversão da Polícia do Sudoeste Africano no norte da Namíbia.
Esta afirmação de Martti Ahtisaari constituiu um golpe directo desferido contra os racistas sulafricanos, e particularmente contra o administrador-geral do Sudoeste Africano, Louis Pienaar, que continuamente reproduzia os argumentos da RAS e justificava a presença dos Koevoet no Norte da Namíbia com a potencial ameaça que os elementos do PLAN representavam.
O argumento já não tinha razão de ser e era agora mister que todos os elementos dos Koevoet integrados na Polícia do Sudoeste Africano (SWAPOL) fossem imediatamente desmobilizados e reintegrados na sociedade.
No entanto, Pretória recusava-se a seguir as decisões da ONU e mantinha resolutamente as suas bases no Norte da Namíbia. Segundo Vezera Bob Kandetu, director dos Serviços de Informação e Monitorização das Igrejas em Windhoek, até 9 de Agosto de 1989 mais de 400 queixas ainda envolviam as actividades da unidade Koevoet na Namíbia e tinham sido apresentadas à UNTAG.
A 10 de Agosto de 1989, Martii Artisaari voltou a pronunciar-se sobre a intransigência de Pretória, desta vez em Stellenbosch (Western Cape), afirmando que os problemas que ainda precisavam de ser abordados na Namíbia incluíam a situação do policiamento no Norte, pois a perseguição nesta zona da Namíbia estava a tomar formas que eram realmente inaceitáveis.
“Os ex-membros da Koevoet penetravam até mesmo em currais na tentativa de descobrirem os combatentes do PLAN, braço armado da SWAPO”, declarou o representante especial do Secretário-Geral da ONU.
Não suportando a pressão internacional levada a cabo pela SWAPO e pelos seus aliados internacionais, a 16 de Agosto de 1989 o administrador-geral da RAS na Namíbia cedeu e anunciou que os exmembros da unidade paramilitar Koevoet seriam retirados do Norte da Namíbia e acantonados noutros lugares.
Para justificar a sua posição, Louis Pienaar disse: “o PLAN já não tem capacidade para representar uma ameaça, pelo que, agindo sob estas garantias e, em conformidade com os compromissos anteriores assumidos por mim, estou preparado para retirar os 1.200 membros da força Policial do Sudoeste Africano das regiões do Norte, o remanescente da componente de contra-subversão”.
Apesar destas declarações, o regime racista de Pretória nunca deixou de usar as suas artimanhas para dificultar o plano de independência da Namíbia dirigido pela UNTAG.
A 24 de Agosto de 1989, a RSA desencadeou mesmo uma última tentativa, ao afirmar que a SWAPOL tinha encontrado dois depósitos de armamento da SWAPO, no norte da Namíbia. Um deles, alegava, tinha sido enterrado “recentemente” na mata perto de Grootfontein e o outro foi localizado 18 quilómetros a sudoeste de Ruacaná.
Cansado destas artimanhas do regime de apartheid em Pretória, que tudo fazia para impedir o bom andamento do processo de paz e de independência, tentando perpetuar a sua presença no Sudoeste Africano, e em face dos muitos apelos da SWAPO sobre as constantes violações dos sul-africanos, a 29 de Agosto de 1989 o Conselho de Segurança da ONU, por iniciativa do Movimento dos Países Não-Alinhados, aprovou a importante Resolução 640/89, que dizia, entre outras coisas, o seguinte:
“O Conselho de Segurança, tendo revisto criticamente o processo de implementação da Resolução 435 de 29 de Setembro de 1978 e notando com preocupação que todas as suas disposições não estão a ser integralmente cumpridas;
Preocupado com os relatos de intimidação generalizada e perseguição contra a população civil, em particular por elementos da unidade Koevoet na Polícia do Sudoeste Africano;
Reconhecendo os esforços do Grupo de Assistência das Nações Unidas para o Período de Transição para levar a cabo as suas responsabilidades, apesar dos obstáculos colocados em seu caminho;
1. Exige de todas as partes, particularmente da África do Sul, o rigoroso cumprimento dos termos das Resoluções 435 (1978) e 632 (1989);
2. Exige também a dissolução de todas as forças paramilitares, étnicas e unidades de comando, em particular os Koevoets e o desmantelamento das suas estruturas de comando, conforme o exigido pela resolução 435 (1978).”
Esta Resolução, uma versão diluída de um projecto com o foco fortemente direccionado para a África do Sul por deliberadamente não cumprir o Plano de Independência das Nações Unidas, foi determinante para acelerar o processo de retirada das tropas sul-africanas do Norte da Namíbia e, consequentemente, cumprir uma das condições primordiais para que as eleições fossem realizadas num clima de paz e de segurança.
No final de Agosto de 1989, as tropas sul-africanas, que tinham sido reduzidas meramente a 1.500 homens, estavam acantonadas e os elementos que restaram da antiga Unidade de Contra-Subversão da Polícia do Sudoeste Africano, outrora denominada Koevoet, foram acantonados em bases distantes da fronteira.
“Assim, no final do mês de Agosto, o que é que a SWAPO tinha conseguido?”, pergunta Peter Stiff em determinado momento do seu livro. “As tropas sul-africanas, que tinham sido reduzidas meramente a 1.500 homens, estavam acantonadas. Os elementos que restaram da antiga Unidade de Contra-Subversão da Polícia do Sudoeste Africano, outrora denominada Koevoet, foram acantonados em bases muito longe da fronteira. O país estava de forma inquietante desconfortavelmente aberto a uma grande incursão da SWAPO”, responde o próprio Stiff, transmitindo a ideia parcial presente em todas as análises dos estudiosos aliados do apartheid segundo a qual a independência da Namíbia, o fim do apartheid e a derrota da UNITA em Angola seriam o fim da minoria branca na África Austral.
Jogadas estratégicas
O apartheid foi utilizado pelas potências ocidentais como bastião anti-comunista na região austral de África. Tendo fracassado nesta empreitada e com o aproximar do fim da Guerra Fria, a África do Sul viuse envolvida num clima de intensa pressão interna e externa para pôr fim ao regime.
Como as eleições gerais na África do Sul estavam agendadas para o mês de Setembro de 1989, por sinal a última eleição parlamentar sob os auspícios de um regime segregacionista realizada na África do Sul, as potências ocidentais consideravam que este era o momento propício para começar a engendrar mudanças.
A 18 de Agosto de 1989, o embaixador dos Estados Unidos na RSA, William Swing, reafirmou a posição do seu país segundo a qual a África do Sul devia agir rapidamente para negociar o fim do apartheid após as eleições de Setembro. “Os Estados Unidos estão determinados a ajudar a facilitar este processo”, frisou Swing.
Paralelamente à pressão internacional que a África do Sul sofria da parte dos seus aliados, os Estados Africanos e os Países Não-Alinhados representados no Conselho de Segurança da ONU pressionavam igualmente a África do Sul e criticavam veementemente a sua política intimidatória e a sua pretensão de falsificar os resultados das eleições gerais no Sudoeste Africano que se realizariam em Novembro de 1989.
Esta atitude da África do Sul foi igualmente condenada a 22 de Agosto de 1989, quando o Presidente do Movimento dos Países Não-Alinhados, o zimbabueano Isack Mudenge, informou o Conselho de Segurança das Nações Unidas que a África do Sul pretendia manter a Namíbia como um Estado cliente sob um regime fantoche. Para isso, havia montado uma estratégia para que a SWAPO não conseguisse obter, nas eleições de Novembro, uma maioria de dois terços na Assembleia Constituinte.
Segundo Elnan Schoeman, no seu livro “South Africa’s Foreign Relations in Transition 19851992”, um documento de trabalho que descrevia as pretensões do regime de apartheid e que circulou restritamente pelos representantes dos Países Não-Alinhados, os cinco membros permanentes na sua forma actual consideravam já essa atitude dos sul-africanos inaceitável.
Elnan destaca igualmente a decisão tomada pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas, a 29 de Agosto de 1989, de aprovar a Resolução 640/89, que, inter alia, exigia a dissolução de todas as forças paramilitares, étnicas e unidades de comando, em particular os Koevoets e o desmantelamento das suas estruturas de comando, conforme o exigido pela Resolução 435 (1978).
Todo este cenário foi fundamental para que o administrador-geral do Sudoeste Africano, o sul-africano Louis Pienaar, decidisse retirar e acantonar os 1.500 membros dos Koevoets desdobrados no norte da Namíbia, conforme requerido pela UNTAG. Uma decisão vivamente aplaudida pelos representantes dos Estados Unidos da América, da Grã-Bretanha, da União Soviética, da China e da França e, sobretudo, pelo povo namibiano.