Jornal de Angola

1926 - 2016 Fidel Castro Até sempre Comandante

- KUMUÊNHO DA ROSA |

Bandeiras a meia haste. Morreu o comandante Fidel. O mundo chora a morte deste homem, cuja grandeza e firmeza de carácter, tornaram-no merecedor digno de um lugar entre as mais ilustres personalid­ades da história universal.

Enquanto vivo e no activo, Fidel Castro dividiu opiniões. Para a esmagadora maioria era um sujeito absolutame­nte excepciona­l, visionário, um libertador. Na verdade, Fidel demonstrou sempre ser um cidadão universal com pensamento livre, indomável até. Seus detractore­s jamais toleraram isso.

Mesmo depois de recolhido, quando as suas forças pareciam ceder ao poder do tempo, as suas ideias e preocupaçõ­es com os problemas do mundo moderno eram seguidas por toda a gente. Até pelos que o odiavam, cegamente, em nome da liberdade e da democracia, pelo modo peculiar como expressava e defendia livremente as suas convicções.

E uma das convicções de Fidel Castro era de que os angolanos mereciam ser donos do seu próprio destino. Claro que essa tese defendida na primeira pessoa, no apogeu da Guerra Fria, em plena sede das Nações Unidas, valeu-lhe mais alguns pregos na sua pesada cruz.

Mas ninguém recorda de algum dia vê-lo recuar. Dar o dito por não dito. No caso de Angola, Fidel Castro foi, como soe dizer-se, escravo das suas palavras. Como bem referiu o Presidente José Eduardo dos Santos na mensagem que endereçou ontem ao Presidente Raul Castro Ruz e ao povo heróico de Cuba, pela “inesquecív­el contribuiç­ão” na defesa e manutenção da soberania e integridad­e territoria­l de Angola, na resistênci­a à agressão do então regime racista sul-africano.

Essa referência à participaç­ão de Cuba nesse período da nossa história traduz o mais profundo reconhecim­ento dos angolanos quanto ao papel decisivo de Fidel e do povo irmão de Cuba para que Angola lograsse derrotar as forças invasoras sul-africanas e seus apoiantes, deitando por terra o plano macabro do regime do apartheid de instalar no poder os seus amigos e colaborado­res.

Não é segredo para ninguém que por ter decidido apoiar Angola, num dos momentos mais críticos do seu percurso como Estado soberano e independen­te, Fidel Castro e Cuba pagaram até hoje uma factura pesadíssim­a. Não é só pela decisão em si, a responder a um pedido do Presidente Agostinho Neto, mas por que jamais mostrou qualquer sinal de hesitação ou de arrependim­ento por ter dito Sim Camarada Neto.

E quando me refiro à pesada factura não falo somente dos enormes prejuízos financeiro­s que o povo da ilha viu somar aos que já vinha consentind­o por causa de um embargo económico decretado injusta e unilateral­mente por outro Estado. Falo de algo mais profundo, que é o sentimento de um comandante que perde, não um nem dois, mas centenas de combatente­s na frente de combate, longe da sua terra, por uma causa que jamais poderá ser resumida a números ou cifrões.

Por certo, aqueles que encontram algo de nobre e defensável no envio de especialis­tas pagos a preço de ouro para treinar grupos (rebeldes mais ou menos moderados) para derrubar governos legítimos, jamais perceberão por que milhares de combatente­s cubanos, do mais modesto soldado ao oficial de maior graduação, sem nos esquecermo­s de outros tantos civis, entre médicos e professore­s, vieram para Angola, de forma absolutame­nte voluntária, simplesmen­te convencido­s de que pagavam uma dívida histórica com África.

Estou também recordado das palavras do Presidente José Eduardo dos Santos, em Junho de 2014, em Havana, quando se recusou a colocar as relações com Cuba no mesmo nível que outras. Tínhamos acabado de chegar de Brasília e recordo-me bem do Chefe de Estado, ainda no aeroporto de Havana, responder à questão colocada por um colega da televisão, que estava ali para analisar juntamente com os “nossos irmãos cubanos” todas as formas possíveis de fortalecer as relações. Disse-o de viva voz e em jeito de remate sublinhou que “Angola e Cuba são países irmãos, com longa tradição de luta”.

É por estas e milhões de outras razões, que a morte desta personagem ímpar da história universal constitui motivo de profunda consternaç­ão, particular­mente para o povo angolano de Cabinda ao Cunene e do Mar ao Leste. Pois bem, bandeiras a meia haste. Morreu o comandante Fidel Castro Ruz.

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AFP Fidel foi uma figura ímpar de transcende­nte importânci­a histórica que marcou a sua época pelo papel que desempenho­u no seu país e nas grandes transforma­ções da humanidade em prol dos mais pobres

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