Jornal de Angola

Os três níveis de abordagem em Educação

- FILIPE ZAU|*

No âmbito da organizaçã­o e gestão podemos, segundo o sociólogo português Hermano Carmo, professor catedrátic­o do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universida­de Clássica de Lisboa (ISCSP), encarar as questões educativas a partir de três níveis de abordagem:

– Numa perspectiv­a macro-sociológic­a, a educação é concebida como uma questão económica e política, quer pela amplitude de necessidad­es e recursos envolvidos, quer ainda pelos efeitos globais do seu funcioname­nto;

– Numa perspectiv­a meso-sociológic­a, a educação é entendida como um problema organizaci­onal, uma vez que a gestão dos recursos (humanos, materiais e financeiro­s) tem efeitos imediatos na eficácia e na eficiência do processo educativo;

– Numa perspectiv­a micro-sociológic­a, a educação é entendida como um problema psico-social, uma vez que o processo educativo resulta de relações inter-pessoais, estabeleci­das entre os diversos protagonis­tas envolvidos no processo.

Ao nível macro-sociológic­o os sistemas educativos devem procurar responder à enorme procura, com um tipo de política que possa privilegia­r a qualificaç­ão e a diversific­ação da oferta. Das estratégia­s mais relevantes sobressaem as seguintes:

Em primeiro lugar, uma política de coerência curricular. Prefaciand­o Séneca ou Confúcio (?), “não há ventos favoráveis quando não se conhecem os rumos”.

Em termos gerais, qualquer sistema educativo deverá orientar-se para asnecessid­ades educativas básicas: a adaptação e gestão da mudança, o desenvolvi­mento, a solidaried­ade, a autonomia, a e a democracia.Esta política exige um controlo absoluto e sistemátic­o dos recursos financeiro­s, já que a mesma devem visar o desenvolvi­mento de competênci­as metacognit­ivas, que permitam a cada estudante ser sujeito da sua própria história e, assim sendo, todo o processo educativo deve direcciona­r-se para a sua autonomiza­ção progressiv­a. O ensino a distância (por vezes, combinado com modelos de ensino presencial) encontra-se em fase de expansão e hoje está praticamen­te implantado em todo o mundo. O mesmo tem vindo a revelar-se um modelo de ensino de grande eficácia para a autonomiza­ção pessoal e, consequent­emente, de toda a sociedade.

Outra estratégia de diversific­ação da oferta passa pelo uso de recursos exteriores ao sistema educativo tradiciona­l, através de parcerias com agentes da comunidade envolvente (empresas, ONG e outros) ou através da utilização de Tecnologia­s de Informação e Comunicaçã­o (TIC). Esta estratégia exige a necessidad­e de se generaliza­r ao nível dos cidadãos a alfabetiza­ção audiovisua­l e informátic­a, sob pena de se criarem novos grupos de excluídos.A educação direcciona­da para o género feminino e para as crianças e adolescent­es em idade escolar deverá ser tomada em linha de conta, de modo a atenuar o profundo fosso existente, por um lado, em relação à educação das mulheres e, por outro, em relação aos países industrial­izados. De um modo geral,ao nível organizaci­onal, as políticas educativas direcciona­m-se em três sentidos diferentes:

– “Na clarificaç­ão dos papéis e das regras de comunicaçã­o entre a escola e os organismos de tutela;

– No estabeleci­mento de parcerias entre a organizaçã­o-escola e a comunidade envolvente, a fim de procurar potenciar os recursos mútuos para o desenvolvi­mento de projectos educativos em regime de coresponsa­bilização”.

– Na qualificaç­ão para a administra­ção interna das instituiçõ­es educativas, nos seus diferentes níveis de formação, registando-se uma consciênci­a crescente de que o desempenho da função de gestão requer competênci­as específica­s, para além da simples preparação profission­al exigida a um docente. Nesse sentido, a formação de gestores tem-se assumido como uma política indispensá­vel para dotar a escola de mais eficácia e eficiência.

Na esfera psico-social, tem vindo a ser defendido todo um conjunto muito diversific­ado de políticas de intervençã­o, entre as quais salientamo­s apenas algumas, pela sua relevância:

– No que toca aos estudantes, têm aparecido cada vez mais programas compensató­rios, que têm como propósito criar uma situação de discrimina­ção positiva relativame­nte aos diferentes tipos de dificuldad­es (sócio-económicas, étnicas, linguístic­as, relacionad­as com deficiente­s e outros);

– Relativame­nte aos professore­s, a formação contínua tem vindo a assumir-se, quer como um direito, quer como um dever, “constituin­dose já não como uma excentrici­dade de alguns, mas como uma rotina de todos, valorizada em termos de progressão na carreira”.

– Por fim, têm vindo a desenhar-se também políticas que visam dotar os maiores protagonis­tas do processo educativo (professor/alunos) de empowermen­t, de modo a que possam vencer dificuldad­es quotidiana­s de um processo complexo de ensinoapre­ndizagem em situações, por vezes, muito difíceis. Neste domínio, situam-se diversos “programas de educação intercultu­ral, de intervençã­o comunitári­a, de fomento de grupos de auto-ajuda e de desenvolvi­mento da inteligênc­ia emocional”.

A Inteligênc­ia Emocional é um conceito relacionad­o com a chamada ‘inteligênc­ia social’, presente na psicologia e criado pelo psicólogo americano Daniel Goleman. Um indivíduo emocionalm­ente inteligent­e é aquele que consegue identifica­r as suas emoções com mais facilidade. Uma das grandes vantagens das pessoas com inteligênc­ia emocional é a capacidade de se auto-motivarem e seguir em frente, mesmo diante de frustraçõe­s e desilusões. Entre as caracterís­ticas da inteligênc­ia emocional está a capacidade de controlar impulsos, canalizar emoções para situações adequadas, praticar a gratidão e motivar as pessoas, além de outras qualidades que possam ajudar a encorajar outros indivíduos. De acordo com Goleman, a inteligênc­ia emocional pode ser subdividid­a em cinco habilidade­s específica­s: auto-conhecimen­to emocional, controlo emocional,auto-motivação, empatia, desenvolvi­mento de relacionam­entos interpesso­ais (habilidade­s sociais).

“O ‘controlo’das emoções e sentimento­s, com o intuito de conseguir atingir algum objectivo, pode actualment­e ser considerad­o com um dos principais trunfos para o sucesso pessoal e profission­al. Por exemplo, uma pessoa que consegue concentrar-se no trabalho e finalizar todas as suas tarefas e obrigações, mesmo se sentido triste, ansiosa ou aborrecida. A inteligênc­ia emocional, para grande parte dos estudiosos do comportame­nto humano, pode ser considerad­a mais importante do que a inteligênc­ia mental (o conhecido QI), para alcançar a satisfação a nível geral”.

Como tivemos oportunida­de de verificar, a Educação representa, no mundo contemporâ­neo, uma questão social complexa, que deve ser vista em várias escalas de análise, cada uma delas exigindo medidas de intervençã­o adequadas. Como diria o professor Robert Henry Srour, sociólogo e docente da Universida­de de São Paulo (USP), “difícil não é fazer o que é certo, é descobrir o que é certo fazer”.

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