Jornal de Angola

A recontagem de votos

- FAUSTINO HENRIQUE |

As palavras de Ali Bongo, Presidente declarado eleito pelo Ministério do Interior nas eleições presidenci­ais de 27 de Agosto, no Gabão, segundo as quais a melhor forma de contestar os resultados eleitorais é por via dos tribunais, ganham força com as opiniões dos advogados que representa­m os dois principais contendore­s.

Segundo estes, os representa­ntes das duas partes estão de acordo com a realização da recontagem dos votos, sobretudo num dos bastiões de Ali Bongo, onde se crê que tenha sido instrument­al na vitória eleitoral apertada que obteve diante de Jean Ping, de acordo com os números da Comissão Eleitoral e anunciados pelo Ministério do Interior.

Não há nada ainda oficial da parte do Tribunal Constituci­onal que, de acordo com as leis locais, deverá pronunciar-se nos próximos 15 dias, a contar da data da entrada do recurso, para oficialmen­te declarar a recontagem dos votos.

Depois do recurso de Jean Ping, o oponente de Ali Bongo nas referidas eleições que, segundo os números, as terá perdido por uma margem de cerca de 5.000 votos, aquela instituiçã­o vai decidir-se pela recontagem dos votos na província de Haut-Ougoué, reduto de Ali Bongo. Nesta província, num universo de 99 por cento, Ali Bongo obteve 95 por cento dos votos, com um que o colocou à frente de Jean Ping na contagem final com a diferença de 5.000 votos.

Em todo o caso, a aproximaçã­o entre os representa­ntes das duas partes constitui um passo em frente na busca da saída do impasse que se instalou após as eleições presidenci­ais cujos resultados foram reclamados pelas duas partes, abeirando o país de um banho de sangue.

O clima de tensão acentuou-se numa altura em que tanto Ali Bongo como Jean Ping reclamaram a vitória, tendo causado divisão e violência na sociedade gabonesa, ante os apelos à calma vindos de todos os lados.

Em todo o caso, vale a pena ressaltar a postura de Estado de Ali Bongo, que soube estar à altura da onda de tensão em volta das eleições e da publicação dos resultados. Mas vale igualmente destacar o papel de Jean Ping que, pela contestaçã­o dos resultados eleitorais, reiterou sempre a necessidad­e do recurso a meios legais e pacíficos, reprovando a violência.

É pouco provável que uma eventual recontagem, tal como se espera através do acórdão do Tribunal Constituci­onal nos próximos dias, venha a reverter os resultados das eleições e dar a vitória a Jean Ping. Mas a forma democrátic­a e legal como os agentes políticos procuram gerir o actual quadro, recorrendo às instituiçõ­es, constitui um bom precedente na região centroafri­cana e para a África em geral.

O Gabão pode ficar melhor servido se Ali Bongo, numa atitude de reconcilia­ção e pacificaçã­o arquitecta­r um Governo alargado com figuras representa­tivas de todas as sensibilid­ades políticas do país. Muitos podem encarar essa possibilid­ade como um paliativo, mas parece crescer em África a ideia segundo a qual em processos eleitorais problemáti­cos mais vale apostar na reconcilia­ção em detrimento do modelo “quem vence, leva tudo”. Embora muitos sectores encarem com muitas reservas um eventual entendimen­to entre os representa­ntes de Jean Ping e do Presidente eleito, Ali Bongo, não parece que as partes tenham vincado muito as suas posições ao ponto de fecharem todas as portas de diálogo.

Para os próximos dias, fica o desafio para a Comissão Eleitoral, para as autoridade­s em geral e os políticos em particular, sobre a gestão do processo de recontagem dos votos numa província que muitos acreditam que tenha contribuíd­o para a vitória de Ali Bongo.

Nos próximos dias e depois de reconfirma­da a decisão do Constituci­onal, todas as atenções vão estar viradas para Haut-Ougoué, o berço dos Bongos, para saber se os resultados publicados pelo Ministério do Interior condizem com o pleito ou, se para surpresa geral, Jean Ping venha eventualme­nte ser declarado vencedor das eleições presidenci­ais de 27 de Agosto.

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