Angela Merkel anuncia aproximação à Rússia
Berlim e Washington começam a desenhar o quadro das suas relações bilaterais
A chanceler alemã fez saber aos seus parceiros na União Europeia e aos Estados Unidos que quer desenvolver esforços para restabelecer a cooperação com a Rússia, principalmente em questões de segurança, económicas e comerciais.
Angela Merkel tocou oportunamente no tema durante a reunião sobre segurança em Munique, Alemanha, onde praticamente o conjunto de países da OTAN apreciaram as principais preocupações em matéria de inteligência e cooperação militar de alto nível para garantir a defesa dos Estados.
A chanceler alemã justificou que as diferenças com a Rússia são existenciais, e, em muitos casos, muito complexas, mas “é fundamental retomar a cooperação para se discutir os assuntos e encontrar em comum os melhores caminhos para desenhar o quadro de uma solução política”.
Merkel também trocou impressões com o Vice-Presidente dos EUA, Mike Pence, sobre o modelo actual das relações mais particulares com os Estados Unidos. Os dois políticos comprometeram-se a manter a estreita relação entre os seus países, à luz das políticas europeias e da nova Administração norte-americana.
A conversa aconteceu no marco da Conferência de Segurança de Munique (MSC), um grande fórum de política externa, e serviu como uma primeira tomada de contacto após os atritos surgidos entre ambos os lados do Atlântico com a chegada de Donald Trump à Casa Branca.
Após a reunião, os colaboradores do Vice-Presidente dos Estados Unidos afirmaram, em comunicado, que tanto Mike Pence como Angela Merkel “reafirmaram a duradoura aliança entre EUA e Alemanha e comprometeram-se a manter a estreita cooperação num amplo leque de desafios globais”.
Pence e Merkel abordaram, ainda, o debate sobre a despesa militar no seio da OTAN, após a exigência da nova administração de Washington de que seus parceiros na Aliança Alântica aumentem o orçamento na Defesa e Segurança.
A nota esclarece que foi abordada a necessidade dos aliados da OTAN cumprirem o compromisso de repartir cargas e houve acordo para que a Aliança continue a transformar-se para fazer frente às ameaças do século XXI.
O Vice-Presidente dos Estados Unidos e a chanceler alemã também trataram da estratégia para derrotar o Estado Islâmico (EI) no Iraque e na Síria, assim como outras organizações terroristas.
Pence quis agradecer à chanceler Merkel pela sua liderança na mediação externa para resolver o conflito da Ucrânia através do formato Normandia, que inclui Paris e Berlim como mediadores entre Kiev e Moscovo. Além disso, o Vice-Presidente norte-americano reconheceu a contribuição alemã à missão internacional no Afeganistão e ao novo desdobramento da OTAN nos países bálticos como dissuasão frente à Rússia.
Guerra Fria
O ministro das Relações Exteriores russo, Sergei Lavrov, afirmou que o seu país “não procura conflitos, mas protege apenas os seus interesses e acusou os europeus de terem sacrificado o bom senso em favor de uma minoria contra a Rússia e a OTAN, de manter-se como uma instituição da Guerra Fria”.
Lavrov defendeu, perante os membros da Conferência de Segurança de Munique, uma ordem mundial pós-Ocidental na qual cada país, baseando-se em sua soberania no marco da lei internacional, busque um equilíbrio entre os seus próprios interesses nacionais e os dos parceiros, com respeito à identidade histórica e cultural de cada um.
O ministro russo afirmou que o objectivo de Moscovo é “cumprir totalmente os acordos de Minsk para pôr fim ao conflito ucraniano e acusou Kiev de não ter dado passos, garantindo que as sanções russas não vão ser levantadas enquanto os compromissos alcançados não forem completamente aplicados”. Perante os Estados Unidos, a Rússia deseja uma relação baseada no pragmatismo, respeito mútuo e responsabilidade global compartilhada, disse o ministro russo antes de manifestar que Moscovo está aberto, se Washington também estiver, a explorar o imenso potencial da cooperação política e económica.Para o ministro russo das Relações Exteriores, a etapa denominada pós-Guerra Fria acabou e as instituições falharam na hora de se adaptar, como foi comprovado nos esforços a favor dos processos de democratização no Médio Oriente e Norte de África.
Para a Rússia, a ampliação da OTAN derivou em tensões de níveis sem precedentes nas últimas décadas, que prejudicaram projectos comuns de cooperação.
Sergei Lavrov lembrou que a declaração que fixou as relações entre Rússia e a Aliança baseava-se no interesse comum de evitar conflitos e ameaças na área euro-atlântica, respeitando os interesses da outra parte, não a criar linhas de demarcação de alto risco.
Em sua opinião, não foi atingido o objectivo, fundamentalmente porque a OTAN continua a ser uma instituição da Guerra Fria. O ministro russo rejeitou as acusações de ampliar a denominada nova ordem liberal e confiou que os líderes mundiais responsáveis apostem por uma ordem democrática e justa.
Lavrov apresentou a Rússia como um país euro-asiático que deseja boas relações de vizinhança e lembrou que milhões de soldados soviéticos deram a vida por uma Europa livre. “Queremos ver uma Europa livre, independente nas suas decisões”, realçou o ministro, tendo lamentado que a União Europeia não encontra a forma para mudar a sua política perante a Rússia.
O ministro russo das Relações Exteriores exigiu provas aos governos ocidentais que acusam Moscovo de espionagem cibernética e ciberataques, e apontou que os Estados Unidos evitaram em repetidas ocasiões sentar-se para falar com eles sobre este assunto. Sergei Lavrov deixou um convite claro às autoridades norte-americans e europeia para manterem com a Rússia um diálogo franco que sirva para aproximas os pontos de convergência e ultrapassar as diferenças, muitas das quais são de pontos de vista.