Colonização é crime contra a humanidade
Dois dos principais jornais franceses, “Le Figaro” e “Libération”, destacaram ontem as declarações do candidato centrista às presidenciais, Emmanuel Macron, durante a visita à Argélia, na última quarta-feira, em que o líder do movimento “Em Marcha” declarou que a colonização francesa foi um crime contra a humanidade, uma verdadeira barbárie.
Macron propôs que a França apresentasse desculpas oficiais em relação aos crimes cometidos durante a colonização da Argélia. Em 1830, a França tomou o país, que ficou sob domínio francês até 1962. Um passado que os franceses devem “olhar de frente”, reconhecendo “aqueles que foram vítimas dos nossos gestos”.
As declarações de Macron suscitaram reacções tanto da extremadireita como da direita, nas quais o ex-ministro da Economia de François Hollande tem muitos inimigos, mas também no próprio Partido Socialista.
Segundo o candidato da direita François Fillon, a atitude de Macron mostra o ódio que o centrista tem da história francesa. ParaFillon, as declarações do rival não são dignas de um candidato à presidência. De acordo com o líder do partido “Os Republicanos”, Bernard Accoyer, declarações como essas podem alimentar ainda mais um mal-estar de identidade e atrapalhar a coesão nacional. Quem também reagiu de forma violenta foi a líder da extrema-direita, Marine Le Pen. “Existe algo mais grave do que, quando queremos ser presidente e vamos a um país estrangeiro, acusar a própria nação de crimes contra a humanidade?”, escreveu Le Pen na sua página do Twitter.
Para alguns representantes do Partido Socialista, o comportamento de Macron é oportunista, já que há alguns meses, em entrevista à revista francesa “Le Point”, o ex-ministro declarou que a colonização da França na Argélia contou com práticas de tortura, mas também foi responsável pela evolução do país e a evolução da sociedade argelina.
Em entrevista publicada ontem pelo jornal “Le Figaro”, Macron defende-se e diz não se arrepender das declarações que fez na Argélia. Segundo disse, essa polémica serve para mostrar em que estado está hoje a França, que só aceita enxergar uma parte da sua história.
Para o centrista, é preciso reconhecer as barbáries praticadas durante a colonização como crimes contra a humanidade. “Isso não quer dizer que os franceses que viviam na época da colonização na Argélia e serviam o exército francês eram criminosos, porque o único responsável é o Estado francês”, pondera. Segundo Macron, é preciso que os franceses reconstruam as memórias fracturadas, já que a França está hoje bloqueada pelo que chama de uma triste paixão pela sua história, o que impede o país de evoluir.
Já o jornal “Libération” minimiza a polémica e diz que considerar as barbáries da colonização como crimes de guerra é algo óbvio, não apenas na Argélia, mas em todas as colónias francesas, como Tunísia, Marrocos, Indochina, entre outras. “Qualquer historiador sério sabe dos crimes, massacres e atrocidades que foram cometidos durante a colonização francesa”, diz o historiador Benjamin Stora, em entrevista ao diário.
Para Stora, as declarações de Macron não são nem um pouco revolucionárias. “Quando falamos da história francesa, mencionamos aspectos gloriosos, mas raramente as partes obscuras, quando sabemos que elas existem”, reitera o historiador.
Stora acredita que a intenção de Macron de pedir desculpas à Argélia é um pragmatismo que ainda falta aos franceses. Lembra que os Estados Unidos, ao pedirem desculpas pelos crimes de guerra cometidos no Vietname, permitiram que Washington reabrisse a sua embaixada no país e que os vietnamitas se tornassem um grande parceiro comercial dos norte-americanos.