Luanda e Bangui de mãos dadas
A República Centro Africana (RCA) é daqueles países que, até há alguns anos, fruto do conflito interno, engrossava a lista de Estados falhados e encaminhava-se para o caos político e social. Ainda hoje, enfrenta desafios monumentais na transformação do actual período de consolidação do processo de transição numa fase irreversível de normalização democrática e desenvolvimento.
A antiga colónia francesa atravessa com muitas dificuldades um período doloroso de transição que, como se acredita, a grande maioria dos centro-africanos preferem olhar como algo ligado ao passado.
Com a queda do regime do Presidente François Bozize, em Março de 2013, a RCA entrou numa fase crítica em termos de definição do seu futuro político, atendendo a que o país ficou dividido não apenas em linhas políticas distintas, mas sectárias e religiosas. O país enfrentava a sua terceira guerra civil, numa altura em que a coligação de forças rebeldes oriundas do norte muçulmano, congregadas no que ficou designado como Seleka, tinha tomado o poder em Bangui.
Na capital do país e um pouco por todo o lado, as confrontações militares eram preenchidas pelo menu que dividia os centro-africanos entre muçulmanos, representados pelos Seleka, e anti-Balaka, milícias cristãs, voltadas contra aqueles primeiros.
O conflito acentuou-se de tal maneira que o Conselho de Segurança da ONU gizou uma resolução, por via da qual surgiu a Mission International de Soutien à la Centrafrique sous Conduite Africaine (missão internacional de apoio à RCA sob condução africana) ou simplesmente MISCA, um expediente que contou com o suporte da França.
Essa missão militar, que contou com cerca de seis mil militares fornecidos por vários países africanos, contribuiu decisivamente para que fosse possível a assinatura do acordo do dia 23 de Julho de 2014, de cessação das hostilidades, por parte das forças em conflito na RCA, sob a mediação do Presidente da República do Congo, Denis Sassou Nguesso.
Poucos acreditavam que o Governo de transição surgido por via do referido acordo e conduzido por Catherine Samba Panza levasse aquele país às eleições que consagraram Faustin-Archage Touaderá como Presidente democraticamente eleito.
Mas há um país que poupou esforços e os resultados já demonstram que a RCA é um exemplo de êxito e sucesso na gestão e resolução de conflito com selo africano.
Angola aceitou o desafio de contribuir para que a RCA, o único país africano que se tornou num império no período pós-colonial, fosse estabilizado, não poupando esforços para aquele país passar de Estado fracassado para país viável, com instituições e futuro.
Embora seja ainda sacudido por acções menos boas, nalguns casos envolvendo mesmo fatalidades, a RCA procura trilhar hoje os caminhos do desenvolvimento. Volta e meia o país vive episódios protagonizados por membros das exmilícias Seleka e anti-Balaka, como sucedeu no norte do país, no dia 29 de Outubro, em que dezenas perderam a vida, mas é generalizada a ideia de que apenas com paz e unidade o país pode avançar.
É verdade que o Estado centroafricano enfrenta ainda desafios para estender a sua autoridade e administração a todo o território do país, na medida em que na parte setentrional há uma tentativa de secessão e partes do territórios controlados por senhores da guerra.
Em todo o caso, com o fim da chamada terceira guerra civil e com a consolidação do processo de transição, o país representa já um exemplo de um Estado que esteve à beira do fracasso e que ultrapassou essa fase. Não há dúvidas de que a RCA, com a ajuda dos seus parceiros, tem sido capaz de enfrentar com sucesso o actual período difícil de transição e o processo de democratização.
A contribuição de Angola na formação de efectivos das forças de segurança e de defesa, além dos esforços que ambos os Estados fazem para cimentar a cooperação económica e comercial representam capítulos importantes nas relações entre os dois países.
A chegada ao país hoje do Presidente Faustin-Archage Touadera, Chefe de Estado da RCA, constitui a abertura de uma página importante no capítulo das relações bilaterais, numa altura em que as autoridades políticas dos dois países devem, cada vez mais, dar espaço para o sector privado.
Segundo o “Journal de Bangui”, órgão de comunicação social da RCA, há um Acordo Geral de cooperação, recentemente assinado em Luanda pelos ministros das Relações Exteriores de Angola e da RCA, Georges Chikoti e Charles Doubané, que constitui um passo relevante.
A bola tende a passar rapidamente para o lado dos empresários e empreendedores angolanos e centro-africanos, que deverão estar preparados para fortalecer o que os políticos fazem neste momento em que Angola e a RCA estreitam os laços de cooperação e andam de mãos dadas.