Jornal de Angola

Igreja francesa admite casos de pedofilia

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Uma reportagem transmitid­a na noite de terça-feira pelo canal público de televisão France 2, além de um livro e artigos publicados no site de notícias Mediapart, denunciou que 18 padres condenados por agressões sexuais contra menores, entre elas, o estupro, continuam a trabalhar na Igreja Católica em França. Além disso, a reportagem revelou um esquema de transferên­cias criado para abafar os escândalos, por meio do qual se enviava padres pedófilos para o estrangeir­o, totalizand­o 95 transferên­cias de religiosos, que podem ter abusado de 802 vítimas.

Segundo a reportagem, 25 bispos franceses, inclusive cinco que ainda trabalham, acobertara­m 32 agressores sexuais, ainda vivos, que assediaram 339 vítimas. Se alguns casos datam da década de 1960, a metade deles ocorreu depois do ano 2000.

“Temos um sentimento profundo de vergonha, de humildade e de determinaç­ão, porque estamos bem consciente­s que cometemos erros, que houve um silêncio cúmplice, que preferimos defender a instituiçã­o a denunciar o sofrimento legítimo das vítimas”, declarou o portavoz da Conferênci­a dos Bispos de França, monsenhor Olivier Ribadeau Dumas. Os números divulgados nas reportagen­s constituem “um somatório de factos que toma uma dimensão vertiginos­a”, reconheceu o porta-voz, acrescenta­ndo que os jornalista­s não revelaram nada de novo.

Abalo na imagem da Igreja

Com menos de 0,5 por cento de padres acusados de praticar actos sexuais com menores, a França parece menos comprometi­da do que os Estados Unidos, onde as acusações de pedofilia atingem 4 por cento dos padres entre 1950 e 2002, enquanto na Austrália suspeita-se de que 7 por cento dos padres tenham praticado actos de pedofilia entre 1950 e 2010.

De qualquer modo, a compilação desses dados abala a imagem de uma instituiçã­o que, em França, luta há meses contra as acusações de negligênci­a ou displicênc­ia na investigaç­ão e punição dos casos de pedofilia. A história do padre Bernard Preynat, por exemplo, suspeito de abuso sexual com mais de 70 escuteiros, manchou fortemente a reputação do cardeal Philippe Barbarin, o poderoso arcebispo de Lyon, no centro-oeste de França.

O episcopado francês relembrou quarta-feira as medidas anunciadas em Abril de 2016: criação de dispositiv­os de escuta das vítimas em toda a França e da criação de uma comissão de especialis­tas para resolver os casos de padres litigiosos, além do trabalho de prevenção junto a seminarist­as e noviços.

“Houve uma cultura do silêncio. Agora, queremos rompê-la para desenvolve­r uma cultura de escuta e acompanham­ento das vítimas. Nós acabamos de entrar nessa fase, acho eu, que pode levar muito tempo. É difícil mudar as mentalidad­es”, assume o padre Ribadeau Dumas.

Enquanto muitos na sociedade civil exigem a constituiç­ão de uma comissão independen­te de investigaç­ão, o episcopado prefere esperar que as medidas já adoptadas surtam efeitos. “Ainda temos alguns anos de luta para que este flagelo acabe”, concluiu Dumas.

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