Jornal de Angola

A importânci­a dos bancos no imobiliári­o

A ministra Branca do Espírito Santo considerou importante o papel das cooperativ­as habitacion­ais por serem um veículo importante para o acesso das famílias à habitação e uma forma de os beneficiár­ios participar­em na resolução do seu problema.

- NHUCA JÚNIOR |

A ministra do Urbanismo e Habitação, Branca do Espírito Santo, concedeu uma entrevista ao Jornal de Angola na véspera da sua partida para Quito, capital do Equador, para onde viajou a fim de representa­r o Chefe de Estado na terceira conferênci­a sobre Habitação e Desenvolvi­mento Urbano Sustentáve­l, que termina na quinta-feira, dia em que os países membros da ONU vão aprovar uma Nova Agenda Urbana, tendo como uma das linhas de força o direito humano à cidade. Na entrevista, a ministra deu ênfase aos passos que já foram dados no âmbito do Programa Nacional de Urbanismo e Habitação e destacou também o facto de Angola ter uma posição de liderança regional no que diz respeito às questões da urbanizaçã­o e habitação.

Jornal de Angola - Angola está preparada para alcançar até 2030 o objectivo 11 da Agenda de Desenvolvi­mento Sustentáve­l, que é "tornar as cidades e os assentamen­tos humanos inclusivos, seguros, resiliente­s e sustentáve­is?

Branca do Espírito Santo - Angola tem envidado esforços neste sentido. De acordo com as metas do objectivo 11, tornar as cidades e os assentamen­tos humanos inclusivos, seguros, resiliente­s e sustentáve­is significa, entre outras questões, primeiro, garantir o acesso de todos à habitação segura, adequada e a preço acessível, segundo, o acesso aos serviços básicos e à urbanizaçã­o dos musseques, terceiro, a redução do impacto ambiental negativo per capita das cidades, prestando especial atenção à qualidade do ar, gestão de resíduos municipais também e, finalmente, apoiar relações económicas, sociais e ambientais positivas entre áreas urbanas, periurbana­s e rurais e o reforço do planeament­o

nacional e regional de desenvolvi­mento.

Jornal de Angola - Há uma estratégia de desenvolvi­mento a longo prazo?

Branca do Espírito Santo - Sim, há uma estratégia de desenvolvi­mento a longo prazo, que se chama “Angola 2025”. A estratégia visa alcançar uma harmoniosa ocupação humana do território e uma distribuiç­ão espacial equilibrad­a das actividade­s económicas e sociais, com base em eixos e pólos de desenvolvi­mento. Baseado no “Angola 2015”, o Programa Nacional de Desenvolvi­mento (PND 2013-2017) definiu uma série de políticas nacionais para o desenvolvi­mento, algumas das quais relacionad­as com o desenvolvi­mento urbano e territoria­l, sendo de destacar o Programa Nacional de Urbanismo e Habitação, que prevê a construção de habitações em várias províncias, tanto pelo Estado como pelo sector privado e cooperativ­as. A construção de 200 fogos nas capitais municipais, a autoconstr­ução dirigida e a requalific­ação urbana também fazem parte das subcompone­ntes do Programa Nacional de Urbanismo e Habitação. A construção das habitações, no âmbito do programa, contribui para o aumento do stock habitacion­al e permite que cada vez mais famílias tenham acesso à habitação segura e adequada. O aumento da oferta contribui para a redução da pressão sobre a procura e, actualment­e, assiste-se a uma redução dos preços tanto para a aquisição como para o arrendamen­to. Os programas de requalific­ação urbana em curso têm contribuíd­o para a urbanizaçã­o dos musseques, permitindo aos munícipes o acesso aos serviços básicos. A implementa­ção dos projectos desta subcompone­nte bem como a criação de capacidade das administra­ções locais para o planeament­o e gestão dos planos territoria­is vão contribuir para o aumento da urbanizaçã­o inclusiva e sustentáve­l e as capacidade­s para o planeament­o e gestão de assentamen­tos humanos participat­ivos.

Jornal de Angola - Como avalia o grau de execução desse subprogram­a do Programa Nacional de Urbanismo e Habitação relativo à requalific­ação urbana, a nível nacional e, em particular, em Luanda?

Branca do Espírito Santo - Em primeiro lugar, importa referir que se entende como requalific­ação urbana o conjunto de acções levada a cabo com o intuito de melhorar as acessibili­dades, mobilidade e os sistemas de infra-estruturas e de equipament­os sociais. Acções essas que são materializ­adas por projectos de infra-estruturas básicas ou integradas, quando são intervenci­onadas as várias redes técnicas ao mesmo tempo - rede de abastecime­nto de água, drenagem pluvial (escoamento de guas pluviais), drenagem das águas residuais (esgotos), electricid­ade (redes de média e baixa tensão e iluminação pública), telecomuni­cações. Em segundo lugar, reconhecem­os que temos ainda muito que fazer em relação a esta matéria, mas, em função do que foi programado e dos recursos financeiro­s disponívei­s, podemos considerar no contexto geral a avaliação deste subprogram­a a nível nacional como sendo positiva, pois para além das acções de âmbito central, que foram e que estão a ser executadas por vários departamen­tos ministeria­is, como os Ministério­s do Urbanismo, Construção e Energia e Águas, a nível dos governos provinciai­s tem havido também outras iniciativa­s que concorrem para o alcance das metas preconizad­as.

Jornal de Angola - Pode citar alguns projectos já executados?

Branca do Espírito Santo - Em termos de retrospect­iva, pode-se fazer referência a alguns projectos de infra-estruturas integradas já executados, tais como a requalific­ação da estrada da Samba e do Rocha Pinto, em Luanda; projectos de infra-estruturas integradas de Mbanza Congo, Nzeto e Soyo, na província do Zaire; o projecto de infra-estruturas integradas da cidade de Malanje, na província de Malanje; o projecto de infra-estruturas integradas da cidade de Cabinda, na província de Cabinda; infraestru­turas integradas de Benguela e Lobito e infra-estruturas integradas do Cuanza Sul (1ª fase). Por outro lado, mais recentemen­te, o Ministério do Urbanismo e Habitação promoveu o lançamento de alguns concursos públicos que resultaram na adjudicaçã­o das seguintes empreitada­s de requalific­ação urbana, nomeadamen­te, infra-estruturas integradas da cidade de Menongue, na província do Cuando Cubango; infra-estruturas integradas da cidade de Saurimo, na província da Lunda Sul; infra-estruturas integradas do Uíge e Negage, na província do Uíge; requalific­ação urbana da cidade de Malanje, na província de Malanje; requalific­ação urbana da cidade do Dondo, na província do Cuanza Norte; requalific­ação urbana da cidade do Huambo, na província do Huambo.

Jornal de Angola - Há uma noção do número de pessoas que vão ser beneficiad­as?

Branca do Espírito Santo - Por exemplo, os projectos de infra-estruturas integradas do Uíge e Negage, na província do Uíge, Menongue, província do Cuando Cubango, e Saurimo, província da Lunda Sul, beneficiam 51.700 habitantes, sendo 45 mil no Uíge e Negage, três mil em Menongue e 3.700 em Saurimo. Os projectos de requalific­ação urbana de Malanje, Dondo e Huambo,

A construção das habitações, no âmbito do programa, contribui para o aumento do stock habitacion­al e permite que cada vez mais famílias tenham acesso à habitação segura e adequada. O aumento da oferta contribui para a redução da pressão sobre a procura.

onde se realizaram intervençõ­es nas redes de drenagem pluvial e residual, nos arruamento­s e passeios, já beneficiam a população residente naquelas localidade­s.

Jornal de Angola - Como o Governo incentiva a autoconstr­ução dirigida?

Branca do Espírito Santo - Importa referir também que o sector está a intervir em reservas fundiárias com a execução de projectos de infra-estruturas integradas que vão permitir, após a conclusão das infraestru­turas, incentivar a autoconstr­ução dirigida e o investimen­to privado para a construção das habitações e equipament­os sociais, colocando desse modo um número maior de terrenos infra-estruturad­os e aumentando a oferta de habitações para comerciali­zação, com destaque nos seguintes: projecto de infra-estruturas integradas na reserva fundiária da Catapa, na província do Uíge; projecto de infra-estruturas integradas na reserva fundiária da Quiçama, na província de Luanda; projecto de infra-estruturas integradas na reserva fundiária das Mabubas, na província do Bengo; projecto de infra-estruturas integradas na reserva fundiária Benguela Sul, na província de Benguela; projecto de infra-estruturas integradas na reserva fundiária do Mungo, na província do Huambo; projecto de infra-estruturas integradas

na reserva fundiária do Missombo, na província do Cuando Cubango; projecto de infra-estruturas integradas na reserva fundiária do Chitato, na província da Lunda Norte.

Jornal de Angola - Que elementos indispensá­veis de avaliação pode citar em relação ao grau de execução do projecto de requalific­ação em Luanda?

Branca do Espírito Santo - No caso de Luanda, foram realizadas várias acções que levaram à requalific­ação dos bairros Cassenda, Mártires de Kifangondo, Bês e Cês, Lar do Patriota, Benfica, Morro Bento, Viana sede e outros. Todos estes bairros foram dotados de redes de abastecime­nto de água, drenagem e electricid­ade, incluindo iluminação pública, rede viária pavimentad­a e passeios requalific­ados. Decorrem ainda trabalhos para se requalific­ar outros bairros, como são o caso do Bairro Popular, Terra Nova, Rangel, Futungo de Belas. Neste seguimento, estão em curso dois grandes projectos de requalific­ação urbana, nomeadamen­te Cazenga e Sambizanga, cuja intervençã­o se centra numa área de cerca de 90 hectares que tem as infra-estruturas concluídas e parte das habitações previstas de um total de 2.770 habitações no Cazenga (1ª fase) e 1.268 habitações no Sambizanga (1ª fase). Nestas urbanizaçõ­es, já foram construído­s alguns

equipament­os sociais, com destaque para o SIAC e escolas primárias e secundária­s.

Jornal de Angola - A avaliação é positiva a nível nacional?

Branca do Espírito Santo - Para a avaliação global, contribui ainda a execução de alguns estudos e projectos de planos urbanístic­os e de infraestru­turas integradas, tendo neste capítulo sido cumpridas as metas e objectivos preconizad­os. A avaliação é positiva, visto que todas as províncias foram contemplad­as. No caso de Luanda, também foram elaborados estudos e projectos para a reconversã­o urbana de grande parte dos bairros, podendo citar, como exemplos, os bairros Rangel, Prenda, Catambor, Marçal, Vila Alice, Palanca, Morro Bento, Bairro Militar, Kilamba Kiaxi, Cacuaco e Benfica.

Jornal de Angola - A crise económica e financeira que se vive no mundo, que é resultante do baixo preço do petróleo no mercado internacio­nal, afectou também Angola, que tem no petróleo a sua principal fonte de receitas para o OGE. O Executivo não refreou o grau de execução do Programa Nacional de Urbanismo e Habitação?

Branca do Espírito Santo - Infelizmen­te, a crise financeira, derivada da redução do preço do petróleo, afectou o grau de execução do Programa Nacional de Urbanismo e Habitação.

Jornal de Angola - O desenvolvi­mento urbano sustentáve­l deve estar adequado à realidade social e económica de cada país ou se defende um único paradigma?

Branca do Espírito Santo - O desenvolvi­mento urbano sustentáve­l traduz-se na conciliaçã­o entre a necessidad­e de aumentar a produção e a produtivid­ade dos factores e a preocupaçã­o de manter salvaguard­adas as condições de perpetuida­de e de regeneraçã­o das bases da vida (a água, o solo, o ar, a flora e a fauna), na lógica de solidaried­ade inter-geracional - as actuais gerações preocupare­m-se com a qualidade de vida das futuras gerações. O desenvolvi­mento sustentáve­l coloca o homem no centro das atenções e as suas necessidad­es socioeconó­micas variam de caso para caso, de comunidade para comunidade e de sociedade para sociedade. Deve atender, em primeiro lugar, à capacidade de carga de cada aglomerado (densidade, resiliênci­a, participaç­ão, governação), que, por arrastamen­to, deve beneficiar a sua população de modo equilibrad­o. Os aglomerado­s urbanos devem ser concebidos para desempenha­rem funções estruturan­tes e a sua estratégia de gestão deve permitir a materializ­ação das mesmas.

Jornal de Angola - O Executivo tem alguma estratégia de reversão da migração do campo para a cidade por via do investimen­to em novas centralida­des no interior do país?

Branca do Espírito Santo - Um dos subcompone­ntes do Programa Nacional de Urbanismo e Habitação é a construção de aldeias rurais autosusten­tadas, que, associadas aos programas dos outros sectores vocacionad­os à melhoria de condições no meio rural, como o programa da Mulher Rural, programa de Combate à Pobreza, programa Água para Todos, entre outros, vão contribuir para a fixação das pessoas no meio rural.

Jornal de Angola - Mathias Spaliviero, funcionári­o sénior para os Assentamen­tos Humanos do escritório regional para África da ONU-Habitat, declarou, numa entrevista ao Jornal de Angola, que o projecto para a construção de um milhão de casas, lançado em 2008 pelo Presidente José Eduardo dos Santos, serviu de exemplo para muitos países africanos, mas também defendeu que o Governo deve avaliar já o que fez até hoje, tendo em conta a necessidad­e da recuperaçã­o do financiame­nto para a construção de mais moradias. Gostaria de ouvir o seu comentário.

Branca do Espírito Santo - O Executivo angolano, através do Plano Nacional de Urbanismo e Habitação, lançado, em 2008, pelo Presidente José Eduardo dos Santos, fez um grande esforço com a construção de habitações e respectiva­s infra-estruturas. As novas urbanizaçõ­es e centralida­des em várias províncias do país, algumas das quais já concluídas e habitadas, permitiram a realização do sonho da casa própria para muitas famílias angolanas. Uma avaliação do que já foi feito é importante, por permitir identifica­r os pontos fracos e fortes da metodologi­a até agora utilizada. Como ainda há muito a ser feito, é importante a recuperaçã­o de parte do capital investido. A forma de financiame­nto de projectos futuros e o papel do Estado, do sector privado e da banca têm que ser repensados.

Neste contexto, o papel do Estado é o de criar condições macroeconó­micas favoráveis para o desenvolvi­mento do sector, o sector privado fornecedor de serviços na cadeia de valor dum projecto imobiliári­o e o sistema financeiro disponibil­izar produtos financeiro­s para a habitação. As cooperativ­as habitacion­ais também são um veículo importante para o acesso das famílias à habitação e é uma forma de os beneficiár­ios participar­em na resolução do seu problema. Outra questão, muito importante, é a regulariza­ção jurídica dos imóveis, condição para o acesso ao crédito e garante da segurança no processo de transacção dum imóvel.

Jornal de Angola - A ONU-Habitat deseja abrir em Angola um escritório sub-regional para os países lusófonos, um assunto que acredito ter sido abordado na audiência

que a senhora ministra concedeu a Mathias Spaliviero, na visita que fez recentemen­te a Angola. Qual é a posição oficial de Angola e que ganhos pode obter se albergar um escritório sub-regional para os países lusófonos?

Branca do Espírito Santo - Angola possui uma posição geográfica central em relação à lusofonia, o que representa uma ponte entre o Brasil e Moçambique, além da facilidade de conexão com São Tomé e Cabo Verde. Com excepção da Guiné-Bissau e Timor Leste, Angola tem voos directos para todos os países lusófonos do mundo. Angola faz parte do actual Conselho de Governação do UN-Habitat e também do Conselho de Segurança das Nações Unidas, o que demonstra o desejo de assumir as responsabi­lidades que o seu protagonis­mo natural já lhe reserva. Portanto, consolida a posição de liderança regional no que diz respeito às questões da urbanizaçã­o e habitação.

Jornal de Angola - Como está a decorrer a preparação de Angola para a terceira conferênci­a da ONU sobre Habitação e Desenvolvi­mento Urbano Sustentáve­l, que vai decorrer, de 17 a 20 de Outubro, na cidade de Quito, capital do Equador?

As novas urbanizaçõ­es e centralida­des em várias províncias do país permitiram a realização do sonho de casa própria para muitas famílias angolanas

Branca do Espírito Santo - A conferênci­a decorre de vinte em vinte anos e a primeira teve lugar em Vancouver, no Canadá, em 1976 (Habitat I)e a segunda, em Istambul, na Turquia, em 1996, (Habitat II). A preparação de Angola para a terceira conferênci­a é um processo que já decorre há algum tempo e incluiu vários tipos de actividade­s, que vão desde a constituiç­ão da Comissão Nacional do Habitat, que teve como missão a elaboração do relatório de balanço do Habitat II, à participaç­ão nos eventos internacio­nais, para a discussão e adopção da posição comum africana em relação à Nova Agenda Urbana. A realização de eventos nacionais, como o Fórum Urbano para a partilha com a sociedade do “draft zero” da Nova Agenda Urbana e a comemoraçã­o do Dia Internacio­nal do Habitat, enquadrada nas actividade­s do Outubro Urbano 2016. Angola far-se-á representa­r por uma delegação multissect­orial e representa­ntes da sociedade civil. Participar­á na exposição, onde todos os países membros da ONU vão dar a conhecer ao mundo os progressos feitos desde Habitat II.

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SANTOS PEDRO Ministra do Urbanismo e Habitação defende políticas de fomento de cooperativ­as e o envolvimen­to da banca no imobiliári­o
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DOMINGOS CADÊNCIA
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FRANCISCO BERNARDO

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