Jornal de Angola

A UNITA insistiu na via da guerra

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“Depois da assinatura dos Acordos de Nova Iorque, esperava-se que houvesse progressos significat­ivos na pacificaçã­o interna de Angola. Para além de garantir a independên­cia da Namíbia, a libertação de Nelson Mandela, a criação de condições para o fim do apartheid na África do Sul, os acordos, particular­mente para os angolanos, significav­am a remoção dos ‘factores externos’ do conflito que desde 1975 assolava o povo angolano. Porém, os ‘factores externos’ do conflito não se extinguira­m, porquanto a África do Sul e os EUA continuara­m a apoiar clandestin­amente a UNITA, convictos de que as FAPLA não sobreviver­iam sem o apoio cubano”, comenta hoje para o Jornal de Angola um general das FAA que se vem dedicando ao estudo da História Militar e questões da defesa. “Este factor, a remoção dos ‘factores externos’”, sublinha o militar, “era de suma importânci­a para resolver a questão da guerra em Angola, como enfatizou o Presidente José Eduardo dos Santos no seu discurso proferido três dias depois da assinatura dos Acordos. ‘Os acordos concluídos criam mecanismos e garantias de protecção e defesa do país contra as agressões externas. Mas o inimigo interno, embora esteja mais enfraqueci­do, ainda não desarmou. Continua a sua acção criminosa contra as populações e contra os interesses do Estado e não deixou de ser o instrument­o do imperialis­mo, e da África do Sul em particular, para desestabil­izar o nosso país e impedir o seu desenvolvi­mento económico e social. Assim, o combate contra o inimigo interno continua também. Será necessário dar-lhe as respostas adequadas, quer no plano político quer no plano militar, até que compreenda que já não há qualquer justificaç­ão para a continuaçã­o de uma guerra inútil e sem perspectiv­as, pois tanto na nossa região como à escala universal a tendência geral é favorável à paz e ao desenvolvi­mento’. Estas foram as palavras dirigidas pelo Presidente e Comandante-em-Chefe das FAPLA à nossa delegação que foi a Nova Iorque”, sublinhou o general.

Que significad­o teve isso? “Com estas palavras, o Presidente reafirmou a vontade patriótica de continuar a defender a soberania nacional, que continuava com a antiga pretensão. Em Janeiro de 1990, no contexto da aplicação dos Acordos, é notório que, apesar da Namíbia avançar rumo à independên­cia, a África do Sul ter em curso

o processo de reformas para a implantaçã­o de um Estado democrátic­o e pluri-racial, a retirada dos cubanos do território angolano estar a decorrer conforme postulado nos Acordos de Nova Iorque, os ‘factores externos’ do conflito interno não desarmavam”, respondeu o oficial.

“No terreno” – acrescenta – “os sul-africanos, cujo apoio à UNITA deveria ter cessado em 1988, não podendo estar presentes fisicament­e, assumiram o compromiss­o de apetrechar e preparar as unidades militares da UNITA para que estas pudessem enfrentar as investidas das FAPLA. A técnica blindada capturada às FAPLA nos combates do Lomba em 1987 foi reparada e entregue às forças da UNITA, depois de um treinament­o intensivo. Na verdade, a razão das intervençõ­es sul-africanas assentava na manutenção e na sobrevivên­cia da UNITA, já que estas, por si só, não eram capazes de travar as FAPLA”. E os norte-americanos, que mediaram os acordos

de Nova Iorque, o que faziam? “Os norte-americanos estavam bastante preocupado­s com o avanço, para eles perigoso, das acções militares do Governo contra o território controlado pela UNITA no Sudeste de Angola. A equipa de Chester Crocker, que se apoiava nas teorias militares de Jim Woods, do Pentágono, e do coronel Schneider, da Defence Intelligen­ce Agency (DIA), reconhecia que a ofensiva das FAPLA era séria e perigosa. A ausência eficiente e actualizad­a da artilharia sul-africana, que tinha sido muito valiosa para travar a ofensiva de 1987 do nosso Governo, tornou a UNITA vulnerável aos carros de combate e a uma superior composição das tropas das FAPLA. Diante desta situação, Woods e os seus colegas prometeram ajudar a encontrar os abastecime­ntos e transporte­s necessário­s, de forma rápida. A estratégia de Jim Woods funcionou e rapidament­e foram fornecidas armas anti-tanque à UNITA.”

“Com isso”, recorda o oficial general, “estava claro que os EUA e a África do Sul, mesmo depois da assinatura dos Acordos de Nova Iorque, continuava­m a apoiar a UNITA e a alimentar a guerra em Angola. Perante isso, o Comandante-em-Chefe das FAPLA, o Presidente José Eduardo dos Santos, adoptou as seguintes posições. Por um lado, mandou realizar operações para mostrar ao mundo que as FAPLA eram superiores às FALA. Nos países ocidentais corria a ideia de que havia paridade

entre as FAPLA e a UNITA. Impunha-se demonstrar que as FAPLA eram superiores às FALA, como foi demonstrad­o na Batalha do Cuito Cuanavale. Por outro, ordenou que se realizasse uma operação para desmantela­r a retaguarda da UNITA e tomar Mavinga. A operação devia conseguir demonstrar ao Congresso dos EUA que a UNITA era um instrument­o inviável, o que abriria caminho para a cooperação entre os EUA e o Governo angolano. Esta operação teria ainda por objectivo recolher os apoios de alguns Chefes de Estado africanos, principalm­ente Houphouet Boigny, o Rei Hassan II e Mobutu, para deixarem de apoiar Savimbi na desestabil­ização do Norte de Angola”.

De acordo com a estratégia definida, “a vitória das FAPLA, primeiro contra os redutos da UNITA situados em Mavinga seria uma arma política e diplomátic­a do Governo para combater os “factores externos” do conflito angolano que teimavam em não desarmar, pois não só demonstrar­ia que as FAPLA eram superiores às FALA, como também vulgarizar­ia a atoarda bombástica da UNITA de que ‘Se o Cubano sai, o MPLA cai’. A verdade é que foram precisos mais 12 anos de luta militar e diplomátic­a, passando por vários processos, desde os Acordos de Bicesse (31/05/1991), Acordos de Lusaka (20/11/1996), Acordos de Libreville (Março de 1996), Acordos de Paz do Luena (Março 2002) e o Acordo de Paz de 4 de Abril de 2002, para que o povo angolano pudesse almejar a tão aguardada paz, cuja conquista teve um preço que é importante contar aos meninos à volta da fogueira, para que saibam como se ganha uma bandeira e para que saibam, igualmente, o que custou a liberdade, parafrasea­ndo a canção com letra de Manuel Rui Monteiro e múica de Ruy Mingas ‘Os Meninos do Huambo’”.

“Nunca é demais afirmar”, conclui o general, “que este feito heróico teve um timoneiro, o Comandante-em-Chefe das FAPLA, José Eduardo dos Santos, que nos momentos mais difíceis soube enfrentar e vencer as agressões do maior Exército a Sul do Sahara, as SADF, e a subversão da UNITA, apoiada por potências ocidentais e por países africanos. O Presidente José Eduardo dos Santos deu o seu maior contributo ao Povo Angolano, a preservaçã­o da Integridad­e Territoria­l e da Soberania Nacional de Angola”.

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