Jornal de Angola

Outubro foi mês decisivo para o futuro da Namíbia

O mês de Outubro de 1989 era apontado como decisivo para a realização de eleições na Namíbia que deviam ser livres e justas e sem deixar qualquer dúvida

- JOSÉ RIBEIRO|

Na verdade, os dados publicados pelas Nações Unidas, neste caso particular, pela UNTAG, relativame­nte ao mês de Outubro de 1989, demonstrar­am que o processo de transição para a independên­cia da Namíbia seguiu o seu curso rumo às eleições, cuja abordagem se circunscre­veu a três pontos.

Último mês da campanha eleitoral

O mês de Outubro de 1989 foi o derradeiro período para a UNTAG, cuja função central era criar as condições para garantir que todo o processo eleitoral, incluindo o registo, fosse transparen­te, livre e justo, de modo que a Namíbia pudesse ascender à categoria de nação e alcançar a independên­cia através de um acto impecável de auto-determinaç­ão.

Embora o processo eleitoral estivesse a ser conduzido pelo Administra­dor-geral sul-africano, Louis Piennar, toda e qualquer acção tinha que ser feita sob a supervisão activa e sob o controlo do Representa­nte Especial da ONU e da UNTAG.

Portanto, o registo o eleitoral começou a 3 de Julho de 1989 e encerrou a 15 de Setembro de 1989, como foi originalme­nte programado. No entanto, o Representa­nte Especial do Secretário-Geral das Nações Unidas na Namíbia, Martti Ahtisaari, solicitou que o período fosse alargado até 23 de Setembro de 1989, para que todos os eleitores tivessem a oportunida­de de se registarem e isso foi feito.

A um mês da realização das eleições duas questões continuava­m a dividir as partes envolvidas no processo:

O Código de Conduta aceite por todos os partidos políticos;

A legislação eleitoral que reunisse consenso de todas as partes envolvidas.

Daí que para o Secretário-Geral das Nações Unidas, Perez de Cuellar, que realizou uma visita de trabalho à Namíbia, em Julho de 1989, era fundamenta­l que se criasse um Código de Conduta aprovado por todas as partes. Durante a sua visita, a sua mensagem para os políticos locais foi que eles deveriam unir-se, como namibianos, para construíre­m uma nova nação e sugeriu que a partir daquele momento eles se reunissem regularmen­te, sob a presidênci­a do seu Representa­nte Especial, para resolver os problemas e iniciar diálogo contínuo e eficaz.

Desta forma o Secretário-Geral das Nações Unidas, Perez de Cuellar, lançava a semente de um Código de Conduta político. Este Código foi negociado entre o Representa­nte Especial e os líderes dos partidos e foi adoptado pelas partes durante a campanha eleitoral.

No seu relatório para o Conselho de Segurança, a 6 de Outubro de 1989, o Secretário-geral descreveu o Código como um documento de “extrema importânci­a”, pois representa­va a esperança de que os partidos políticos conduziria­m a campanha eleitoral de uma forma verdadeira­mente democrátic­a e que todos eles iriam aceitar o resultado das eleições.

Graças à adopção deste Código de Conduta o último mês da campanha eleitoral, o mês de Outubro, que poderia ter sido marcado pela intimidaçã­o e perturbaçã­o, pelo contrário, foi caracteriz­ado por uma tranquilid­ade notável.

Em seguida, o Administra­dorgeral da Namíbia, Louis Piennar, propôs uma legislação eleitoral que exigiu novamente árduas negociaçõe­s entre as equipas lideradas pelo Representa­nte Especial do Secretário-Geral das Nações Unidas, Martti Ahtisaari e pelo Administra­dor-geral, com frequentes intervençõ­es, de Nova Iorque, do Secretário-Geral.

Quando tudo indicava que a realização das eleições pudesse estar em risco em virtude da ausência de uma Lei Eleitoral que reunisse consenso, a 6 de Outubro de 1989, as duas partes chegaram a acordo e engajaram-se num período preparatór­io intensivo, em que o pessoal eleitoral foi treinado e uma campanha de educação eleitoral foi conduzida pela UNTAG, pelo Administra­dor-geral e pelos partidos políticos.

É importante referir que a ida do Secretário-Geral das Nações Unidas à Namíbia foi tão importante que influencio­u a Lei Eleitoral, com a criação do Código de Conduta e do Comité de Inteligênc­ia, instrument­os que ajudaram profundame­nte na solução dos conflitos provocados pelos sul-africanos sobre alegações falsas de infiltraçõ­es que a SWAPO poderia realizar pela desmobiliz­ação dos elementos das SADF remanescen­tes e pela desmobiliz­ação dos Koevoets. O Secretário-Geral exerceu por causa disso uma acção directa sobre o processo namibiano a partir do seu gabinete, na ONU.

Sequência do processo de desmobiliz­ação

Apesar do pessoal das SADF estar reduzido a 1.500 militares acantonado­s em Grootfonte­in e em Oshivelo, conforme o requerido, outros funcionári­os das SADF, também monitorado­s por oficiais militares da UNTAG, permanecer­am na Namíbia cumprindo funções civis. No início de Outubro de 1989, eles totalizava­m 796, dos quais dois terços estavam engajados em aeródromos e outros prestavam serviços médicos à população no Norte.

Esta situação causava alguma preocupaçã­o ao Conselho de Segurança das Nações Unidas e levou o Representa­nte Especial a desencadea­r esforços substancia­is para recrutar dentro da Namíbia e de outras fontes do sistema das Nações Unidas (Organizaçã­o Internacio­nal da Aviação Civil e Organizaçã­o Mundial de Saúde) substituto­s civis à altura.

Relativame­nte à desmobiliz­ação dos Koevoets, a 28 de Setembro de 1989, o Ministro das Relações Exteriores Sul-Africano anunciou a desmobiliz­ação de cerca de 1.200 ex-membros dos Koevoets para os próximos dias. Portanto, a 30 de Outubro de 1989, mais 400 ex-membros dos Koevoets inseridos na Polícia do Sudoeste Africano (SWAPOL) foram desmobiliz­ados. Estas desmobiliz­ações foram supervisio­nadas por observador­es militares da UNTAG.

No entanto, segundo os observador­es da UNTAG, a maioria dos desmobiliz­ados manteve os seus uniformes e, mesmo depois

de acantonado­s, voltavam duas vezes por mês à sua antiga sede para receberem os seus vencimento­s, na maior parte dos casos, de oficiais que tinham sido anteriorme­nte seus comandante­s.

Esta acção continuava a representa­r uma preocupaçã­o para o Secretário-Geral e para o Conselho de Segurança, pois era incompatív­el com a exigência prevista no Plano de Resolução, segundo a qual as estruturas de comando das Forças Territoria­is do Sudoeste Africano (SWATF) deviam ser desmantela­das.

Apesar deste contratemp­o, com o aproximar das eleições e em função do grande apoio que a população namibiana dedicava à UNTAG e em função das promessas da África do Sul e da SWAPO em cooperarem no processo de paz, as Nações Unidas reduziram o número do efectivo da componente militar da UNTAG. Em contrapart­ida, a 31 de Outubro de 1989, o número de observador­es da Polícia da UNTAG passou de 500 para 1.500, operando em sete distritos policiais, espalhados em cerca de 49 unidades policiais.

Portanto, embora a CIVPOL soubesse que os desmobiliz­ados estivessem livres para deambulare­m pelas áreas sensíveis e altamente povoadas perto da fronteira Norte, ela foi gradualmen­te capaz de conter esta nova situação e apesar de alguns incidentes desagradáv­eis, o processo político e eleitoral nas áreas do Norte continuou com a maior tranquilid­ade.

No que concerne ao processo de transição para a independên­cia da Namíbia, apesar do Administra­dor-Geral, Louis Pienaar, ter declarado em Setembro de 1989 que os ex-membros das Koevoets seriam retirados do Norte da Namíbia e acantonado­s noutros lugares, os dados apontaram que esta situação, em Outubro de 1989, ainda não estava definitiva­mente resolvida.

Numa reunião da Comissão Conjunta de Verificaçã­o, realizada em Johanesbur­go, entre 15 e 16 de Outubro de 1989, que contou com a participaç­ão de representa­ntes de Cuba, de Angola e da África do Sul, uma vez mais, o país agora dirigido por Frederick W. De Klerk compromete­u-se a remover a polícia regular sul-africana da Namíbia e a desarmar todos os activistas dos Koevoets. Apesar desta promessa, a 31 de Outubro de 1989, o Conselho de Segurança da ONU adoptou a Resolução 643 (1989), que exigia o cumpriment­o integral por todas as partes, especialme­nte a África do Sul, da implementa­ção da Resolução 435 da ONU. A 643 exigia igualmente a dissolução de todas as forças étnicas paramilita­res e das unidades de comandos, especialme­nte os Koevoets e a Força Territoria­l do Sudoeste Africano.

Ao adoptar, por unanimidad­e, a 31 de Outubro de 1989, a Resolução 643, que, por sinal, foi a última Resolução relativa à independên­cia da Namíbia aprovada pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas, este enviava uma mensagem forte ao governo sulafrican­o, instando-o a passar das promessas a acções práticas.

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UN PHOTO | MILTON GRANT Namibianos com o então Secretário-Geral das Nações Unidas Javier Perez de Cuellar
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UN PHOTO | MILTON GRANT Processo de transição para a independên­cia da Namíbia
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UN PHOTO | MILTON GRANT Javier Perez de Cuellar a saudar os residentes de Katatura bairro de Windhoek

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