Jornal de Angola

A festa do Povo

TODOS À NOVA MARGINAL

- PEREIRA DINIS |

Quando a Nova Marginal de Luanda, na Praia do Bispo, é toda decorada para receber o grande momento do Carnaval, o desfile da classe A, com a participaç­ão de 14 grupos de diferentes municípios, distritos e bairros da capital, é hora para recordar tudo quanto o Entrudo já permitiu ao povo angolano mostrar ao mundo.

Mentes mais frescas recordam que a festa tem um passado longo demais para ser resumida num simples texto de jornal. Aproveitam­os o ambiente que hoje atinge o clímax na capital com o desfile principal para recordar que o União Operária Kabocomeu foi o primeiro grupo a vencer o Carnaval no pós-independên­cia.

A festa foi retomada em 1978. Agostinho Neto apelou ao povo para retornar às tradições e propôs um motivo para os festejos: a expulsão do exército invasor sul-africano a 27 de Março do ano anterior. Surgiu assim o Carnaval da Vitória. O emblemátic­o grupo do Sambizanga estendeu a fita métrica para mostrar como os angolanos eram enganados pelas autoridade­s coloniais. Diz-se que se empoleirou na política para vencer. A verdade é que os números da ferramenta se reproduzir­am nas contas finais e o grupo ganhou o primeiro desfile de Luanda. Tudo aconteceu no largo do Kinaxixi.

Com o passar dos tempos, mudou-se os cenários. O Carnaval desceu para a avenida 4 de Fevereiro, a antiga Marginal de Luanda, e derivou para a Praia do Bispo, onde 14 grupos, entre veteranos e estreantes se apresentam hoje no desfile central do Carnaval de 2017. Todos pretendem contagiar jurados e público para, no fim, poderem cantar vitória.

Ontem, último dia de “reflexão” dos grupos, integrante­s das falanges de apoio, reunidos junto às sedes dos grupos, mostravam-se crentes na vitória. No Sambizanga, os amigos e simpatizan­tes dos grupos Kabocomeu, Kiela e Kazukuta afirmavam que a melhor dança, música e coreografi­a saíam de um dos grupos daquele distrito, mais conhecido por albergar a sede do clube Progresso Associação do Sambizanga.

Domingos Chipula, tocador de bumbo (tambor), que já se apresentou no Kabocomeu, Kiela e Kazukuta, aproveita o espírito de Carnaval para lançar algumas piadas aos grupos rivais. Afirma que tanto o município de Viana, sede do União Njinga, vencedor da edição passada, quanto a Samba, terra do União 10 de Dezembro, terceiro classifica­do, não têm tradicão de Carnaval. Esses grupos “ganharam por acaso”, brinca.

Rivalidade da Ilha

Adeptos dos grupos do Sambizanga reconhecem que “em Luanda, quem põe o Sambizanga em sentido é a Ilha, o União Mundo, mas quando os muxiluanda vêem o Kabocomeu e o Kazukuta ‘deslizar’também se põem a prumo. Alguns mais velhos recordaram antigas rixas entre os grupos, as quais remontam a tempos anteriores à independên­cia nacional. Históricos do Kabocomeu recordam, por exemplo, que os integrante­s do União Kiela zombavam pela sua conduta social. E lembram a resposta de então: “somos bêbados, mas vestimos melhor.” E a piada deriva em acusações de inveja. O agrupament­o musical Os Kiezos deu nova roupagem ao tema e tornaram-no eterno.

Na Ilha do Cabo, as tradições do Carnaval sempre foram além do União Mundo, o emblemátic­o grupo fundado em 1968, que cultiva o estilo semba e pretende levar mais de 1.500 pessoas, para destacarem a importânci­a da diversific­ação da economia no país.

Os ensaios do União Mundo, iniciados em Novembro, serviram para contagiar boa parte da população local, em particular as crianças e adolescent­es. Embora façam de tudo para imitar as vestes do grupo, que privilegia­m o amarelo, vermelho e branco, lembrando os pescadores e as mamãs da Ilha, os petizes contentam-se com o que conseguem encontrar entre os trapos lá de casa e saem a percorrer os becos da zona com a sua batucada.

Hoje, na Nova Marginal, os foliões vão voltar a ter a oportunida­de de apreciar exímios mestres do musengo (apito), pungue (corno), batuque (tambor), ngoma, da dikanza (reco-reco) e do dibalelo (caixa), que dão às letras a dimensão sublime do Carnaval.

E depois do desfile de Carnaval, vem a quarta-feira das mabangas. A festa é mais resumida, algo intimista. Os grupos costumam juntar os rendimento­s angariados nos desfiles de rua para realizar uma festa para os integrante­s. O recurso aos bivalves, antigament­e recolhidos nas zonas baixas da Baía de Luanda, é mais uma demonstraç­ão da influência do mar e da pesca, em particular, no Carnaval de Luanda. Sem tempo para irem à faena, deixa de haver peixe para o mufete. Daí, comer-se mabangas.

Vencedores e homenagead­os

A primeira edição do Carnaval pós-independên­cia, em 1978, foi ganha pelo grupo União Operária Kabocomeu, que dança Kazukuta. O União Angola Independen­te venceu três edições seguidas: 1994, 1995 e 1996. O União Esperança venceu duas (2014 e 15), o que trouxe novo dinamismo ao Entrudo no Rangel. O grupo União Njinga Mbande, Viana, venceu na classe de adultos e infantis na edição passada. O União Mundo da Ilha tem dez títulos, conquistad­os de forma intercalad­a.

Os desfiles de Carnaval em Luanda começaram no dia 25, com a classe infantil. Domingo foi a vez da classe B, em que participam 15 grupos, como o União Kwanza, União Twafundumu­ka, União Angola Independen­te e os estreantes Unidos do Zango e União Imbondeiro do Cazenga. Hoje, percorrem os três quilómetro­s da Nova Marginal os grupos da classe A.

O primeiro grupo a ser homenagead­o foi o União Kabocomeu, em 2003, seguiu-se o União Feijoeiros do Ngola Kimbanda (2004), União Dizanda do Icolo e Bengo (2006), União Kiela do Sambizanga e União Kwanza (2007), União Mundo da Ilha (2009), União 10 de Dezembro (2011), União Angola Independen­te (2012), União Jovens do Mukuaxi (2013), União Povo da Samba (2014) e União Kazukuta do Sambizanga (2016).

Este ano, os homenagead­os são o grupo União Amazonas do Prenda e o investigad­or Roldão Ferreira. A homenagem realiza-se no sábado, na Liga Africana. O primeiro grupo a desfilar é o União Angola Independen­te. Têm direito a prémios os cinco primeiros classifica­dos.

No Sambizanga, os amigos e simpatizan­tes dos grupos Kabocomeu, Kiela e Kazukuta afirmavam que a melhor dança, música e coreografi­a saíam de um dos grupos daquele distrito, mais conhecido por albergar a sede do clube Progresso Associação do Sambizanga

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MOTA AMBRÓSIO | EDIÇÕES NOVEMBRO Todos os caminhos vão dar hoje à Marginal da Praia do Bispo onde 14 grupos carnavales­cos disputam o título no desfile central da Classe-A do Carnaval de Luanda
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KINDALA MANUEL|EDIÇÕES NOVEMBRO União Operária Kabocomeu foi o primeiro grupo a vencer o Carnaval no pós-independên­cia com a dança Kazukuta e tem como pretensão a conquista do primeiro lugar este ano por isso tem trabalhodo afincadame­nte para atingir os objectivos

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