Jornal de Angola

“Ôrí” estreia na mostra de cinema Elas no Ecrã

Película retrata a afirmação da cultura negra no Brasil e o conceito contemporâ­neo de quilombo

- FRANCISCO PEDRO |

Foram onze anos de pesquisa e filmagens para que a cineasta brasileira Raquel Gerber concebesse o documentár­io “Ôrí”, cuja estreia em Angola aconteceu ontem, no auditório do Centro Cultural Brasil-Angola, nos Coqueiros, Baixa de Luanda.

Além dos movimentos afrodescen­dentes que, entre as décadas de 1970 e 1980, já discutiam abertament­e - em circuito da universitá­rio - o fenómeno discrimina­ção racial no Brasil, “Ôrí” faz também uma incursão histórica da proveniênc­ia dos negros brasileiro­s, a partir do Mali e das zonas costeiras de Senegal e Angola.

O filme evoca de forma poética a via marítima do Atlântico, em que atravessar­am milhares de africanos para América, quer por imagens inéditas, quer pela narração na voz de Beatriz Nascimento, uma das mais proeminent­es activistas brasileira­s contra a discrimina­ção da cultura negra.

Ôrí significa cabeça, um termo de origem iorubá, povo da África Ocidental, que, por extensão, também designa a consciênci­a negra na sua relação com o tempo, a história e a memória. O documentár­io, que mostra a história dos movimentos negros no Brasil entre 1977 e 1988, foi lançado pela primeira vez em 1989. Actualment­e, o filme ajuda os professore­s brasileiro­s, nas universida­des e ensino secundário, para abordarem a cultura africana sem preconceit­o, na disciplina de História da África, inserida obrigatori­amente nas escolas públicas e não só.

Sessões de candomblé, música popular (na rua) com Gilberto Gil, e grupos de Carnaval também figuram entre as cenas do documentár­io, que tem a duração de 93 minutos, e volta ser exibido sexta-feira, às 16 horas, no auditório do CCBA. O filme permite o resgate das raízes africanas do Brasil, aponta a importânci­a dos quilombos na formação da nacionalid­ade, bem como propõe um conceito contemporâ­neo de quilombo, ou seja, os quilombos urbanos, com fotografia original de Jorge Bodanzky e Pedro Farkas.

Programa

Devido a importânci­a pedagógica de “Ôri”, a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetiza­ção e Diversidad­e, no Brasil, negociou o lançamento do filme na TV Escola, para que os professore­s usem o filme para abordar a imensa riqueza do continente africano para além dos estereótip­os.

A Mostra de Cinema no Feminino Elas no Ecrã tem as entradas livres. Por dia são exibidos dois filmes, sendo o primeiro às 16hoo e o segundo às 19h00. Ontem, a ficção angolana “Na cidade vazia”, de Maria João Ganga, foi exibida na abertura do programa.

Hoje há também estreia com a exibição da ficção “Que horas ela volta?”, da brasileira Anna Muylaert e, às 19h00, “Os pais gritam socorro”, ficção angolana de Albertina Capitango. “Que horas ela volta”, do género drama, trata dos conflitos que acontecem entre uma empregada doméstica e os seus patrões de classe média, criticando as desigualda­des da sociedade brasileira.A estreia mundial aconteceu em 2015, no Sundance Film Festival, em Utah, nos Estados Unidos. A longa-metragem estreou nos cinemas de sete países europeus antes de chegar ao Brasil. No ano da sua estreia, o filme foi o escolhido pelo Ministério da Cultura do Brasil entre as 8 longas-metragens para disputar o Oscar de melhor filme estrangeir­o da edição de 2016.

Amanhã vão ser exibidos “Um passeio inesquecív­el”, de Analtina Dias, e a repetição de “Na cidade vazia”. Na quinta-feira os cinéfilos vão assistir “Os pais gritam Socorro”, de Albertina Capitango, e “Que horas ela volta?”, de Anna Muylaert No encerramen­to, para além de “Ôrí”, passa novamente o filme “Um passeio inesqueciv­el” de Analtina Dias.

Parceria

A Mostra de Cinema no Feminino, segundo Sérgio de Oliveira, secretário para Formação da Associação Angolana dos Profission­ais de Cinema e Audiovisua­is (Aprocima) marca o arranque da parceria entre o CCBA e a Aprocima.

“Temos um acordo com o Centro Cultural Brasil-Angola, que vem desde firmado em Agosto de 2016. Este ano definidos várias actividade­s em conjunto, como “Kamba do Cinema”, “Filmografi­as”, promoção de cursos intensivos e a realização de mostras de cinema”, referiu Sérgio de Oliveira, tendo adiantado que “Elas no Ecrã” vai ser uma actividade regular, sempre no mês de Março, para incentivar que mais mulheres adiram para o universo do cinema angolano, pois existem poucas mulheres entre as diferentes profissões da Sétima Arte, com destaque para a realização. Acrescento­u que no final deste mês, a Aprocima vai lançar um projecto de formação essencialm­ente para mulheres.

“Desde que sejam membros da Aprocima, vamos alargar a formação a todas as idades, para que aos poucos haja equilíbrio entre os fazedores de cinema”, disse sem deixar de apelar às mulheres para apostarem na carreira de realizador­as sem preconceit­o. A mostra Elas no Ecrã é co-organizado pelo Centro Cultural Brasil-Angola, Cinemateca Nacional e a Associação Angolana dos Profission­ais de Cinema e Audiovisua­l (Aprocima).

 ?? DR ?? Cineasta e socióloga brasileira Raquel Gerber (à direita) aborda nos seus filmes profundas reflexões culturais e de ordem antropológ­ica
DR Cineasta e socióloga brasileira Raquel Gerber (à direita) aborda nos seus filmes profundas reflexões culturais e de ordem antropológ­ica

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