Capacetes Azuis dificultam ensino
REPÚBLICA CENTRO AFRICANA Crianças deixam de estudar porque rebeldes e forças da ONU ocupam escolas
A organização não governamental de defesa dos direitos humanos Human Rights Watch (HRW) acusa num relatório divulgado ontem grupos armados e até mesmo “capacetes azuis” da ONU de ocuparem, saquearem e danificarem escolas na República Centro Africana, impedindo deste modo o ensino das crianças.
“Grupos armados e até mesmo soldados da missão de paz da ONU na RCA (Minusca) usaram edifícios escolares como bases ou quartéis ou colocaram as suas forças perto de terrenos escolares”, refere a HRW num comunicado sobre o seu relatório “Sem aulas: Quando grupos armados utilizam escolas na República Centro Africana”.
No documento é referido que “o Governo centro-africanos e a missão de manutenção da paz devem aumentar a protecção dos estudantes e das escolas em áreas do país afectadas por conflito armado”.
A ONG denuncia no comunicado que “a violência por grupos armados e os ataques a civis aumentaram drasticamente desde Outubro de 2016, particularmente no centro do país” e que combates entre duas facções séléka, nas províncias de Ouaka e Alto-Kotto, provocaram um aumento dos ataques contra civis e obrigou à fuga de dezenas de milhares de pessoas.
A HRW entrevistou mais de 40 pessoas, entre os quais estudantes, pais, professores e comandantes de grupos armados em seis províncias da RCA e documenta no relatório oito casos da responsabilidade dos séléka, ao mesmo tempo que refere que “os combatentes anti-balaka também ocuparam e danificaram escolas”. A ONG refere dois casos em que os “capacetes azuis” utilizaram escolas como bases, violando as regras da ONU, e que as forças abandonaram ambas as escolas depois de a HRW ter informado responsáveis das Nações Unidas.
“As crianças perderam anos de educação em muitas zonas da República Centro Africana, porque os grupos armados não trataram as escolas como locais de aprendizagem e de refúgio para as crianças”, lamenta Lewis Mudge, investigador da HRW e co-autor do relatório, citado no comunicado. “O Governo e a ONU podem fazer mais para garantir que os combatentes se afastam das salas de aula e que as crianças podem ir à escola com segurança”, recomenda o comunicado.
O Departamento para a Coordenação dos Assuntos Humanitários da ONU estimou em Novembro do ano passado que 2.336 escolas “estavam operacionais” na República Centro Africana, enquanto 461 não funcionavam devido à insegurança, falta de professores, deslocação das pessoas, destruição ou ocupação de escolas por grupos armados. A República Centro Africana mergulhou numa crise política e de segurança sem precedentes depois do derrube do Chefe de Estado François Bozizé e a tomada do poder em Março de 2013 pela então coligação rebelde séléka.
A violência inter-comunitária devido a confrontos entre milícias cristãs, os anti-balaka, e rebeldes séléka, muçulmanos, provocou milhares de mortos e centenas de milhares de deslocados, segundo a ONU.